À Sombra da Justiça escrita por BadWolf


Capítulo 2
Um Dever e Uma Traição


Notas iniciais do capítulo

É, o nome do cap tá meio tenso, mas prometo que é só uma agitadinha...
Boa leitura.



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–Um absurdo, Watson! Um absurdo!

Holmes resmungava, batendo no pobre pedaço de jornal com indignação. Ao saber da notícia, ainda quando voltava do apartamento de Esther em Pall Mall, ele soube pelos jornais.

–Um criminoso daquele naipe, assassino de quantos inocentes... Nem mesmo a morte de um nobre como Ronald Adair impactou naquele juiz covarde e corrupto! O Império está cercado pela corrupção!

–Não culpe o juiz, Holmes. – disse Watson, enquanto tomava café. – Moran contratou um dos melhores advogados do ramo criminalista, o Mr. Manson.

–Um americano mercenário, é isso o que é aquele patife! Um sujeito que defende aquele ser abominável não merece morar em nosso país!

–Cuidado com a xenofobia, Holmes... Os americanos são quase nossos irmãos. Aliás, eu vejo pelo seu ar abatido que você está metido em outro caso, não é?

Holmes, que estava com olheiras, pouco disse. – Um caso pouco importante. Sequer é digno de suas notas, Watson.

–Será mesmo, Holmes? Você tem passado todas as noites fora de casa ultimamente... Têm chegado de manhã, bem cedo... Diga-me: é algo de interesse nacional?

Holmes, que estava fumando, virou-se para Watson descrente. E um tanto encabulado.

–Por Deus, Watson! Este foi uma tolice que tive de resolver, nada tem haver com o governo. Se de fato fosse importante, você certamente seria o primeiro a saber. Estou fazendo-lhe um favor, Watson, de não ocupa-lo com problemas insignificantes.

De repente, Holmes ouviu a porta bater. Era Mrs. Hudson.

–Mr. Holmes, há um senhor chamado Mr. Sparks que deseja vê-lo.

Holmes ergueu uma sobrancelha, de surpresa. Mr. Sparks trabalhava no Serviço de Inteligência, e até seu conhecimento poderia chegar, era o chefe de Esther. O que ele pretendia ali, se ele não sabia das relações de Esther com ele?

–Deixe-o entrar. – pediu Holmes.

Mr. Sparks entrou, rapidamente colocando seu chapéu no cabideiro.

–A que devo a visita, Mr. Sparks?

–Fui recomendado por vosso irmão, Mr. Holmes. Há um assunto de extrema delicadeza que preciso que o senhor resolva.

–Se não fosse algo tão delicado, certamente o senhor, funcionário do Serviço de Inteligência Britânico, não estaria aqui. Mas sente-se, Mr. Sparks, e conte-me o que se passou.

Mr. Sparks sentou-se em uma poltrona, bastante elegante. Mexeu em seu bigode e nos óculos, antes de começar.

–Mr. Holmes, estou enfrentando problemas com um de meus colaboradores.

Espero que Esther não esteja causando problemas...

–Hum... – disse Holmes, pedindo que Sparks prosseguisse.

–Digamos que... Um certo colaborador nosso está avançando demais em uma certa investigação...

–Um certo colaborador... Uma certa investigação... Poderia ser mais preciso, Mr. Sparks? Eu tenho uma boa idéia de quantos agentes a nossa Rainha tem empregado nos últimos tempos e creio ser bem difícil refiná-los deste modo. – disse, impaciente.

–Er, bem... O senhor está certo. Há uma mulher e...

Holmes arregalou os olhos. Era o que ele menos queria ouvir. Watson fez o mesmo, mas por outros motivos.

–Uma mulher? – perguntou, curioso e muito ouriçado.

–Sim. Ela é a nossa primeira agente, feminina. Estamos experimentando a possibilidade, e até então, estava sendo muito positiva. Creio que este “filtro” seja o bastante, a ponto de você não precisar que eu dê um nome, não é?

–Mesmo que me desse, certamente seria falso. Mas prossiga.

–Esta agente está investigando um homem poderoso, da Rússia, e por conta própria, sem o nosso consentimento. O trabalho dela é bem simples: ir ao subúrbio da cidade, passar-se por imigrante russa – ela é fluente na língua – e investigar e detectar suspeitos de espionagem ou possíveis terroristas. Ela vinha fazendo este trabalho divinamente, mas de uns tempos pra cá vem se mostrado insatisfeita. Ela acha que os mais perigosos estão em palácios, não em cortiços.

–De certo modo, ela pode estar certa. – concordou Watson.

–Sim, mas há limites à Diplomacia. O homem que ela está investigando é poderoso demais, e muito fluente com o Czar e nós já temos problemas demais com a Rússia. Não podemos ter uma de nossas agentes incomodando um homem tão poderoso daquele país.

Holmes sentia vontade de suspirar, de tão lamentável que achava a situação de Esther. Ela queria, a todo custo, acabar com aquela ameaça. O motivo era louvável, mas para quê, se agora ela estava livre do Conde Ivanov, longe de qualquer perigo?

