A madrugada já ia alta, mas Davi não conseguia pregar o olho. Rolava de um lado para outro da cama, ouvindo a respiração de Vicente e Bóris, seus colegas de quarto. Com apenas um mês, já havia desacostumado totalmente a dormir longe de Megan ou de seu cheiro, que já estava impregnado em sua cama.

E tinha o acréscimo da preocupação que estava.

Havia visto a namorada tentar correr até ele, ela estava desesperada com algo. E o hacker tinha certeza que não tinha nada a ver com ele estar confinado na mesma casa que Manuela.

Apanhou o celular na cabeceira (Jonas sabia que era inútil tentar tirar essas coisas dos confinados, afinal, eram alguns dos maiores hackers do país) e teclou uma mensagem:

“Você está bem?”

A resposta veio logo, indicando que ela estava acordada também.

“Sim. E você?”

“Com saudade do seu cheiro. Não sei mais dormir sem você, loirinha”

“Sorte minha que suas camisas estão aqui em casa”

“:( essa semana vai passar voando, tenho certeza”

“Claro, vai sim. Agora tenta dormir, seu dia será longo. I love you stupid boy”

“Também te amo loirinha. Bons sonhos”

“Se for com você, serão os melhores”

Davi sorriu, colocando o celular na mesa cabeceira e abraçando o travesseiro, tentando acessar em sua cabeça a lembrança do cheiro de Megan, na esperança de assim pegar no sono mais depressa.

Mas só de saber que ela estava bem, já era um grande alívio para ele.

~*~

Mas nem tudo era como Davi imaginava. Assim que devolveu o celular para sua cama, Megan caminhou para o banheiro do quarto. Sentou sobre a tampa da privada, trazendo os joelhos para junto e si e os abraçando.

Observou as quatro caixinhas no balcão, mordendo o lábio inferior nervosamente. Não era a primeira vez que faria um teste de gravidez, mas nunca havia se sentido tão em pânico quanto naquele momento.

Talvez porque, pela primeira vez, já sabia a resposta.

Sempre havia sido perfeitamente regulada, e um atraso de dois dias já era alarmante. Mas quase três semanas? A última vez que havia menstruado fora logo que chegaram ao Brasil, alguns dias antes da primeira prova e da primeira noite com Davi.

E em meio a toda a situação, Megan não se lembrava de terem sido cuidadosos. Em nenhuma das vezes daquela noite.

_ Coragem Megan Lily. – suspirou, levantando e pegando a primeira caixinha, rasgando o lacre.

O processo foi o mesmo de sempre, e o tempo de espera idem. Ela ficou sentada na cama, abraçada à camiseta que usava, que por acaso era de Davi.

Não conseguia se acalmar a nenhum custo. Sua cabeça articulava como o hacker reagiria à notícia, se ficaria feliz, se gostaria de ser pai. Nunca haviam conversado sobre isso, e ela nem imaginava que teriam que pensar no assunto tão cedo.

E tinha o reality... O quão prejudicial seria para Davi se ela estivesse grávida dele? Fosse bom ou ruim, a mídia iria cair matando em cima do resultado do concurso e daria um jeito de tirar mérito, usando sua gravidez para isso.

O apito do celular a trouxe de volta a realidade, fazendo-a suspirar. Levantou da cama, caminhando até o banheiro sem pressa. Se apoiou no balcão, enquanto seus olhos constatavam o que ela já sabia.

+

+

+

+

_ Grávida. – suspirou, se escorando à parede do banheiro e escorregando para o chão frio do banheiro.

Por vários minutos, ficou apenas imóvel, observando o nada. Então, uma após a outra, levou as mãos para a barriga, a envolvendo com força e começando a soluçar alto.

~*~

Davi estava parado no meio da praia. Seus olhos corriam de um lado para o outro, tentando entender o que ele fazia ali. O céu estava escuro e tudo parecia sem cor, sem vida.

_ Davi... – ouviu a voz ao longe, começando a procurar a origem – Davi...

Ele virava no lugar, mas a única coisa que conseguiu localizar foi um casal jovem, fortemente abraçado. Começou a caminhar até eles, mas quanto mais caminhava, mais longe eles pareciam.

_ Davi...

A voz vinha deles, e não parava. O hacker começou a correr, mas eles só se afastavam mais e mais, enquanto ele começava a arfar. Seu coração quebrava suas costelas, e ele tentava gritar, mas sua voz não saia de jeito algum.

Até que ele a viu.

