Tomorrow 7 escrita por Small Boat


Capítulo 10
O capítulo final - parte 2


Notas iniciais do capítulo

Obrigada a todas que permaneceram até aqui, a todas que acompanharam a história na vida real. De pouquinho todas as personagens dessa narrativa se distanciaram ainda mais dessa realidade paralela, mas vou lembrar de tudo com carinho, porque crescemos para sermos ainda melhor. E fico feliz de crescermos juntas! ♥



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2h antes

A polícia havia chegado e estava recolhendo informações com as pessoas ali presentes. Já havia contado duas ou três vezes a minha versão da história e Thaís, não se recordava de nada.

Os machucados em seu corpo haviam parado de sangrar, mas suas mãos ainda estavam trêmulas e seus olhos demonstraram a confusão que se passava em sua cabeça por não recordar nada antes daquele momento.

— Thai, tem certeza que você não lembra de absolutamente nada?

Ela negou com a cabeça.

— Eu saí do salão antes das meninas, porque havia chegado mais cedo... tinha que buscar meus filhos... mas, eu não sei se eu os busquei. Lembro de ter entrado no carro, mas... será que eles estão bem, Kat? - perguntou um pouco desesperada.

— Vou ligar para Peter, talvez ele saiba. Ele estava em casa certo?

— Sim… Quer dizer, ele estava numa reunião, mas acho que ia buscar as crianças… ele ia aprontar tudo para vir com eles… - ela chorava em meio às palavras, sofrendo demais por não conseguir se lembrar do paradeiro dos próprios filhos.

— Com licença, senhora, isto pertence a você? - um policial fardado se aproximou de nós duas se direcionando à Thais. Ele segurava um saco plástico que continha um relógio ensanguentado.

Estremeci ao me lembrar. Era dele. De Josh.

— N-não, eu não uso relógio… - respondeu Thais enxugando as lágrimas. - Kat? Está tudo bem?

— É dele… - disse de forma quase inaudível. 

Não foi preciso mais nada. Thais entendeu. 

— Joshua Copperman. - Thais levantou-se alterada sem se importar com a cabeça que latejava. - O relógio é de Joshua Copperman.

As vozes de Thaís e do policial ficaram distantes demais para eu compreender o que conversavam. Na minha mente só se repetiam as imagens de meu ex-marido, em nossa casa, usando aquele relógio. O relógio que eu dei no nosso aniversário de casamento. O relógio que eu o via usar todos os dias, no braço que me envolvia todas as noites.

Já fazia um tempo desde que havia visto ele pela última vez. E digamos que não tenha sido tão agradável. Foi um término conturbado, afinal, que término seria tranquilo quando se descobre que seu cônjuge é um psicopata assassino? 

Na mente das pessoas, é como se tudo virasse ao contrário quando você descobre algo assim, e da noite pro dia você começa a sentir repulsa e pavor daquela pessoa. De fato, cultivei esses sentimentos desde o momento que descobri todas as barbaridades que ele fazia e ainda faz. Mas, o amor que sentia por ele não pôde ir embora tão fácil. 

Ainda era difícil ver fotos dele, ouvir o nome dele. Principalmente, porque na maioria das vezes isto vinha dos noticiários que explanavam os horrores que ele cometia. Não é fácil parar de amar alguém, mesmo que essa pessoa seja um completo maluco.

Era um amor que doía e me causava culpa, mesmo sabendo que nada daquilo era minha culpa, ainda sim é difícil pensar como poderia ter sido enganada por tantos anos? Como pude ter sido casada com alguém tão horrível? Como pude ainda amar alguém tão desprezível?

Não compartilhava esses pensamentos com ninguém, muito menos com Thomas. Amava muito Thomas e estava feliz com ele, mas esse sentimento amargo que ainda possuo por Josh ainda me atinge como um soco no estômago.

No entanto, já fazia um tempo que eu não ouvia notícias dele. Não sabia ao certo se estava preso ou não, mas tentava não fazer questão de saber de nada, assim facilitaria para mim mesma.

— Kat. - a mão de Thais me despertou do devaneio.

— E-eu… - sussurrei na tentativa de organizar os pensamentos.

— Eu sinto muito, amiga. - me puxou para sentar ao lado dela. O policial já havia voltado para o grupo forense que recolhia mais provas no local.

— Você não tem que sentir muito, Thai. Você estava presa. E mais uma vez foi culpa… dele. - falei sentindo a boca amargar e as lágrimas teimando em cair.

— Mas eu sei que você ainda sofre com isso. E imagino que não esperava que ele estivesse envolvido mais uma vez nessa história. Nem você, nem eu. - suspirou. - Eu só queria me lembrar…

— Você vai. E quando lembrar, faremos de tudo para colocar esse maluco na cadeia. - disse por fim. Estava decidida a acabar com ele.

Eu não queria me envolver com nada desde o início. Principalmente depois dele ter matado a própria amante. Mas agora não tinha escolha. Ele havia ameaçado a vida da minha melhor amiga, no meu evento de inauguração. Eu não iria deixar que ele fugisse dessa vez.

 

12h antes

Thais levantou às 8h. Era um pouco mais tarde do que costumava levantar para ir trabalhar e para levar as crianças à escola. Mas Peter havia saído para uma reunião de um novo projeto e disse que ela poderia dormir mais um pouco, pois ele levaria os filhos para a escola.

Ela e as meninas pretendiam doar alguns equipamentos para a ONG de Katarina como presente de inauguração e também a placa do local, que seria confeccionada por um conhecido delas. Por isso, Thais teria que sair mais cedo para garantir que tudo estivesse pronto para a entrega no local do evento.

Em menos de uma hora, ela tomou um banho gelado e se arrumou para ir no local onde Hugo a aguardava. 

O galpão era enorme como vários containers juntos, estilizado e decorado de forma rústica, porém muito simplista. No entanto, apesar de sua aparência, ali eram produzidos os produtos de carpintaria mais cobiçados pela elite da cidade.

— Thai! - gritou Hugo ao vê-la.

— Huguinho! - ela correu para abraçá-lo. - E então como estão as coisas?

— A placa está quase pronta! Falta só secar a última mão que demos na parte dourada. Está linda, não se preocupe, vamos entregá-la hoje a noite no evento como você pediu! - disse ela a levando para dentro do galpão em direção à placa.

De fato estava linda. Os detalhes dourados com o nome da ONG e o de Katarina logo abaixo dava uma aparência fina ao objeto enorme. Ela quis tocar, mas se conteve diante dos demais funcionários de seu amigo.

— Nossa nem sei como te agradecer, está realmente linda! - elogiou Thais. - Quero dizer, além do pagamento, é claro! - eles riram.

— Que nada, Thai, não vai precisar, eu vou fazer esse aqui de cortesia. - ela lhe olhou espantada. - Seu gesto em doar algo tão importante para sua amiga é muito nobre, e a ONG dela é mais ainda. - levantou as mãos - portanto, nem se preocupe com isso!

— Uau… Digo, obrigada, Hugo, de verdade se eu puder fazer qualquer coisa para te recompensar, por favor me fala! Eu e as meninas precisamos te pagar de alguma forma! - disse sem graça.

 

— Hm… Me paga um almoço então, pode ser? - disse dando uma piscadela para a amiga.

— Fechado, Huguinho, te mando uma mensagem ainda essa semana para marcarmos, ok? - Thais sorriu e em seguida se despediu de seu amigo explicando que deveria estar no salão em alguns minutos.

Após confirmar o horário de entrega da placa com seu amigo e entrar em seu carro, Thais foi direto para o salão. Sabia que teria que se arrumar mais cedo, pois o evento na escola das crianças iria terminar em poucas horas e teria que estar lá para buscá-las.

 

9h antes

— Thai! - Myka havia chegado. - Chegou cedo?

