I never told you what I do for a living escrita por Iofthestorm


Capítulo 3
Capítulo Dois - Melaine e Sam




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Mais uma faca nas minhas mãos

Uma mancha que nunca sai dos lençóis

Eu sou tão sujo, querida

O tipo de sujeira que a água nunca tira da roupa

Tirei o estetoscópio do ouvindo, encarando gentilmente a Sra. Manson a minha frente.

–Tenho boas notícias – sorri – aparentemente o novo medicamento está funcionando e sua pressão está mais baixa.

A velha mulher sorriu, radiante. Ela era baixinha e gordinha, como a Mamãe Noel.

–Isso é ótimo, querida. O outro médico nunca acertava minha pressão. Era de você quem essa cidade estava precisando.

Não pude evitar de sorrir ainda mais. Era por isso que eu tinha querido ser médica, a principio. Para fazer diferença na vida das pessoas. Na vida, e não na morte. Coisas simples. Sem violência. Ajudei a Sra. Manson a descer da maca.

–Venha jantar comigo esta noite. – ela convidou. Não tinha sido a primeira. Elas sempre se preocupavam comigo. – o que você gosta de comer? Posso cozinhar qualquer coisa.

Abri a boca pronta para recusar. Não era apropriado, sabe? E de qualquer forma, eu estava melhor sozinha.

–Querida, não vou aceitar um não como resposta. Gerald me contou que você tem ido aquele bar toda a noite. Você deve se sentir muito sozinha, eu entendo, mas aquele lugar não é apropriado para uma moça. Venha jantar comigo.

Meu rosto ficou vermelho – e esse é o lado negativo de ser ruiva. E o lado negativo de cidades pequenas, é que todo mundo toma conta da sua vida. Minhas visitas frequentes e aparentemente aleatórias ao bar estavam sendo notadas.

–OK, eu irei. – falei, derrotada. Conhecia as senhorinhas empolgadas bem demais. Ela nunca desistira.

–Sete horas. Tem meu endereço na ficha. – respondeu a Sra. Manson, animada. Ela saiu logo em seguida, dizendo que precisava fazer compras para o jantar.

Fazia quase um mês desde que eu havia descoberto o Smith, e bem, Sam. E ainda assim eu não sabia o sobrenome dele. Aliais, ninguém parecia saber nada sobre ele. Ele era tão misterioso, e tão incrivelmente sexy. No último mês, o número de jovens mulheres que frequentavam tinham triplicado. Toda a noite havia pelo menos 20 mulheres circulando o balcão e nos fins de semana, era ainda mais lotado, atraindo inclusive algumas moças de cidades próximas. Pense em um deus forte e musculoso de dois metro de altura, ombros largos, olhos verdes doces e sorriso meigo.

Sam não dava atenção a nenhuma delas. Ele também não dava muita atenção a mim, mas sempre sorria quando me via. Seu sorriso era só de rosto, porque seus olhos eram tão tristes que tudo que eu queria era abraça-lo e prometer a ele que ficaria tudo bem.

Eu costumava ter uma amiga que dizia que eu era uma viciada em amor. Eu não poderia viver sem estar apaixonada e sim, ela estava certa. Não que eu me considerasse apaixonada por Sam. Eu não era uma completa maluca. Eu só tinha uma queda por ele, só isso. Era minha distração, minha dose diária de adrenalina e oxitocina numa cidade em que não acontecia nada. E era justamente esse tipo de paz e tranquilidade que eu queria na minha vida.

–-

O único motivo que eu tinha aceitado o convite da Sra. Manson era porque eu sabia que as pessoas estavam comentando e fazendo perguntas. Sobre mim, sobre a minha história. Havia especulações e até alguns boatos surgindo, o que me preocupava. Eu sabia que eu deveria deixar aquela cidadezinha em breve e procurar outra. Eu já tinha toda uma história inventada para contar aquela noite: uma triste história de como um psicopata havia matado minha noiva. Esse era o máximo de contato que eu me permitira. Eu queria evitar me mudar com frequência, pois isso também acabaria chamando muita atenção, nesse caso de demônios, e esses eram piores que moradores curiosos.

Cheguei até a casa da Sra. Manson, no instante que a porta era aberta. Rapidamente reconheci as costas da pessoa que estava entrando – era Melaine. Involuntariamente sorri, e odiei que eu estava feliz em vê-la. Ela estava aparecendo no Smith com certa frequência. Há muito já tinha concluído que ela não era nenhum monstro, e sim apenas uma jovem médica confusa.

