Worse Than Nicotine escrita por Dama do Poente


Capítulo 22
It’s Not Enough To Tell Me That You Care


Notas iniciais do capítulo

Essa é uma postagem programada, porque a autora está se preparando para o vestibular. Então, agradeço aos que comentaram até agora: Pandinhaw - a que estava mais ansiosa por esse capítulo -, Sophie, pudim e Sra. Maddox. Obrigada pelos reviews no último cap.
Espero que gostem desse aqui!



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P. O. V Ártemis:

Começava a achar que a origem de meu nome estava subindo a minha cabeça. Na verdade, talvez fosse melhor ser isso mesmo: eu estava ficando louca, com a cabeça no mundo da lua. Qualquer coisa seria melhor do que ver minhas suspeitas mais insanas se confirmarem.

Era exatamente sobre isso que eu pensava quando Apolo me ligou naquele início de tarde. Na hora cheguei a imaginar que ele já tinha o resultado das amostras, mas todos os meus devaneios e loucuras foram jogados para escanteio quando ele disse que Allegra estava vindo para minha casa e que ele precisava que eu ficasse com ela por um tempo.

— O que está acontecendo, Apolo? — porque certamente algo estava acontecendo, pois ele jamais ficava longe da filha.

— Não dá pra contar pelo telefone, Artie! Se der, eu passo aí mais tarde, ok?

— Ok! — eu queria dizer mais alguma coisa, qualquer coisa, mas naquele exato momento, Órion passava pela porta da sala.

— Tenho que desligar: minha prima/ex-babá/advogada da família está me xingando com muita eloqüência no outro telefone. — ele desliga, me deixando em silêncio.

Os olhos esverdeados de Órion me estudavam, mas ele estava tão quieto quanto um caçador a estudar sua presa. Eu costumava admirar tal olhar, mas pela primeira vez senti medo dele, e quase concordei com Apolo, lembrando de todas as vezes que ele citou tal olhar:

“É como um leão, mirando o filhotinho de cervo: os olhos altivos e livres de altruísmo, procurando a melhor forma de cercar, ludibriar o pequeno e indefeso cervo. O tipo de olhar que eu não confio”

— O que faz aqui? — resolvo quebrar o silêncio e o contato visual, que era mais intenso que o de Dexter, Hannibal e qualquer predador juntos.

— Visitar minha namorada! — ele abre seu sorriso galanteador — Por acaso não posso? — ele pergunta.

— Hoje não! Nem enquanto eu estiver por aqui! — Allie responde, chegando nesse instante.

E se havia alguém que verdadeiramente odiava-o, esse alguém era Allie. E o ódio era mútuo.

— A pirralha artista! Que desprazer vê-la! — Órion para a alguns passos de mim.

— Igualmente, Órion! — Allie concorda, e rapidamente me abraça, formando uma barreira entre ele e eu — O que está esperando para ir embora? Não percebeu que essa é uma sexta-feira “mãe— e — filha”?

Ouvi-la me chamar de mãe foi como um calmante. Era a melhor sensação do mundo, sempre fora, e há pouco tempo voltava a ser: ela costumava me chamar de mamãe quando era pequena — o que me cativou a adotá-la legalmente —, mas de uma hora para a outra, em seus rompantes de conceitualismo, resolveu me chamar de tia, e só agora voltava a me alegrar ao me chamar de mãe.

— Por que não deixa suas coisas em seu quarto, enquanto eu levo Órion até a porta? — sugiro, tentando não mostrar mais favoritismo do que já mostrava.

— Embora eu ache que ele saiba o caminho, vou fingir que não o detesto e vou deixá-lo desfrutar de sua companhia por um tempo. — ela pega a mochila e se encaminha para o corredor.

— Pirralhinha...

— Ei, olhe lá como fala da minha filha! — o calei, abrindo a porta.

— Ela nem é sua filha de verdade! — ele revira os olhos, já fora do apartamento.

— Mãe é quem cria, e eu ajudo a criá-la desde que ela tinha cinco meses. Então, sim: ela é minha filha.

— Não dá pra discutir com você quando ela está aqui. — ele ri com desdém. — Enfim, passarei um tempo fora, a trabalho...

