As Crônicas de Astra escrita por Fantasius


Capítulo 5
Runas na cachoeira - Joanis


Notas iniciais do capítulo

O capitulo de hoje está um pouco maior que os outros, mas se acostumem, pois a partir daqui a historia se solidificara e os capítulos terão que assumir tamanhos maiores. Espero que gostem.



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A cachoeira caia num estrondo, assustando os cavalos. Entre árvores e plantas de vários tipos ela formava um grande lago de água cristalina. No centro das águas, num ponto de calmaria, uma grande pedra branca se projetava. Nela haviam símbolos estranhos, aparentemente gravados de ouro, pois brilhavam em contato com a luz solar. Aves cantavam pela floresta, enchendo o ar com os mais variados sons.

Foram dois dias de viagem e Joanis ansiava logo por ver a grande cidade de Garidis. Idrian havia dito que ele morava na fortaleza da cidade e que ele estava profundamente ligado à nobreza. Sua noiva Antariad, morava na vila, num região perto do rio, mas se mudaria para o castelo quando se casasse com Idrian. Ele também havia contado das belezas que existiam na região e sobre a grande Torre Branca, que projeta uma sombra sobre a cidade, marcando as horas. Joanis estava agitada como uma criança para conhecer a cidade da Torre e queria saber por que estavam ali naquele fim de mundo.

A viagem, embora tivesse sido um pouco cansativa, até mesmo para a menina, fora bem agradável ao lado de Idrian. Joanis passou uma noite calma, como não tinha há anos, na pousada e na manhã seguinte, logo após um desejum farto, partiram cada um num cavalo. O caminho foi animado, Idrian evitava tocar no assunto de sua madrasta, ele até mesmo se recusava a contar o que acontecera depois que ela havia desmaiado. Mesmo na estrada as refeições foram fartas, como a garota não provava fazia muito tempo. Idrian fazia questão de cantar sempre, como se quisesse animar a menina, como se soubesse de seus anos de sofrimento e escravidão. Porem o que mais estava encantando Joanis eram as festas que o cavaleiro havia contado. Algumas eram apenas frequentadas pelos nobres no castelo, mas as mais incríveis eram as que aconteciam no vilarejo: fogos de todas as cores, animais, palhaços, músicos e comida farta. Quando chegassem a Garidis estariam na festa de inverno. “Luzes e calor, como milady nunca viu.” Disse ele.

Mas agora estavam ali, parados em frente a uma grande cachoeira, apenas se atrasando.

– Senhor... – Joanis olhou para os lados, procurando algo, ou alguém – O que estamos fazendo aqui? Por que não continuamos?

– Por que chegamos. – respondeu Idrian, entrando no lago – Entre aqui. – ele estendeu a mão – Vou te mostrar algumas coisas.

O coração da menina saltou. Então era isso, ela fora atraída por sonhos e ilusões para uma floresta distante, a fim de ser estuprada. Não havia escapatória, não havia ajuda. Joanis, com a cabeça baixa, desmontou e entrou no lago. A água estava gelada, e os pelos da jovem se arrepiaram.

– Senhor... – começou ela, pegando nas mãos daquele que a iludiu – O que ira fazer?

– Eu? Ir até aquela pedra. – ele então mergulhou e emergiu um pouco a frente – Fique ai! Não corra!

Joanis estava assustada, já fora entregue por sua madrasta a estupradores duas vezes, ficara grávida e Siliany batera tanto nela que ela abortou. Não queria que tudo aquilo se repetisse, muito menos com Idrian, que parecera tão legal. “Deuses, por favor, impeçam que ele faça algo, impeçam que ele seja um estuprador.”

O homem nadou até a pedra branca e subiu nela, acenando para que ela aguardasse. “Por favor, não.” Pior do que um estuprador, ele era um bruxo, como sua madrasta. “De novo não, magia não!” os símbolos gravados na pedra começaram a brilhar em dourado conforme Idrian passava a mão nelas. Eles tinham formas variadas, runas, como aprendera com Siliany. Logo elas saltaram da rocha e começaram a dançar na floresta ao redor, o rio se agitou de maneira estranha, como se quisesse entrar na pedra, as copas das árvores se moviam violentamente, mas tudo estava no mais absoluto silêncio.

– Joanis, venha aqui! – gritou Idrian, enquanto mais runas voavam, criando um circulo ao redor dele e da rocha – Rápido!

Porém a menina continuava parada, paralisada de medo. Anos de escravidão sobre o controle duma bruxa, e agora que enfim havia se livrado dela, caíra nas mãos dum outro praticante das artes mágicas. Não queria ser submetida novamente a torturas que se propagavam por dias, por ferimentos que não cicatrizavam, por visões do inferno.

