Broke escrita por Esther, Esther Alves


Capítulo 4
4 - Breaking


Notas iniciais do capítulo

Oie, babys. Mais um, yep. Logo, logo, atualizarei. Finalmente!
Beeiju >.



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Breaking The Habit
Memórias consomem
Como feridas abertas
Eu estou me isolando de novo
Vocês supõem
Que eu estou salvo aqui no meu quarto
A menos que eu comece de novo
Agarrando minha cura
Eu tranco firmemente a porta
Eu tento recuperar meu fôlego de novo
Eu machuquei muito mais
Do que qualquer outra vez antes
Eu não tenho mais opções de novo


Capítulo 4  — Breaking

 

Sorrir não faria-me sair desse abismo. Não tiraria-me da escuridão. Não faria parar de doer. Nada faria.

Apenas seria atormentar-me mais, seria distorcer a realidade. Criaria uma ilusão, levando embora a pouca sanidade que ainda possuía.

Como uma alucinação dolorosa.

E eu definitivamente não precisava de algo para torturar-me ainda mais.

— Pare de dizer asneiras, Bonasera. — cuspi as palavras rispidamente, soltando-me de seu braço.

Percebi que ela iria comentar algo, porém decidiu dizer outra coisa:

— Eu irei acompanhar-lhe para indicar sua sala, e mostrar-lhe o resto. — falou, dando um suspiro.

Não respondi, apenas esperei-a ir à frente. Ela entrou no Departamento e a segui, passamos pelo corredor que dava acesso às salas, mas dessa vez havia pouco movimento, pois ainda era cedo. Ela entrou na "sala de descanso", como a chamavam e tirou o jaleco sujo, jogando-o num cesto. Pôs um saco em cima de uma mesa de vidro, e despejou café em uma xícara, entregando-me. Sentou-se na mesma cadeira que fez o curativo em mim e mirou-me.

— Ficará em pé? — deu de ombros.

Suspirei e sentei-me no sofá de couro preto.

— E então, qual o real motivo de ter transferindo-se para cá? Não acredito que seu emprego no FBI seja ruim de alguma forma. — comentou, irônica enquanto mordia um pedaço de biscoito.

— Isso é assunto particular. — respondi, ríspido, bebericando do café.

—  Você quer algo, não é? — trinquei os dentes com o maldito costume de ela conseguir saber o que se passava.

Arqueou a sobrancelha.

— Algo importante, uh. — ela murmurou. — Mas que raios poderia ter de importante aqui? Aqui ninguém tem um passado obscuro para você querer desvendar, Taylor. — ela riu.

Não respondi novamente, apenas beberiquei o café, encarando-a.

Eu também gostaria de saber, Bonasera. Gostaria de saber que raios há de importante para ela aqui.

— Vai deixar-me falando sozinha, senhor-todo-poderoso? — revirei os olhos.

— Eu não tenho porque respondê-la. — respondi, sarcástico.

— Ok. — deu de ombros. — De qualquer forma, não interessa-me saber o que procura. É problema seu mesmo. — levantou-se. — Vamos, vou mostrar-lhe o resto do Departamento.

Assenti, entregando-lhe a xícara e a seguindo. Ela mostrou-me as salas - praticamente todas de vidro -, os escritórios, o laboratório criminal e todas as outras extensões do Departamento. Explicou-me como funcionava as investigações aqui, e que diferente do FBI, investigavam de tudo, desde acidentes até homicídios.

— Todos os investigadores que atuam na cena do crime são detalhistas, sem exceção. — franzi o cenho. — Os casos nem sempre são fáceis de se resolver, temos que ter uma paciência infinita para isso. — ela dizia quase como se sentisse dor com isso. — É, eu tive muito trabalho com isso. — deu de ombros. — Bom, vocês Agentes pensam muito bem antes de agir, tudo é minunciosamente calculado, não é? Aqui também precisamos fazer sempre uma investigação detalhista, sem nenhum erro, porque senão acabamos como estamos hoje. — fez uma careta.