Seus olhos eram escuros, seu cabelo era longo e escuro, seu sorriso bem conhecido por ele, graças a foto que estava em sua cabeceira.

A palavra “mãe” ficou presa em sua garganta, enquanto ele tentava a todo custo gritá-la. Forçou as pernas a correrem mais e mais, mas de repente elas pareciam geleia, fazendo-o se estatelar no chão, enquanto tentava gritar.

E foi então que seu pânico aumentou infinitamente.

O rapaz que a abraçava se afastou, enquanto ela caminhava em direção ao mar. Davi arregalou os olhos, observando a força assustadora das ondas, gigantescas e escuras. Sua mãe molhou os pés, caminhando em linha reta, sem hesitar.

Ele queria gritar o mais alto que pudesse, mandar o homem corresse e a impedisse, pedir que ela parasse. As ondas a faziam bambear, mas sua mãe continuava caminhando e a água já atingia seu peito.

Davi fechou os olhos, sentindo as lágrimas marcando seu rosto, não querendo ver o que viria a seguir. Os soluços irromperam de seu peito, e ele deitou sobre os braços, desejando que tudo acabasse.

Mas não acabou.

_ Davi.

Levantou a cabeça depressa, virando o corpo e sentando. Megan estava há alguns metros dele, usando um vestido preto e longo. Sua pele estava mais branca do que o usual, seus olhos fundos e tristes, a boca sem cor.

_ Davi. – a voz dela era tão sem vida, que fazia o peito do rapaz se apertar. Ele tentou forçar as pernas, mas elas pareciam tão sem vida quanto os olhos de Megan – Davi...

Ela virou o rosto em direção ao mar, fazendo Davi arquejar. Ele seguiu seus olhos e, se era possível, sentiu seu pânico aumentar.

Havia uma criança ali, mais perto do mar do que Davi julgava ser seguro. Os cabelos castanhos claros revoavam em seu rostinho claro, enquanto seus olhos estavam fixos no nerd. E então o pequeno se virou para Megan, que começou a caminhar até ele.

Se o coração de Davi estava disparado, naquele momento parou. Sem voz e sem força, ele começou a se arrastar pela areia fria, enquanto observava a namorada erguer a criança nos braços e começar a caminhar diretamente para o mar. O rostinho de bebê apoiado no ombro dela, o encarando pelo meio dos cabelos esvoaçantes.

_ Não... – foi um sussurro fraco, enquanto os pés dela tocavam a água e o vestido começava a flutuar – Não...

Uma onda quebrou, fazendo-a ficar submerda até os joelhos. A criança se agarrou mais a ela, enquanto ela se virava uma última vez para Davi. Ele viu uma lágrima escorrer pelo rosto dela, apesar da distância.

_ Não... – a água estava na altura da cintura – Não. – a onda atingiu as costas da criança – Não. – a onda os derrubou – NÃO. NÃO. NÃO.

_ Davi, Davi. Acorda cara, acorda. – ele abriu os olhos, encarando o teto do quarto. O rosto de Vicente em seu campo de visão, preocupado – Acorda.

Ele sentou, ainda arfando, e observou que o quarto estava com todos os concorrentes, cada um em seu pijama e com cara de sono.

_ Você tá bem? – Manuela se abaixou ao lado de sua cama, e ele assentiu sem convicção.

_ Você estava gritando muito. – contou Ernesto.

_ Gritando o que?

_ Você chamou a sua mãe e a Megan, e gritou “não, não” umas cem vezes. – resmungou Danilo, coçando os olhos – Acho que até a Megan e sua mãe ouviram, lá da casa delas.

_ Dá um tempo Danilo. – mandou Hanna, enquanto o rapaz dava de ombros.

_ Você tá bem mesmo? – perguntou Vicente, e o nerd assentiu.

_ Acho que tive um pesadelo. – despistou, engolindo em seco.

_ Que coisa mais marica. – Zac riu entre dentes, enquanto todos os fuzilavam – Bom, eu vou dormir. E se não quiserem fazer o mesmo, melhor. É menos concorrência para mim.

_ Acho que ele tá certo. – comentou Davi, quando o rapaz saiu – Eu to bem pessoal, de verdade. Podem ir dormir.

Um a um, todos deixaram o quarto e os companheiros retornaram às suas camas. Davi disse que iria lavar o rosto e se trancou no banheiro. Se apoiou na pia, encarando o espelho e vendo as lágrimas aparecendo.

Decidiu tomar um banho gelado, tendo certeza que não conseguiria fechar os olhos sem ver Megan sumindo no mar.