–Teachtir gobás luathdorch! – as palavras remeteram Joanis ao passado, eram palavras de poder, ditas na língua podre e amaldiçoada, e ela ainda servia aquelas palavras, pois ainda tinha a coleira, que era visível apenas por ela – Anoiranéig!

Era inevitável, tinha que servir, tinha que obedecer. Com lágrimas ardendo nos olhos ela começou a nadar até a pedra, onde subiu e se prostou ao lado de seu novo mestre.

– Senhor... – tentou dizer, mas as palavras falharam e ela se calou.

“Venha logo! Agora!!” as palavras ditas por Idrian, em forma de magia, ainda ecoavam na cabeça da menina, e ela apenas conseguiu ouvir o fim de uma outro frase dita por ele:

– Dimitium... – “me perdoe”, mas em outro tom, outra língua, algo mais puro – Joanis, dimitium, obsecro.

Joanis não conseguiu responder, as palavras falharam. As runas agora dançavam de maneira estranha, se juntando ao rio, que por sua vez se lançava contra a rocha. A menina sentiu seu corpo se desfazer, mas a dor não veio. A realidade girou num vortex de luz e tudo sumiu.

Os raios de sol entravam pela cortina entreaberta, iluminando o quarto. “Que lugar é esse?” se perguntou Joanis, examinando o ambiente. Havia um grande armário de madeira e algumas poltronas grandes, com almofadas brancas. As paredes de tijolos estavam decoradas com alguns quadros de paisagens. O travesseiro que a cabeça dela estava apoiada era macio e confortável, tal como a grande cama. Então ela se lembrou do que acontecer na cachoeira: Idrian era um bruxo como sua antiga mestra. Provavelmente agora estava na casa dele, pronta para ser torturada. “Não conseguirei fugir... novo mestre, novas torturas...”. A porta se abriu levemente e outro homem entrou. “Deve ser outro escravo” pensou, embora ele não tivesse aparência de escravo. Vestia uma armadura completa que reluzia com a luz solar, sua capa branca estava limpa e não mostrava nenhuma mancha. Na bainha ostentava uma grande espada, numa bainha decorada.

– Que bom que acordou. – disse o cavaleiro, passando a mão em seus cabelos castanhos – Irei chamar Idrian.

– NÃO! –Joanis automaticamente se amaldiçoou por ter gritado – Quero dizer, não agora, quero... – ela escolheu bem as palavras para não dizer fugir – quero descansar. – a menina deu seu sorriso mais falso e fechou os olhos.

– Milady, lorde Idrian sabe que a senhorita ficou aterrorizada com o que aconteceu no lago – ele se sentou numa poltrona – Sabe que esta com medo de que ele seja um mago das sombras, como sua antiga mestra. Mas ele não é, ele apenas conhece um pouco das artes sombrias, mas seria incapaz de usa-las por muito tempo. Ele pode te explicar melhor.

– Qual seu nome? Quem é você? – a menina se acalmou um pouco, talvez aquilo fosse verdade.

– Milady, meu nome é Karl Jouton, um cavaleiro de luz, como lorde Idrian. O Paladino, como sou conhecido no templo. – ele fez uma reverência – Irei chamar lorde Idrian.

Karl se virou e saiu do quarto balançando sua capa branca, deixando Joanis sozinha. Ela se sentou na cama e observou o que vestia: um vestido de seda branca. “Deuses, isso é lindo.” Seria tudo aquilo verdade? Idrian não era um ser das trevas? Onde estava? O que aconteceu no lago? Eram tantas perguntas que Joanis não saberia por onde começar. Alguns minutos depois, usando roupas finas, com detalhes vermelhos, Idrian adentrou no quarto. Ele se ajoelhou e abaixou a cabeça.

– Perdão milady. Não queria ter feito aquilo. Perdoe-me. Dimitium, obsecro.

Joanis olhou para o homem, ajoelhado aos pés dela, pedindo perdão. Sentiu-se culpada por ter julgado ele de formas tão malignas.

– Sim... – respondeu, olhando nos olhos dele – Senhor, o que são essas palavras? Disse-me no lago, antes... Antes de... Tudo sumir...

– É língua antiga, falada no inicio dos tempos, pelos deuses e divindades. Língua branca, como dita aqui, acalma os corações, quebra as trevas e aquece a alma. O que eu disse quer dizer: perdoe-me, por favor.

Ele se levantou e se sentou na cama ao lado de Joanis.

– Milady, eu não queria ter usado a língua podre, ainda me sinto mal...

– Senhor, por favor, pare de culpar. Esta tudo bem... – ela olhou pela janela, o sol estava para se por e o céu de tingia de laranja, haviam poucas nuvens, que também estavam tingidas – Onde estamos?

– Primeiro: dimitium, pare de me chamar de senhor, me chame de Idrian. – respondeu com um sorriso – Aqui é Garidis, a cidade da torre.