— Boa viagem! Me mande um postal! — e sem estar com a mínima vontade de encenar despedidas melosas, simplesmente bati a porta e a tranquei.

Ouço-o resmungar alguma coisa, mas finjo que não é comigo e simplesmente me afasto da porta.

— Placar geral: Allegra 2, Órion 0! — ela comemora, sentada ao balcão de minha cozinha.

— Você é terrível! — eu deveria repreendê-la por seu comportamento, mas Allegra era, em geral, uma menina muito educada e gentil, nunca era rude com as pessoas, exceto...

— Meu bem, por que você odeia Órion? Por acaso você está tomando partido de seu pai? — essa era uma idéia louca, mas valia à pena perguntar

— Desse jeito você me ofende! — ela revira os olhos — Eu amo o papai, a senhora sabe, mas isso não quer dizer que me deixo influenciar por tudo o que ele fala, embora boa parte seja real e racional.

— O racionalismo do seu pai realmente é brilhante, mas também exagerado! — sou obrigada a comentar.

— Infelizmente é verdade, mas não podemos dizer isso à ele: vai ferir seus sentimentos e ele vai escrever poemas tão sôfregos quanto Bukowski, e eu não estou pronta para enfrentar uma crise psicológica do papai! — retruca — Enfim, sobre o que falávamos?

— Sobre porque você odeia Órion... — a relembro, pensando em todas as ocasiões em que os dois se encontraram.

— Sei lá... — ela dá de ombros, com o rosto enfiado dentro da geladeira — Devem ser ciúmes: a senhora passa muito tempo com ele, e trabalhando, e quase não fica mais comigo.

— Sem dramas, Allegra Grace! E não creio que sejam ciúmes: quando vocês se conheceram, você era apenas um bebê, e chorava todas as vezes que ele a pegava no colo. — comento, lembrando que este fora um dos motivos para que Apolo impedisse-me de ver Allie enquanto eu estivesse com Órion, algo sobre “a presença dele perturbar os nervos em formação dela”

— Ah, então é ódio gratuito! Tipo o que rola entre William e eu!

— Espera um minutinho: quem é... — e meu momento mãe/melhor amiga é interrompido pelo telefone a tocar.

Aproveitando o fato de eu ser obrigada a atender, Allie escapa de minha pergunta, indo para seu quarto, me deixando discutindo com Heracles, Zöe e Bianca.

— Ártemis, estive falando com sua assistente, e que história é essa de pegar evidências e levar para outro laboratório? — Zöe pergunta seriamente.

Maldita Phoebe. E eu aqui achando que nós, ruivas, podíamos confiar umas nas outras. Mas não: lá vai a outra confessar tudo. Isso tudo era o quê? Medo do autoritarismo de Zöe? Só porque ela era Tenente? Francamente...

— Eu apenas pedi que Apolo fizesse uma segunda análise. — me defendo, contando a verdade.

— Senhorita Mesiac, não é porque seu namorado é membro honorário do grupo de legista, que a senhorita pode levar provas para casa e dividi-las com ele. Temos nosso próprio laboratório, que...

— Está demorando muito para me dar os resultados. Tanta demora me incomoda, e eu quero outra avaliação: meus instintos me dizem para não confiar inteiramente na equipe do laboratório. — era verdade, eu não confiava no laboratório do lugar, mas a raiva em minha voz tinha mais a ver com a suposição de Heracles.

Como se eu não soubesse o que ele e Zöe dividem.

— Ártemis, você não é paga pelos seus instintos. — Zöe diz, provavelmente tentando se exibir...

— Mas foram eles quem nos ajudaram a resolver muitos casos. — inúmeros, na verdade.

— Quer vir até aqui me dar uma explicação plausível? — Heracles pede, mas seu tom de voz indicava que ele seria menos educado se pudesse.

— Não, eu não quero, Heracles! — replico no mesmo tom, sem fingir paciência alguma — Não quero, não posso e não irei! É meu dia de folga, minha filha está aqui, e se não confiam em alguém que os ajudou tanto, então procurem outro legista! — desliguei o telefone abruptamente, batendo-o contra o gancho.

