A Garota do Cabelo Lavanda escrita por Chibieska


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Agradeço a todos por estarem acompanhando a fic e dando apoio. Sugestões de tema para os capítulos são sempre bem-vindos.

Tema: Ciúmes



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/493668/chapter/3

QUEM ELA MAIS ADMIRA

“Então, você gosta da Miyako?” Daisuke perguntou em misto de inocência e provocação. E lá se fora outro almoço arruinado, Ichijouji Ken engasgou com o suco que bebia, sentiu o liquido parar na garganta e voltar, mas sem passagem pela boca, acabou saindo pelo nariz. Era uma sensação horrível, mas não tão horrível quanto ser indagado por esse tipo de pergunta.

“Que tipo de pergunta é essa, Motomiya-san?” A voz saiu engraçada, enquanto tentava regularizar a respiração e se limpar.

“Ué, se você não gosta da Hikari, só pode gostar dela.” Conclui genialmente.

Takaishi e Ichijouji trocaram olhares. Realmente era difícil entender o que se passava na cabeça do ruivo. No dia anterior estava morrendo de ciúmes dos olhares que Ken lançava para a Yagami e agora tentava empurrá-lo para Inoue. Será que uni-lo com a garota de óculos era uma estratégia para ter certeza que ele ficaria fora do caminho da Hikari. Mas se era assim, então por que não arranjá-la para Takeru, que com certeza, era um obstáculo muito maior.

“Você só conversa com elas duas, então só pode ser uma delas.” Explicou Daisuke ao ver a cara de incompreensão dos amigos. Como eles não podiam entender uma situação tão simples?

“Quer dizer que ele só pode gostar de uma garota com quem conversa?” Questionou Takeru, sem ver lógica nenhuma nessa linha de pensamento.

“Então, você tem um amor platônico? Por quem?” Os olhos do adolescente brilharam de curiosidade.

“Eu não gosto de ninguém.” Afirmou Ken, tentando por fim a conversa. Por que de repente, Daisuke decidira entrar nesses papos estranhos e querer lhe arranjar uma namorada. E por que a sua resposta não soara tão sincera quanto deveria?

“Mesmo?” Motomiya parecia bastante desconfiado da resposta. “Bem, desde que você não se apaixone pela Hikari...”

=8=

Sexta-feira era o dia da semana que os digiescolhidos se encontravam, Daisuke, Takeru e Miyako não tinham atividades em seus clubes (futebol, basquete e informática, respectivamente) e Hida Iori saia do colégio mais cedo. Assim, o grupo sempre se encontrava em uma cafeteria próxima a estação para colocarem o assunto em dia e programar algum evento para o final de semana.

Talvez pela conversa que tivera mais cedo com Daisuke, Ken não conseguia se sentir muito confortável na companhia das garotas. Olhar para Hikari seria o mesmo que receber um olhar de fuzilamento do amigo. Mas desviar para Inoue, significaria perceber um risinho condescendente estampado na cara de Motomiya. Assim, ele tentava estabelecer comunicação apenas com Takeru e Iori, mas não estava se saindo muito bem nisso. Parecia que quanto mais evitava cruzar seus olhar com os das meninas, mais necessidade sentia de vê-las.

“Você está bem?” Miyako perguntou e Ken só percebeu que era com ele quando ela o cutucou no ombro com o dedo.

“Ah, sim. Estou ótimo.” Sorriu amarelo.

Miyako torceu os lábios e arqueou as sobrancelhas, estava na cara que o jovem estava mentindo. Ichijouji não era do tipo de ficar perdido em pensamentos, mas se ele não queria entrar no assunto, ela achava melhor deixar passar.

“Bem, como eu ia dizendo...” Ela se ajeitou na cadeira e prosseguiu, agora que tinha a atenção do adolescente. “Koushiro-kun está indo muito bem na faculdade. Ele vai apresentar um importante trabalho em breve e se tudo der certo, ele poderá estudar na Europa. Não é fantástico?” Contou empolgada. Os olhos da garota brilhavam e ela gesticulava muito, hábito que tinha quando realmente estava animada com algo.