—  O que fizeram? — questionei-lhe, a fitando.

— Antes de Zachary, digo, Ian Howell assumir o cargo, estávamos muito bem. Éramos uma das melhores equipes de investigação, contudo, quando ele foi enviado para cá, as coisas começaram estranhamente a dar errado. Parecia não saber o que fazia. — franzi o cenho.

— Por que não contou isso quando lhe perguntamos o que sabia? — falei, entredentes.

— Não achei necessário. — deu de ombros.

Respirei fundo, decidindo não respondê-la. De qualquer forma, sabíamos que Ian Howell era um mafioso, jamais conseguiria exercer a função de investigador. Realmente, já havíamos comprovado isso, não foi uma novidade saber que ele deixou a equipe de mal a pior. 

— Terei que aturá-la sempre? — questionei, massageando as têmporas.

— Serei sua parceira, Taylor. — eu quase gemi em desgosto ao saber disso. — Trabalharemos juntos o tempo todo.

Que ótimo. Agora terei mais uma dor de cabeça, pior que Melissa.

— Stella, bom dia! — ouvi a voz animada da ruiva, Darah, senão engano-me. — Oh, senhor Taylor! Que maravilhoso vê-lo! — ela sorriu abertamente. — Estou feliz que esteja aqui! É realmente muito bom revê-lo!

— Ok, Darah, já chega. — revirou os olhos. — Reúna todos no laboratório, têm que conheceram o nosso novo chefe. — sorriu, irônica.

— Oh, é verdade? O senhor trabalhará aqui? — assenti. — Deus, eu não acredito! Que ótima notícia! Trabalharei com o melhor detetive do país! — ela deu um abraço em Bonasera, rindo. — Oh, é mesmo! Tenho que ir avisar a todo mundo! Senhor Taylor, com licença, nos veremos em instantes! — saiu, apressada.

Arqueei a sobrancelha para Bonasera.

— Ah. — riu. — Darah é assim mesmo, bem excêntrica.

— Percebi. — falei, irônico.

— Acostume-se, Taylor. As pessoas aqui são bem exóticas. — riu ainda mais.

Apenas a fitei, sem respondê-la.

— Ah, falando em pessoas exóticas, aí está ela. — observei a figura de quem Bonasera referia-se e tive uma grande surpresa.

— Mac, meu amigo! — ela sorriu e jogou-se em cima de mim, abraçando-me com força.

— Josephine Danville. — murmurei, franzindo o cenho.

— É Jo, sabe que odeio quando chamam-me de Josephine. — ela disse, contra meu ouvido. — Como eu senti sua falta, faz tempo que não nos vemos... — suspirei e passei os braços por seu corpo.

— Realmente. — afirmei, afastando-a de mim.

— Há tantas coisas que quero saber, Mac. — Josephine sorriu. — Como você está? — suspirei profundamente.

Havia alguns anos que Josephine e eu não nos víamos, apesar de mantermos contato.  Ela sabia de muitas coisas. E falar delas incomodava-me profundamente. Ainda doía.

— Há coisas que é melhor que você não saiba. — falei, friamente.

— Realmente, temos muito o que conversar. — Danville falou, pondo a mão em meu ombro.

— Poderemos fazê-lo em outra ocasião, agora terei que apresentar-me aos demais. — murmurei, com a frieza que costumava acompanhar-me.

— Apresentar-se?

— Ele é o novo chefe, Jo. — Bonasera respondeu, revirando os olhos.

— Seremos parceiros novamente, como no passado! — Josephine falou, sorrindo.

— Você já teve essa infelicidade? — Bonasera perguntou, irônica.

— Sofrimento? — riu. — Claro que não, trabalhar com o Mac é a melhor coisa do mundo, acredite. Ele não é só meu parceiro, Stella, é meu melhor amigo. 

Bonasera olhou-me como se duvidasse.

— Estamos falando da mesma criatura desprezível? — revirei os olhos.

