Jake DarkShadow

Meu novo colega de quarto era uma baixinha bipolar. Por que bipolar? Você me pergunta por quê? Bem, muito simples. Ela, uma hora, estava me dando dicas de música, estava falando algo como se fosse um anjo inocente e na outra ela virava um bicho mais assustador que o monstro do Lago Ness que gritava, batia e me xingava.

Sim, essa era Angeles NightWalker, um ser que não era nenhum pouco angelical.

Ela cursava farmácia, mas não tenho a mínima ideia do motivo, afinal ela toca piano, desenha bem, escreve poemas e histórias e ama ler. Não entendo aquela baixinha nenhum pouco. O que era ruim, porque quando eu entendo alguma pessoa é fácil fazê-la se afastar.

E então você me vem com uma outra pergunta, afinal você é cheio(a) delas, o porquê de eu querer fazê-la se afastar. É simples, quando a pessoa não gosta nem desgosta de você, ela não te enche o saco se preocupando com coisas banais e ela não te odeia até o ponto de fazer algum mal para você. E eu não queria que ela sentisse alguma coisa (boa ou má) por mim.

Por que, novamente?

Eu não gostava de pessoas como Angeles. Uma garota americana típica, que provavelmente teve todo o amor da família, deve ser mimada pra cacete e com certeza o papai teve algum dinheiro para colocá-la na melhor faculdade de Londres. Se eu não fizesse ela desgostar de mim, provavelmente ela estaria agora nos meus pés, tentando fazer de qualquer coisa para me ter e, depois de ter brincado, me jogar fora.

Não, eu estava bem melhor sem essa gente.

Mas eu não sei porque, eu não conseguia odiá-la... Bem, eu não gostava dela, até percebe-se pela forma que eu a trato, mas por algum motivo, eu não consigo odiá-la.

Meu celular tocou. Era Ash me ligando. Ele disse que ia ter uma festa no dia seguinte, mas eu não estava nenhum pouco com vontade de ir, teria que arrumar alguma desculpa.

Maldito japonês. Ele era o supervisor dos dormitórios, ele deveria ter feito alguma coisa para tirar o bicho do meu quarto.

Eu batalhei tanto por aquele quarto. Antes que passa pela sua linda e imaginária cabecinha de que eu matei alguém, seduzi alguém (isso eu faço sem precisar) para ganhar o quarto, não. Eu simplesmente sou o melhor aluno dessa faculdade e o reitor que era um conhecido meu fez questão de me dar o maior quarto que era uma sala enorme reformada. E eu tinha ele todo para mim. Mas agora, não mais.

Meus pensamentos foram dispersados quando o anjo do mal entrou no meu quarto (não, não vou falar que também é dela).

— Oi, Jake.

— Oi Chi — eu havia dado esse apelido desde o segundo dia que eu estava convivendo com aquele monstrinho (o que significava dois dias atrás) porque ela parecia uma criança, uma Child, então eu comecei a chamar ela de Chi. E não, não era um apelido carinhoso, era pra zombar dela.

Ela parecia muito calma. Isso sempre acontecia quando ela saía com o namoradinho dela. Aquele de cabelo castanho-claro. Ele parecia ser um cara muito legal, não sei como aguenta ela.

Ela saiu pelo o quarto e foi em direção a cozinha.

A COZINHA, PUTA QUE PARIU. Eu esquecia que eu estava com fome e com preguiça então peguei a Pringles dela. Fudeu, fuja, Jake, para as colinas.

— Jake? — perguntou Angeles vindo em minha direção — cadê a minha Pringles?

— Então, Chi, eu acabei comendo porque...

Eu não tive tempo de terminar minha frase porque subitamente senti uma coisa quebrando a minha cabeça. Quando vi, ela tinha uma frigideira na mão. Frigideira? Caralho, isso dói muito, nunca brinque com frigideiras em casa.

— AI, CARALHO, ANGELES, POR QUE VOCÊ FEZ ISSO?

— VOCÊ OUSOU, SEU VERME IMUNDO, A COMER MINHAS PRECIOSAS PRINGLES?! ELAS SÃO MINHAS PRECIOSAS.

Ela criatura parece até o Gollum de “O Senhor dos Anéis”. Suspirei, eu precisava fazer alguma coisa antes que ficasse com um galo na minha linda cabeça.

— Desculpa, desculpa. Vamos, ponha uma roupa, eu vou comprar suas Pringles.

Sua boca formou um pequeno ‘o’ provavelmente estranhando eu ceder assim tão fácil e ela, como uma criança feliz, correu para o banheiro se trocar.

Eu já estava pronto com meu jeans, blusa branca e vans então fiquei sentado na cama esperando ela. Depois de dar uma olhada no quarto eu percebi que uma das coisas que não era tão ruim de tê-la no meu quarto era que ela era uma pessoa organizada e bem limpa.

Mas eu ainda queria o quarto só para mim.

Ela saiu do banheiro vestindo uma calça jeans preta justa e um blusão fechado cinza claro com o símbolo do Star Wars e um AllStar.

Saímos dos dormitórios e fui em direção ao estacionamento exclusivo dos alunos. Então eu sorri maldosamente.

— Ah, Chi, só tem um problema.

— O que foi?

— Eu só tenho uma moto e pelo que eu vejo de você, você não sabe dirigir. Espero que não tenha medo de motos.