— Sim. - Thais sorriu quando Myka a deu um beijo na bochecha, sentando-se na cadeira ao lado dela. - Tenho que buscar as crianças ainda. Onde estão as outras? - disse enquanto Lisa puxava seu cabelo novamente para finalizar a escova.

— Vão chegar daqui a pouco, Mari e Bia vem juntas e Kat acho que chega em seguida. - ela puxou uma revista do cesto ao lado da poltrona que estava. - Ai, ainda não sei o que fazer no cabelo…

— Você nunca decide, né? - elas riram.

— Prontinho Thais, do jeitinho que você pediu! - disse Lisa desligando o secador e tirando-o da tomada.

— Uau, ficou linda, Thai! - disse Mykaella olhando a amiga mexer nos cabelos escovados.

— Obrigada Myka e obrigada Lisa! - Thais sorriu satisfeita com o resultado e abraçou Lisa. - Bem agora tenho que correr para a escola dos meninos! Tchau meninas!

Depois que finalizou o pagamento do serviço na recepção, Thais entrou em seu carro e ligou o GPS no destino desejado. 

— O que? Droga! - disse quando sentiu o carro puxar para a direita. - Eu pedi pra Peter trocar ontem, ugh! 

Ela decidiu então parar em um posto de gasolina próximo para trocar o pneu. Ao descer do carro viu o posto praticamente vazio e desistiu da sua ideia inicial de pedir ajuda a algum funcionário.

— Ótimo… - ela puxou o celular do bolso e ligou para Peter. - Peter! Graças a você não vou ter como buscar as crianças, estou com um pneu baixo e vou ter que trocar, é melhor que você vá assim que terminar aí! - como o marido não atendeu o telefone, ela deixou a mensagem no correio de voz dele e desligou a ligação bufando de raiva.

— Não se preocupe, eu posso lhe ajudar. - uma voz familiar surgiu atrás de si.

— Josh?! - gritou Thais espantada. - O que você está fazendo aqui, seu maluco? Vou ligar para a polícia! 

Antes que ela pudesse fazer qualquer movimento, Josh a agarrou pela cintura e a jogou dentro de seu carro que havia estacionado logo atrás do dela. Ela tentou gritar e se debater, mas aparentemente ninguém a ouviu. Como em plena luz do dia alguém consegue sequestrar outra pessoa e não ser vista?

O carro cheirava a ovo podre e… Sangue. 

 

— Me tira daqui! Socorro! - ela tentou abrir as portas e as janelas do carro, sem sucesso.

— Quietinha, Thai, vou te levar comigo, vai ficar tudo bem. - o sorriso maligno de Josh era visível através do retrovisor.

Então ele deu partida no carro.

Thais procurou novamente pelo telefone e só então percebeu que ele havia o pego quando a agarrou. Ela estava assustada e o coração acelerava mais a cada segundo.

— Por favor… Josh, o que você quer? - ela não queria chorar, não queria demonstrar fraqueza na frente daquele monstro.

— Só quero conversar, Thaisinha, não se preocupa! - ele balançava a cabeça no ritmo da música de Ed Sheeran que tocava no rádio. - Só fica quietinha que já vamos chegar!

Thais puxou o cadarço do tênis lentamente com o plano de atacá-lo. Enrolou as pontas, cada uma em uma mão e apertou com força até seus dedos ficarem vermelhos. Respirou uma vez, duas vezes. Apesar dos dedos apertados no cadarço, suas mãos ainda tremiam. Ela estava com medo do que ele poderia fazer consigo, mas com medo de tentar atacá-lo com o carro em movimento. Suspirou tentando deixar que seus pensamentos racionais de sobrevivência falassem mais altos, mas estava assustada demais para seguir qualquer linha de raciocínio, mesmo que este fosse para se salvar.

— Chegamos! - disse ele após mais dez minutos. 

Assim que parou o carro, Thais pensou: é agora. Respirou mais uma vez, e se deslocou para trás do banco do motorista enquanto Josh – estranhamento calmo – pegava uma bolsa preta no banco do carona. 

Assim que o homem alto retomou sua postura, Thais colocou os braços por cima da cabeça dele na tentativa de colocar o cadarço no pescoço do mesmo. Mas ela o viu sorrir.

— Você acha que sou tão burro a ponto de deixar você escapar, Thaisinha? - ela ouviu um click da arma sendo destravada e apontada para ela. Com uma mão ele segurava o cordão em frente ao seu pescoço, com força suficiente para não encostar em si, e com a outra ameaçava Thais. - Desça do carro devagar. - ele agora tinha a voz mais séria e nenhum sorriso no rosto horrendo.

Lentamente ela desenrolou as mãos do cordão fino e abriu a porta do seu lado esquerdo. Ainda estava de tarde e a luz do sol iluminava o cenário à sua frente, no entanto, mesmo conseguindo enxergar a paisagem, não fazia ideia de onde estava. 

Esteve distraída o caminho inteiro pensando em como fugir daquele lunático, que não prestou atenção aonde estava sendo levada. E agora era tarde demais.

Pensou em seus filhos e seu coração se comprimiu em seu peito. Eles estavam sozinhos, se tivesse sorte seu marido iria buscá-los em breve, mas ainda sim não sabia nem se sairia viva daquele lugar.

— Não queria ter que fazer isso, mas você tá ficando muito espertinha. - a voz a Josh a despertou de seus pensamentos. Ele desceu do carro com sua bolsa preta e, ainda apontando a arma para ela, ordenou que ela caminhasse. - Vamos, entre naquela casinha.

Estava mais para um barraco.

Estava coberto de mofo e plantas secas, deixando claro que era um local pouco visitado. As árvores ao redor se fechavam ao redor do casebre tornando a visão ainda mais macabra.

Ao entrar, a sensação não melhorou nem um pouco. O local tinha apenas dois cômodos separados por paredes de madeira. O cheiro forte de terra molhada e animais mortos inundava os sentidos de Thais. 

A suposta sala-cozinha em que entraram possuía apenas uma mesa de madeira igualmente velha, um balcão sujo de cozinha que possuía uma pia acoplada – provavelmente quebrada, e duas cadeiras sujas de um líquido escuro já seco.

— Vamos sente-se aqui. - ele apontou com a arma para a cadeira. Obedecendo ao comando do mais velho, Thais sentou-se enjoada pelo local e ainda tremendo pelo pavor da cena.

— Josh, não é preciso isso, por favor… - ela o viu tirar ferramentas e uma corda grossa da bolsa que pousou em cima da mesa. - Você quer conversar… - era difícil falar quando a voz não queria sair, mas tentou soar o mais convincente possível - vamos conversar então.

— Eu te dei uma chance, chefinha. Você não aproveitou, quis me atacar… Agora preciso garantir que você fique quieta até eu terminar. - ele não olhava para ela, apenas passava o olhar nas ferramentas que tirava lentamente da bolsa. Um olhar de prazer e ansiedade.

Ele a amarrou na cadeira com as cordas apertando bastante seus pulsos e tornozelos. Quando finalizou, soltou uma gargalhada.

— Nossa, como o tempo voa, não é? - ele balançou a cabeça. - Há alguns meses estava aqui com um cara que me devia dinheiro, e olhando para essa cadeira, parece que foi ontem! - ele ria - Ainda consigo lembrar dos gritos dele pedindo para deixar alguns dedos! Bizarro! - soltou mais uma gargalhada.

Essa informação fez Thais ter ainda mais certeza do que havia pensado ao fitar aquelas cadeiras. Sua visão estava turva e sua mente tomada pelo medo, não conseguia se mover, não conseguia respirar, nunca havia sentido tanto terror em toda sua vida.

