Legado de Semideuses! escrita por Lucas Lyu Santos


Capítulo 8
A ambígua ciência da morte.




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No dia seguinte eu caminhei diretamente para a floresta assim que consegui digerir meu café da manhã. Não sabia se o que tinha visto ontem era simplesmente uma alucinação ou a realidade, mesmo assim não me dei ao luxo de pensar muito nisso; a não ser aquele capuz negro. Talvez eu nunca saiba se realmente era uma pessoa que vagava naquela hora da madrugada, afinal eu estava a efeito daquele líquido dos filhos de Hypnus e já não conseguia pensar claramente nas coisas – a prova disso foi que acordei debaixo da minha cama com um tênis de travesseiro.

Meu pescoço estava levemente com algumas dores que mal podiam ser ignoradas, mas a cada segundo elas se tornavam amenas. As dunas eram realmente muito íngremes e cheias de botões claros de margaridas por todo o campo esverdeado. As árvores tinham comprimentos e extensões incrivelmente grandes. E uma linda visão com flores de todas as cores caindo levemente ao chão, que formava um lindo caminho de pétalas em minha frente me dava até uma dose de admiração. Minhas costas doíam ao som dos meus passos e mal pude perceber que duas figuras estavam encostadas nas árvores esperando alguém chegar.

– Já era sem tempo. – Sofia, a garota do coração na bochecha esquerda disse. – Hoje eu vou te mostrar como se usa uma adaga. – Ela empunhou o aço. – Você usa uma arma dessas principalmente para arremessar ou fazer cortes pequenos e precisos no seu oponente.

– Do mesmo jeito que Mariana fez em mim no dia que vocês tiraram as chances de eu ser pai, não é?

– É, não exagera Lyu.

– Se tivesse sentido a dor. – Falei baixo e olhando para a outra direção. – Oi Batistão, o que faz por aqui? – A garota citada estava a sete metros.

– Eu tenho que fiscalizar o seu desenvolvimento assim como a Mell está fiscalizando o treinamento da Alinne. – Ela fechou o computador e limpou o óculos na sua camisa preta cheia de borboletas azuis de manga longa. Ela usava uma calça xadrez vermelha e preta que combinava com o seu all star azul e branco.

– Okay. Mas por que não deixar eu e Alinne treinarmos juntos?

– Ela está com a Maary. – Ela colocou o óculos e arrumou com o dedo assim que ele ameaçou cair. – As caçadoras não são muito fãs de homens, ou seja, é melhor deixar do jeito que está se não quiser levar uma flechada no meio das pernas.

– Tudo bem, vamos começar. – Sofia Merino interrompeu.

Ela me ensinou como fazer cortes finos e em determinados momentos empunhar a adaga em diversos modos ofensivos e defensivos. Usamos um espantalho para praticarmos, e dessa forma eu notei que os cortes dela eram bem mais eficazes e precisos na medida certa para deixar o adversário clamar por dor; ela acertava o alvo onde poderiam existir veias, mas sempre que a lâmina alcançava o material ela tirava sem que perfurasse muito. Eu tenho absoluta certeza que se o espantalho falasse ele gritaria por socorro. Passamos mais de meia-hora nesses movimentos e eu tive certeza que estava me saindo bem. Logo essa hipótese se confirmou quando estávamos atirando as facas à distância e eu consegui surpreendê-la. Mas de qualquer forma ela ainda mostrara muito controle sobre aquele instrumento e seus olhos cor de mel ficavam extremamente atrativos e magníficos. Caminhei até a minha adaga e a tirei do espantalho que tinha perdido o pescoço pela minha mira - precisei usar força para retirá-la - quando um calafrio atingiu meu corpo, uma pontada de arrepios atingiu meu ombro e uma brisa enevoada de dor passou pelo meu corpo. Sofia havia arremessado uma faca sendo eu o alvo. Ela conseguiu ao menos me acertar de raspão e um dos olhos do espantalho. Conclui que se ela fazia isso num boneco de pano, imagina como seria em um adversário. Por isso eu desejei nunca lutar com a filha de Afrodite, e não teria dinheiro no mundo que faria contrariar minha vontade.