O coração da menina se encheu de alegria, enfim tinha chegado à cidade que ansiava tanto ver. A escravidão enfim tinha chegado ao fim, ali, mesmo ainda com a coleira, nada poderia feri-la, por estava sobre proteção de pessoas do bem.

– Senhor... Idrian! – se corrigiu Joanis – Como chegamos aqui? A última coisa que lembro foi... As runas no lago...

– Sei que também ficou com medo daquelas runas, mas não é necessário, não são das artes das trevas. Runas gravadas por magos da luz, centenas de anos atrás. Aquelas runas na pedra são o portal para Garidis; Garidis fica escondida dentro daquela floresta, e apenas pessoas permitidas podem entrar, ou sair. As runas desfazem nosso corpo e nos levam pelo rio, até o mar, onde a correnteza nos leva a uma ilha perdida, que é aqui.

– Isso é magia! – pela primeira vez na vida a jovem estava encantada com algo mágico – Magia boa! Diferente... – ela se interrompeu, não queria contar de sua madrasta, não naquele momento.

– Sei do que está falando, mas não precisa contar, não agora, não para mim. Mas em uma hora, eu virei busca-la para encontrar o senhor de Garidis, o grande mago Alminus, ele quer saber de você. Agora, se me permite, irei me arrumar, faça o mesmo, escolha o que quiser no armário.

Idrian se levantou, fez uma reverência e saiu do quarto, fechando a porta. Joanis estava encantada, pela primeira vez ela vira que a magia podia ser algo belo. “Poderia ter aproveitado mais aquelas belas luzes, se não estivesse morrendo de medo.” Pensou ela, se lembrando das runas que dançaram no lago e fizeram tantas façanhas. Levantou-se e andou até a janela, olhando para fora viu que estava num lugar alto, de onde podia ver apenas o mar e algumas casas na praia. “Até o mar é mais belo...” refletiu, olhando para o horizonte, onde o sol se punha. A primeira estrela já havia surgido e cintilava no céu que escurecia aos poucos. Voltou-se contra o guarda roupa e o abriu: belos vestidos, das mais diversas cores e formatos, Joanis não havia nem sonhado com aquela quantidade. Escolheu depois de alguns minutos fascinada, um simples vestido de manga longa, azul escuro, com detalhes dourados nas mangas e na barra. Sentou-se na poltrona, perto da janela, e esperou Idrian retornar.

Joanis observava as gaivotas no céu, quando Idrian bateu na porta.

– Milady, vamos? Alminus está te esperando.

Ela se levantou e saiu do quarto. O homem vestia calças de lã, e um casaco branco. No cinto carregava a bainha com a espada. Estendeu a mão para a jovem, que a segurou. Idrian a guiou por belos corredores, com infinitas portas. Passaram por pontes que ligavam as torres a outras torres. E numa dessas que não possuía teto, foi que a menina pode ver o castelo em sua totalidade: Varias torres brancas, interligadas por pontes de mármore e no centro de tudo se projetava uma torre maior que todas as outras. Já estavam num ponto bem alto, pois olhando para baixo, pela beirada da ponte, Joanis via toda a cidade, em sua imensidão de casas e vielas.

– Lá milady, é a Torre que eu havia dito para a senhorita. È lá que Alminus nos espera.

A menina, encantada com tudo aquilo, apenas consentiu e seguiu Idrian até o final daquela ponte, onde viraram para um pátio que ficava aos pés da Torre e subiram numa escada que levava ao interior dela. Lá o resto de luz era refletido por centenas de espelhos e vitrais, que representavam cenas de lutas épicas. A escada que levava ao topo era espiral e parecia se propagar para o infinito.

– Vamos demorar horas pra chegar lá em cima! – exclamou a menina e sua voz ecoou pelas paredes da torre – Perdão. – disse, abaixando o tom de voz.

– Isso é para os inimigos, para que não alcancem o topo, não sem muitas baixas. – ele andou até uma pedra dourada, que estava numa espécie de altar, no centro da torre. – Suba aqui.

Joanis obedeceu e se prostou ao lado de Idrian, que estava tocando na rocha. Uma luz dourada invadiu a sala, algumas runas dançaram ao redor deles e tudo sumiu, reaparecendo em frente a uma grande porta branca com uma árvore desenhada com algo que brilhava como as estrelas.

– Aqui milady, - iniciou o homem – são os aposentos de Alminus. – ele segurou o braço dela e a fez olhar em seus olhos – Milady, ele ira te contar coisas, sobre sua vida... Por favor... Dimitium, seja forte.

– Eu vivi anos de trevas, você sabe – respondeu Joanis, pondo a mão na porta – Serei forte.

O desenho da árvore cintilou e a grande porta se abriu.


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Notas finais do capítulo

Segunda tem mais, até lá. Espero que tenham gostado. Próximo capitulo terá algumas revelações. Aguardem. U.U