— Bem, olha só, vou ser rápido porque ainda vou ter que buscar meu terno na lavanderia, e organizar tudo para o grande show… - disse ele arrumando as ferramentas em cima da mesa de maneira obsessivamente alinhada. - Eu preciso que você deponha ao meu favor e… me dê uma vaga novamente na sua empresa assim que tudo voltar ao normal! - sorriu novamente.

— Você está louco? Você fugiu da polícia duas vezes, você matou pessoas, você… você me sequestrou! Acha mesmo que vai sair impune disso tudo? - cuspiu as palavras com as últimas forças que ainda lhe restava.

— É só que você vai me ajudar a depor ao meu favor também e confirmar tudo aquilo de atestado de loucura ou algo assim… - coçou a cabeça tentando se recordar do termo correto, mas desistiu. - Você também vai contratar os melhores advogados para me ajudar! Que tal?

— Por que você acha que eu faria isso, seu merda? - ela ofegava, não mais de medo, mas de ódio. Como ele tinha coragem de lhe pedir algo assim?

— Por que… Eu sei onde você mora, onde seus filhos estudam, onde seu marido está neste exato momento e os projetos que ele possivelmente estará envolvido nos próximos meses. - ele puxou uma faca de tamanho considerável da arrumação que fizera na mesa podre. - E você sabe do que sou capaz… não é, Thaisinha? - falou próximo demais do rosto da mulher que tremeu quando a faca encostou em seu rosto.

— Não me chama assim, seu covarde! - disse em meio as lágrimas que desciam contra sua vontade. 

Depois de alguns segundos encarando cada detalhe do rosto de sua antiga chefe refletido na faca bem limpa, Josh se afastou dela e voltou a sorrir. Um sorriso insano e forçado, mas que no fundo refletia algo que o homem pensava com uma felicidade perturbadora, mas que Thais não conseguia entender o que era.

—- Antes de resolvermos isso, vamos fazer um outro acordo. - ele suspirou como se ainda não tivesse tudo bem planejado, e estivesse decidindo naquele momento o que iria fazer. - Você vai me ajudar no meu plano de hoje com os explosivos e tudo mais, e… - girou em seu próprio eixo como se estivesse animado para contar uma ótima notícia. - meu contatinho não vai matar sua família hoje! - aplaudiu o mais velho enquanto via Thais derramar mais lágrimas de horror.

—- O-o que… - murmurou.

—- É, então, essa parte eu tinha deixado de fora porque queria ver sua reação quando você encontrasse eles em casa com minha… pessoa - sorriu ele pensando no tal “contatinho” que, para Thais, era novidade. - Queria que fechássemos o acordo logo e tudo mais, mas pensei que mais duas mãos poderiam ser úteis para agilizar o plano, já que só faltam sete horas para o grande evento! 

E então ela entendeu. Explosivos. Grande evento. Ele planejava atacar o evento de inauguração da ONG de Katarina.

A cada nova informação seu coração se comprimia e o suor frio escorria de sua testa. Sua tontura agora já nem era mais tão perceptível, pois já estava começando a ficar com os membros dormentes. Já não sabia se era devido às cordas que a amarravam com força ou ao nervosismo.

— Então, vamos lá, eu vou te soltar se você prometer ser boazinha comigo hoje, pode ser? - ele girou a faca em sua mão.

— Eu… eu não vou te ajudar com esse plano maluco! Você está blefando! Não tem ninguém com minha família! - vociferou ela tentando realmente acreditar nas suas próprias palavras.

— É, nossa você é mais previsível do que aqueles filmes de terror clichês. Esperava um pouco mais de você, Thaisinha! - ele revirou os olhos e balançou a cabeça fingindo decepção. - Bem, tá aqui.

O homem tirou o celular do bolso e, alguns segundos depois, o estendeu para Thaís. A imagem que aparecia na pequena tela foi uma das piores coisas que ela já cogitou ver na vida.

Thiago, Claire e Peter desacordados em cima de uma cama que reconhecia ser a sua e a de seu marido. No vídeo, uma pessoa segurava uma arma apontada para sua família e se aproximava da cabeça de cada um deles, fazendo Thais tremer e se debater na cadeira.

— Não… Não… Meus filhos… Solte eles! - gritou enquanto chorava - Deixe eles em paz por favor! Eu te imploro!

— Ok, ser um clichê de filmes nem é tão ruim assim quando chega na parte do “eu imploro” - debochou o homem rindo da situação.

— Como eu nunca percebi o quão doente você é? - sua voz embargada saía com dificuldade.

— Você se surpreenderia se soubesse, Thaisinha. - ela não entendeu sobre o que ele se referia exatamente, afinal sua mente estava tomada pelo pavor. Agora não temia mais apenas por sua vida, mas pela de sua família. Neste momento tinha certeza que eles estavam em perigo e precisava fazer alguma coisa. Mas ainda não sabia o que. - E então? Já pensou sobre o assunto? Vai me ajudar, ou vai continuar esperneando?

Thais refletiu por longos segundos usando o pouco de raciocínio lógico que ainda lhe restava.

— Tudo bem. Eu vou com você. - disse por fim. Sabia que teria que fazer coisas da qual não se orgulharia, mas precisava fazer alguma coisa. Não conseguiria salvar a si mesma e à família amarrada como estava no meio do nada.

 

5h antes

Josh suspirou satisfeito ao descer do carro. Trajava um terno escuro e gravata vermelha, e com todo orgulho observava o local do evento de inauguração da ONG de sua ex-mulher como se fosse seu. Abriu a porta do carro e deixou que a melhor amiga de Katarina saísse do banco traseiro.

— Bem, chegamos! - ele a segurou pelo braço forte demais. 

Os olhos dela demoraram a se acostumar com a luz do sol da tarde. Não sabia quantas horas havia ficado presa naquele fim de mundo, mas tinha certeza que havia sido tempo suficiente para o sol quase se pôr.

Seu coração errou uma batida ao ver Thomas à distância, dando ordem aos seus funcionários que andavam de um lado para o outro organizando os adereços que enfeitariam o salão em alguns instantes. Seu colega, futuro marido da sua melhor amiga, estava a alguns metros de si, mas não podia se mover, não podia gritar…

O toque mais suave de Josh a fez despertar e respirar fundo. Tinha que seguir o plano dele até onde desse… Até onde desse para escapar. Não sabia ao certo qual seria este momento, mas tinha que encontrar algum. Haviam dezenas de pessoas naquele local, alguém iria ajudá-la.

— Meu amigo! - disse Josh ao avistar um dos funcionários de Thomas. 

— Raphael! Finalmente você chegou, os explosivos já estão todos na van. - o homem ruivo mais alto que Josh falou. - E então essa é a sua nova garota? - sorriu ao encarar Thaís.

— Quê? Não! Minha garota tá me ajudando em outra parte do processo! - Josh riu. - Nem se eu estivesse louco, essa vadia acabou com minha vida… - aproximou-se do rosto de Thaís. - Mas hoje ela vai me ajudar a recuperar minhas chances, não é? - disse quase sussurrando.

— Você é maluco mesmo. - disse o mais alto rindo da situação.

Os olhos de Thaís se enchiam de lágrimas a cada segundo, mas se recusava a entregar-se aos seus sentimentos agora. Não podia.

Pensou novamente na imagem de seus filhos desacordados na cama ao lado de Peter que se encontrava na mesma situação. Precisava fazer isso por eles.

 

4h15 antes

Thaís tremia com os dois explosivos, que Josh lhe dera, em mãos. Eles estavam no subsolo do local. Tatiano, o amigo de Josh, havia encontrado um acesso há alguns dias e já tinha tudo mapeado. 

Josh estava logo atrás dela com lanternas e mais três explosivos em uma bolsa preta, que também continha fitas adesivas, tesouras e facas. 