Meu plano de fazê-la ficar com medo foi por água abaixo porque ela deixou bem claro que não tinha medo. Que saco.

Subimos na minha Harley preta e fomos ao mercado mais próximo. A sensação das mãos de Angeles na minha cintura era... Estranha. Diferente. Era meio aconchegante, ela tinha mãos quentinhas e eram pequenas como as de uma criança. Balancei a cabeça, desviando esses pensamentos ridículos.

Eu jurei para mim mesmo, naquele dia que eu NUNCA mais vou fazer compras com aquele ser. Ela me fez gastar MUITO dinheiro. Ela comprou milhares de Pringles, coca-colas, finnis, cookies, bolachas, barrinhas de cereal, amendoin e um bolo. Ela ME FEZ COMPRAR UM BOLO.

Eu não sei como, ela deve ser uma bruxa, mas ela conseguiu carregar tudo até a faculdade. Chegando no dormitório ela guardou tudo na mini cozinha e foi terminar de tirar as suas coisas das caixas.

Eu deitei na cama, peguei meu livro “Criaturas Mágicas e onde habitam” e comecei a ler pela décima vez. Eu tirei os olhos do livro quando ouvi um estrondo de uma caixa indo no chão. Angeles arfava, se esforçando para pegar a caixa.

— Isso parece ser pesado — comentei.

Ela se virou ao ouvir minha voz.

— E é.

— Hm, então use mais força — indireta/direta dizendo que eu NÃO iria ajudá-la.

Ela percebendo isso, franziu o cenho.

— Eu entendi! Obrigado por nada, Jake, espero que você fique banguela.

Era engraçado mexer com ela. Quando eu a irritava seus olhos azuis adquiriam uma tonalidade meio acinzentada e suas bochechas coravam violentamente por conta da palidez da sua pele.

Eu vi que ela estava separando outra caixa agora e dela estava tirando...BARBIES?!!

— Isso são barbies? — exclamei, chocado.

— Não, são bonecas de coleção das princesas e vilãs da Disney.

— MAS ELAS SÃO BARBIES!

— NÃO SÃO. SÃO BONECAS DE COLEÇÃO! FIQUE LOGO BANGUELA DE UMA VEZ, SEU RETARDADO.

Eu não me segurei e comecei a gargalhar. Ela corou e começou a me acertar com um travesseiro.

— Você tem seus bonecos e eu não falo nada — ela argumentou.

— Não são bonecos, são figure action dos meus personagens de animes, séries e filmes favoritos vindos diretamente do Japão graças ao Ash. E não adiante se fazer de boba porque eu sei que você tem também, eu vi você separando uma caixa cheia delas.

Ela ficou quieta, pois sabia que eu estava certo, me deu as costas e terminou de desempacotar as suas coisas e arrumá-las. Eu continuei lendo, sem preocupações com a minha faculdade etc. Afinal, mesmo eu cursando medicina, eu conseguia me virar bem porque eu sou um gênio e o dia seguinte era sábado. O que significava sair de noite e curtir.

Já estava de noite. Eu estava tocando minha guitarra no quarto. Angeles estava na sala jogando “Bioshock Infinite”. Eu devo ter pegado no sono, porque acordo com um barulho pequeno como de um prato sendo colocado na minha escrivaninha que ficava ao lado da minha cama.

Eu esfreguei os olhos e vi Angeles colocando um prato de uma macarronada digna dos deuses e um copo de coca-cola. Eu fitei ela incrédulo, ela deve ter posto veneno...

— Para compensar as comprar de hoje — ela sorriu.

Está vendo? Ela estava brigando comigo, agora até fez comida...

Hesitantemente, peguei o prato e comecei a comer. Eu não vou falar isso para ela, mas a macarronada estava divina. Eu comi o meu prato em menos de cinco minutos. E depois fui olhar na cozinha procurar mais.

Quando olhei no relógio vi que eram dez e meia da noite. Eu saí da cozinha (depois de ter comido o meu segundo prato) e fui para o quarto pegar meu pijama. Angeles estava na cama dela lendo “País das Neves”. Que porra de livro era aquele?

— O que você está lendo? — perguntei.

— Um livro.

— Oh, jura? Achei que fosse um catálogo de vendas do sex shop.

Ela ficou vermelha. Era muito engraçado porque Chi era inocente, então qualquer coisa com relação a esse tipo de coisa fazia ela ficar vermelha.

— É a história de uma gueixa do Japão.

— Bem, ainda bem que não é uma gueixa da África.

Ela tacou o seu pinguim de pelúcia em mim. Pouco tempo depois, eu fiquei mexendo no computador enquanto Angeles já estava no último sono. Decidi pregar uma peça nela.

Depois de ter feito meu trabalho, me deitei, mas não pude deixar de pensar naquilo que vinha me incomodando desde que ela chegou.

O fato de ela ser uma incógnita. Ela parecia ser uma americanazinha mimada, mas eu nunca vi ela falando com algum parente. Ela amava ler, assistir filmes/séries/animes. Ela não sabia se vestir direito, afinal as roupas dela eram blusas/blusões que engoliam ela e alguma calça/shorts. Uma hora ela me trazia comida, na outra ela estava praticamente me matando.

Angeles NightWalker realmente era um bicho estranho. E minha mais nova colega de quarto.