Ken concordou com um aceno de cabeça. Ficava feliz por Izumi, mas algo dentro dele não estava completamente feliz. Talvez fosse o excesso de empolgação da garota ou a maneira como ela se referia ao senpai.

“Ele está estudando algoritmos de Dijkstra[1], parece que encontrou uma solução mais eficiente para resolver o nó de...” Mas Ken não estava prestando atenção. Embora fosse o único além de Miyako que poderia se interessar pelo assunto, sua mente estava bem distante dali.

Era engraçado como a garota ficava eufórica toda vez que via Izumi ou falava sobre ele. Ela o considerava um gênio da informática, um modelo a ser seguido, alguém para ser verdadeiramente admirado. Ela o achava bonito, inteligente e esperto. Além disso, o garoto era extremamente paciente para ensinar-lhe coisas novas e dividir seus conhecimentos com a jovem. Eles tinham a mesma paixão por informática, gostavam dos mesmos livros e dos mesmos filmes e no final, ambos funcionaram como o cérebro do grupo entre os digiescolhidos. Eles eram uma combinação perfeita, um casal adorável...

Ken sentiu-se incomodado ao pensar nesse tipo de coisa. Inoue era a amiga que sempre estava lá para dar uma mão, que sempre topava uma bagunça, que gostava de tagarelar aleatoriamente. Se ela tivesse um namorado, mesmo que fosse Izumi, ela teria que dividir seu tempo entre eles e o rapaz e com certeza, não teria tanto tempo livre para ficar parolando sobre algoritmos de Dijkstra.

Além disso, toda essa admiração fanática que a adolescente de óculos mantinha pelo guardião da sabedoria, ela também já nutrira por ele. Mesmo preso em sua própria ambição quando encarnou o Kaizer, o garoto sabia que a menina mantinha uma admiração velada por ele. Ainda se lembrava da cara de boba-alegre que ela fizera enquanto seu time disputava uma partida contra o time de Daisuke. Lembrava-se dos gritos dela na arquibancada, torcendo pelo time rival só porque ele era um dos titulares. Era engraçado como todo o respeito e admiração evaporaram quando Inoue descobriu que ele era o Kaiser. E era triste constatar que aqueles sentimentos nunca voltaram.

Eram amigos agora, e ele era mais próximo dela do que jamais fora de qualquer garota. Era ela quem o tirava da fossa, o fazia cair na real, que o motivava e sempre o lembrava de que o passado era passado e o que importava era quem ele era agora. Ela sempre aparecia com comidinhas diferentes, roubadas do estabelecimento da família e sempre programava algo para fazerem juntos, mesmo que fosse um simples passeio no parque com seus Digimon. Daisuke não fora o primeiro a insinuar que a proximidade entre eles significasse mais do que amizade, mas Miyako não se importava com esses rumores, e ele julgou que não deveria se importar também. Mas ele reconhecia como era ótimo tê-la sempre por perto, tão amigável e solícita. Mas talvez ele desejasse mais, desejasse que ela falasse dele com aquela mesma empolgação, que o admirasse, que gostasse dele como gostara antes.

“Ken-kun?” Miyako agitou as mãos diante do adolescente, até que finalmente ele piscou e pareceu realmente vê-la e não olhar através dela como fizera até então. “Você está meio estranho hoje, aconteceu alguma coisa?”

Ichijouji correu os olhos pela mesa e viu o olhar preocupação estampado nos rostos dos amigos. Pela expressão, ele deveria realmente estar agindo estranho e se perguntou quanto tempo ficara fora do ar, mergulhado em pensamentos. Sorriu sem graça e pegou sua mochila.

“Eu estou bem, só estou um pouco cansado. É melhor eu ir.” Levantou-se e fez uma rápida mesura, mas antes que pudesse sair, Miyako se levantou também.