— O que fez a Stella para ela ter uma imagem tão ruim de você? — murmurou, rindo. — Bem, Tells, o Mac Taylor que conheço é maravilhoso!

— Ah, sim. Ele faz questão de ser insuportável comigo, Jo. — resmungou, sarcástica.

— Como se você não fosse intragável, não é? — respondi, da mesma maneira.

— Intragável é você, seu prepotente opressor!  — disse, irritada.

— Impertinente detestável.  — retruquei, revirando os olhos

Fuzilou-me.

— Carrasco tirano.  — resmungou baixo.

— Demente maçante.  — falei com escárnio.

Ela abriu a boca como se estivesse ofendida, o que me satisfez muito.

— Deus, o que há com vocês? - Josephine riu.  — Onde está a Stella divertida e o Mac reservado que eu conheço?

— Como posso me divertir com alguém me chamando de
louca?  — fez um bico.

Realmente, ela ficava bonita quando juntava os lábios.

Franzi o cenho com esse tipo de pensamento. Que raios eu estava pensando?

— Não provoque então.  — falei, revirando os olhos.

— Ah, cala a boca!  — resmungou.  — Vamos logo até a porcaria do laboratório para apresentar esse ser aos outros!  — falou, saindo em passos duros.

— Por que está agindo dessa forma com Stella? Você nunca implicou com nenhuma de suas parceiras de equipe.  — Josephine perguntou.

— É divertido irritá-la.  — falei, zombeteiro.

—  E não é comum essa reação dela, ela quase nunca se altera com brincadeiras. 

Bonasera realmente detestava-me, então. Não que isso importasse-me, contudo, era incomum que minhas parceiras de equipe se desentendessem ou discordassem de mim. Que seja, minha relação com Bonasera não afetaria em nada meu rendimento no Departamento. Mas é conveniente nos suportarmos para que a parceria que estamos iniciando siga em frente. 

Josephine guiou-me até o Laboratório Criminal, onde todos estavam reunidos, ela juntou-se a eles. Esperavam que eu iniciasse minhas palavras.

— Sou o Detetive Taylor, Supervisor Chefe do FBI e da polícia de Nova York. — falei, duramente. — Apresentem-se. — ordenei.

— Stella Bonasera, detetive supervisora. — resmungou, fuzilando-me.

— Josephine Danville, detetive supervisora. — sorriu.

— Darah Johnson, estagiária de criminalística.

— Rachel Lesman, perita assistente. — sorriu.

— Daniel Messer, detetive.

— Donald Flack, detetive em homicídios.

— Sheldon Hawkes, médico legista e detetive.

— Aiden Burn, detetive. (eu decidi deixar a Aiden viva)

— Lindsey Monroe, detetive.

— Sid Hammerback, médico-chefe legista.

— Adam Ross, técnico de laboratório.

— Jéssica Angell, detetive.

— Peyton Driscoll, médica legista.

Após todos apresentarem-se devidamente, esperaram que eu desse prosseguimento.

— Não estou aqui em vão. — iniciei, duramente. — O título de melhor não veio dos céus até mim. Foram anos até construir a imagem que prezo tanto, e faço de tudo para mantê-la impecável. Eu não treino qualquer equipe, não ponho minha carreira à prova por qualquer um, considerem-se sortudos por esse feito. Estou disposto a treiná-los para que tornem-se os melhores, contudo, não admito falhas. Os melhores não falham. Até hoje vocês o fizeram, por isso estão na posição inferior, em decadência. Esforcem-se para sair dessa imagem desprezível que criaram aos olhos de todos, e eu os transformarei na melhor equipe que passou por mim.  — bati na mesa que estava em minha frente, como se fosse uma sentença.

Observei a expressão de cada um. Uma mistura de surpresa e admiração. Internamente, senti-me satisfeito, eles haviam capitado o que eu falara. Eles começaram a bater palmas.

Mas meu foco foi o rosto de Bonasera, ela olhava-me com a boca entreaberta, os lábios projetados para frente e olhos serenos. Ela estava fitando-me como se a culpa estivesse sobre ela. Mas culpa de quê?