– Antes de encerrarmos o treinamento, vamos lutar. Quero ver se essas horas que eu passei te ensinando não foi perda de tempo. – Eu estou começando a achar que as pessoas desse acampamento conseguem ler meus pensamentos.

– Ta de brincadeira né? Você vai me mandar pra enfermaria fácil, fácil.

– Nada que um pouco de néctar resolva, ande logo filho de Apolo.

Por um segundo eu a vi em câmera lenta e com os cabelos flutuando ao som da batida do meu coração que gritava por medo. Ela estava com duas adagas em seus punhos e quebrava os seis metros que nos separavam. Seus olhos pouco amistosos agora esbanjavam uma delicadeza falsa, pois ela queria me mostrar que era ela a melhor entre nós dois. E nisso eu não tinha dúvida de que ela estava certa.

Eu levantei a primeira adaga em posição de defesa e a outra que antes estava fincava no espantalho, em posição de ataque. A princípio ela tentou me acertar com um golpe no meu braço esquerdo vindo de uma súbita rapidez e agilidade, mas assim que notei sua adaga se movimentando em busca do meu sangue, meus olhos alertaram meus sentidos e a ponta da minha lâmina se projetou ao encontro da lâmina dela. Nesse momento as duas adagas se chocaram e o aço fez um eco surdo sobre a arena, faíscas saíram.

– Nada mal. Mas, cuidado com a sua defesa aberta. – Eu só fui entender o aviso quando a mão direita dela veio ao encontro do meu ombro esquerdo com a outra lâmina que ela carregava.

– Dessa vez não. – Novamente o aço fez um barulho oco, eu me defendi com a minha outra adaga. Agora as quatro adagas estavam grudadas, faiscando uma nas outras.

– Dessa vez sim. – E quando achei que estava indo bem, uma joelhada me disse o contrário.

Coloquei a mão sobre a barriga e soltei alguns urros de dor quando algumas pontadas de raiva percorreram meu corpo. Afastei-me e novamente tomei um chute na parte do estômago, caí perto de Batistão. Sofia olhou por um momento e recuou esperando que eu levantasse. Aos poucos recobrei os sentidos em conjunto com a dor que se dissipava, até sumir.

– Sofia, um minuto. – A loira chamou minha atenção.

– Okay, só não demore. Você até que foi bem Lyu. – Merino foi na direção das adagas fincadas no espantalho e começou a retirá-las.

– Lyu, preste atenção. – Batistão chegou próxima do meu ouvido. – Eu já vi essa patricinha lutando inúmeras vezes. Ela é boa? Sim, uma das melhores em todo o acampamento, mas numa luta você tem que prestar bem atenção nos movimentos que seu oponente vai escolher. Por isso quando for atacar observe exatamente a projeção do tronco dela. – Beatriz deixou que as informações fossem absorvidas. – Se virar muito para o lado direito, ela vai te chutar ou tentar um soco com a mão esquerda. São esses trocadilhos que confundem, mas é só ter calma que logo vai conseguir pegar, além do mais você tem reflexos rápidos por ser um semideus e graças ao seu pai você tem uma descendência de Zeus dentro dos seus olhos. – Ela pausou. – Eles enxergam tudo.

– Hm, tudo bem, vamos ver se isso funciona. – Levantei-me com as armas sobre meus dedos. – Obrigado. Vamos lá Merino, pegue leve, por favor.

