A Lenda dos Corvos escrita por Matheus Hipolito


Capítulo 1
Capítulo 1 - Viveiros de Nova York




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Capítulo 1– Viveiros de Nova York

A vida sempre nos prega peças, e são essas peças que nos fazem acordar para vida e sair do transe, que é a ilusão. No meu caso não foi diferente, acho que fui acordado da pior maneira possível, pela minha mãe.

Minha avó e meu avô não são da nossa cidade, então de vez em quando eles aparecem aqui na nossa casa, para ver como anda as coisas e para ver como eu ando na escola, o que é bem esquisito, quando se tem 17 anos.

E em uma dessas visitas, resolvemos dar uma volta pelo parque Blood, que fica perto de casa, e tem sempre algo de diferente, como corridas, gincanas, vendas, e dessa vez era uma corrida de patins.

Minha mãe parou, olhou para mim e me lançou um sorriso, que eu lembro muito bem, mesmo depois de quase 2 meses desse dia. Quando jovem,minha mãe competia, ou melhor, brincava de competir corridas de patins,e ela sempre fora muito boa nisso, mas agora ela já está mais velha, e não está mais na idade para subir sobre 4 rodinhas e andar por ai pelo Blood. Mas ela não nos escutou, e foi mesmo assim.

— Helena! - minha avó disse ríspida para minha mãe— você não tem mais idade para isso!Minha avó é bem engraçada mesmo estando brava, pois ela é bem magrinha e miudinha,e é branca,como se tivesse caído em um pote de tintada mesma cor,e usa óculos enormes de sol marrom, e um chapéu idiota, talvez isso me faça amá-la tanto assim, o seu jeito engraçado, mesmo quando não está brincando.

As únicas partes em que me lembro desse dia foi o sorriso de felicidade da minha mãe quando viu o cartaz que indicava: corrida de patins, e a hora em que eu corria em sua direção, e ela estava caída, sobre sua perna direita, numa posição assustadora, não sei como sua perna não saiu do corpo.

Depois disso passamos o dia todo no hospital, um domingo perdido, se não fosse pela infantilidade da minha mãe.

Não posso pensar assim! - repreendo a mim mesmo.

Todos nós temos o direito de fazer o que bem entender, e minha mãe só queria se divertir, não vou mais culpá-la.

Depois que sua perna já tinha voltado ao normal, eu corri para dar-lhe um abraço, e pela primeira vez nesse ano, eu havia chorado. Digamos que eu sou discreto e cuidadoso como um corvo.

***

Hoje é o último dia de aula, e depois começa as férias de verão, ou seja, mais empregos me esperando.

É, eu vou trabalhar.

Foi um pouco difícil me acostumar com essa ideia, pois sempre tive tudo o que eu queria, e nunca precisei acordar cedo nas férias de verão, mas isso virou uma necessidade, e a vida está aí.

Minha mãe era professora na academia mais famosa e bonita de Nova York, mas depois do incidente, ela não é mais nada, além de costureira.

Ela costura bem, isso é verdade, as vezes quando algum fiozinho do meu uniforme de basquete solta e um buraquinho abre, ela mesmo concerta.Mesmo sendo uma mulher fina, ela não é fresca.

Minha mãe tem vários fregueses, ela é conhecida, e isso nos ajudou muito. Não vivemos na pobreza, pois meus avós nos ajudam um pouco, mas precisamos nos estabilizar cada vez mais.

Então depois da aula já prometi a minha mãe: Roger Rood irá procurar um emprego.

***

— E aí, Rood?— Pergunta Martin Alg, meu melhor amigo, desde o primeiro ano do ensino médio, ele é mais baixo que eu, e é bem mais desastrado também, é sempre aquele amigo que não pega ninguém nas festas, e que não chama muito a atenção, mas é um cara maneiro, mesmo com todas suas brincadeiras infantis— Pronto?

Não entendi de cara o "pronto?", pois tive que acordar mais cedo hoje, porque minha mãe não pode dirigir, e para ela ainda sou uma criança para dirigir seu carro. Minhas pernas ainda doem de tanto pedalar na minha bicicleta.

Só depois de alguns segundos fui perceber o que aquilo significava.

— Sempre estou pronto— Respondo meio sonolento, levando minha bicicleta para o pequeno estacionamento da escola.

— Deu pra perceber— Diz Martin, ironicamente— Você está tão radiante como um dia nublado.

— Vamos logo, pivete— Digo a ele, chamando–o com a mão.

***

Hoje temos aulas de várias matérias em que eu costumo dormir, mas hoje reservei o dia para pensar com o que eu gostaria de trabalhar.