De fato eu deveria estar enlouquecendo, ou porque outro motivo eu iria discutir daquela forma? Ainda mais sabendo que eles estavam certos.

Joguei-me no sofá, tentando me recuperar, mas os tremores de meu corpo pareciam piorar, à medida que eu permanecia em silêncio. Nesses momentos me arrependia de ter decidido morar só: o silêncio era enlouquecedor, e nenhum gato suprimia essa sensação. Principalmente um gato que vivia sumindo.

— Então, o que teremos para jantar? — Allegra me desperta de meus devaneios sobre Moony.

Usava jeans e um suéter verde, com uma coruja estampada — certamente um presente de Annabeth, creio eu —, e os cabelos trançados como de costume. Crescia tão rápido, e ainda assim parecia o mesmo bebê que eu acalmara naquela tarde há tantos anos, quando conheci Apolo.

— O que acha de fugirmos das regras de seu pai, e irmos naquela lanchonete ao lado da biblioteca? Posso te contar como conheci seu pai e como o fiz ser expulso da biblioteca na mesma tarde.

— Vocês dois e seus poderes de abalarem tudo. — ela revira os olhos, como se nos repreendesse, mas seu sorriso mostrava que estava louca para ouvir, mais uma vez, a história.

Essa era uma história bastante repetida ao longo dos anos, com detalhes e momentos sendo acrescentados conforme Allie crescia e era capaz de entender tudo sem se sentir confusa. Tudo começou com “nos conhecemos na biblioteca”, enfim passou por “ela bebia café com vodka, muita vodka mesmo, naquele dia”, e agora...

— Você e o papai já se beijaram? — ela pergunta, passando uma batata frita pelo molho de salada de seu hambúrguer de frango.

— Muitas vezes, Allie! Somos amigos! — dou de ombros, sorvendo um pouco do meu refrigerante.

— Não beijo de amigo. Beijo de casal! Tipo os que a Riley dá no Ben em Baby Daddy. — ela esclarece e eu me engasgo com o refrigerante. — Nossa, você tá bem?

Confirmo com a cabeça, enrolando para não responder. Como eu explicaria a ela que isso já aconteceu inúmeras vezes, mas nem eu, nem Apolo, parávamos para falar ou pensar sobre o acontecimento.

— Espero que faça sessões extras de pilates para queimar todas as calorias desse hambúrguer, Grace! — uma jovem voz masculina, levemente esganiçada, interrompe o fluxo de “pensamentos apropriados sobre o que falar com sua filha”.

— Se fizesse sessões extras de musculação, seria capaz de erguer alguém, Solace! — Allie rebate, levantando-se.

Ergo meus olhos para a discussão, notando um garoto loiro, pouca coisa mais alto que Allie, porém aparentemente mais magro. Seus olhos claros faiscavam de raiva.

E eu me sentia a própria Afrodite lendo revistas de fofoca, e mandando mensagens para todas as mulheres que ela lembrava: “S.O.S.: ALLIE TEM UM PRETÊ!!”

— Ensaiou a música? — o garoto cruza os braços.

— Por que temos que ser parceiros em tudo? — Allie suspira — Eu não preciso ensaiar, muito menos ensaiar para um ensaio: não sou eu quem coaxa a cada nota!

— Mas é quem desafina nas mais altas...

— E você que desafina em todas?!

Eles continuaram a trocar desafores — e eu a trocar mensagens com Afrodite —, cada vez mais alto, atraindo olhares, até que uma mulher, falsamente loira, surge ao lado do garoto. Os dois se calam imediatamente, fazendo com que eu me perdesse na novelinha encenada.

— Senhorita Grace? — a mulher ergue uma sobrancelha.

— Senhora Solace? — Allie responde em desafio.

— Hambúrguer e fritas? Refrigerante? E quanto aos recitais?

O menino loiro balança a cabeça, mostrando seu contentamento com as acusações que a mulher fazia.

— Posso fazer a mesma pergunta. A senhora é a professora, e seu filho é bailarino assim como eu: o que fazem aqui? Por acaso vieram me policiar? — é a vez de Allie cruzar os braços.