Novamente ela ficou em posição de ataque e dessa vez esperou que eu fosse até ela. Os meus passos eram curtos e calmos, porém bem atentos para poder recuar assim que alguma merda acontecesse. Assim que eu fiquei á um metro e meio de distância, ela pulou em cima de mim com ambas as adagas desferindo golpes a frente do meu peito. Rapidamente consegui barrar os ataques projetando minha mão direita para a esquerda; quando o aço fez um barulho eu consegui colocar a adaga da mão esquerda sobre meu rosto e vi claramente diante dos meus olhos as lâminas brilharem ao se tocar. Assim que um momento de silêncio caiu sobre a tensão da luta, eu ouvi as palavras de Batistão no meu subconsciente “Se virar muito para o lado direito, ela vai te chutar ou tentar um soco com a mão esquerda’’ , meus olhos repararam a silhueta dela se mover – que por sinal era bonita – e me virei quando a perna dela subiu em busca de outro golpe em mim. Dessa vez, porém, eu estava atento e usei minha força para empurrar as duas adagas dela para trás, fazendo com que ela perdesse o equilíbrio, deixando a sua perna direita no ar.

– Não posso baixar a guarda. – Cochichei a mim mesmo e segurei o pé dela antes que o corpo dela fosse ao chão.

– Não seja idiota. – Ela, no mesmo instante projetou o pé esquerdo para o alto e deu um giro com o objetivo de acertar o calcanhar sobre o meu ombro enquanto ela fingia estar caindo.

– Nem pense. – Abaxei-me.

E assim ela ficou de pé novamente, e dessa vez veio vorazmente em busca do troco. Uma, duas, três, quatro, sequências de golpes rápidos desferidos ao vento e ao nada, ela errou todos. Eu mal conseguia acreditar que meus reflexos eram rápidos a ponto de conseguir despistar a lâmina em poucos segundos, era incrível essa sensação... Eu fui recuando para trás e vi a raiva consumir a garota que agora tinha mais força e imprudência. Meu pé esquerdo foi para trás e meu calcanhar bateu de leve na árvore, senti o fim da linha se aproximar quando não tive mais para onde recuar. Meus olhos se arregalaram e ela abriu um sorriso triunfante. Sofia usou sua mão direita e atacou com extrema rapidez o meu braço direito, que por sua vez ficou imóvel, ela acertara algo duro e a adaga ficara pendurada. Ela novamente olhou para o seu feito e sorriu, mas assim que eu me mexi com um brilho diferente nos olhos, ela notou ser tarde demais para uma reação.

– Droga, como pode isso? – Eu a ignorei se perguntando.

Ela tinha acertado o tronco, mas o pedaço da minha camisa interpretou notavelmente um papel divino. Eu aproveitei e encolhi meu ombro e fechei o braço, dando sensação de que ela tinha me atingido quando na verdade não; era tudo um breve plano. Assim que eu fui para frente um pedaço do pano da minha blusa laranja ficou pendurado na adaga cravada na árvore. O que eu fiz a seguir até mesmo me impressionou; acertei um chute na mão esquerda da garota que soltou a adaga ficando completamente sem defesa e logo recuando quando a força dos meus golpes finos e rápidos cortaram o ombro esquerdo dela. Fiz o que pude para não acertar qualquer veia e quando notei o que estava acontecendo, ela tinha alguns cortes no braço e a fim de terminar com tudo isso acertei um chute levemente preciso na perna esquerda dela para fazê-la totalmente sem equilíbrio. Ela caiu aos poucos e eu a segurei novamente pelo pé direito antes que suas costas fossem de encontro ao chão. Ela se levantou, ficamos imóveis próximos um do outro.

– Como? – Ela estava a centímetros perto de mim.

– Não sei... – Fui sincero.

– Filhos de Apolo podem criar uma falsa visão do futuro. – Batistão se levantou.

– Ah, entendo. – Nossos olhos se chocaram. Estávamos próximos, Sofia e eu.

– Cof-cof. – Mariana apareceu. – Acho que você perdeu, Sofia. – Ela interrompeu o momento. – Agora. – Fez cara de emburrada. – Vamos!

[...]

Eu voltei para o refeitório com um sorriso indiscreto no rosto. Estava tarde e em todo o acampamento podia ser visto uma decoração arrojada da festa que mais tarde aconteceria. Peguei um prato com algumas massas e antes de me sentar joguei um pouco da minha comida no fogo para agradecer meu pai por não ter tomado uma surra durante o treinamento, eu até que estava gostando desse negócio de ser semideus. Alinne logo se sentou ao meu lado com uma sensação de dever comprido, ela estava com um olhar mais “determinado” ou “poderoso” que eu decidi não perguntar o motivo, resolvi ignorar.