Porquê Esther, porquê você está fazendo isso?

Se nós tivéssemos mais tempo para ficarmos juntos...

Não. Não era hora de se lamentar.

–Então, de que maneira o senhor quer empregar meus serviços, Mr. Sparks? Espero que não seja para silenciar sua agente, pois este não é o meu ofício.

–Não, Mr. Holmes, de forma alguma. Tudo que eu quero é que o senhor atrapalhe a investigação dela. Se o senhor é tão bom em desvendar, creio que seja bom também em tornar as coisas mais “nebulosas”.

–Foi meu irmão que te indicou para isto?

–Sim, ele me disse que não há pessoa mais confiável para essa missão.

Ah, mas eu mato Mycroft...

Holmes bufou. – Certo, Mr. Sparks. Pensarei em uma tática para destruir a pequena investigação de sua agente.

–Mas nós precisamos saber quem é ela! – disse Watson, muito ansioso. Holmes olhou para ele, com certa raiva. – Ao menos um nome...

–Bem, o nome... Esther. Isso é tudo. Bem, senhores, preciso ir. – disse Sparks, com pressa. – Se caso precisar, procure-me, Mr. Holmes.

Enquanto só o que se ouvia eram os passos na escada, Watson ficava refletindo.

–Esther... – disse, quase degustando o nome. – Deve ser uma mulher corajosa, de fibra. Afinal, o meio da espionagem é restrito aos homens, e ainda assim ela é admirada pelo Mr. Sparks, por seu trabalho.

Holmes sentia-se incomodado pelo interesse de Watson.

–Corajosa... Ela deve ser é uma...

–Holmes, Holmes! – advertiu Watson. – Olhe o julgamento!

–Agora vai me dizer que está apaixonado por uma moça que você nunca viu? Só pelo que você ouviu dela? – Holmes bufou. – Bem, de qualquer forma, eu preciso agir...

Imediatamente, Holmes levantou-se e correu para buscar sua cartola e sobretudo. Watson, que ainda estava sentado, terminando anotações, ficou surpreso.

–Mas já tão rápido? – indagou, ouvindo o bater da porta brusco em resposta, sem sequer dar tempo de levantar-se.

Ora, mas que rapidez! Será que sua mente já encontrou uma pista, assim tão rápido? E porquê ele não o convidou? Um tanto irritado por sentir-se excluído, Watson curvou-se para a janela e assistiu o caminhar de Holmes, pelas ruas de Baker Street.

–Estranho... Ele não vai procurar por um cabriolé, em uma tarde tão chuvosa?

Holmes caminhou até Shagford Street, sua “segunda” casa. Entrou por uma porta ao lado do prédio de Esther, que era uma espécie de café. Havia alguns clientes ali, tomando chá e conversando. Holmes caminhou imediatamente até a porta, onde havia uma placa escrito “banheiro em manutenção”. Era uma entrada falsa, que dava para os corredores dos apartamentos onde Esther vivia, no primeiro andar. Ela morava no segundo. Depois, ele ia embora pelo mesmo jeito. Era nada mais que uma tática, para enganar qualquer um que se metesse em seguí-lo.

Ele entrou em casa e foi direto para o seu quarto. Correu para as gavetas de Esther e procurou por papéis. Pouco encontrou. Foi, então, para o escritório, que ela costumava virar as noites submersa em seu trabalho. Assim como ele.

Depois de vasculhar bastante, por horas, e pouco de significante encontrar, ele finalmente encontrou um pequeno cofre, atrás da parede. Elementar.

Demorou mais de uma hora para descobrir a senha, que era o número do livro e do verso de um versículo bíblico que ela gostava. Esther mantinha em sua casa o Tanakh, uma espécie de “Bíblia judaica”, que era similar ao Antigo Testamento, mas também uma Bíblia cristã. Ele correu para o Kethuvim (Os Escritos), e folheou o livro até encontrar o que estava procurando. Correu, então, para a Bíblia.

–“Então, respondeu a rainha Ester e disse: Se perante ti, ó rei, achei favor, e se bem parecer ao rei, dê-se-me por minha petição a minha vida, e, pelo meu desejo, a vida do meu povo.” Esther (O Livro 8 da Bíblia), Capítulo 07, Versículo 03. – disse, com orgulho, após ouvir o som do cofre se abrir, ao colocar a senha 080703.

Holmes encontrou uma pasta, da qual bastou dar uma leve folheada para ver que era relacionada ao Conde Ivanov. Um dossiê que poderia ser bombástico, repleto de suspeitas e ligações do Conde com toda a sorte de crimes possíveis relacionados ao velho “Urso de Moscou”.

–Mas que belo trabalho, Esther... – balbuciou Holmes, com orgulho. Ele chegou a suspirar, tamanha era sua culpa. Olhou rapidamente para a lareira, ainda apagada. Ele poderia lançar aquele material valioso e explosivo ali, no fogo, e toda aquela história estaria encerrada. Mas que direito ele tinha em fazer isto? Aquele era seu trabalho! Não era justo, ou correto, acabar com sua investigação. Ambos sempre foram claros em acordar que jamais se intrometeriam em seus trabalhos.