Como a vida da minha filha podia ser mais animada do que Pretty Little Liars?! Porque, fala sério, discutir com a professora de balé, no meio de uma lanchonete, é muito mais legal do que passar cinco temporadas se perguntando quem é o vilão.

— Espero vê-la na segunda, acompanhada por um de seus responsáveis! — a professora informa, a expressão fechada.

— Se meu pai não estiver salvando a vida de alguém... — Allie dá de ombros, sentando-se e encerrando a conversa.

A professora e seu filho se afastam, mas o mau-humor trago por eles, aparentemente, sentou-se à mesa conosco: Allegra encarou com nojo o seu lanche, e acabou por enrolá-lo, descartando-o. Logicamente levara aquilo a sério, e agora se sentia culpada por ter sido adolescente e não ter sido bailarina.

— Sim! — digo com um suspiro.

— Sim o que? — ela pergunta, confusa.

— Sim, seu pai e eu já bancamos o Ben e a Riley! — sorrio, e ela começa a ensaiar uma dancinha da vitória. — Mas não contarei mais nada, não enquanto estivermos aqui! — levanto-me, deixando a gorjeta sobre a mesa.

— E para onde iremos, então?

— Para casa, maratonar alguma série e comer torta alemã!

— Mas...

— Quer ouvir as histórias?

Um pouco mais animada, ela saltita até mim, me dá a mão e caminhamos de volta para casa, onde preparo a torta, enquanto ela toma banho.

Mas a história, a torta e a maratona perderam para o sono, pois quando fui procurar para saber o motivo da demora de Allie, a encontrei dormindo, abraçando uma águia de pelúcia. Um sorriso tenro tomou conta de meu rosto enquanto ajeitava suas cobertas e tirava o celular de suas mãos.

— Os anos passam, eles crescem, mas o primeiro bichinho sempre será o favorito! — suspiro, caminhando para fora do quarto.

— O que me faz questionar o porque desta águia estar aqui!

Não posso negar que minha pulsação acelerou, mas jamais saberei se foi por puro susto ou por ser Apolo, que se encontrava encostado à porta do quarto, olhando com tanto amor para a filha, que eu me senti errada ali, parada no meio do quarto.

— Ela merece tanta, mas tanta coisa que eu não posso dar. — ele suspira, enfiando as mãos no bolso da calça — Como uma família normal, por exemplo... — e quando nossos olhares se cruzaram, pude ler toda a tristeza por trás daqueles olhos enormes, que sempre mostravam alegria para mim.

— Vem cá! — abro os braços para ele, e logo estou abraçando seu corpo quente. —, tenho uma torta alemã esfriando e vodka em algum lugar... Conte-me tudo!

E, sentado no chão, com uma fatia de torta e uma dose de vodka, Apolo me conta sobre o mais novo drama da família Grace, e meu coração se aperta com tanta dor e compaixão.

— Meu pai ainda está cego de raiva, mas não sei se é por Thalia ou pelo rapaz, Jason discutiu com os irmãos do cara, Thalia sumiu com Nico e os dois apareceram horas depois em seu apartamento. Hera tenta ajudar, mas Thalia sempre a bloqueia... — ele suspira, tirando os óculos e massageando a ponto do nariz.

— E sobrou para você manter tudo nos eixos... — deduzo, baseando-me em experiências anteriores.

— Ligue para sua prima, contate o pai do indivíduo, providencie para que a mídia não saiba e para que sua prima chegue aqui o mais rápido possível... Essas são, minha querida sacerdotisa, as palavras de meu pai, que acha que sou seu secretário, ou coisa parecida...

— Agora entendo o porquê de querer uma família normal... — suspiro, acariciando seus cabelos revoltos — Mas não podemos escolher nossos parentes.

— Eu sei, e eu amo os meus, mas queria que eles lembrassem que eu tenho uma família para cuidar, que eu tenho uma filha e que é ela quem precisa de cuidados meus, não eles!

— Obrigada pela parte que me toca... — resmungo, sem poder evitar ficar chateada.