Penso em trabalhar aqui mesmo na escola, fazendo algo para o time de basquete, além de atuar no jogo, mas acho que iria ser um pouco constrangedor pra mim, não que eu seja uma pessoa popular, mas qualquer um que tem a função de arrumar as bolas do time de basquete, iria ser zoado, então descarto essa hipótese.

Posso trabalhar em uma loja de roupas, gosto muito de me comunicar com as pessoas, posso ficar no caixa, ou até mostrando as roupas pras pessoas, mas talvez isso me canse muito, só quero algo para ajudar na economia da minha casa, não algo que use meu dia todo.

E então ouço o canto dos pássaros, na árvore ao lado da minha sala, e então olho para ela, vejo pelo menos três pássaros cantando e voando de lá pra cá, e penso no Bully, meu papagaio que fica no nosso quintal, e uma ideia brilhante surge na minha cabeça.

Por que não trabalhar em um viveiro?

Isso me faz sorrir, mas um sorriso grande e largo, o que faz Martin perceber e me imitar, e quando percebo que a sala está rindo, olho para eles, e largo o além para lá, e então vejo Martin me imitando, o que me faz recuar os ombros, e ficar vermelho de vergonha, mas mesmo assim eu rio. Não posso ter feito essa cara de idiota, como o Martin está fazendo agora. Mas ainda é uma ótima ideia, viveiros que me aguardem.

***

Depois de quatro horas, rodando os pelo menos 8 viveiros de Nova York, eu desisto. Não encontrei nenhuma, nada, nem pelo menos uma vaga de limpador de viveiro, nada.

Estou andando de volta para casa, não estou cabisbaixo, mas estou triste, muito triste. Agora terei que pensar em algo para fazer, alguma outra coisa para trabalhar.

Caminho na avenida principal, mas percebo que algo está acontecendo lá na frente, parece que um pedaço de asfalto rachou, e que toda aquela área está interditada, então corto caminho por uma rua a esquerda, uma rua que eu nunca tinha visto, repleta de lojas obscuras, lojas de Halloween, lojas de fantasias, e até uma leitura de mãos, vejo também uma... espera aí, já andei 4 quarteirões, e com certeza não sei onde estou, penso em voltar para onde eu estava, mas só de pensar já me sinto cansado, e então vou indo em frente, explorando esse pedaço de Nova York que eu mal sabia que existia no mapa.

***

Andei pelo menos uns 15 quarteirões, e não reconheci nada, nem uma loja que eu já havia entrado, nem uma pessoa conhecida, nem o carro da mãe de Martin, acho que posso me considerar perdido.

Mas então, algo me chama a atenção, talvez foi os vidros que reluziram ao sol, mas me deparo com o Nightmire Crowns, e sim, é exatamente isso o que eu pensei, é um viveiro de corvos.

Meu coração disparada, e derrapo com a bicicleta até parar bem em frente ao viveiro.

Ele é grande e totalmente preto. Há várias janelas com vidros foscos, e o prédio parece ser bem antigo, como naquelas histórias de terror. Como o próprio nome já diz: Nightmire Crowns, iria ser um belo e assustador local para um pesadelo com corvos.

Entro e escuto o som de um sino. Aqui é um lugar sombrio.

***

O local é totalmente escuro, mesmo com o sol brilhando lá fora.E consigo ver escadas rodeando o local.Já tinha percebido lá fora,que o viveiro devia ter mais de dois andares, mas aqui, o local parece bem maior.

Várias prateleiras com gaiolas, corvos entalhados, potes de vidros transparentes, estão distribuídas pelo local, e claro, muita,e muita sujeira também.

Existe uma escada descendo para um porão, onde não tem porta, mas mesmo assim, não consigo ver o que tem lá em baixo, e em frente a essa escada, fica um balcão bem largo, que dá na altura do meu estômago,e nele, há uma enorme gaiola com um corvo dentro, um corvo de mentira,entalhado,pois desde que eu entrei, ele não esboçou nada, mas agora de perto, ele parece estar me perseguindo com os olhos.

De dentro eu consigo ver quem está lá fora pelos vidros foscos e sujos da Nightmire Crowns, mas lá de fora eu não via nada, com certeza quem foi que fez essa loja, não queria mostrar pra qualquer um o que ele guardava aqui, só para os amantes de corvos.

E mesmo corvos sendo pássaros, eu não me interesso muito por eles, mas agora é algo para a minha sobrevivência, e eu vou ter que começar a gostar deles, pois aqui poderá ser minha fonte de sustento.

***

Subindo as escadas do porão, eu avisto uma silhueta masculina, com certeza é masculina,e algo no seu ombro me fez ver ele como um pirata, mas agora de perto, eu percebo que não é um pirata, pois piratas carregam papagaios no ombro, não corvos.


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