– Ela fez O QUÊ?! - Caspian estava furioso.

– Eu juro, senhor! Eu não sabia o que ela estava fazendo. Até agora não entendo... - justificou-se Rip-Chip.

– Trazer um homem para dentro do castelo, como se fosse um cão perdido! - indignou-se Caspian - Já pensou se é um espião de Lord Sobespian ou de seus desertores?

– Perdoe-me a intromissão, mas tenho duas informações importantes. - disse uma mulher, abrindo a porta da biblioteca.

Era Amber. Amber era a ama-de-leite de Caspian, porque a mãe dele morrera no parto. Agora que ele é rei, ela é sua mais importante e influente conselheira. Amber era uma mulher de meia idade, acima do peso, que mantinha seus cabelos ruivos presos em um coque. Costumava usar um vestido vermelho, que sempre trazia conforto a seu afilhado. Somente ela era capaz de colocar juízo em sua cabeça real; ela e suas primas, é claro.

– Primeira coisa: - disse Amber, olhando fixamente para Caspian - Lord Sobespian e seus revoltados foram mortos na Batalha do Beruna (Príncipe Caspian, As Crônicas de Nárnia). Nem para espião calormano ele serve, por ser tão pálido.

Caspian ficou ainda mais furioso, mas tinha que admitir que ela estava certa. Sempre estava certa.

– Segunda coisa: - continuou ela, pegando um livro da prateleira, que tinha por título "Povos Extintos E Suas Culturas" - o Professor Cornelius chegou de sua viagem à Arquelândia. Ele e suas primas estão na mesa de refeições, esperando-te para o café matinal.

Agora com o livro em mãos, Amber se dirigiu à porta. Mas antes de sair, lembrou-se de algo importante:

– General Rip-Chip, as ladys Sam e Belle pediram que você desse uma olhada no convidado delas; mandaram te lembrar que ele é sua responsabilidade.

– Sim, milade. - Rip-Chip fez uma reverência.

Assim que Amber saiu, Caspian virou-se para Rip:

– Elas vão se ver comigo! EU sou o rei!

Caspian caminhou furioso pelos corredores. "Onde já se viu? Duas inglesinhas desafiando a autoridade do Rei de Nárnia?!" pensava ele "Que ultraje! Que insulto!". Ele andou ainda mais irritado; seus passos raivosos ecoavam pelos corredores de madeira, mais pesados que passos de elefante. Logo avistou a porta dupla do salão de jantar. Caspian abriu com força, assustando Sam, Belle e o Professor. Mas eles logo voltaram a sorrir.

– Caspian! Chegou na hora certa! Eu estava contando as maravilhas do da Arquelândia para elas! - Professor Cornelius tinha um enorme sorriso.

Caspian nem deu atenção. Ele caminhou firmemente para perto de Samantha, e debruçou-se na mesa, olhando furioso para ela.

– Quem te deu autoridade para mandar neste castelo? - ele perguntou, entre dentes.

– Bom dia pra você também, primo! - cumprimentou Sam.

Ela evitou olhar para ele, pois sabia que se olhasse, não conseguiria ficar séria. É de família, a mãe dela também ri quando fica nervosa. Ela manteve seu olhar fixo em Belle, que estava sentada bem na sua frente.

– Não. Me. Provoque. - rosnou Caspian.

– Caspian, isto é jeito de tratar convidadas tão bem-vindas? - repreendeu Professor Cornelius.

– Deixe, Professor! Ele acordou do lado errado da cama hoje! - riu Sam, pegando seu copo de suco de laranja.

Caspian odiava traição, segredos e crimes; mas acima de tudo, não admitia ser ignorado. Com um golpe rápido, ele derrubou o copo das mãos de Samantha, derramando todo o seu conteúdo no azarado Professor, que ficou ensopado. Abelle levantou-se com rapidez e começou a esfregar seu guardanapo na camisa do velhinho. Não demora e Amber traz uma camisa limpa pra ele. Cornelius, é claro, ficou desconcertado, mas sentiu-se melhor por saber que esse pequeno incidente não afetou o livro que Amber lhe entregou.

– Eu não tinha terminado. - Sam olhou nos olhos de Caspian. Agora ela estava furiosa.

– Quem te deu o direito de mandar e desmandar neste castelo? - disse Caspian, ríspido.

– Qual ordem de Vossa Majestade desacatei? - Sam usou o mesmo tom de voz baixo e rude que ele.

– Por que não me avisou do peregrino? - ele finalmente falou.

– Ora, francamente Caspian! - Sam se levantou da mesa, ficando perto de Cornelius - Tudo isso por um mendigo?

– EU SOU O REI! Preciso saber o que acontece no MEU CASTELO! - ele tentou se justificar.

– Que grande incompetência seus soldados demonstrariam se, tendo a mim, minha irmã e o General Rip-Chip, fossem chamar Vossa Majestade, que depois de três noites finalmente conseguiu dormir, por causa de um mendigo tacando pedras no muro! - Samantha o trouxe à razão.

– Mas eu precisava saber! - ele tento se defender outra vez.

– E não soube??? General Rip-Chip comprometeu-se a te contar assim que você acordasse! - falou Sam, que recebeu um acento de cabeça como confirmação de sua irmã.

– Mas... - Caspian sabia que estava perdendo, e não gostava - por que você trouxe ele pra dentro???

– PORQUE ELE ESTAVA QUASE MORTO!!! - Sam gritou pela primeira vez em toda a discussão. Todos se espantaram - Faminto, sedento, implorando por ajuda! Eu jamais me perdoaria se o deixasse morrer ali!

– O que você teme, Caspian? - Belle perguntou, meio que estrategicamente - Acaso tem algum segredo que precise ser protegido? É por isso que teme tanto que ele seja um espião?

Caspian já estava sem argumentos. Havia perdido a discussão, mas não se conformava com isso.

– Será que todos só sabem defender esse mendigo?! - ele revoltou-se.

Rip-Chip abriu a porta do salão. Seus olhinhos estavam ansiosos e brilhantes, ávidos por entregar boas novas.

– Senhores... - ele chamou a atenção, muito ofegante.

– Ah! Rip-Chip! - falou Caspian, meio debochado - Por favor, diga-nos algo que não inocientize esse cão perdido!

– Sim senhor! - respondeu prontamente - Ele está acordado.