Quase dei meia volta. Não é que eu não gostasse dela. Eu gostava e esse era o problema. Nunca conversávamos muito. Eu não fazia perguntas nem ela. Nunca mais tocamos no assunto do primeiro dia. Apenas trocávamos algumas poucas palavras. Mas os olhos dela, pareciam que liam minha alma. Eu já havia entendido mais do que ela revelou: ela queria salvar o mundo e não conseguiu, por isso fugiu para um lugar que as pessoas ainda podiam ser salvas. Mas agora, Melaine queria me salvar, e embora eu não pudesse deixar de me sentir agradecido, sabia que ela não tinha ideia do tamanho do dano. Eu não tinha salvação. Suspirei fundo e me dirigi a porta.

–-

Foi uma noite agradável. Assumi um papel, como tantas vezes fingi ser agente do FBI, técnico do sistema de alarme ou até mesmo padre. As pessoas ali falavam sem parar, mas em não demorou muito para eu entender a verdadeira intenção da Sra. Manson com aquele convite. Ela queria juntar Melaine e eu. Já disse antes, não era que eu não gostasse da Melaine. Era que eu era veneno, era que eu só trazia morte e sofrimento as pessoas minha volta. Não minto mais para mim mesmo, toda vez que ela sorria, eu sentia vontade de beijá-la. Confesso que no último mês até tinha sonhado com isso.

Mas não era assim que funcionava para mim. A mancha jamais sairia, eu era um homem marcado, escolhido por Lúcifer e Melaine, ela não tinha nada a ver com essa loucura, assim como Jessica. Eu não teria outra morte em minhas mãos.

–-

MELAINE

A Sra. Manson tinha um belo jardim de inverno, que foi para onde eu fugi quando tudo se tornou demais. Eu sempre tinha sido introvertida, com uma tendência a fugir das pessoas e gostar um pouco de ficar sozinha. Mas não ganhei nem cinco minutos de tranquilidade, quando ouvi passos atrás de mim.

–Está tudo bem? – reconheci imediatamente a voz de Sam. Meu coração deu uma batida irregular. Eu não aprendia nunca, não era verdade? Eu era uma viciada em amor.

–Está sim. Olha como é aqui é bonito – toda vez que eu ficava nervosa, começava a falar sem parar antes que pudesse pensar ou me conter – as estrelas.

As flores ao lado, as estrelas em nossa cabeça, o clima frio... Para mim aquilo tudo era muito romântico, e Sam estava ali ao meu lado agora, e pelo que meu costa, eu e ele tínhamos trocado sorrisos demais, olhares demais no último mês. O que eu queria? O que eu estava esperando? Eu nunca tinha parado para pensar nisso. As vezes, eu só queria que a solidão parasse de doer tanto. Meu problema era esse – eu acreditava que alguém iria me entender, e depositava tanta fé e esperança e energia, que depois eu me via perdida, vivendo um relacionamento só na minha cabeça. Eu não conhecia Sam. Eu não sabia nada sobre ele.

–-

SAM

Podemos desejar e querer amor, podemos querer felicidade, mas a verdade é que não podemos dar aquilo que nós não temos. E eu não tinha nada para dar a ela. Nada além da minha dor e da minha culpa, e de uma maldição que só trazia morte desde que eu tinha nascido. Enquanto estávamos ali parados no escuro, nos olhando, um olhar dizendo tanta coisa. Era ridículo. Eu e ela não nos conhecíamos.

Eu procurava nela alguém como eu. Eu via que ela era tão solitária quanto eu era. E eu não podia me conformar com a solidão, nenhum ser humano se conformava. Eu queria alguém que entendesse. Alguém com quem eu pudesse dividir o fardo. Mas não era justo com ela. Ela tinha uma profissão e uma carreira, poderia ter uma vida feliz e normal. A partir do momento que eu deixasse ela entrar na minha vida, ela perderia tudo isso e acabaria morta. O que eu mais tinha que fazer é ficar distante dela. Eu não podia dar a ela o que eu queria que ela me desse. A vida normal, a felicidade. Uma profissão. Amor, talvez.

Eu não vim aqui para recomeçar uma vida, eu vim aqui para sumir. A mancha nunca vai sair da minha alma. Eu nunca serei puro e limpo novamente.


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Notas finais do capítulo

Se alguém ta lendo, por favor, deixe um comentário. Espero que estejam gostando! Meu objetivo é de fato escrever um romance/drama. Foge também um pouco do que eu costumo escrever.