Félix fitava Niko com os olhos acirrados enquanto se dirigia aos dois

Cada passo uma lembrança dos últimos dias.

Ao sair da casa de Niko, Félix realmente sentia que ali poderia estar a nova vida que tanto buscara - bom, nem tanto, não se imaginava sendo pai novamente de duas crianças - e toda a rotina que acabara de presenciar. Balança a cabeça em sinal negativo: "Pelo Carneirinho vale a pena"

Após mais uma visita médica com César e toda a decepção que sente ao ver o pai sentir pena de Aline, Félix resolve dormir um pouco, a última noite e os últimos acontecimentos o tinham esgotado - tanto para bem como para o mal.

Quando acorda: "O quê? 2h da manhã? Não posso ir agora visitar o carneirinho, melhor deixar amanhecer"...

Mais passos.

No café da manhã Félix descobre que precisa ir assinar alguns papéis com Paloma, ajudar mami poderosa e que não haverá ninguém para ficar com César a tarde. César não colabora, implica com Félix ao seu límite. Ao final do dia Félix preferiu se isolar no seu quarto, não queria que seu reencontro com o Carneirinho fosse uma sessão de terapia - 'meu pai não gosta de mim'.

Após algumas horas trancado em seu quarto, Félix se sentia sozinho - imaginava que Niko não entrava em contato porque eram tantas ocupações reais: filhos, restaurante, administrar a casa, quanto a ele - "Quase 40 anos e vivendo de mesada, sem a mínima chance de se recolocar no mercado e um passado mais que sombrio"."Quando será que Niko vai entender isso? Por mais que ele diga que eu sou uma boa pessoa nunca haviamos passado mais que algumas horas juntos, ele não sabe nada a meu respeito"."Santa ingenuidade" Entre seus pensamentos, Félix adormece mais uma vez.

Mais passos, passos firmes.

Felix estava decidido a visitar Niko hoje, estava incontrolável – não sabia como, mas dois dias sem vê-lo estava o deixando louco. Não queria ligar, não queria dar desculpas pelo telefone – queria o toque, o cheiro, o calor de seu carneirinho. Tudo pronto e Mami poderosa a se desesperar com o filho de Cesar a chorar – ainda não tinham conseguido uma babá e muito menos uma enfermeira para ajudar com César.

– Félix, meu filho, pode vir aqui?

– Sim mami, estou de saída, mas pode dizer.

– Querido, tenho 5 entrevistas hoje para tentar contratar alguém para cuidar do bebê e ajudar as meninas com seu pai – não posso sobrecarrega-las também, não seria justo. Ontem mesmo percebi que você estava esgotado também.

– Ah mami – o moreno abaixa a cabeça em descrença – talvez o Papi me culpe por tudo...

– Culpar você? Por ajudar a salvá-lo? Félix, até pra você talvez não seja bom cuidar do seu pai por tantas horas seguidas. Você está péssimo!

Pilar continua...

“Estou quase lá” pensa Félix.

– Querido, que tal você me ajudar com as entrevistas? Você vai se sentir melhor e tirar um pouco do peso das suas costas em aguentar seu pai.

– Mami, é minha obrigação – além disso, sou o único desocupado aqui.

– Félix!?

– Mami, é verdade, você me salvou do “HOOOT DooooGGG do Fééélix” . Félix sorri pela primeira vez.

Pilar abraça Félix e pede um pouco de paciência ao filho.

– Querido, por favor me ajude com as entrevistas e no final da tarde podemos fazer algo juntos. Que você acha?

– Mami?! Eu estava de saída...mas posso te ajudar, só porquê foi você que me pediu.

Félix fica imóvel a umas 4 lojas da porta do restaurante, nem Niko nem Eron percebem...

Muitas entrevistas depois, Pilar percebe que o filho está aborrecido e o chama pra conversar no escritório. A nova empregada começaria em 2 dias.

– Filho, obrigada pela ajuda. Mas eu te chamei aqui na verdade pra te perguntar o que acontece? Antes a rejeição do seu pai não te incomodava tanto. Que houve?

Felix desaba.

– Mami, eu acho que queria ser aceito pelo papi, ter uma convivência saudável. Você o tolera porque tem um passado juntos, agora imagina alguém novo nessa casa aguentar isso, acho que nem sendo bem pago suportaria por muito tempo...

– Como assim alguém novo, filho? – Pilar não entende muito bem...

– Ah mami, deixa pra lá – Felix fica marejado.

