Filho da Mentira escrita por Sirena


Capítulo 15
The Prophecy


Notas iniciais do capítulo

Não queriam saber o que aconteceu no dia que Balder morreu? Aqui está!
Espero que gostem...



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Capitulo Quinze

The Prophecy

Loki

8 anos atrás

Eu nunca fui uma criança muito normal.

Desde quando me lembro de sou atormentado por sonhos. Sonhos demasiados vividos, o suficiente para me fazer gritar a noite, para que gotas translúcidas de suor encharcassem meu rosto e molhassem meu cabelo. Pesadelos que me faziam chorar de maneira compulsiva, verdadeira.

Que me faziam questionar o que era real e o que era irreal.

Na maiorias da vezes eu sabia a diferença. Sabia o que estava acontecendo.

Mas havia exceções.

Como no dia em que meu irmão morreu.

Era uma noite fria e escura. A tempestade rugia no exterior, trovejando, como gritos escuros numa noite sem fim.

Como qualquer criança, eu temia os sons fúnebres da chuva. Por este motivo, mantinha a porta levemente aberta para que uma fração mínima da luz das tochas, presas na parede do corredor pudessem se adentrar. O suficiente para que o grito de terror preso em meu peito não se manifestasse.

Porém havia algo muito pior do que trovões lá fora. Muito. Muito pior.

Estava dormindo aquela noite quando um bater de asas me fez emergir na realidade. Porém foi a visão de uma ave de penas negras e lustrosas o que me prendeu a ela. A fria e maligna realidade.

Na verdade, nenhum momento questionei-me se aquilo era ou não real. Não parecia nada digno de ser questionado. Era vivido demais para ser apenas mais uma visão. Apenas um pesadelo.

Imediatamente afastei os cobertores, jogando-os no chão, o barulho mínimo do tecido embaraçado se encontrando ao solo. Silencioso e cauteloso como um felino caminhei pelo quarto, cruzando a mínima distancia entre mim e ave. Porém assim que estava quase perto o bastante para toca-la, o animal simplesmente se afastou, abrindo suas enormes asas e planando para longe de mim.

Naquele momento, deveria ter feito o que qualquer um faria. Correria para debaixo dos cobertos e fecharia os olhos, deixando a ave simplesmente ir.

Mas algo me prendia a ela. Uma conexão inexplicável, inquebrável. Forte demais para um garoto de seis anos.

Poderosa demais para qualquer um, talvez.

Comecei a percorrer os corredores desertos do palácio, a respiração baixa e controlada, os pés nus, a visão centrada na ave “fantasma” que parecia dançar pelos grandes cômodos, fazendo malabarismos complexos no ar numa sequencia de giros, planos e pousos bem elaborados.

Estava tão centrado nela que nem percebi que já estava fora do palácio. Sem o conhecimento de como exatamente havia chegado ali. Como se meus sentidos básicos houvesse desaparecidos por um momento.

Pisquei algumas vezes, tentando voltar à realidade. Tudo que sabia até agora era que estava do lado de fora, por questões mais do que obvias. O vento frio carregando gotículas de agua balançava meu cabelo louro curto, fazendo minha própria roupa, mesmo pesada com a agua se mexer. Meus pés estavam úmidos e grudentos, aderidos a terra molhada. Era possível ouvir o som dos galhos das arvores se mexendo, das folhas verdes caindo em rodopios com a força da tempestade.

Olhei ao meu redor tentando ter uma noção da minha localização atual. Surpreendi-me a descobrir que estava à beira de um penhasco, apenas três passos do precipício, perto de uma queda iminente. Assustado recuei alguns passos, enquanto tentava absorver como havia chegado ali. O penhasco de Hert era consideravelmente longe do palácio, mais de meia hora de distancia caminhando por estradas tortuosas. Estradas que não me lembrava nenhum momento de ter percorrido.

–Como... Cheguei... Aqui... -Balbuciei, a respiração entrecortada.

A ave ressurgiu em meu campo de visão, as asas abertas, olhando diretamente para mim. Penas escuras que perante minha presença começaram a se desmanchar em cinzas, cada milésimo minúsculo se fragmentando e se espalhando no chão, um monte escuro e úmido disforme.

–Loki- Gritou uma voz sombria, carregada pelo vento, um rugido da tempestade- Loki...

Recuei um passo, escorregando na lama, lacerando meus dedos na queda enquanto tentava amortecer o impacto.

–Loki- Repetiu a voz, um murmúrio extremamente próximo- Por que você fez isso?

–O que eu fiz?- Perguntei a voz, ao ser invisível.

–Olhe para suas mãos- Ordenou.

Mesmo temeroso eu obedeci. Retirei minhas mãos do chão, colocando-as a frente do rosto, a palma aberta, firme, os dedos com o mínimo movimento.

Elas estavam vermelhas. Ambas escorrendo um liquido rubro e viscoso que descia como uma cascata pelos dedos, se esgueirando nos punhos e descendo em círculos para o resto do braço.

–Sangue- Disse, surpreendido com a afirmação.

“Mas não era meu sangue.” Pensei em estado de choque, paralisado, imóvel.

–Por que você matou tantas pessoas, Loki? Por que teve que destruir tantas vidas?- Indagou a voz, assoviando tão próximo que parecia estar presa dentro da minha mente.

Então em um segundo, estava afundado num mar de corpos. Desconhecidos que tiveram seus corpos retalhados por espadas, os membros decepados por armas, o peito rasgado por lanças. Milhares de pessoas manchadas de sangue. Homens, mulheres e crianças, recém-nascidos. Alguns ainda mantinham os olhos abertos, vidrados, olhando fixamente para mim; íris verdes, negras, castanhas e azuis, agora com uma única cor_ a cor da morte.