— Você vai colocar os dois explosivos nesta saída de ar aqui. - Josh apontou com a lanterna para um túnel de metal estreito que provavelmente só caberia o corpo dela ali. - Eu vou colocar nos canos de gás logo ali em frente. Nem tente fazer nenhuma gracinha, ou eu te mato bem aqui e ninguém vai achar seu corpo despedaçado - ameaçou.

— S-sim. - gaguejou ela. Agora seria sua chance. 

Josh lhe entregou um rolo de fita adesiva – e nenhuma tesoura – e apontou para a tubulação.

— Estarei te esperando. - disse por fim.

Thaís puxou a grade que tapava a tubulação de ar sem nenhuma dificuldade e, respirando fundo, adentrou no local estreito. Era um pouco difícil respirar ali dentro, mas já não sabia se era por causa da ansiedade, medo ou porque realmente aquele lugar tinha pouco oxigênio. Mas não desistiu, arrastou-se até que todo o seu corpo estivesse dentro do túnel e segurando o explosivo com cautela empurrou-se mais para dentro.

— E aí? - ouviu Josh falar do lado de fora.

— É… Está tudo bem, só não estou conseguindo cortar a fita. - mentiu.

— Nossa como você é burra… 

Ela não se importou com o comentário, apenas tentou avançar alguns metros mais à frente sem que Josh a ouvisse bater no metal ao redor de si. Avistou então uma passagem a direita e pensou que se conseguisse alcançá-la, ficaria mais difícil de Josh chegar até ela a tempo. Ainda mais se ela deixasse o explosivo preso no meio do caminho.

Mas como iria fazer isso sem que demorasse demais?

— Cadê ela? Precisamos ir, o pessoal da banda deixou os equipamentos de som por aqui e eles vão descer a qualquer momento. - ouviu o ruivo se aproximar. 

— Ela é tapada demais, sabia que não iria dar certo… - suspirou impaciente.

— Ah, cara, você e essa sua mania de esperar até o último segundo pra matar quem é preciso. Você devia ter acabado logo com essa puta lá na cabana!

— Eu queria que ela visse todo mundo ser morto por causa dela… - o coração de Thaís acelerou ao pensar na sua família novamente. Mas não parou de se mover. - Mas bem, vamos ter que dar nosso próprio jeito.

— Nosso nada, eu vou vazar, já fiz o que tinha que fazer! - Tatiano respondeu.

— Tatiano, volta aqui! Ei! 

Ouviu passos se distanciando e imaginou que Tatiano estava indo embora. 

— Filho da puta! - xingou Josh alto o suficiente para ela ouvi-lo quando chegou ao desvio da tubulação. - Thais! - gritou ele com a cabeça dentro do túnel.

Quando ele apontou a lanterna para ela e percebeu o quão distante ela já estava, seu sangue ferveu. 

— Ah, você não vai me enganar dessa vez, sua puta! - vociferou ele entrando no túnel rapidamente. 

Assim que Thaís percebeu que o homem estava vindo atrás dela, acelerou seus movimentos. Mesmo com medo da bomba em suas mãos, arrastou-se o mais rápido que podia para dar a curva. Seu plano era deixar o explosivo no meio do caminho, mas não dava tempo de prendê-lo, tinha que ir rápido.

O barulho de Josh vindo atrás dela era assustador. As botas pesadas batendo no metal, a respiração pesada de um psicopata correndo atrás de sua vítima e o ódio que emanava dele, fazia um combo perfeito para filme de terror.

Thaís sentia seus braços e cotovelos se machucando à medida em que passava pelos parafusos que uniam as partes do grande tubo de metal, mas mesmo assim não parou. Não podia permitir que sua família morresse e nem suas amigas.

Mas foi tarde demais quando o homem a segurou pelo tornozelo. Ela gritou e se debateu tentando se soltar da mão grande e calejada de Josh, mas ele era muito forte. Então com a outra perna chutou o rosto dele.

— Sua vadia! - ele agora gritava sem se importar com quem estivesse ouvindo. 

Thaís continuou se movendo pelo túnel o mais veloz que podia, enquanto escutava Josh se recuperar rápido demais e voltar a se movimentar. 

Ela avistou uma outra bifurcação à esquerda e outra à direita. Sabia que pelos seus cálculos a entrada da direita a levaria novamente para o local onde estava antes, já a da esquerda poderia levá-la a um outro ambiente, onde talvez tivessem pessoas. Mas talvez não.

Sem pensar muito, resolveu ir pela direita. Sabia que o caminho para chegar em algum lugar seria minimamente mais curto do que se fosse pela esquerda. 

Com os cotovelos sangrando continuou a se arrastar rapidamente até encontrar a grade de metal que tapava a outra saída de ar. Mas, mais uma vez ele a alcançou.

Thaís já estava com as mãos na grade fina quando ele a agarrou pelos pés novamente.

— Agora você não escapa! - gritou ele.

Se debatendo mais uma vez, ela pensou: o explosivo

Sabia que isso poderia matar os dois, mas também sabia que ao menos sua família teria chances de sobreviver.

Ainda tentando se defender do homem que a puxava cada vez mais para perto, Thaís puxou o gatilho da bomba e atirou contra Josh.

Nesse segundo, ele pareceu se assustar com o que veio em sua direção e tentou se afastar do explosivo. Mas foi em vão. A bomba estava de frente para ele.

Thaís aproveitou o momento para se impulsionar para fora, caindo de cara no chão úmido. Respirando com dificuldade levantou-se rapidamente com medo de ser atingida pelo fogo, quando a bomba explodisse. No entanto, não foi o que aconteceu.

Josh riu. Um riso nervoso, no começo, e depois um riso de alívio. Agora um riso de pura maldade.

Sem entender, Thaís deu alguns passos para trás olhando de um lado para o outro em busca de uma saída, mas o lugar era muito escuro para enxergar sem qualquer lanterna.

— Vaso ruim não quebra, Thaisinha! - Josh sorriu ao descer da tubulação de ar. Thaís podia ver um brilho abaixo do nariz dele que deduziu ser sangue devido ao chute que levou. 

Os dois ofegantes se olharam por um milésimo de segundo, até Thaís entender: corra.

Os pés, agora descalços, empurravam o chão gelado com força a cada passada que dava. Ainda sim o som das botas de Josh contra o piso a faziam tremer de medo – mas também a fazia correr cada vez mais rápido.

— Você não vai escapar de mim, Thaisinha! - a voz gutural de Josh ficava ainda mais cheia de ódio a cada frase que saía dele.

Thaís chegou ao fim do corredor esbarrando na parede fria do lugar, olhou para os lados em busca de uma saída, sem sucesso. Era o fim da linha.

Josh se aproximou a passos lentos agora que via que sua vítima não tinha mais saída. 

— Ah, Thaisinha. Você tá um trapo. - ele riu ao observar a mulher na pouca luz de sua lanterna. - Mas acabou pra você, querida. - puxou uma faca da sua bota.

O coração de Thaís estava prestes a sair pela boca. Precisava achar uma saída, mas não tinha. Não tinha uma porta, não tinha uma tubulação, não tinha uma escada. Absolutamente nada. Só ela e Josh.

Mesmo assim ela tentou lutar com tudo o que tinha.

Josh pulou para agarrá-la, enquanto ela tentava fugir pela sua esquerda. Enquanto ela, nos braços do mais forte, tentava arranhar seu rosto, ele preparou a faca para acertá-la na barriga, mas antes que conseguisse completar o golpe, Thaís mordeu seu rosto, o fazendo soltar a faca no chão.

Com a lanterna na outra mão, Josh a acertou na cabeça que se viu tonta pelo golpe, mas ainda sim tentando com todas as suas forças escapar dele.

Ele a empurrou contra o chão e ela girou para ficar de bruços em busca de forças para se levantar. Ao mesmo tempo, Josh a puxou pelas pernas e tentou subir no corpo da mulher que se debatia no chão.