– Filho, conta pra sua mãe o que houve. O que seu pai falou afinal? Não, não importa o que ele falou, o que importa é que você não pode deixar isso te abalar, não mais.

– Mami, tem 3 dias que eu não falo com o Niko.

– Vocês brigaram? Desculpe filho, achei que contando que o Anjinho está na Espanha ajudaria, o Niko foi tão sincero quando disse que não queria atrapalhar vocês...Bom ainda acho que se ele não queri atrapalhar vocês é porque realmente se importa.

– Mami, mami – nós passamos a noite juntos.

Pilar fica muda, respira fundo e continua muda.

Félix faz menção de se levantar pois já sabe o que a mãe vai dizer. Melhor não sabe.

– Querido, você se arrependeu?

– Não

– Ele te dispensou depois.

– Não, mami...

– Não foi o que você esperava?

– Não, Mami!... Não seja indiscreta

Pilar sorri aliviada.

– Eu não conheço muito desse mundo...mas o que houve então?

– Ele quer ficar comigo...de verdade. Félix puxa uma cadeira e se senta com as mãos sobre a cabeça.

– Se fosse aquele mecânico que mora perto da Márcia eu até entenderia esse desespero...mas o que há de errado com isso? O Niko seria a nora ou genro que eu pedi a Deus...Pilar sorri tentando animar o filho.

– Eu devo ter feito hashi da madeira da arca de Noé...

– Mami, o Niko é uma pessoa boa, ele merece alguém bom que goste dele, tenha um trabalho e que seja um exemplo para os filhos dele. Eu não sou exemplo nem pra mim, quanto mais para o Jayminho e o Fabricio. Ele é um cara decente...eu...- Félix abaixa a cabeça.

– Eu posso não conhecer o Niko muito bem, agora ele sabe exatamente quem você é – ele nunca se abalou ou desistiu de te ajudar mesmo quando te viu sem dinheiro ou eu contei da caçamba; e...e até onde eu sei você também contou os melhores momentos do seu passado, não?

– Mami?! – Félix respira fundo. – “Sim, contei. E quanto mais eu contava, nada mudava”.

– Félix, porque você não vai procurá-lo ou pelo menos liga pra ele?

– Estou a três dias tentando e conseguindo qualquer desculpa pra adiar isso. Acho que estou dando um tempo pra ele perceber a burrada que fez...Félix respira fundo e chora.

O abraço de Pilar o confortava, suas palavras também, ela dizia que eles precisavam conversar mais e que amanhã sem falta Félix teria um dia mais tranquilo sem César, que ele deveria se organizar e ir procurar Niko, Pilar não aceitaria o filho em casa sem conversar com ele, mesmo que fosse para ele voltar dispensado por Niko.

O coração de Pilar dizia que seu filho estava destruído e a única pessoa que poderia concertar isso era o Niko.

Félix imóvel. Talvez fosse melhor ir embora. Eron se aproximava perigosamente de Niko .

Quatro dias sem falar ou ver o Carneirinho, três dias de maus-tratos de Cesar, dois dias entrevistando candidatas a empregadas e um dia de Pilar o incentivando a procurar Niko; finalmente Félix estava convencido que não falar com Niko seria muito pior do que não tentar.

Acordou, recebeu a empregada nova, deu algumas instruções e foi se preparar. Decidiu por esperar o final do dia e fazer uma surpresa a Niko no restaurante. Queria pedir desculpas. Queria dizer que gostaria de estar junto dele, de conhecê-lo e conhecerem-se. Sorriu triste. “O Niko é tão inocente...como pode?”

Passeando pelo shopping antes de ir ao restaurante, parou em uma loja, comprou algo, pediu para presente e seguiu para a escada rolante onde viu Eron e Niko a distância.

Cada passo uma lembrança, parou 4 lojas antes da entrada do restaurante e os olhava fixamente. Não podia ouvir o que eles falavam.

– Eron, por favor – já conversamos...eu não vou te dar esperanças, você precisa seguir em frente, sei lá...eu preciso ir, eu preciso descansar. Os últimos dias não tem sido fáceis pra mim...

– Niko – Eron avança em sua direção e o segura pelo braço – precisamos conversar.

Niko faz força para se desvincilhar sem chamar a atenção dos clientes do shopping. Odiava um barraco.

Era a gota d’água – Felix segue com toda sua ira em direção ao restaurante e grita:

– Niko! Desculpe o atraso, podemos ir?