— Não Artie, eu não quis dizer isso! — ele respira fundo — Você é a melhor coisa que aconteceu na minha vida e na de Allie, mas gostaria de ser mais pai da minha filha do que dos meus irmãos. Trabalho como um louco, na tentativa de salvar vidas, e quando tenho tempo para cuidar da vida mais importante para mim, não posso desfrutar dessa regalia.

Vê-lo naquele estado era tão raro; Apolo sempre irradiava bom humor e vontade de viver, mas tudo o que ele aparentava no momento era desespero e angústia. E meu maior desejo era fazer com que tudo aquilo acabasse, e que meu Apolo voltasse à superfície.

— Tinha planos de levar você e Allegra para patinarmos para que ela relaxasse e esquecesse os recitais, mas ao invés disso, irei esperar por minha prima/ex-babá/advogada da família, que vai se hospedar lá em casa até sabe-se lá quando. Consigo vê-la brigando comigo, mudando meus móveis de lugar e obrigando Allie a fazer algo extremamente nerd ou sei lá o quê... Ela consegue ser pior que minha mãe... — ele suspira pesadamente.

— Bom, se me der mais alguns uniformes e a bolsa do balé, posso deixar Allie ser feliz e normal aqui em casa! — ofereço, como quem não quer nada

— Tem vaga para o pai também?

— Só se lavar a louça! — sorrio, vendo-o se levantar.

— Meu amor, eu lavaria a louça do prédio inteiro, se isso me ajudasse em algo. — e como se quisesse comprovar algo, ele dedica os próximos minutos lavando o prato, o copo, e a colher que usara.

Mesmo que tenham sido poucos minutos, o silêncio foi algo libertador, como se as palavras fossem desnecessárias para que entendêssemos as necessidades um do outro: ele precisava de apoio, algo firme, e eu de algo real, que me lembrasse a razão das coisas. Em suma, precisávamos de nós.

Portanto, quando ele me disse que precisava ir, pois pretendia dormir na casa da irmã, foi quase dolorosa a forma como desvencilhamos do abraço.

— Você sabe que Allie estará bem aqui, e que se precisar de algo, pode invadir esse apartamento a qualquer hora. — reforço, para que ele se acalmasse.

— Se for durante vosso sono de descanso e beleza, querida sacerdotisa, tenho permissão para adentrar seus aposentos? — pergunta, segurando minhas mãos.

— Abrirei uma exceção, meu caro rei! — sorrio de volta.

— Cuidado: posso acabar abusando dessa exceção... — ele se inclina, como se quisesse deixar claro nossa diferença de altura.

— Atreva-se, e...

— E...? — ele solta um de minhas mãos e apóia a sua atrás de mim, no batente da porta.

E eu queria muito culpar as inúmeras noites insones que passei examinando os laudos e casos antigos, queria muito culpar o próprio Apolo, mas a verdade é que ninguém foi culpado pelo beijo que se sucedeu; ninguém, exceto eu!

Mas eu não me senti nada culpada no momento, como nunca me senti quando estive em seus braços.

P. O. V Autora:

Horas haviam passado, mas Apolo ainda não conseguia entender se tudo fora real ou um delírio de sua mente alcoolizada.

Forçou-se a lembrar a intensidade do beijo e compará-lo com todos os outros, ou pelo menos com o mais recente: nada parecidos, mas ainda assim guardavam semelhanças.

— Não querendo ser chata, nem nada do tipo, mas não deveria ser eu a dona desse olhar perdido? — Thalia o desperta de seus devaneios.

— Ele está assim desde que visitou a Artie! Quando desci, o encontrei com essa cara de pamonha e o olhar de peixe morto! — Jason zoa o irmão.

Felizmente o mais velho não estava tão bêbado assim, e tão pouco estava no clima para brincadeiras, por isso uma quantidade eloqüente de xingamentos e algumas almofadas foram dirigidas a Jason.

— Ok, o que aconteceu com você? Conte seus problemas para mim, assim eu posso esquecer os meus e tentar te ajudar com os seus! — Thalia senta-se de frente para Apolo.

— Faço minhas as suas palavras! Fale tudo, Apolo! — e Jason faz o mesmo que a irmã.

