The Forest City escrita por Senjougaha


Capítulo 86
Capítulo 86 - Mudada


Notas iniciais do capítulo

Eu sei que demoro mas eu garanto a vocês: não desisti da fic e NÃO DESISTIREI!
Recebo muito apoio de vocês e nunca vou menosprezar isso. Obrigada ♥



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Saí da faculdade pensativa.

Eu precisava focar em coisas que realmente surtissem efeito em minha vida, como por exemplo, descobrir quem me observava durante a noite.

Estava na hora de falar com alguém, mas papai estava fora da cidade.

Quando Michele disse isso finalmente os 50 dólares fizeram sentido.

Não sabia quanto tempo ele ficaria fora e achava isso totalmente estranho.

Só de pensar no silêncio que a casa ficaria e que eu teria de fazer minhas refeições desacompanhada já me causava certo mau humor.

Fui interrompida por uma voz ao longe e parei no lugar, semicerrando os olhos para encontrar, pela primeira vez no dia, a japonesa baixinha que corria em minha direção.

Seus passos suaves faziam jus aos seus olhos gatunos que me encaravam com reprovação.

— Você não saiu pro intervalo - acusou Yukina.

Pensei em uma desculpa plausível.

Todas me pareceram esfarrapadas.

Passei o peso do corpo de uma perna para a outra e deixei meus ombros caírem em desânimo.

Umedeci os lábios, pronta pra lhe contar a verdade.

— Eu entendo que esteja cansada e precise de um tempo - a japonesa me interrompeu - ainda mais nessa fase.

Franzi o cenho.

Fase?

Que fase?

— Você tem estado confusa desde que se fundiu, Selene - ela pegou minhas mãos, com olhar preocupado - não tenho sido a melhor amiga do mundo recentemente, achei que precisasse de um pouco de espaço, mas está me preocupando.

Soltei uma de minhas mãos e a passei no rosto.

Não entendia onde Yukina queria chegar, mas estava me causando enjoo.

— Eu estou bem - sorri.

E embora eu realmente estivesse “bem”, me senti uma mentirosa.

Franzi o cenho para mim mesma.

As pupilas felinas da baixinha se dilataram, mas o olhar de desconfiança passou tão rapidamente quanto chegou.

— Soube que seu pai está fora - ela sorriu - que tal se eu for na sua casa e pedirmos pizza?

Me perguntei se ela planejava levar Iria e Michele a tiracolo, mas cheguei à conclusão de que não me importaria.

Não era eu quem estava se sentindo solitária?

Assenti.

— É uma ótima ideia.

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Ao contrário do que pensei, Yukina simplesmente sentou no lado passageiro do carro e fechou a porta.

Tentei não demonstrar o quão surpresa eu estava, mas foi em vão.

— Precisamos de uma noite de melhores amigas - Yukina fez um beicinho manhoso - sozinhas.

Revirei os olhos e um sorriso me escapou.

É, relembrar os velhos tempos talvez fosse algo bom.

Eu duvidava que a bruxa diante de mim mudaria, mesmo com o passar dos séculos.

Por outro lado eu…

Manobrei a laranja berrante e dirigi pelas ruas largas e calmas numa velocidade razoável.

— O que vem te incomodando, Selene?

A seriedade na voz de Yukina depois de alguns minutos de silêncio confortável - pelo menos para mim - me sobressaltou.

Tive que recuperar o controle do volante, ou o carro poderia facilmente sair cantando pneus na perfeita grama dos jardins dos moradores.

Meu coração estava acelerado e eu tentava adivinhar do que exatamente ela falava.

“Você sabe”, meu consciente acusou.

Encarei-a.

Seus olhos estavam amendoados e negros novamente, mas a pupila continuava dilatada.

— Eu tenho visto a sua aura se escurecer cada dia mais - ela tirou o cinto de segurança e se virou em minha direção.

Franzi o cenho e me surpreendi.

Eu estava com a aura escura e isso não podia ser um bom sinal.

Certo?

— De início pensei que tinha algo a ver com sua transformação, que ainda está acontecendo mesmo agora enquanto conversamos - ela continuou - está se tornando naquilo que nasceu pra ser.

Engoli em seco, ironizando a situação em pensamento.

Minha vida já não estava uma bagunça o suficiente?

— E se o que eu nasci pra ser não for algo bom? - soltei a pergunta que me atormentava.

Yukina não sorriu.

Seu olhar sobre mim indicava que ela não estava tendo aquele papo comigo de amiga pra amiga.

Ela estava realmente séria e tentava entender a situação.

— Eu não sei o que está acontecendo comigo - confessei.

Estacionei o carro no meio-fio e mantive o pisca alerta ligado.

— Liam me dispensou - contei, aproveitando a oportunidade.

— Eu soube - ela respondeu e escondeu o olhar magoado.

Ela queria que eu tivesse contado.

Queria ter tomado conhecimento do ocorrido através de mim.

Me senti culpada.

— Eu queria te contar - abaixei o olhar - mas pra falar a verdade não tinha caído a ficha.

— Não até Daniel cutucar seu orgulho - ela soltou uma risada sarcástica nada típica.

Ergui a cabeça e fitei o asfalto.

Um misto de sentimentos me invadiu e eu simplesmente não sabia o que fazer.

Estava impotente.

Vergonha, arrependimento, nostalgia e solidão se debatiam dentro de mim e tinha certeza de que se não tivesse me tornado uma só, a voz irritante da Selene-demônio estaria bufando dentro de mim.

Mas naquele momento ela era eu. E eu tinha quase certeza de que isso fazia parte da minha bagunça interna.