– Ain meus Deuses, ai estão vocês! – A filha de Hécate chegou.

Frascolli tinha cabelos curtos e negros. Ela vestia uma roupa preta que tinha uma frase que se destacava na blusa “tenho ppk e daí?” e outras frases mais. Ela vestia um short curto e calçava um vans vermelho. Suas expressões eram engraçadas, eu não sabia se ela ria ou chorava quando seus lábios se contraíam.

– Eu sei que eu não posso sentar na mesa de outros deuses, mas minhas pernas não são feitas de aço né. Desculpa ai Apolo, te amo seu lindo. – Ela ficou ao nosso lado e cruzou as pernas, olhando para mim.

– O que precisa? – Alinne disse.

– Ah nada, só preciso ensinar a defesa e artes das trevas.

– É sério? – Eu conhecia essa frase de algum filme famoso.

– Não, idiota. – Frascolli bateu na mesa sorrindo. – Eu vou ensinar o trabalho da minha mãe e tal, então presta atenção que esses bancos doem a minha bunda e eu preciso dar uma olhada nuns semisexys que chegaram esses dias, uns novatos sabe Rosana.

– Rosana? Ah, tudo bem. – Concordamos.

– Tudo bem... Eu sei que vocês entraram em um portal que os trouxeram diretamente para o acampamento quando estavam naquele beco do metrô, mas na verdade aquilo foi uma ajudinha de Jano com as suas famosas portas. – Ela apontou para os filhos dele que estavam jantando. – Minha mãe é a Deusa da Magia, por isso os mortais não conseguem ver monstros e coisas que acontecem no nosso mundo, é ela que controla a névoa. – Ela percebeu que não tínhamos entendido. – Atah, ok, calma. A névoa é uma camada de mentira que cobre os olhos dos humanos. Se eu estiver com um pégaso no meio de uma avenida movimentada eles acharão que é um pombo gigante ou simplesmente um cavalo que está sendo erguido por um cabo de filme, sei lá, eles são estranhos não me pergunte o porquê.

– Ah sim, entendemos, névoa né? – Alinne disse – Continua.

– Temos uma barreira no acampamento que Zeus mandou erguer logo após os incidentes com alguns lestrigões e criaturas que não eram bem amigáveis, por isso minha mãe e mais alguns Deuses mantiveram uma barreira anti-mortais desde então. Tanto que se algum mortal passar pelo acampamento eles só conseguirão ver algumas dunas desertas com árvores e uma placa marota que os filhos de Hermes colocaram “Cuidado, estupradores com poderes especiais.” – Ela riu. – Aqueles meninos, bem dotados sabiam? – Cochichou para Alinne.

– Enfim né. – Intervi. – Então se estamos numa duna ou montanha, como viemos parar aqui pelo metrô?

– Há algumas portas que ligam diretamente o acampamento, mas isso depende extremamente da minha mãe e de Jano para poder abri-las. – Ela nos olhou de forma fria. – Então se me maltratarem, além de eu dar na cara de vocês, eu conto para minha mãe e digam adeus as portas de segurança caso precisem usar alguma vez na vida. – Ela nos fuzilou com os olhos. – Nossa gente, é brincadeira caramba. Sorriem, hoje ainda vai ter muito homem, mulher, relaxem e viva a pegação. – E ela se levantou assim que Helena entrou no pátio. – Tudo bem, tchau seus lindos!