E vê-los assim, sentados de frente para ele, como se esperassem por uma história — o que, de certa forma, era o que faziam —, fez com que Apolo se lembrasse de quando os dois eram mais novos, e ele os levava para o estúdio da mansão, onde as paredes com isolamento acústico os impediam de ouvir as terríveis brigas entre Beryl e Zeus. Apolo sempre protegeu os irmãos, pois ele sabia o quão ruim era estar sozinho quando seus pais se enfrentam num divórcio litigioso, porém, mesmo agora quando os dois eram adultos, ele ainda sentia a necessidade de protegê-los: ele era o irmão mais velho, afinal!

— Aconteceu, Cara de Pinheiro, que eu tenho uma filha linda, porém chorona. Sempre foi, e graças a isso eu conheci uma jovem eslava, dona de cabelos rubros, como uma fênix, e olhos verdes acastanhados que eu jamais vi igual e sempre serei incapaz de compará-los a algo. Tornamo-nos amigos, melhores amigos, tão próximos ao ponto de formarmos uma família para minha linda filha, e este um dia poeta que vos fala, se apaixonou!

— Mas não foi correspondido, certo? — Jason o interrompe, acostumado a ouvir esta narrativa.

Nem sempre foi assim, maninho!

— Aí é que, creio eu, todos nos enganamos. Embora a sacerdotisa pareça ser a que mais se engana, pois ela mente para si própria! — ele suspira, lembrando-se da sensação de sentir os lábios de Ártemis sobre os seus.

Já haviam se beijado antes, muitas vezes — algumas das quais nem consideravam, uma vez que aconteceram em jogos de desafios, happy hours ou festas de fraternidades —, mas este último beijo e o de dezembro foram diferentes. Não se tratava mais de dois pré-adultos no auge de tempestades hormonais, mas sim dois adultos conscientes, que sabiam bem o que queriam.

No dia do apagão, na festa de Thalia, os dois conversavam sobre velhas memórias — como o primeiro paciente que tiveram —, estava rindo sobre suas versões mais novas quando a calma se fez presente: seus risos se calaram, seus olhares se cruzaram, e tudo o que ele tinha consciência era da mão dela em seu cabelo e da sua mão sobre a perna dela. Suas respirações aceleraram e ele fez o movimento em direção a ela, tocando os lábios delas com os seus, receando que ela o afastasse, mas a mão em seu cabelo o apertou mais, enquanto outra o puxou pelo colarinho. Os lábios carnudos eram macios contra os seus e tinham o sabor de chocolate quente, e quando ele se atreveu a provar um pouco mais, deslizando sua língua sobre eles, Ártemis se aconchegou mais em seus braços, soltando um suspiro. Fora um beijo doce, brutalmente interrompido pela tragédia que se sucedeu.

O beijo daquela noite, no entanto, era um verdadeiro paradoxo do que ocorrera em dezembro: a forma com que Ártemis o puxara para si e como seus lábios se chocaram foram brutais, e ele simplesmente abandonou o cavalheirismo quando a puxou contra si, apertando-a contra seu corpo, como se cada milímetro longe doesse. Embora o sabor do beijo permanecesse o mesmo, a sensação mudara de contemplação, veneração, para urgência e paixão — uma paixão que sempre existira. Ela o beijava sofregamente, enterrando as unhas na pele exposta da nuca, transformando os cabelos deles num emaranhado de fios loiros — não que os dela tenham permanecido os mesmos —, mordendo o lábio inferior, dando a falsa ilusão de que interromperia o momento. Porém, quando o fez, foi diminuindo o ritmo até que eles trocavam apenas selinhos.

Seus olhares, mais uma vez, se cruzaram, ela suspirou e sorriu para ele, dando-lhe um último selinho, nada demorado, e sussurrou, docemente, boa noite, antes de fechar a porta e deixá-lo ali, atordoado.

— Já parou pra pensar que, talvez, seja você quem mostrará a ela a verdade? — e, mal sabia Thalia, tal pergunta era um eco na mente daquele um dia poeta.


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Notas finais do capítulo

E então? O que acharam da narração da Ártemis? Estou testando outros P.O.V's por motivos de possíveis continuações.
E o que acharam do momento Apotemis? Contem-me nos reviews, ok?!
Beijooos!



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