– Você... não pode fazer isso, Catnip... – ele disse, se sentando no sofá e massageando as têmporas. – Os exames...

– Gale, me escuta. Esses exames não provam nada. Eu... Cansei disso aqui. Cansei dessa cidade, desse ar, dessas pessoas, desse marasmo! Eu cansei dessa rotina entediante! Eu não nasci para isso. Eu nasci para o mundo, nós nascemos para o mundo! Vem comigo! – eu exclamei, animada. – Vamos entrar no carro e sair daqui!

– Meu amor... – murmurou, com a voz doce. – Você precisa de descanso e sossego. Eu... Nós podemos viver juntos, na nossa casa.

– Gale, por favor. Nós podemos. Eu posso. Por um minuto, eu só queria sentir a adrenalina pulsando nas minhas veias, o meu coração disparado. Isso é pedir demais? – Cruzei os braços e fiz bico.

– Katniss Everdeen! Chega! Não podemos! – meu noivo gritou. Gale me olhou. Seus olhos demonstravam raiva, coisa que ele nunca sentiu por mim. – Você não pode! Sua saúde é frágil, você é frágil.

– Você não quer, não é? Quer que eu desfrute o resto da minha vida aqui, nessa cidade sem-graça. Então tudo bem. Se não vai comigo, eu vou sozinha.

Me levantei da poltrona e fui até o nosso quarto, peguei a minha mala em baixo da cama e abri minha gaveta, pegando todo o dinheiro que eu guardara durante aqueles nove anos que namoramos e minhas roupas. Quando Gale chegou até a porta, eu estava esvaziando a gaveta.

– Kat... Você não precisa fazer isso.

– Eu quero fazer isso. – eu disse, sem olhar para ele.

– Não, você não quer.

Eu não respondi. Peguei a mochila pequena dentro do armário e fui até o banheiro, para encher com os meus cremes e shampoos e minha maquiagem. Sua mão quente segurou meu braço, me fazendo parar. Olhei para ele.

Seus olhos já mostravam o que ele queria dizer. “Não me deixe Catnip, me desculpe”. Meus olhos marejaram e puxei meu braço com força.

Terminei de arrumar minhas coisas e coloquei tudo na sala. Dei uma última olhada em toda a mobília, tendo a súbita certeza que aquilo foi a melhor coisa que eu fiz nos vinte e oito anos da minha vida.

Chamei o elevador e esperei. Ele chegou até mim, segurou meus braços e me beijou. Eu não correspondi. Percebi que não o amava do jeito que eu pensava. Eu tinha só... Me acostumado com ele e com nossa vida.

– Você vai mesmo? – a voz dele soou baixa, quase como um sussurro.

Fiquei em silêncio para ganhar tempo. Foi o suficiente para o elevador chegar ao décimo terceiro andar e a musiquinha tocar nos meus ouvidos.

Coloquei meus poucos pertences no elevador, e só então percebi que tinha esquecido a chave do carro. Ele apenas me estendeu a mão, com a chave.

– Obrigada, Gale.– murmurei.

Esperei a porta fechar, e deixei as lágrimas que eu estava segurando rolarem. Mesmo assim, eu me senti ingrata por não ficar tão demolida quanto deveria. Estávamos namorando por nove anos, e decidimos morar juntos fazia cinco. Com certeza era para eu estar muito arrasada, e eu só derramei algumas lágrimas.

Cheguei até a garagem e destravei meu carro, colocando todas as minhas coisas no porta-malas. Entrei na Mercedes e sequei minhas lágrimas. Não sabia para onde eu iria, por onde eu iria começar, mas decidi que dormiria aquela noite em um hotel, trabalharia mais um pouco no restaurante e depois iria viajar.

Eu dirigia decidida. Alguns minutos depois, eu cheguei até o hotel. Fiz o chek-in e fui até meu devido quarto. Só depois de tomar um banho e ligar a televisão eu percebi que já tinha escurecido.

Teria um dia muito longo depois que amanhecesse.