Até que Holmes ouviu passos pela casa. Certamente, era Esther chegando. Ele pôs tudo no cofre e rapidamente o fechou. Assim que Esther chegou, ele sentou-se em uma cadeira, fingindo procurar algo.

–Holmes?! O que você...?

–Boa tarde, minha cara. Se a pergunta é “o que você faz aqui, em meu escritório?” eu te respondo: estou procurando por um bloco, que pensei ter deixado aqui na última vez que estive por aqui..

–Bem, eu não vi nada. Se caso eu encontrar, eu te digo.

Ambos ficaram se olhando, brevemente.

–Vejo que você está ocupada nos últimos tempos, com algum negócio importante. – ele disse, presunçosamente, recebendo a atenção dela.

–Vamos, faça-me uma exibição de seus grandes poderes dedutivos. – ela disse, de braços cruzados e sorriso na fala, enquanto Holmes a circundava, com ar orgulhoso.

–Em uma tarde chuvosa, você está com os sapatos sujos de lama e um pouco de grama e o vestido respingado na altura dos joelhos, um claro sinal de que correu por algum motivo, além do seu semblante um pouco mais pálido do que o normal. O que houve?

Esther suspirou. – Eu estive na mansão do Conde Ivanov hoje.

–O quê?! O que você foi fazer lá? – perguntou Holmes, preocupado.

–Foi crucial para minha investigação, Holmes. Lembra-se daquele composto que você criou? “Sem cheiro, sem cor”?

–S-Sim, eu até te fiz uma demonstração uns dois dias atrás...

–Então, meu amor. – ela disse, colocando sua mão sobre o ombro de Holmes, carinhosamente. – Eu coloquei uma idéia em prática, graças ao seu composto. Resolvi espalhar um pouco de composto na soleira da mansão. Tenho motivos para acreditar que Mikhail irá passar por lá. Ele irá pisar no composto. Eu sei onde ele mora, e irei provar que ele pisou. Lembra que era só passar um pouco de amônia que a cor azul poderia ser revelada?

–Sim, exatamente. – disse Holmes, entendendo onde ela queria chegar. Deus, quanta esperteza, mulher. Foi por isso eu abdiquei de minha solteirice e te escolhi como esposa.

–Então. Depois disso, eu fui até o cortiço onde Mikhail mora e roubei seu sapato. Fiquei de tocaia, na janela, até ele tirá-lo e tirar uma soneca. Por isso eu corri. Ele percebeu que tinha alguém na janela e eu tive de correr. Quase eu fui pega por ele. Mas o que importa... – ela disse, com um sorriso encantador, estendendo duas botas surradas emsua mão. – É que eu consegui. Eu vou testar agora no sapato esquerdo. Amanhã mesmo, eu levarei o sapato direito de Mikhail e mostrarei a Mr. Sparks. Ainda há composto na entrada da mansão. Ligar a presença do Conde Ivanov à Mikhail, um foragido russo e com uma longa ficha criminal em Londres será a desmoralização dele!

–Esther... – disse Holmes, diante de uma Esther entusiasmada e nervosa. – Você não acha que está indo longe demais, com toda essa... Obsessão pelo Conde Ivanov?

–Holmes, por favor...

Holmes correu para abraça-la.

–Você está abalada, exausta! Eu posso ver isso claramente. Você está envolvendo sua vida pessoal em seu trabalho, está usando o seu emprego no serviço de Inteligência para uma vingança!

–É claro que não! – indignou-se Esther. – O Conde acabou por aparecer e...

Holmes ergueu uma sobrancelha, em suspeita. – Por favor, creio que não há necessidade de mentir para mim. – antes que ela continuasse, Holmes a beijou. – Agora, você está exausta e precisa descansar.

Ela concordou, envolvendo-se nos braços acolhedores de Holmes.

–Vou tomar um banho. – ela disse.

–Pois faça isso. Será revigorante. – ele deu um beijo em sua testa, e Esther saiu do escritório, deixando Holmes sozinho com um bom trabalho a fazer.

Ele correu para o sapato restante, que ela levaria para mostrar a Mr. Sparks que estava certa. Ele não tinha contado a ela que se lançasse um de seus nitratos sobre o sapato, o efeito não ocorreria. Bastava poucas gotas que o composto teria seu efeito anulado, mesmo lançado contra amônia. Ele derrubou o nitrato contra a sola da bota de Mikhail, e colocou o sapato de novo na sacola.

–Eu sinto muito, Esther. Eu sinto muito.


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Notas finais do capítulo

AH HOLMES!!! Mas que sacanagem!! Sabotar a esposa é muito feio!!!
Bem, como vocês devem ter visto, a vida dos meus persoagens não é nada fácil... Nem preciso dizer que a coisa vai feder no próximo capítulo, né? Semana que vem vocês saberão aonde isso vai dar.



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