Fitei seus olhos para ver se encontrava algo que dissesse-me que raios de culpa ela estava sentindo e porquê ela ficaria daquela forma.

Seus olhos não estavam límpidos, como eram, estavam enegrecidos, com um brilho escuro. Ela havia feito algo ruim. Sim, só poderia ser. Bonasera não expressava sentimentos ruins em seus olhos. Pareceu despertar de seu transe, e seus olhos voltaram a resplandecer a pureza novamente. Sua expressão fechou-se ao perceber que eu a encarava. Dei um sorrisinho de escárnio e ela bufou.

As palmas cessaram-se, e eu foquei novamente nos detetives.

— Espero que tenham absorvido o que falei, e que cumpram. — finalizei, rigidamente. — Voltem às suas funções.

Eles dispersaram-se, sobrando apenas eu, Bonasera, Josephine, a senhorita Johnson e o técnico do laboratório.

— Bonasera, venha comigo. — chamei-a. — Senhorita Johnson separe todos os casos que ficaram pendentes até hoje, Danville traga-me todos os que vocês estão investigando, irei analisar todos.

— Sim, senhor Taylor. — sorriu.

— Tudo bem, Mac. — murmurou Josephine.

Ambos saímos do laboratório ao mesmo tempo. Bonasera e eu nos direcionamos ao meu escritório - o mesmo que Ian Howell usava. Observei o escritório, em tons de marrom e creme. Uma parede de vidro separava o escritório da sala de descanso. Na lateral, fixada à uma parede branca, havia uma estante cheia de livros, papéis e outras parafernálias. Ao lado do estante, duas poltronas marrons e uma mesa redonda ao centro. Uma mesa maior, retangular, continha um notebook, um relógio digital e um objeto peculiar de decoração - um falcão negro. A cadeira-mestre de couro marrom de posicionada entre a mesa de escritório e uma mesa de vidro, esta tinha várias bebidas alcoólicas, uma cesta cheia de diferentes tipos de chocolate, um recipiente de vidro contendo doces, uma cesta de frutas, um conjunto de porcelana para café, uma cafeteira e por último uma cesta de pão. Os sofás de couro preto ficavam ao lado da janela de vidro, que refletiam parte da cidade de Nova York, e a Televisão ficava fixada à parede de vidro que dividia o escritório com a "sala de descanso", havia ainda puff's e outras duas poltronas de madeira.

Sim, sou perfeccionista ao extremo. Contudo, o escritório havia agradado-me e quem o havia decorado, possuía dom para decoração.

— Acabou a inspeção, Taylor? — ouvi a voz de Bonasera soar irônica. — Espero que tenha gostado da decoração, tive muito trabalho para fazê-lo. — resmungou, sentando-se em uma das poltronas de madeira.

— Realmente, não está nada mal. — comentei e vi seu sorriso.

— Obrigada, mas eu não mudaria, mesmo se você não gostasse. — cruzou os braços.

— Deveria manter o resto do Departamento organizado. — murmurei, sentando-me à sua frente, em uma das poltronas de couro marrom.

— Manter o Departamento organizado é quase impossível. — resmungou. — Eu já tentei várias vezes, mas ninguém consegue organizar-se. A começar pelo corredor, como nos aglomeramos o tempo todos, acaba sempre pior. 

— Começaremos distribuindo as funções. Cada um terá seu encargo concreto, em exceções, farão outras atividades. — falei, duro.

— Todos têm suas funções, por que distribuí-las novamente? — disse,  sem entender.

— A seu exemplo, a senhorita é detetive supervisora, auxilia meu trabalho, supervisionando os outros detetives e atua em campo, quando há investigação. Porém, teve que liderar a equipe inteira sozinha, o que não é sua função. — expliquei-lhe, revirando os olhos. — Para que se organizem, é preciso coordenar as funções precisas de cada um.

—  Certo. — assentiu. — E depois?