Ele era muito pesado e forte para conseguir se desvencilhar dele. Tateou o chão ao seu redor procurando pela faca, mas não a alcançou. 

Antes que pudesse pensar em outra solução, sentiu algo a atingir na cabeça. Depois disso sua visão escureceu.

 

1h antes

Eu vi Thaís, então, ser levada pela ambulância, escoltada pela polícia, para realizar exames. Thomas, que estava sendo interrogado, havia retornado e agora me abraçava.

— Meu Deus, as pessoas estão começando a chegar… - pensei em voz alta.

— Não se preocupe, meu amor, os policiais estão aqui para ajudar a explicar a situação a quem for chegando. Já pedi também que meu assistente enviasse mensagens urgentes aos convidados, assim quem ainda estiver à caminho pode retornar. - ele também estava triste com tudo, parecia em choque.

Virei-me para ele para encarar seu rosto. Não era justo com ele também. Ele havia planejado tudo. Por meses esse foi seu maior projeto, ele estava tão empolgado…

— Thomas. - segurei o rosto dele. - Obrigada. - foi tudo que consegui dizer naquele momento, mas sabia que ele entendia que significava muito mais, porque naquele momento nossos lábios se encostaram em um beijo casto, que logo depois se tornou um abraço apertado. No fim, estava feliz por ter ele.

— Me deixa passar! - ouvi a voz de Bia há alguns metros de distância. – Ela tá ali, Katarina! - gritou ela acenando para mim atrás da fita amarela que agora rodeava o local.

— Bia, calma, fica aí, estou indo! - segurei Thomas pela mão e atravessamos por baixo da fita.

— Amiga, você tá bem? Disseram que houve uma vítima, eu… 

— Calma, amiga, comigo está tudo bem. Mas com Thaís…

— Thaís? Ela estava aqui? Eu liguei feito louca para ela! Meu Deus, o que aconteceu? - nesse momento Mariana e Bárbara desceram do carro de Fabian junto com seus respectivos maridos. 

As meninas se aproximaram rapidamente do grupo.

— Ela estava presa… Eu a achei presa em uma caixa atrás do palco, mas não sei o que aconteceu e ela também não se lembra. Só sabemos quem foi. - falei sentindo um peso no peito ao lembrar.

— Josh. - disse Thomas. Ele sabia que para mim ainda era difícil falar o nome dele.

As meninas exclamaram em surpresa. Algumas disseram que achavam que ele ainda estava preso, outras perguntaram sobre o paradeiro de Thaís, que naquele momento já se encontrava no hospital.

Alguns minutos mais tarde, resolvemos que, ir ao encontro de nossa amiga era a melhor opção no momento. 

— Espera aí, cadê Myka e Karyne? - perguntou Bárbara que acabava de desligar o telefone com a babá de seus filhos.

— Não faço ideia, mandei mensagem no grupo há duas horas e nenhuma das duas visualizou. - respondeu Mari.

Enquanto Bia e Matthew, que tinham muitos contatos no hospital, procuravam uma forma de encontrar Thaís, Bárbara, Mariana e eu tentávamos contato com as meninas.

Meu coração gelou ao pensar que elas também pudessem estar em perigo.

— Temos que ligar para a polícia! - disse Mari, pronta para discar, quando um policial apareceu correndo de um dos corredores da emergência.

— Espere! - gritou Mariana. – O senhor está vindo da sala de Thaís Gomes? 

— Sim, senhora. Digo, não era para eu informar nada… - ele sacudiu a cabeça. - Desculpe, preciso ir, é urgente.

— Não, espera, ela lembrou de algo? - Mari segurou o braço do policial e Bárbara a fuzilou com o olhar, fazendo a amiga soltar o braço do mesmo. - Desculpe.

— Sim, senhora. Mas não posso dar mais informações, se a senhora quiser saber mais terá que buscar com a própria. Pessoas correm perigo e eu preciso ir. - disse ele por fim.

Aquelas palavras me atingiram como um soco. Myka e Karyne. Elas corriam perigo e Thaís havia lembrado.

— Vamos! - disse Bia ao passar correndo pela mesma porta que o policial havia saído.

Não deu tempo de questionarmos, corremos todos atrás dela e de Matthew. A cada porta que passávamos naqueles corredores confusos e intermináveis, meu coração acelerava de ansiedade. Será que nossas amigas estavam bem?

— Aqui! - disse Matthew batendo na porta de número 1011 da ala amarela.

— Pode entrar. - disse uma voz embargada que imaginei ser a de Thaís. – Meninas! - falou ela chorando mais ainda do que aparentava estar anteriormente. - Eu estava torcendo para que vocês chegassem logo, eu preciso sair daqui, me ajudem!

— O quê? Calma! Nada disso você precisa de cuidados, os médicos disseram que você sofreu contusões e precisa de observação. - falou Bia.

— Não, eu preciso dos meus filhos! - Thaís gritou. - Preciso ir atrás deles! 

— Seus filhos?! O que…

— Aquela psicopata está com eles agora e sabe-se lá se ainda estão vivos. - seu choro se intensificou e em meio a soluços ela repetiu: - Aquela psicopata!

— Espera, Thai. De quem você tá falando? - Mari perguntou.

— Mykaella! 

Naquele segundo tudo começou a girar, os sons pareciam distantes, não sabia como reagir, não sabia nem se podia acreditar no que ela estava dizendo.

— Calma, explica isso direito, o que você quer dizer? - agora Mari falava sério.

— Ela… Ela está com meus filhos… e Peter e… Ela vai matar eles. Ela e Josh estão juntos. - Thaís suspirava na tentativa de puxar o ar para continuar falando, mas não conseguia. - Eles estão juntos! Por que vocês acham que ela não está aqui?

— Thai, você tem certeza disso? Não pode acusar nossa melhor amiga assim! - tentou Bia.



Dia 23, Sábado - Dia da Reunião

Andréa e eu fomos as últimas a deixar o hospital naquele dia. Ou ao menos foi isso que elas haviam pensado. Eu ainda fiquei nos arredores esperando o carro de Andréa dar partida para ter certeza que seríamos só eu e ela.

Subi novamente os andares do enorme hospital particular com a desculpa de que havia esquecido alguns pertences no quarto dela. E foi fácil, como sempre.

O quarto já estava escuro quando abri uma fresta da porta. Ela já estava dormindo, mas precisava seguir com meu plano.

— Querida… - disse eu acordando-a com carinhos na cabeça.

— Myka? - ela abriu os olhos assustada. - O que ainda faz aqui? 

— Vim cobrar minha última parte do acordo, minha querida. - ainda com a voz suave e fazendo carinho em seus cabelos, tentei me esforçar para não deixar meu ódio vazar pelas minhas palavras.

— M-mas, eu já fiz o que você pediu, você disse que me deixaria em paz… - gaguejou ela.

— Kaká… Você sabe muito bem que seu professorzinho é o melhor, não é? 

— Por favor, deixe a gente em paz! 

— Ah, você vai mesmo querer pagar de inocente, amiga? - Me afastei dela e comecei a caminhar pelo quarto. - Roberto ainda me deve um favor. Eu emprestei grana para ele comprar mais materiais, e… Preciso que ele me retribua agora.

Percebi que a burra da Karyne estava tentando alcançar o botão que acionaria as enfermeiras da emergência. Mas deixei ela acreditar que eu não estava vendo. Seria mais divertido.

Puxei então uma faca pequena do cós de minha calça e a segurei próxima à luz do abajur para que ela pudesse ver com clareza.

Yasmin dormia próximo dela em um berço do hospital, enrolada em algumas mantas cor de rosa.

— Não… Por favor, eu faço qualquer coisa! - Karyne tentou se sentar com dificuldade. - Eu falo com ele! Eu prometo!