Alinne e eu fomos nos trocar para a grande festa. E assim que saímos pelo chalé percebemos que a música já estava tocando e muitas pessoas dançavam e pulavam, até mesmo a garota que tinha chegado. Ela estava com um vestido branco com alguns detalhes roxo – tinha um curativo na altura do ombro direito – e usava uma coroa de flores nos seus cabelos loiros, além de estar descalça. Ela veio até nós e esbanjou um sorriso aquecedor, mas eu tinha certeza que ela ainda estava um pouco perdida com as coisas de semideuses, assim como eu. Ela passou direto até a mesa de bebida e pegou uma Pepsi, eu pensei que pra mim também poderia ser. Ao longe eu via inúmeras fitas decorativas, além de balões e tantas coisas mais que era difícil não prestar atenção. Munhoz e sua irmã estavam conversando com as filhas de Poseidon – Orsi e Letkaske que viraram quando me viram passar. Eu decidi esquecer essa história dos pégasos e por isso ignorei os olhares sem qualquer incomodo, afinal, o que eu poderia ter feito para matá-los? Nada, não tinha sido minha culpa...

Os outros campistas estavam dançando, Alinne fora ao grupo das caçadoras e lá estava mais a vontade – pelo menos me pareceu - enquanto Rô estava brincando com os filhos de Dionísio numa rodinha improvisada “vira, vira, vira” e gritos desesperados preenchiam o acampamento. Tinha um pouco mais de sessenta pessoas e assim foi a noite inteira com o som tocando músicas de gostos diferentes. As filhas de Afrodite estavam jogando seu charme em alguns garotos que eu não conhecia. O que presumi ser azar deles. A menos duas das filhas da deusa não estavam no clima da festa. Sofia estava sentada olhando em minha direção até que Mariana deu uma leve cutucada, ela estava brava com alguma coisa que a garota do S havia feito. Ignorei, mais não tinha certeza até quanto tempo.

– E aí filho de Apolo. – Ela estava com um vestido vermelho chamativo. – Veio sozinho? – A silhueta dela era perfeitamente feita com detalhes de deuses, ela era linda em todos os quesitos possíveis.

– É, sabe como é né Merino. – Tentei parecer desleixado.

– Tudo bem, quer dançar? – Ela definitivamente era filha de Afrodite, talvez a própria Deusa em pessoa.

– Ah, Alinne está um pouco longe, então estou sozinho, por que não. – Olhei ao redor e já não via a garota do vestido roxo, Mariana e tampouco Alinne, então decidi curtir a noite. – O que houve com a sua amiga? Ela me parecia com raiva.

– Ah não liga, ela só estava chateada com uma coisa que aconteceu.

– Diga-me, ué.

– Aquele dia que você foi reclamado, do bilhete, do beijo com a sua irmã. Era pra ter acontecido o oposto, era a vez dela...

– Como assim a vez dela?

– Você já deve ter ouvido sobre as tatuagens de iniciação. – Ela virou e levantou o cabelo. – Essa é a minha. – Era um coração cheio de pássaros em volta na nuca. – Quando o pai aceita o filho ele tem exatamente tudo que um semideus tem direito, no caso de nós, para conseguirmos passar pela iniciação temos que quebrar o coração de um menino. – Ela olhou nos meus olhos. – E ela tentou fazer isso com você. Como não conseguiu, ela ainda não vou iniciada.

– Nossa... Cara, nem vou falar nada. – Uma pontada de raiva me preencheu. – Isso é sacanagem.

– Sabemos, mas isso quem manda é Afrodite, não as filhas dela.

– Tsc, mesmo assim, vocês deveriam ao menos ter um bom senso né. E se fosse o contrário?

Nesse momento um longe estrondo invadiu a minha dança. Estávamos isolados dos outros e assim que explosões aconteceram ao nosso redor – nas árvores – uma fina camada de fumaça invadiu toda a festa e espantou todos com o barulho. O som parou e cerca de cinco minutos depois todos estavam em volta de alguma coisa. Eu consegui me aproximar o bastante para ver o corpo de uma garota, mas não consegui identificá-la por ter muitas pessoas em cima.