— Trabalharemos em equipe para limpá-lo, organizá-lo e mantê-lo. — murmurei. — Casos arquivados, pendentes e em andamento serão separados. Irei analisar todos, e os que puderem dar seguimento, o faremos. 

— Ok. — sorriu. — Conte comigo. 

Fitei seus olhos e quis sorrir, porém não o fiz. Eu não o faria, nunca.

(...)

Após uma semana, conseguimos organizar o Departamento de forma geral. Desde as atividades às janelas de vidro quebradas.  A equipe do Departamento estava empenhando-se para fazer o melhor. Realmente, um ótimo trabalho havia sido feito e isso deixava-me satisfeito.

Devo admitir que nunca havia visto uma equipe tão bem perspicaz. Realmente, a falha mais grave era a falta de um bom treinamento. Christine estava redondamente enganada quando dizia que equipe CSI era incapaz, eles estavam saindo-se melhor do que muitas equipes que treinei no FBI.

Contudo, nesta semana eu estava tão centrado em resolver os problemas do Departamento, que havia esquecido-me de investigar sobre a possível relação entre eles e a máfia. Parecia que minha suspeita tornava-se cada vez mais infundada, todavia, havia algo. Eu tinha plena certeza. 

Bem, algo dizia-me isso. Apesar de não basear minhas ações em intuição, dessa vez, somente dessa vez eu teria que acreditar nela.

Inferno, eu deveria estar concentrando-me na investigação sobre Miguel Somers, mas uma simples intuição fez-me deixar temporariamente meu cargo no FBI para simplesmente treinar uma equipe que estava abaixo do meu Nível. 

O que eu não faria por ela? Nada, porque eu faria exatamente tudo. Iria até o inferno se fosse preciso para achá-la. 

Suspirei pesadamente. Realmente patético.

— Com licença, senhor Taylor. — ouvi a voz gentil de Darah e a fitei.

— Entre, Darah. — após tanta insistência por parte dela, eu acabei habituando-me a chamá-la pelo próprio nome. 

— Trouxe seu café, como sempre! — sorriu entregando-me a xícara de porcelana. 

— Certo. — murmurei, bebericando-o.

— Uh, senhor Taylor, sem ser inconveniente posso fazer-lhe uma pergunta? 

— Já está fazendo uma. — respondi, irônico e sua face tornou-se vermelha.

— Bem, outra? — sorriu, visivelmente sem graça.

— Fale, só não garanto que obterá a resposta. — murmurei, seco.

— O senhor, bem, é casado? — aquela pergunta incomodou-me profundamente. — Digo, porque usa aliança. 

Fitei a aliança de ouro grossa que usava em meu dedo anelar. Eu já a usava há tanto tempo que dificilmente sairia de meu dedo.

Porém, aquele assunto era proibido. A ferida que o sustentava ainda estava profundamente e dolorosamente cravada com raízes presas em meu ser. E nunca pararia.

Suspirei pesadamente e Darah desviou o olhar, vendo que não obteria uma resposta de meus lábios.

Porque a resposta seria dolorosa demais.

— Eu sinto muito. Posso ir, senhor? — perguntou, baixo.

Apenas assenti e ela saiu. Depositei a xícara na mesa de madeira e levantei-me, observando Nova York através da janela de vidro.

Tudo o que existe deve quebrar. 

Todos que possuem vida quebram-se. E os que não possuem, os cacos cortam a carne podre. 

A carne podre que decompõe-se lentamente, as feridas abertas que os cães lambem. 

Que as pessoas pisam.

Cadáveres que deveriam estar a sete palmos do chão. Que deveriam estar com terra obstruindo cada artéria.

Contudo, cadáveres andam, trabalham, misturam-se com as pessoas vivas e fingem que são parte delas. Quando na verdade não possuem nada, além de um corpo podre e sem vida. 

Mas as pessoas vivas não percebem. Elas não podem. 

São cegas demais, são estúpidas demais.