— Ótimo. - sorri satisfeita, mas não tanto, queria fazê-la implorar mais.

No entanto, não tinha tempo. Tinha que voltar para casa para Aníbal não suspeitar de nada. 

No caminho para casa discou o número para o qual ligava quase todos os dias. Na tela do painel do carro aparecia o nome: Josh.

— Oi meu amor, tudo resolvido! - falei ao ouvir que ele atendeu.

— Ótimo, amor! - ela conseguia ouvir alguns gemidos de dor ao fundo.

— Ainda está com aquele cara?

— Estou sim! Hahaha, ele me diverte muito! - disse Josh.

Revirei os olhos quando ouvi um grito vindo do homem. Ele era o gerente do financeiro da imobiliária que estávamos roubando, e simplesmente resolveu não colaborar mais conosco. E bem, era o que tinha que ser feito. Mas Josh sempre se empolgava demais. Sempre sujava as mãos, quando seria muito mais fácil mandar um capanga para acabar com tudo.

Homens e seus prazeres esquisitos.

— Olha estou chegando em casa, depois você me atualiza do plano. Amanhã volto ao hospital para saber se aquela puta falou com Roberto. Adeus! - disse por fim, impaciente, sem nem esperar que ele desligasse.



Dia 24, Domingo

Aníbal iria a casa dos pais com as crianças a tarde e seria o momento perfeito. As meninas não haviam combinado nada, então eu estaria livre para resolver todos os detalhes do plano antes que meu marido retornasse. 

Já havia trabalhado com Josh antes. Nos conhecemos na empresa que eu Thaís éramos donas. A realidade é que eu não estava satisfeita com o que eu tinha. Havia conseguido tudo fácil demais e chegado ao topo ainda muito jovem. Eu precisava de algo que me desse adrenalina. 

Sempre manipulei tudo e todos ao meu redor para conseguir o que eu queria, e vê-los se ferrar depois era a cereja do bolo! Mas em relação a empresa não era assim, eu e Thaís tínhamos essa ideia desde o fim do Ensino Médio. Nossos pais investiram em nós desde muito cedo, então tudo foi fácil. Até eu conhecer Josh.

Josh começou a trabalhar para nós no segundo ano da empresa. Ele conheceu tudo quando o escritório ainda era pequeno, e acompanhou tudo até se tornar um enorme e imponente prédio no centro da cidade. Até o fatídico dia que ele resolveu estragar tudo.

Eu demorei a perceber que ele era igual a mim. E ainda mais para perceber que ele havia se aproximado de Katarina com segundas intenções. Para mim ele era apenas um investidor em busca de novos projetos para colocar sua grana gorda. 

Mas me surpreendi no dia que ele entrou em minha sala falando sobre ela. Eu sabia que ele não a amava. Eu sou tanto um personagem quanto ele. 

Suas palavras vazias ecoavam no escritório que só tinham as paredes ocas de nós dois. Então me arrisquei. 

— Pode parar. Sei que você não a ama. - falei cruzando as pernas em minha cadeira.

— O-oque? - gaguejou ele, surpreso.

— Olha sinceramente não me importo. - sorri. - Só quero saber quais são seus planos.

Ele parou alguns segundos. Mudou completamente a expressão. Agora eu o via. Frio e calculista assim como eu.

— Não precisa fingir na minha frente, Josh. Você e eu somos iguais. - me curvei para frente apoiando os cotovelos na mesa. - No entanto, preciso saber o que você quer trabalhando aqui. Se for conseguir meu lugar pode ir esquecendo, eu posso ser tão louca quanto você.

Os olhos dele então brilharam. Lentamente, ele levantou-se da cadeira em minha frente e foi até a minha, apoiando-se na mesa.

— Meu plano. - sussurrou ele. - Vai ter que trabalhar duro para tirar ele de mim. - sorriu ladino.

— Eu gosto de desafios. - me pus de pé próximo demais do rosto dele.

Passamos alguns segundos compartilhando da excitação e das faíscas que nossos olhos produziam ao ouvir o tom de ameaça e de desafio do outro. Era isso que eu queria.

Só então ele me puxou pela cintura me beijando violentamente, mordendo meus lábios e arranhando minha cintura por baixo da camisa.

E assim, passaram-se meses e anos. Depois de um tempo, ele me revelou seu plano sobre a construtora e eu o ajudei. Desde o comecinho, o mais excitante de tudo aquilo: as ameaças, as chantagens, a manipulação. Ele era como eu e eu era como ele.

Quando ele foi pego a primeira vez, eu tentei o máximo que pude desviar a atenção do problema e me afastar o máximo de qualquer prova que me ligasse a ele. Afinal, se ele fosse preso e me descobrissem também, nosso plano acabaria. 

No entanto, ele resolveu ir por outro caminho e fingir loucura. O tiroteio no shopping e tudo que se seguiu foi fruto daquela cabeça impulsiva. Eu não havia concordado com nada.

De toda forma, aceitei trabalhar com ele novamente. Sabia que dessa vez envolveria minhas amigas. Elas morreriam amanhã junto com seus cônjuges e dezenas de outras pessoas. 

Mas era hora de virar a página. Elas eram um empecilho. Ter que ficar indo encontrar com elas e sustentar um personagem desde a escola era exaustivo. Então juntaríamos o útil ao agradável: ele se livraria de Katarina e Thaís, e eu me livraria de todas elas!

E assim como planejado, eu estava dirigindo em direção a cabana. Mais cedo havia me encontrado com Roberto em seu laboratório e ele havia me dado todas as informações do fornecedor dele. O que não era o combinado.

Roberto trabalhava em um laboratório de pesquisa de química, seu foco era em substâncias explosivas. Mas ele também mantinha um negócio à parte no qual consistia em fornecer explosivos caseiros – e discretos – para traficantes. 

Com isso, Roberto mantinha muitos contatos no mundo do crime. Inclusive vendedores de armas. Foi assim que conseguimos as nossas por um precinho ótimo!

Mas é claro que alguém sempre tem que querer atrapalhar. Karyne.

Ela não queria que Roberto vendesse para mim e para Josh, por medo. De que? Ninguém sabe. Sinceramente, não entendo a mente pequena daquela garota. Mas para a minha sorte, eu tinha o ingrediente certo para uma chantagem deliciosa.

O pai de Yasmin não era Roberto. Essa é uma história para depois, mas o importante é que foi a peça perfeita para tê-la em minhas mãos.

Mas agora, o canalha do Roberto não queria mais colaborar e achou que um contatinho poderia resolver o problema.

A manhã já estava se transformando em tarde quando cheguei à cabana apenas para ser surpreendida – mais uma vez – pelos gritos daquele homem novamente.

— Chegou, meu amor! - disse Josh que abriu a porta para mim. Na mão esquerda ele possuía um pano velho sujo de sangue que usara para abrir a maçaneta e na direita um alicate também sujo de sangue, que eu supus estar usando para cortar os dedos de sua nova vítima.

— Socorro! Socorro! Senhora me ajude por favor! - suplicou o homem amarrado na cadeira. 

Revirei os olhos. Honestamente, não tinha paciência e nem tempo para aquilo. Mas resolvi me divertir só mais um pouquinho.

— Se esqueceu de mim tão rápido… Como é seu nome mesmo? - tirei meus óculos escuros e nossos olhares se encontraram, só então percebi que ele havia me reconhecido.

— Mykaella. - o homem tremia e gaguejava. Era lindo.

— Isso mesmo, seu imprestável. - me aproximei dele pisando em seu pé descalço que parecia ter sido queimado. - Sentiu minha falta? - sorri quando o vi se encolher de dor ao meu toque.

— É cara, te falei, ela é incrível! - falou Josh, limpando as mãos no pano. - E aí amor? Conseguiu?

