III – Iridescent

– Cato! – a voz ecoou em desespero. – Cato!

O chamado continuava mais alto. E parecia ficar mais distante, não importava o quão rápido corresse. Seu nome parecia ecoar cada vez mais pela Cornucópia. Obrigou-se a correr mais rápido. Daria tempo. Ele tinha que acreditar nisso. Iria encurralar a garota do Distrito 12 e torturá-la antes que de ver sua vida se esvair. Tudo ficaria bem.

E o canhão soou.

Cato parou. Sentiu o desespero invadir cada parte de seu ser. Voltou a correr, mas não se lembrou de ter dado o comando as suas pernas. Queria não pensar no pior. Queria virar ali e ver a menina das facas sorridente e limpando sua arma, apenas esperando por ele para irem embora e ver o aerodeslizador buscar o corpo inerte de sua oponente. Tudo ficaria bem.

Quando se virou, após atravessar a estrutura da Cornucópia, tudo parou. O corpo que viu era diferente daquele que esperava encontrar. Aproximou-se a passos arrastados e sentiu os joelhos tocarem a grama. Com os dedos trêmulos, ele tocou o rosto pálido. A expressão permanecia assustada, como se tivesse morrido antes mesmo de tocar no chão.

O loiro se aproximou mais e tomou aquele corpo pequeno em seus braços. Sentiu uma lágrima deixando o olho direito. E Cato Summers gritou em dor por Clove Blake, agora morta em seus braços.

Aquilo tudo pareceu surreal. E injusto. Não deveria ser assim. Era a garota do Distrito 12 que deveria estar morta, com a pequena rindo e falando o quanto foi fácil. O final daqueles Jogos deveriam se resumir apenas a eles, pois graças a uma mudança nas regras, eles poderiam sair juntos dali. Não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Não queria acreditar.

Agora estava sozinho. Nada mais valeria a pena, sabia disso. E o som nos arbustos não tão distantes chamou a sua atenção. Os Jogos ainda não haviam chegado ao fim. Iria sobreviver, iria chegar até o fim. Iria vingá-la. E começaria por aquele rapaz do Distrito 11, que segurava a mochila destinada a ele.

Segurou firme a espada em mãos e se levantou, deixando o corpo de Clove para trás. Respirou fundo e começou a correr atrás dele. Não se importou para qual lado ele havia corrido, ele estava determinado.

Mas precisava admitir que Thresh era um adversário a altura e não apenas tinha uma força fora do comum, como também era rápido. Cato apanhou como nunca antes em toda a sua vida. Porém, havia falhas no moreno, e sua vitória seria inevitável. E poderia ter se vingado dele, se não fossem por aqueles animais mutantes. Jogou o seu adversário para eles e ignorou os gritos.

O que importava agora era a sua vingança. Ainda precisava encontrar a garota do Distrito 12 e fazê-la sofrer. Não se importava se morreria, apenas queria se certificar de que ela iria lamentar por ter tirado a menina dele.

Quando avistou a Cornucópia, ele foi pego de surpresa por uma daquelas bestas. Talvez nem todos estivessem entretidos, afinal. Havia sido rápido o suficiente para se livrar das presas, mas não tanto para se livrar das garras. Sua visão foi pintada de vermelho, junto com a dor que veio junto com o corte sobre a sobrancelha.

A espada tratou de se livrar da primeira besta, mas não do segundo, que parecia ter sentido o rastro dele depois que o irmão saiu atrás do loiro. Lutou contra o segundo e correu de um terceiro. Precisava alcançar a Cornucópia. Não tinha forças para lutar contra todos. Já não havia forças para mais nada. Apenas queria que tudo aquilo acabasse.

Quando alcançou a enorme estrutura, ele matou uma besta que havia se aproximado demais e jogou a espada para cima. Devido ao seu tamanho e peso, somado ao cansaço, teve dificuldade, mas alcançou o topo da Cornucópia antes que uma das feras pudesse arrancar a sua perna.

Estava cansado. Esperava que aquelas bestas encontrassem os dois tributos do Distrito 12. Só que isso não aconteceria. E a sorte parecia estar ao seu favor. Primeiro apareceu o arco que ele sabia ter pertencido a Glimmer dias atrás. Depois a menina. E depois o outro.

Porém, Cato sabia que não teria condições de matar os dois. Estava cansado por sua luta com Thresh somado a fuga das bestas. E não queria matar os dois. Se fizesse isso, seria consagrado vencedor. Não queria essa vitória. Não valia a pena ser vencer. Ele não passava de uma máquina de matar produzida pelo Distrito 2 para que trouxesse honra e glória. Mas ninguém nunca havia dito o preço por isso. Agora queria apenas vingança por Clove. Vingança daquele maldito casal. Vingança da Capital.

Estava disposto a se jogar dali, levando o outro. Reconheceria a derrota nos Jogos, mas não daria a vitória para aquela menina em chamas tão facilmente. Ela iria pagar pelo que fez à sua menina das facas.

O momento foi rápido. O tiro foi o suficiente para fazê-lo afrouxar o aperto e suficiente para deixá-lo atordoado a ponto do garoto do Distrito 12 empurrá-lo. Aquele era o fim. Sua queda parecia ter demorado uma eternidade, mas tudo acabou quando sentiu suas costelas batendo com força na grama, em meio aos rosnados das feras.

Não soube dizer de onde sentiu a primeira mordida, contudo, aquela dor se espalhou rapidamente pelo corpo inteiro. Os gritos que saíam de sua garganta eram difíceis de serem contidos. Queria pedir por ajuda, queria que aquela garota atirasse uma flecha nele, apenas para que tudo aquilo acabasse logo.

E foi como se alguém houvesse lido seus pensamentos. O assobio foi rápido e logo viu a flecha projetada em seu peito. Aquilo não doeu. Também não teve como sentir nada segundos depois após o projétil acertar o coração. Jamais ouviria o canhão soar. O canhão que anunciaria a sua morte.

Anos de treinamento não adiantaram de nada. Tudo havia sido jogado fora no momento em que Cato Summers reviveu a amizade com Clove Blake. Porém, o que eles não sabiam é que os sentimentos haviam florido e eles nem ao menos notaram até ser tarde demais. Contudo, a alteração das regras durante os Jogos havia dado esperança aos dois.

Até o momento em que o crânio da morena fora esmagado na Cornucópia. Aquilo tudo fez Cato perceber que a esperança era apenas uma ilusão e sentiu-se furioso. Furioso com Brutus, Enobaria e todos os outros professores que teve. Furioso com aquele casal maldito do Distrito 12. Furioso com a Capital e com seu jogo desumano que divertia a todos aqueles esnobes.

A morte foi uma benção que recebera. A única coisa boa, exceto Clove. Naquele último segundo, no momento em que a flecha o atingiu, o loiro se sentiu mais leve. Sentiu-se feliz pela primeira vez em muito tempo. Não havia mais nada a temer. Não haveria mágoa, não haveria injustiças. E com este último pensamento, ele deixou toda a tristeza e frustração irem embora.

Por fim, Cato Summers se deixou ir junto com a morte, da qual iria levá-lo até Clove Blake. E apenas um fato era certo: nada mais iria separá-los.