Estúpidas a ponto de amarem um cadáver. Sim, ainda criam a maldita esperança que ele ressuscite, que as infecções se curem e o que órgão oco volte a bater.

E morrem acreditando nisso. Essa é a vida. Cruel e medíocre.

Felizes são os que podem morrer, sem virarem mortos-vivos.

E eu nunca fui feliz.

Ouvi batidas na porta e logo Bonasera surgiu.

 

 — Taylor, tem uma... — antes que Bonasera pudesse dizer, Whitney surgiu na porta com um sorriso.

— Whitney? O que faz aqui? — perguntei, arqueando a sobrancelha.

— Eu vim para lhe entregar os papéis que você pediu e ver você também. — ela entrou e Bonasera fez uma careta.

— Melissa que deveria trazê-los. — afirmei, franzindo o cenho.

—  Eu sei. — revirou os olhos. — Mas eu queria te ver, já que quase nunca você tem tempo para mim. E aproveitei a oportunidade. — deu de ombros.

Respirei fundo, indicando a cadeira para ela sentar-se.

— Gostaria de beber algo, Agente Whitney? - Bonasera falou numa voz de desdém.

— Claro, detetive. Um café seria ótimo. — Christine respondeu no mesmo tom.

— Tudo bem. — saiu, balançando a cabeça.

— Sabe que não deveria ter vindo, Christine. — falei, ríspido.

— Ah, meu amor... Eu estava sentindo sua falta. — ela disse, num tom manhoso e isso me fez revirar os olhos. — Você sempre está tão ocupado com o CSI. Nunca recebi uma ligação sua desde que começou a trabalhar aqui, nem mesmo um "como você está?". Nada. Parece até que você não se importa com o que temos. — ela disse, irritada.

— É o meu trabalho, Cristine. Não tenho tempo para discussões amorosas. - falei, duro.

— Não é discussão amorosa, Mac! Eu só queria um pouco da sua atenção! — respirei fundo, tentando manter a calma. — É tão difícil assim ao menos dedicar um pouco do seu tempo pra mim? Eu sempre tento te agradar, fazer de tudo por você, e nem ao menos a sua atenção eu recebo. Eu gostaria que se importasse mais comigo, não estou pedindo declarações, só seja mais atencioso, afinal eu sou sua namorada há quase sete anos.

— Está bem, Christine. — falei, irritada. — Farei o possível para dar-lhe um pouco de atenção. — ela sorriu abertamente.

Veio em minha direção e abraçou-me. Respirei fundo, abraçando a de volta e dando alguns tapinhas em suas costas.

— Obrigada! — ela disse, animada. — Obrigada, meu amor... — Christine cobriu meus lábios e enlaçou meu pescoço.

— Aqui es— ouvi a voz de Bonasera na porta e logo ela arqueou a sobrancelha, e me olhou com uma expressão de sarcasmo.

Segurei os pulsos de Christine e a afastei de mim, abruptamente. Ela olhou-me, confusa e digiri-lhe um olhar irritado.

— Christine, que raios está pensando? — perguntei, friamente. — Já não lhe disse que não aceito isso em meu ambiente trabalho, inferno? — murmurei, irritado.

— Foi por impulso, seu estúpido, eu estava sentindo sua falta. — ela respondeu, irritada. — Está fazendo um escândalo por pouca coisa!

— Já disse e não vou repeti-lo. Sabe que não deve misturar as coisas, Whitney. — retruquei, ácido. — Volte ao trabalho, preciso analisar os papéis que me entregou.

— Claro, chefe. — respondeu, sarcástica. — Quando acabar seu período de autoridade, não esqueça-se que temos de jantar juntos. — ela sorriu, irônica.

— Não esqueço de meus compromissos pessoais, Whitney. — respondi, seco. — Agora volte.

— Está bem. - falou, irritada. — Ah, mesmo que seja um estúpido, eu amo você. — ela deu-me um beijo na bochecha. — Até breve, detetive. Desculpe pelo o que viu. — falou friamente e saiu.