— Foi isso que vim te falar, aquele idiota do Roberto resolveu cair fora da jogada. Eu tô puta! 

— Imaginei… - disse ele puxando o celular do bolso da calça.

— Como assim imaginou?! Você está maluco?! 

— Myka, pensa bem, o cara acabou de ter uma filha, ele viu a merda que deu depois de ter vendido as armas para a gente…

— Merda por sua culpa! Te falei que era melhor a gente pensar antes de agir! 

— Agora isso não importa mais, ok? O que importa é que meu amigo de longa data, Tatiano tá pela cidade e eu já entrei em contato com ele. - sorriu convencido.

— E o que vamos fazer com eles? - indaguei me referindo a Karyne e Roberto.

— Vamos pegar eles assim que o plano acabar, não se preocupe, eles não vão abrir a boca, estão com medo demais da gente. - Josh se aproximou de mim sorrindo e colocando as mãos no meu rosto. – Não fica emburrada assim, tá bem? Vai dar tudo certo. - beijou meus lábios.

— Tudo bem, vê se não faz burrada dessa vez! - disse por fim dando-lhe mais um beijo ignorando totalmente os gemidos doloridos do homem. - Bem, lembra que amanhã eu vou ter que passar a maior parte do tempo com as meninas, né? 

— Lembro sim, meu amor. Já planejei tudo para pegar Thaís assim que ela sair do salão. Não esqueça de mandar mensagem quando ela estiver saindo. Meu amigo vai seguir a família dela até em casa para ter certeza de que todos estarão lá antes de tudo.

— Combinado. Bem agora termina logo isso, assim quem sabe não podemos fazer uma rapidinha antes de ir pra casa, hein? O que acha? - coloquei meus braços ao redor do pescoço dele.

— Vou acabar com ele agora e já te encontro no meu apartamento. - deu uma piscadela e um último beijo antes de eu sair da cabana.



2h depois

Thaís nos contou tudo o que havia lembrado. O vídeo no celular com seus filhos e seu marido desacordado, a pessoa com a arma apontada, a tatuagem na mão que a fez ter certeza que era Mykaella, seu sequestro, sua fuga, tudo.

Ainda se lembrava pouco de como havia parado naquela caixa, provavelmente já estava desacordada no momento em que foi posta lá. Mas todas as informações giravam na minha cabeça como um redemoinho.

— Não pode ser, amiga… Ela pode ser meio doida, mas dopar seus filhos? - disse Bárbara que estava sentada na ponta da cama.

— Sim. E eu suspeito que ela pode ser a tal garota de quem ele falava para Tatiano. - respondeu séria. 

— Meu Deus… 

Eu ainda não conseguia expressar nenhuma palavra. Embora já esperasse essa atitude de Josh, não esperava de Mykaella. Minha melhor amiga com meu ex-marido… Por anos. Aquilo era informação demais para mim. 

— Bem, agora precisamos confiar na polícia e acreditar que eles vão pegá-la… Ela ainda deve estar lá, certo? - sugeriu Mari.

— Não sei… Não sei por quanto tempo fiquei desacordada, digo, ele pode ter ligado para ela e eles podem ter fugido. - respondeu Thaís.

Algumas horas depois de considerarmos todos os cenários, e sem nenhuma notícia da família de Thaís, ela foi liberada pelo hospital. Pensamos então em levá-la para a minha casa até que ela pudesse voltar para a dela.

— Esperem. - disse Mariana antes de entrarmos nos carros. - E Karyne? Vocês acham que eles podem ter feito algo com ela? 

— Eu espero que não… Sinceramente não consigo pensar em mais nenhum cenário desastroso. - respondi, abrindo a boca pela primeira vez em horas.

— E se ela estiver envolvida? - indagou Bia. Todas a olharam espantadas. A esta altura não duvidávamos mais de nada.

— Deveríamos ir à casa dela? - perguntou Bárbara.

— Meninas, vamos deixar isso com os policiais. Podemos informá-los que uma de nossas amigas não dá notícias e eles podem ir à casa dela verificar, tá bem? Vamos focar em levar Thaís para casa. - disse Thomas.

Todas assentimos, pois já estávamos exaustas. Thaís entrou no meu carro com dificuldade, e fizemos o possível para deixá-la o mais confortável possível no banco de trás.

— Desconhecido… - meu telefone tocou, mas não identificava quem era. 

— Atende pode ser notícias deles! - exclamou Thaís - Eu dei seu número já que ele roubou meu celular e o seu é o único que sei decor.

— Alô? - pus o telefone no viva-voz.

Alô, aqui é da Polícia Federal. Encontramos a família da Senhora Thaís Gomes.— Thaís se impulsionou para frente para ouvir mais atentamente. - Falo com Ana Katarina Guimarães? 

— Sim, senhor! - respondi rapidamente ansiosa pela notícia.

Ok. Os familiares da Senhora Thaís se encontram bem, porém de toda forma foram encaminhados para o Hospital Central apenas por procedimentos legais.— todos no carro soltaram o ar aliviados. - É provável que precisem passar a noite para verificar se houve algum trauma, mas por hora esta é a informação que temos.

— Muito obrigada, senhor! - gritou Thaís do banco de trás.

Por nada, senhora. Não hesitem em contatar nossa linha de emergência para qualquer nova informação sobre o caso, tá bem? 

— Pode deixar, muito obrigada. - agradeci já bastante aliviada por todos estarem bem.

Após desligarmos, Thomas deu partida no carro e fomos em direção ao Hospital Central, onde Thaís precisou preencher diversos formulários para conseguir acesso ao quarto dos filhos e do marido.

Primeiro, fomos ver Claire e Thiago. As crianças brincavam em uma salinha com alguns Legos, e pareciam distraídas. Thiago possuía um curativo pequeno na testa e Claire tinha um no braço esquerdo.

Eles contaram que seu pai havia sido um herói ao tentar fugir de tia Mykaella. E que agora sabiam que ela era "má".

Passamos quase uma hora na salinha com eles até que Thaís decidiu visitar Peter. Sabia que não poderia passar a noite com ele, mas ainda sim, foi ver como ele estava e garantiu que traríamos os pertences dele.

 

8 dias depois

Thaís finalmente havia voltado para casa com Peter e seus filhos. Eu e Thomas estávamos sozinhos novamente. Eu, ele e o bebê.

Não havíamos tocado no assunto desde aquele dia. Ele havia aceitado mais do que eu esperava, mas ainda sim tudo estava confuso em minha mente.

— Amor, estou indo para o escritório resolver algumas pendências daquele dia, mas volto rapidinho. Precisa de alguma coisa? - disse ele me acordando com beijos.

— Não, Thomas, obrigada. - sorri ao receber seus carinhos. 

— Estava pensando… Acho que já está na hora de você ter um acompanhamento médico, não acha? Podemos ir juntos se quiser. - senti que ele estava receoso em tocar no assunto, mas também senti que aquilo vinha de um lugar se cuidado.

— Sim, amor. - sorri ao olhar em seus olhos. - Eu adoraria!

Estava feliz pela primeira vez naquela semana. Todo o nervosismo de guardar esse segredo dele estava me matando, sem contar com os últimos acontecimentos. 

Tudo ainda estava uma bagunça. A polícia ainda estava atrás de Josh e Mykaella, segundo investigações foram achados alguns dados nos computadores deles que os ligam a Roberto, o marido de Karyne, casal este que também ainda não foi encontrado. 

A ONG havia sido inaugurada sem qualquer evento formal. Estou grata por ter conseguido inaugurá-la mesmo depois de todo o ocorrido, mesmo que sem a festa, o objetivo da ONG se manteve de pé. Inclusive, em algumas semanas estarei me preparando para uma entrevista para o Globo Repórter! 