“É melhor eu ir com você, seu rosto está muito pálido.”

“Não, está tudo bem. Não precisa se incomodar.” Ken não tinha certeza do porque, mas sua voz gaguejou e ele sentiu todo o sangue subir para o rosto. Definitivamente, estar com Miyako agora não seria uma ideia muito boa.

“Tudo bem, Miyako-chan, eu o acompanho.” Takeru estava de pé, jogando a mochila sobre os ombros.

“Mas...”

“Está tudo bem, eu já estava de saída também.” O loiro sorriu e caminhou na direção de Ken. O adolescente de cabelos negros pareceu não entender, mas intimamente deu graças a Deus e acompanhou o caçula da família Ishida.

Takeru acompanhou Ken até a estação, o garoto era o que morava mais longe do colégio e precisava pegar o metrô diariamente para vir à escola. Como Miyako havia reparado, ele realmente estava muito pálido e mantinha uma expressão bastante sombria no rosto.

“Você está bem?” Perguntou quando chegaram à plataforma B.

“Sim.” Respondeu não muito animado.

“Aconteceu alguma coisa? Você estava bem e então começou a ficar estranho do nada.”

Ken desviou o olhar dos penetrantes olhos azuis e encarou o movimento na plataforma. Não havia muitas pessoas esse horário, a maioria eram idosos que voltavam das compras ou estudantes saídos do colégio. Sentiu que suas mãos estavam geladas e suadas e seu coração ora batia acelerado ora parecia quase parar. Ele não entendia porque desse desejo repentino de Miyako voltar a idolatrá-lo. Ele não gostava dela romanticamente, então não havia motivos para querer que ela gostasse dele desse jeito. Por mais inteligente e superdotado que fosse aqueles pensamentos não faziam nenhum sentido para ele.

“Não é nada, eu estou bem.” Sorriu amarelo.

Takeru não pareceu convencido, mas não o forçou a falar. Os dois garotos permaneceram em silêncio, esperando o próximo metrô. Eram apenas cinco minutos, mas parecera durar uma eternidade para o garoto moreno. Milhões de pensamentos e imagens cruzavam sua mente e o deixavam ainda mais incomodado. Era apenas a Miyako de sempre, com sua admiração doentia de sempre. Não era a primeira vez que ele a ouvira falar de Izumi e infelizmente não seria a última, então por que dessa vez o incomodara? Por que ele tinha que ser só um pirralho do primeiro ano, enquanto Koushiro já estava na faculdade? Por que Inoue não podia simplesmente voltar a gostar dele? Por que fazia tanta questão que ela gostasse dele?

Finalmente, ele pôde avistar o metrô se aproximando da estação, balançando ruidosamente sobre os trilhos. Despediu-se de Takeru com um aceno de cabeça e caminhou em direção à linha amarela de segurança. Esperou o vagão parar, as portas se abrirem e os passageiros descerem. Então entrou no vagão e ficou parado diante da porta. Seus olhos cruzaram com o Takeru.

“Daisuke. Talvez ele esteja certo.” Disse alto o suficiente para que o amigo pudesse ouvi-lo.

“Certo sobre o quê?” Perguntou o loiro sem entender. Mas as portas do vagão se fecharam e o trem começou a partir, em poucos segundos o veículo ganhou velocidade e deixou a estação.

Takeru ainda estava parado no mesmo local, tentando entender o que as palavras de Ichijouji significavam. Enquanto isso, dentro do vagão, o jovem dos cabelos negros havia se sentado. Em seu peito, o coração martelava ruidosamente. Se ele tivera coragem de proferir aquelas palavras era porque realmente Daisuke deveria estar certo. Mas se era assim, por que ele nunca percebera o que sentia?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

[1] Desenvolvido pelo cientista da computação Edsger Dijkstra, é um algoritmo de busca que soluciona o problema do caminho mais curto dentro de um conjunto dirigido em tempo computacional.

N/T: Reviews são sempre bem-vindos e incentivam o autor.