A princípio acharam que ela simplesmente havia bebido muito e desmaiado, mas a partir do momento que uma poça de sangue ficou sobre todo o corpo dela os olhos se espantaram e muitos gritos começaram a se fazer presente. Fui chegando perto; havia um coração na bochecha da garota e inúmeros cortes feitos com uma adaga na barriga – esta adaga que ainda permanecia pendurada sobre a carne da menina – que agora tinha lábios vermelhos; vinho e sangue, uma mistura não compatível com o momento. Sofia chegou perto o suficiente para tampar a boca e se virar sobre meu ombro para não enxergar o acontecido. Logo, Rô, Thalles, Lorenna, Munhoz, Babu, Batistão e todos os outros estavam em volta olhando aquilo, incrédulos, Rô era o mais afetado.

O sangue já estava se espalhando pelo chão e por um segundo vacilei para cima – não queria ver aquilo, não dessa forma – quando sem intenção notei uma presença se esgueirando sobre as árvores á trinta e cinco metros de nós, ela se escondia num capuz. O que eu consegui fazer foi pegar três adagas que estavam no chão e parti no encalço dela, todos estavam ocupados demais para perceber. Eu tinha que saber quem era a moça do capuz.

A figura estava com um capuz negro novamente – ou seja, não foi um sonho aquela visão de ontem á noite, ele ou ela estava plantando aquelas bombas. Agora tudo fazia sentido!

Ela corria insanamente sobre a colina com um colar aos dedos. Eu fui atrás buscando fôlego de onde não tinha para conseguir distância o suficiente para arremessar as adagas. Além de mim, a figura também estava um pouco preocupada em correr que nem prestou atenção que seu capuz se enroscou num galho e ele rasgou completamente. Estava escuro, não consegui ver a cor dos longos cabelos. Mas era grande; Uma garota.

– Pare! – Eu passei pelo capuz e notei o vermelho do sangue. Era burro, mas esperto o bastante para saber que quem matou a garota havia sido ela. – Espere!

Eram quinze metros de distância e assim decidi me arriscar em jogar as adagas na direção daquela garota. A primeira passou ao lado direito e logo esbarrou numa árvore. A segunda foi diretamente a um galho que bloqueou a sua projeção, contudo, a terceira atingiu uma parte do ombro dela e rasgou um curativo branco. No momento que ela saiu das folhagens a luz da lua iluminou e eu vi os cabelos loiros se sobressaírem, nem mesmo aquele vestido fofo ela estava usando mais. No lugar que eu acertei tinha uma tatuagem; um Raio, mas ele tinha um risco no formato de “/”. Era uma filha de Zeus. Ficamos cerca de sete metros de distância nos encarando, eu, incrédulo.

– Júlia? – Me surpreendi. – Você matou uma garota...? Por quê? Você matou... Mas por quê?

– Por isso. – Ela levantou um colar que tinha uma pedra vermelha.

– Uma pedra?

– Uma chave. – Ela tirou algo brilhante de suas costas, era um raio. – Está vendo isso? Eu posso lançar quantos raios eu quiser. – Ela guardou o colar e mudou sua atenção para o raio. – Meu pai me deu quando consegui essa tatuagem, ele me aceitou. – Ela apontou para o curativo que agora estava aberto. – Mas quem disse que eu o aceitei?

Nesse momento uma luz invadiu meus olhos e vi um raio se chocando a outro. Munhoz chegou e lançou instintivamente inúmeros raios para acertar Gugliemo que agora havia pulado de um penhasco de trinta metros. Eu caí com o impacto dos raios e assim que levantei, meus olhos testemunharam ela ir embora ao horizonte montada num pégaso escuro, ela foi montada no escuro para a escuridão.

Assim que entramos no lugar que antes estava repleto de alegria, reparei no cenário em volta; Árvores caídas, folhagens falhadas pelo fogo, pequenos incêndios e muito concreto no chão. Encaminhei-me até a multidão que ainda estava em volta do corpo com um pesar grande no meio do peito. Fiquei de frente á ela, uma lagrima caiu aos meus olhos ao ver Rodrigo chorar litros sobre aquela garota que algum dia tinha sido sua irmã. Antes que eu pudesse chorar, um último adeus saiu da minha boca.

– Descanse bem, Laura.


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