Tudo passou absurdamente rápido após os acontecimentos daquela manha. Sem um mínimo de hesitaçao, o povo escolheu Hans como seu rei, seu amado herói.

Claramente, desconheciam seus poderes de fogo, e ele faria de tudo para manter esse segredo enterrado juntamente com as cinzas que sobraram da antiga Rainha.

Quando viram, porem, Elsa entrar na cidade, medo apossou-se deles, ao perceberem seu vestido azul em vez de negro, e os cabelos prateados em uma trança. Muitos começaram a chorar de terror e confusão.

Mas, no final, Hans acalmou-os, com seu típico carisma e falsa bondade, os dentes brilhando com aconchego a qualquer que se aproximasse do antigo príncipe.

Arendelle voltava vagarosa ao calor anterior, e em poucas semanas, o porto estaria completamente derretido, assim como os campos ao redor do reino.

Com uma cerimonia rápida e sem muitas formalidades, elegeram Hans ao trono, e, com muito pranto e sentimentos fúnebres, o restante dos habitantes prestou homenagem aos mortos brutalmente pela Rainha do Gelo.

Quando caminhava pela cidade, Elsa ainda podia notar os olhares raivosos dirigidos a ela, embora Hans houvesse permitido que ela vivesse, como sua protegida, no palácio.

A jovem de pele alva culpava a si em cada momento de sua existência pelo descontrole que levava a tudo isso, mas no profundo de si, ela ainda não podia compreender algumas coisas. O arrependimento não era completo,

Uma semana após a nomeação de Hans ao trono, finalmente lhe revelaram sobre a morte da irmã.

Ela titubeou zonza no mesmo lugar, e desabou em prantos silenciosos contra o chão de madeira.

O Rei ordenara que Anna, congelada como uma estatua, fosse trazida ao palácio como homenagem a princesa bondosa e gentil.

Elsa sentia seu peito ser atravessado por fino metal todo momento em que seus olhos se dirigiam ate a estatua.

Após isso, ela nunca mais chorou. Mesmo quando a angustia a fazia congelar seus aposentos, ela não derramou uma única lagrima sequer novamente.

Agora, de pé ao lado do trono de Hans, com as mãos enluvadas, ela observa os pedidos dos camponeses de alimento.

O rei, embora mais sério e menos bondoso, ainda mantem a cordialidade, entregando alimentos aos pobres.

Elsa esta silenciosa, como o homem pode notar. Mas ela sempre esta assim. Á dois dias atrás, quando sua família veio lhe visitar, ela estava do mesmo modo, ainda que tentasse ser educada com os pais do rapaz.

Ele a apresentava como sua protegida, porem, logo iria preparar o casamento com a jovem de sangue nobre. Isso lhe daria segurança no trono em dias vindouros.

Ele observou outro camponês deixar a sala, e percebeu que dispunham de alguns momentos sozinhos.

Levantou-se elegante e altivo e caminhou pouco passos ate aproximar-se de Elsa.

Com os dedos cobertos pelo pano macio da luva, ele acariciou seu rosto. Recebendo um olhar frio, porem triste de volta.

Ele tentou sorrir e voltou á seu trono.

Seu trono.

Ele mal acreditava, contudo, disfarçou o sorriso ao perceber outro camponês, com a esposa entrarem.

Enquanto o rapaz, agora o soberano de Arendelle atendia o casal, Elsa se permitiu sorrir. Sabia o segredo que o fazia esconder as mãos sob as luvas. E sabia que seu maior temor, era que o descobrissem.

Pela primeira vez, ela sentiu um sopro de vida acender seus olhos.

Imperceptível e silenciosa ajeitou os cabelos e o vestido.

O vazio persistia, e não mais a maldade rondava seu peito.

Porem algo pior se desenvolvia espaçoso por seu coração congelado.

Desolação.

Um pensamento, súbito, como um flash, cintilou bruxuleante em sua mente.

Tudo o que podia fazer agora era esperar.

Aguardar ate o momento em que o sopro de vida iluminasse seus olhos por completo.

Ate lá ela se manteria em pé, sentindo seu coração ser atravessado constante e dolorosamente por estacas mais frias que seu gelo, agonizante pela dor de perder a irmã.

Ate lá ela continuaria a respirar, ate que pudesse finalmente se ver livre.

Livre de Hans, livre dos olhares aterrorizados de seu povo, e livre da dor excruciante.

Você deixou a maldade tomar o controle, agora pague as consequências, sua consciência continuava a lhe dizer, insistente.

Porem, ela não queria pagar as consequências, não queria sofrer mais.

E por fim, ela se deu conta de seu destino.

Ali, vendo o sol se por detrás dos picos longínquos e descongelados, percebeu que ela e Hans não eram tão diferentes, apesar de tudo.

Mais um monstro oculto por luvas á governar esse reino.

Esconder, não sentir, não deixar que saibam...

Porem, algo a fez ficar. Um sorriso curvou lenta e sarcasticamente seus lábios rubros.

Apesar de tudo, a morte de seus amados, a destruição de Arendelle, ela sorriu completamente.

Se continuasse a culpar-se, a dor jamais iria embora.

Dor... Esse é meu presente para você, a voz doce soou em seus ouvidos, gostou?

Não, ela não gostava.

E, com os olhos cintilantes, ela mostrou os dentes em um sorriso.

Não sentir, não sentir jamais, ela fez sua quieta decisão.

A rainha das neves transformou seu próprio coração em frio e solido gelo.

Nunca mais, ela jurou, irei sentir novamente.

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