Suspirei irritado e massageei as têmporas. Christine sabia o quão irritado eu ficava quando ela misturava o profissional com o pessoal. Isso eu realmente não tolerava.

— Parece que nem com sua esposa você deixa de ser um carrasco. — Bonasera comentou irônica e entregou-me a xícara de café.

— Você realmente só faz comentários inúteis, não é? - revirei os olhos. — Não que seja do seu interesse, mas Christine não é minha esposa. — retruquei, bebericando a xícara de café.

— Pelo jeito que é grudenta, achei que seria. - deu de ombros. — E realmente não me interessa saber de seus relacionamentos, ainda mais com pessoas desse tipo. — arqueei a sobrancelha.

— A que se refere? — questionei, irônico.

— Pessoas enjoativas e pegajosas, como sua namorada, ou seja lá o que ela for sua. — riu, mostrando a arcada dentária branca.

— Eu poderia defendê-la ou até discordar, se não fosse um veredito. — beberiquei mais um gole do café. — Whitney e Melissa às vezes dão-me nos nervos de tanta pieguice, é quase intragável. — eu comentei, sarcástico e ela sorriu mais, quase como se não acreditasse no que havia dito.

— É estranho ver você comentando algo, sem ser infeliz no comentário. — ela riu irônica e ficou encarando-me, como se devesse ou não fazer algo.

— Fale, só garanto que certamente não obterá a resposta. — murmurei, entendiado.

— Por que você não gosta de sorrir? — acabei ficando surpreso com sua pergunta, realmente esperava que perguntasse qualquer outra asneira.

Fitei o nada por longos minutos. Eu poderia não respondê-la, poderia ignorá-la, isso não faria diferença. Contudo, algo no olhar dela me fez querer responder a pergunta.

— Eu não tenho motivo para fazê-lo, seria algo falso. — respondi-a.

— Claro, se você sorrisse sempre, não seria tão especial. - Bonasera murmurou e eu franzi o cenho.

— O que há de especial? — questionei-lhe.

O que há de especial em mim? Nada.

— É sincero. — ela disse, como se fosse óbvio. — Você quase nunca o mostra para não demonstrar o que está sentindo, não é?

— Eu não sinto nada, Bonasera. — falei, seco. 

— Nada? — murmurou, incrédula. — Como nada? Todo mundo sente algo! É impossível não sentir nada!

É impossível para quem está vivo, cadáveres não possuem sentimentos.

— Eu não posso sentir, Bonasera. — falei, gélido, sentindo meu peito doer.

Bonasera arregalou os olhos e aproximou-se de mim, invadindo meu limite, ficando tão próxima que sentia sua respiração bater contra minha face. Pousou seus olhos nos meus e eu senti aquela maldita paz. Sim, eu sentia aquilo. Eu poderia ficar ali encarando-a por horas, porque somente olhando em seus olhos eu perguntava-me se não poderia sentir aquilo para sempre.

E eu não poderia. Nunca.

Eu jamais poderia roubar aquela paz.

— Você sente isso... — ela sussurrou, soltando uma respiração pesada contra meu rosto. — Você sente, não é? 

Fechei meus olhos e respirei fundo. Sim, eu sinto. Sinto tudo.

Quando abri meus olhos, vi os seus brilharem. Um brilho acolhedor.

Não a respondi, apenas afastei-me dela, indo em direção à porta do escritório. Contudo, ela segurou meu braço.

Por que raios essa mulher não deixa-me em paz?

— Responda, Taylor... — pediu, com a voz trêmula. — Por favor... Responda! 

Suspirei pesadamente.

— Não faça isso novamente. — virei-me para olhá-la. — Não faça-me sentir, porque isso me fará querer viver.

E eu não posso viver... Isso doeria mais do que a morte.

 


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Notas finais do capítulo

Well, babys!
O capítulo ficou bom? Quero suas respostas :3
Não se esqueçam de comentar.Não ousem sair daqui sem comentar, se não eu não posto, ruun...♥
Xoxo,:D