Thaís ainda estava se recuperando do trauma que passou e curtindo ao máximo sua família. Também havia resolvido vender sua empresa e investir na carreira que sempre quis: cinema. Ainda estava cedo para qualquer coisa, mas foi o que ela havia pensado para o futuro.

Quanto a Mykaella… Bem…

 

10 dias depois

— Oi Mari! - ela abriu a porta com um sorriso enorme, parecendo aliviada em me ver.

— Ai Kat senti muito sua falta! Não aguentei esses dias sem falar direito com vocês. - ela deu espaço para que eu entrasse - Estava morrendo sem saber se mandava mensagem ou…

— Não vou mentir, também senti. Quer dizer, nós passamos por isso todas juntas e por mais que o elefante na sala seja difícil de mencionar, nós precisamos nos manter ainda mais unidas agora, não acha? 

— Também acho, Kat. Espero que as meninas também pensem assim. Chamei todas elas para cá hoje.

Assenti com a cabeça enquanto sentávamos no sofá. O apartamento enorme de Mariana e Ian possuía uma decoração contemporânea e clean, não era muito meu estilo, mas me passava uma sensação muito boa.

Naquele momento, meu coração batia forte de ansiedade para ver as meninas. Apesar de nós amarmos e nós apoiarmos diante de tudo o que aconteceu, foi difícil manter o contato considerando Mykaella.

Quando um membro de um grupo de amizades morre, é normal que todos se afastem pela falta que faz aquela pessoa, porque cada um vai lidar de um jeito, porque cada um precisa do seu tempo. Para a gente foi um sentimento parecido.

A diferença é que não lembrávamos dessa pessoa como alguém querido que iríamos sentir falta para sempre.

—  Alguém chegou! - Mari pulou do sofá ao ouvir a campainha.

Correu até a porta de dois metros e meio para, só então, gritar de alegria.

— Aí meu ouvido! - reclamou Bia.

— Desculpa, amiga! Ai graças a Deus você veio! - Mari a abraçou forte.

Meu coração se aliviou ao ver Bia entrar com uma caixinha de petit gâteaux. Nos abraçamos e em seguida sentamos juntas novamente no sofá. E assim ficamos por mais uma hora até Bárbara chegar.

— Vocês acham que Thai vem? - indagou Mari. Todas fizeram silêncio e as risadas antes cultivadas, haviam cessado.

— Bem, eu espero que sim… - respondi meio sem graça.

Mantivemos o silêncio por aproximadamente meia hora, ou ao menos foi isso que pareceu. 

Até que a campainha tocou.

Mariana levantou-se rapidamente para olhar quem era. Ela se virou para nós com os olhos cheios da lágrimas. Era ela.

— Oi. - disse Thaís baixinho ao ver a amiga.

— Thai! - Mari a abraçou com força. - Fico tão feliz e aliviada que você veio… Estávamos todas esperando por você! 

Mariana saiu da frente de Thaís para que ela pudesse nos ver. Instantaneamente suas lágrimas correram por suas bochechas. 

— Oi gente. - falou com dificuldade.

Não foi preciso mais nada. Corremos todas para abraçá-la. Sentimos tanta falta dela! 

O resto da tarde passou em um piscar de olhos, em poucos minutos após a chegada de Thaís, já estávamos conversando como nos velhos tempos, rindo e se divertindo. Os petit gâteaux que Bia havia trazido foram devorados rapidamente. Finalmente, depois de tanto tempo, voltamos a sorrir.

No entanto, aquele momento não durou para sempre.

— Ah, não… - Bárbara se voltou para a TV que estava ligada no mudo, desde que chegamos. - Meninas, vejam.

No jornal da noite, era a notícia principal: Josh e Mykaella haviam sido pegos na fronteira do país tentando escapar. O vídeo deles sendo pegos pela polícia era a imagem central na televisão. Josh e Mykaella algemados sendo colocados no carro de polícia. 

O profissional que narrava a reportagem resumiu tudo o que havia sido descoberto até então. Inclusive coisas que nem nós sabíamos.

Joshua Copperman, que mantinha um caso extraconjugal com Mykaella Moura há mais de dois anos, planejou junto a amante um golpe à sua própria empresa com o objetivo de tirar a atual sócia Thaís Gomes.— a tensão na sala era palpável. - Além disso, também foram descobertos recibos de pagamentos de armas de fogo e explosivos vindos do Laboratório Doutor Maxwell, onde trabalhava o dono e o marido de uma das amigas de Mykaella, Roberto Haerin. Segundo testemunhas, Mykaella coagiu e chantageou a esposa de Roberto com informações pessoais, com o objetivo de conseguir esses armamentos. Roberto e sua esposa ainda se encontram desaparecidos. Mais informações sobre o julgamento do casal ainda irá ser revelado nos próximos dias.

O silêncio era ensurdecedor. Todas nós sentíamos o peso daquelas informações. Mykaella havia nos traído da forma mais horrenda que poderíamos imaginar. Karyne, apesar de também ter sido usada, também participou de tudo desde o início, e nunca teve a coragem de falar. 

Meu coração se comprimiu ao saber que as mentiras de Josh – e Mykaella, eram tão antigas quanto o nosso relacionamento. No fim, acho que sempre quis acreditar que ao menos no começo do nosso relacionamento as coisas eram reais. Mas não eram. Nunca foram.

— Bem… Que bom que os pegaram. Assim, não vão poder colocar nenhuma de nós em risco novamente. - tentou Bia, colocando a mão suave na perna de Thaís que assentiu com a cabeça.

— Sim. Eu ainda me sinto triste por tamanha traição de Mykaella, mas só de lembrar que ela iria matar meus filhos… - ela suspirou. - Fico feliz de estarem distantes e bem presos.

— Tem razão. Eu sinto muito, meninas. - falei em meio às lágrimas. - Desculpem ter colocado ele na vida de vocês!

— Kat, não é sua culpa! - Mari me abraçou. - Você sabia tanto quanto nós. E afinal, ele não trabalhou sozinho, né? Nossa "melhor amiga" também estava junto, então você não tem culpa nenhuma! 

— É isso aí! - Bia se aproximou de mim. - E sem mais estresses, porque tem um neném vindo aí!

— Meu Deus, é verdade! - gritou Bárbara que também correu para o meu lado, pronta para acariciar minha barriga que ainda não dava sinais de crescimento.

— Tem razão meninas, preciso focar no meu bebê agora. - e então minhas lágrimas se transformaram um sorriso. 

Pela primeira vez eu estava me permitindo sorrir e apreciar o fato de estar grávida. Desde que descobri a gravidez, só estive preocupada com tudo ao meu redor. Mas graças a Thomas e as meninas, agora eu poderia aproveitar ao máximo essa experiência. 

— Thomas marcou obstetra pra mim… - falei, tímida. As meninas gritaram em excitação.

— Ai que fofo! Meu casal! - disse Bia, emocionada.

— Para eu fico com vergonha! - sorri. - Nós vamos amanhã à tarde, vai ser a primeira vez! 

— Fico tão feliz, Kat! Você vai ver é uma experiência única! - falou Bárbara que já tinha uma barriga protuberante da gravidez que descobrira há pouco. Ela se animou em falar da gravidez de cada um de seus filhos, contando histórias emocionantes e outras que me deram medo. Mas no fim, eu entendia que ela estava animada em me acompanhar naquela nova parte da minha história.

No meu recomeço.

No nosso recomeço. 

Apesar de os últimos acontecimentos terem nos afastado por alguns dias, no fim, tudo serviu para nos unir novamente, mais do que nunca. A confiança uma na outra e o desejo de acompanhar cada passinho da história que estaria por vir se tornou mais genuíno. E no que estivesse por vir, estaríamos juntas. 

Nós, as cinco. 


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Notas finais do capítulo

fim?



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