Existe um lugar nas pessoas que o ser humano deu o nome de “lá no fundo”, ou simplesmente “fundo”. Algumas pessoas costumam chamar de “bem lá no fundo”, mas não há diferença. Todos se referem à mesma coisa. É lá no fundo que guardamos coisas que a gente não quer mais. Sentimentos, não coisas. São aqueles sentimentos que não queremos sentir, não queremos lembrar que existem, não queremos dar lugar a eles.

Já vi pessoas que guardaram amor, para fingir que não o tinham. Já vi guardarem ódio, tentando dar mais uma chance para os outros. Já vi esconderem a dor e a mágoa, tentando enganar tanto os que estavam a sua volta quanto a si mesmo. Já vi esconderem a felicidade, por medo dela sair de controle. Já vi até mesmo esconderem todos os sentimentos por cansarem de senti-los. E eu não posso dizer que essas pessoas estão erradas porque, às vezes, sentir demais é cansativo. Até eu gosto de guardar essas sensações de vez em quanto para não sobrecarregar.

Mas eu, particularmente, não gosto de tratar o fundo como um lixão, ou um limbo. Como um lugar para jogar fora todos aqueles sentimentos exagerados. Não, eu gosto de tratar o fundo como um lugar especial. Aquele lugar para as coisas que não merecem ser tratadas com naturalidade, como se fossem parte comum da vida monótona e repetitiva. Não, eu guardo o que eu gosto. Se procurar no meu “lá no fundo”, vai encontrar lembranças, pessoas, sentimentos. Vai ter aquela lembrança de um momento especial, talvez de um dia importante ou algo do tipo. Vão ter pessoas selecionadas, aquelas pessoas que merecem ser guardadas lá no fundo para nunca serem esquecidas. E sentimentos, os mais importantes. Aquele carinho pela família, aquela felicidade ao estar perto dos amigos e aquele amor por aquela pessoa especial, que é guardado tanto por ser um sentimento bom quanto por ser algo assustador que queremos esconder.

É um lugar engraçado, esse “lá no fundo”. Deve ser provavelmente o lugar mais profundo de cada um. Seria bom ver o “lá no fundo” dos outros, acho. É capaz de ser o lugar mais sincero do ser humano.