–Você irá destruir tudo, Loki. Asgard, um reino que viveu pela eternidade no verão, você irá trazer o inverno, congelando, matando lentamente todos ao seu redor. Tantas e tantas pessoas... Até mesmo sua família. - Afirmou sombriamente a voz- Sim você irá acabar com eles, Loki. Com todas as pessoas que você ama.

Prendi a respiração, sentindo-me se afogando naquele sangue que se espalhava agora por todo meu corpo.

–Todos eles- Sentenciou.

Eu gritei, meu medo ressoando no horizonte como um eco. Escondi a cabeça nas pernas, querendo me esconder de tudo aquilo. Daquela voz sombria. De tudo que estava acontecendo.

Mas principalmente de mim.

E enquanto estava oculto na minha própria escuridão, senti que alguém me tocava por trás. Uma mão quente, um toque breve.

–Não!- Implorei, debatendo-me; tentando me livrar do que quer que fosse.

–Loki!- Senti a pressão nos ombros- Loki sou eu, Balder.

Relaxei os músculos, voltando aos poucos ao normal.

–Loki eu não acredito que encontrei você. –Ele disse, aliviado, enquanto olhava para minhas mãos pálidas, todo o sangue que outrora estava ali se extinguirá, deixando apenas cortes mínimos. A única coisa real daquela noite- Não tem noção de como fiquei preocupado com você. –Ele segurou minha face nas mãos, as lagrimas de desespero se aflorando em seus olhos azuis- O que você está fazendo aqui há esta hora?

Balancei a cabeça em negativa, afundando meu rosto manchado de lagrimas em seu ombro quente e confortante.

–Fique calmo, irmãozinho. Eu estou aqui, não estou? – Ele tranquilizou, os cabelos louros quase castanhos pela chuva caindo sobre seu rosto em mechas irregulares- Aqui. Com você. Não tem ideia quanto eu percorri até te encontrar.

–Estou com medo, Balder- Confessei.

–Do que tens medo?

Afundei meus dedos no seu casaco, buscando conforto fraterno.

–De mim. Eu tenho medo do que posso fazer- Balbuciei, confuso, ainda atormentado pela voz.

–Mas como... - Ele começou, as palavras desaparecendo no ar.

Ele olhou para o lado. Uma flecha havia passando voando a poucos metros do seu corpo, fincando na rocha mais próxima, firme, sombria, aterradora.

–Fique aqui. Parado- Ordenou, meu irmão se levantando.

Balder ficou ereto, a postura firme, ereta e temível de um guerreiro mortal.

–Quem está aí?

A poucos metros de distancia um arqueiro vestido inteiramente de negro estava posicionado de maneira estratégica. A roupa cobria totalmente seu rosto, deixando apenas os olhos a mostra, olhos marcados por cicatrizes antigas deixando sua presença ainda mais aterradora.

–Como herdeiro do trono de Asgard eu ordeno que se identifique- Balder colocará suas mãos nas costas, pronto para retirar sua espada de bronze e partir para o ataque se fosse necessário.

O arqueiro enterrou a mão esquerda na aljava agarrando uma única flecha.

–Por que está aqui?- Rugiu, as mãos no cabo da espada.

Ele estreitou o olhar.

–Para matar o filho mais velho do rei- Respondeu.

Antes que meu irmão pudesse retirar a espada da bainha, o arqueiro disparou a flecha, a seta voando no ar em direção ao peito de Balder.

–Não!- Gritei entrando em desespero.

Balder ainda conseguiu colocar a mão na ponta da flecha, as pernas bambas, em passos incorretos como se estivesse esquecido como andar. A dor o arrastava para trás sem controle o levando em direção ao penhasco, o empurrando para os braços frios da morte.

Outra flecha foi desferida, certeira, rasgando sua roupa, espalhando sangue. Meu irmão deu um ultimo passo, desfalecido, todas suas forças extinguidas.

–Loki- Balder gemeu, fechando os olhos enquanto era agarrando pelas trevas, seu corpo mergulhando no precipício mortal.

–Balder!- Implorei, tentando me levantar, tentando caminhar até o ocorrido. - Balder!- Gritei, me arrastando em direção ao penhasco.

Um penhasco vazio, sem vida, cujo único som era o do rio frio que corria a centenas de metros abaixo de mim.

Ajoelhei-me, chorando pela segunda vez aquela noite. Não de medo desta, mas pelo puro terror, tristeza e desamparo, pois a única pessoa que eu realmente amava, a única pessoa que se sentava nas noites frias ao meu lado e conversava comigo estava morta.

Meu irmão estava morto.

Ainda consegui olhar rapidamente para os olhos do seu assassino, a figura esguia, inexpressiva e imóvel, com o vento arrastando seu capuz e sua capa.

Por um momento pensei que ele também fosse me matar, assim como matou meu irmão. Porém ele simplesmente se afastou voltando, engolindo pela tempestade, voltando para as mesmas trevas que havia surgido.

Ele havia cumprido seu serviço.

Tirar a vida de um inocente e deixar a vida de seu irmão vazia, sem um significado, sem uma razão.

“Você irá destruir tudo, Loki. Asgard, um reino que viveu pela eternidade no verão, você irá trazer o inverno, congelando, matando lentamente todos ao seu redor. Tantas e tantas pessoas... Até mesmo sua família”.

Me perdoe Balder- Desculpei-me para o vazio, para o nada, para ninguém.

Ele era apenas um fragmento de uma verdade aterradora. A verdade de que iria perder tudo e todos que amavam. Uma sina sobre a destruição, com um único culpado: eu.

Uma profecia mortal.


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Notas finais do capítulo

E então gostaram? Comentários são sempre bem vindos!Não seja um leitor fantasma, please!