Um contraste de personalidades.

— O que eu quero que entenda é que estou aqui pro que precisar - Yukina deu de ombros e recolocou o cinto - e se precisar que eu deixe de lado nossa amizade pro seu bem, eu deixarei.

Franzi o cenho.

Não entendia que tipo de situação exigiria que Yuki fizesse isso, mas compreendia perfeitamente sua linha de raciocínio.

— Precisa recuperar sua sanidade mental pro que está por vir - ela me deu um ultimo olhar sereno - sua vida pessoal é o menor problema daqui em diante.

Engoli em seco e assenti.

Não sabia se perguntava à japonesa sobre meu futuro.

Não sabia se ela tinha premonições ou seja lá o que chamavam isso de ver o futuro.

Claro que estava curiosa, mas o bolo que se formou em meu estômago e se remexia ali dentro me alertava de que talvez - muito provavelmente, na verdade - eu não fosse querer saber.

Me lembrei da quantidade de garotas da ficção que, ao saber do futuro, tentavam ao máximo evitá-lo e acabavam mortas.

Ou com um desenrolar nada legal na história pra no final acabarem sendo salvas das garras do dragão pelo príncipe montado num cavalo branco (feito um comercial de shampoo).

Mas eu não seria salva por um príncipe, tampouco haveria cavalo.

E de fato, eu sempre fui a refém do dragão.

O problema estava no fato de que eu era completamente apaixonada por ele.

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Yukina não pronunciou mais uma palavra sequer sobre sua mudança repentina de personalidade dentro do carro.

Sabia que a bruxa tinha muitos segredos e, quando precisava, deixava que sua idade viesse a tona com olhares furtivos de uma anciã ou até mesmo conselhos que mais se pareciam com charadas.

Sim, ela era mesmo familiar de um dragão.

Virei a panqueca na frigideira e franzi o cenho ao constar que dourei demais.

Tínhamos tentado pedir pizza, mas chegando no portão Yukina batera o pé e decidira que panquecas eram uma opção melhor.

Ela estava “de regime”.

Como se panquecas salgadas fizessem parte do cardápio mais fitness do mundo.

Como se a bruxa precisasse de fazer dietas humanas.

Recheei a ultima e colocamos dentro de uma travessa de vidro juntamente com as outras.

Yukina segurava algo nas mãos e antes que eu pudesse perguntar o que era, pude ler “parmesão” escrito na embalagem e ver seu olhar quase vidrado enquanto despejava uniformemente todo o pacote sobre as panquecas.

Revirei os olhos e abafei uma risada.

O forno já estava pré aquecido, então empurrei a travessa para dentro do calor e o fechei.

Encarei o relógio e franzi o cenho.

O tempo tinha passado surpreendentemente rápido.

Yukina correu para a sala e ligou a TV, mas não parecia estar particularmente interessada no que passava.

Se remexia sem parar e roía as unhas.

Esperei que ela dissesse o que queria, sem lhe dar o gosto de eu perguntar o que era.

Yukina bufou.

— Seu pai foi me visitar ontem - ela desembuchou.

Certo.

Aquilo sim me surpreendeu.

Virei a cabeça bruscamente e franzi o cenho.

— Desculpe? - pisquei, confusa.

— Ele pediu pra eu continuar ao seu lado como sua amiga - Yukina revirou os olhos - como se fosse necessário alguém me dizer isso.

Franzi o cenho ainda mais.

— Seu pai está preocupado com você, assim como todos nós - ela disse.

— Eu estou bem - revirei os olhos e me joguei no sofá.

— Você não está - ela meneou a cabeça - mas vai ficar.

Ficamos alguns minutos encarando a televisão.

Um comercial de chocolate prendeu nossa atenção o suficiente para pularmos quando o alarme da cozinha tocou, anunciando que as panquecas estavam prontas.

Nos levantamos e juntas arrumamos nossos pratos e talheres sobre a mesa, sentando para comer silenciosamente depois.

Yukina me encarava de soslaio e sua atitude estava me incomodando.

Afinal, a japonesa costumava falar o que vinha à mente, sem filtros.

O que a impedia de falar comigo naturalmente?

— Daniel não para de falar de você - ela disse, num tom de voz cauteloso.

Não pude evitar de virar a cabeça em sua direção de forma brusca e nada sutil.

— Não estou dizendo pra se iludir novamente... - ela murmurou.

O aviso não impediu que meu estômago se enchesse de borboletas da expectativa.

— … Mas ele tem estado… Mais humano ultimamente - ela mordeu o lábio - quero dizer, ele não tem de volta sua humanidade, nada disso. Apenas está sentindo coisas que, como dragão, nunca sentiu.

— Está tentando me dizer que Daniel-dragão é um cretino porque nunca conseguiu ter sentimentos de verdade por outra pessoa que não fosse ele? - revirei os olhos, sarcástica.

— Basicamente isso - ela limpou o canto da boca e sorriu com infantilidade intencional.

Yukina balançou os pés sobre a cadeira alta e cutucou com o garfo os restos de carne moída no prato.

— Só… Tenha paciência, tá? - ela finalizou.

E parecia ter dito tudo o que queria.

Assenti.

Era só o que eu podia fazer.

Tinha medo de abrir a boca para respondê-la e deixar transparecer o quão esperançada eu estava.

Ou até mesmo de confirmar pra mim mesma que ficara ansiosa e confusa sobre minha própria decisão.

Eu estava sem Liam, sem Daniel e tinha que aprender a viver dessa forma.

Tinha que aprender a ser autossuficiente.

Uma princesa sem príncipe, sem dragão.


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