Herança de Sangue escrita por Brunorofe


Capítulo 10
Revirando o passado


Notas iniciais do capítulo

para me desculpar pela demora em atualizar a história, postarei mais um capítulo! Espero que estejam gostando!



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Mateus desceu as escadas chorando. Era muita coisa para absorver. Precisava sair dali. Janine descia atrás ao lado do Delegado Celso. Ele não viu necessidade em algemá-la. Chamou pelo rádio a equipe do IML. Precisariam confirmar se a criança achada por Janine era mesmo a filha da Kelly.

Na porta da casa de Mateus estava Jaime, em pé, esperando por ele. Mateus não estava com cabeça pra conversar com esse velho oportunista.

– Preciso falar com você, meu filho.

– Olha eu não sei quem é o senhor, mas se continuar me incomodando eu irei chamar a polícia.

– Pode chamar! Todos na cidade me conhecem. Pergunte a sua tia mesmo, quem sou eu.

– Não pode ser. Meu pai está morto.

Mateus entrou na sua casa, pegou o celular que estava sobre o sofá da sala e ligou para Mariana, no mesmo instante. Jaime ainda estava parado na porta.

– Tia preciso que venha aqui em casa agora!

– O que aconteceu, meu filho?

– É urgente. Por favor. – E desligou o telefone.

– Vai ficar parado aí na porta? Vamos, entre! Quero tirar essa história a limpo agora! Minha tia já está vindo.

– Ótimo.

***

Janine nunca havia se sentido tão humilhada em sua vida. Estava sendo presa, suspeita da morte de uma tia que tanto amava, e de dois de seus grandes amigos. O peso em sua cabeça era enorme. Trouxera seus dois grandes amigos para morrerem nesta cidade maldita. Se não tivesse oferecido a casa, os dois estariam vivos, agora!

O Delegado Celso explicou que aquilo era uma prisão preventiva, apenas para desvendarem alguns fatos da morte. E ela era a principal suspeita.

– Entenda, Janine. Você chegou à cidade bem na hora da morte de sua tia. Hoje apareceu com a criança no posto de saúde, e pouco depois chamou a polícia pra abrir a porta em uma cena de crime. Não há como não te ligar ao ocorrido.

– Saiba que não esperava isso do senhor, e preciso ligar para minha advogada. Quero saber se ela já chegou na cidade.

– Claro, claro. Vou fazer tudo que eu puder aqui pra que sua estadia na delegacia não seja das piores. Meus melhores agentes já estão trabalhando no caso.

– Delegado, eu não tenho nada a ver com essas mortes. Alguém está tentando me prejudicar ou me fazer algum tipo de mal. E da forma mais cruel possível, atingindo quem eu amo.

Poucas horas depois, Andréia chegou afobada na delegacia. Estava até vermelha por correr tanto. Era muito competente, porém um pouco desastrada e tímida. Seu rosto branco estava completamente suado e vermelho, combinando com seu cabelo ruivo, que brilhava. Ela tinha quase a mesma idade de Janine, estudou direito na Universidade Federal, e se formou como a melhor da turma.

Janine e Andréia se conheceram uns três anos antes, quando Janine estava fazendo uma reportagem sobre corrupção e precisou de uma advogada pra dar entrevista sobre o assunto. Uma amiga de faculdade indicou Andréia. Tornaram-se amigas instantaneamente. E quando Seu Silva morreu ela assumiu os negócios de Janine, e passou a cuidar de tudo.

Esse seria seu primeiro caso na área criminal. Nunca havia entrado numa delegacia na vida. Estava nervosa. Suas mãos suavam. Sendo sincera consigo mesma, não fazia ideia do que fazer. Mas não poderia deixar isso transparecer, muito menos deixar sua amiga na mão.

***

Mariana levou menos de cinco minutos para chegar à casa de Mateus. Estava com medo do que a esperava. Mas precisava falar com Mateus. Explicar-lhe sua chegada rápida ao velório de Eliete, sua irmã tão amada. Jamais teria coragem de fazer algo contra ela.

Desceu do carro com tanta pressa, que nem se lembrou de acionar o alarme. Correu para a casa do Mateus. A porta estava aberta, mas é como se houvesse uma espécie de porta de vidro que não a deixava entrar. Ficou petrificada com a visão que teve. Sentado ali no sofá estava Jaime. O homem que fez Eliete sofrer tanto. Não era possível que esse aproveitador estava novamente na cidade, pensou ela.

– O que você está fazendo aqui, seu vagabundo?

– A senhora o conhece, tia?

– É uma longa história, Mateus. O que esse cachorro lhe falou?

– Ainda não falou nada. Mas estou vendo que vou precisar de um tempo pra ouvir bastante hoje!

– Esse crápula abandonou sua mãe, e sumiu do mapa. Nunca deu sinal de vida.

– Mas porque me falaram que ele estava morto? Porque mentiram pra mim?

– Pensávamos que ele havia morrido. Nunca mais deu um sinal de vida. Fizemos isso para te proteger, sempre prezamos pelo seu bem.

– Não vai falar nada, Jaime? Minha tia até agora está conseguindo me convencer de que você não presta.

– Por favor, me chame de pai. É isso que eu sou. Seu pai! Sua tia não mentiu. Eu abandonei todos, realmente. Mas foi pelo bem de vocês.

– Por favor, digo eu. Você acha que com essa historinha vai me comover?

– Meu filho, você precisa ao menos ouvir meu lado da história. Depois disso pode achar o que você quiser.

– Estou ouvindo.

– Mateus, não perca tempo com este crápula. Não acredite em nada do que ele disser! – Mariana estava transtornada.

– Tia, eu quero ouvir o que ele tem a dizer.

– Obrigado, meu filho. Bem, quando Eliete engravidou passou a ter muitos enjôos e começou a implicar comigo. Não só comigo, na verdade. Ela não podia ver ninguém. E nisso eu comecei a passar mais tempo fora de casa. E me envolvi com uns jogadores de poker barra pesada. Cada dia que eu me afastava da sua mãe, eu me afundava no jogo, e nas dívidas. Cheguei em um ponto em que não dava pra fazer mais nada. Não tive escolha, tive que fugir da cidade. Se não fizesse isso colocaria sua vida e da sua mãe em risco. Só vi seu rosto uma vez, no dia em que nasceu. E tive que partir. Para que vocês não pagassem por um erro meu.

– Não acredito que você seja tão covarde. Abandonou a gente por isso.

– Desculpe-me, meu filho. Mas eu não via outro caminho a seguir. Eles falaram que se eu não pagasse matariam você. Tive que fazer isso para te salvar. Porque eu te amo.

Mariana sabia que esse não era o motivo real do afastamento de Jaime, mas a história que ele acabara de contar era melhor que a verdade. Mateus nunca poderia saber o que aconteceu!

Jaime começou a chorar. Mateus sentiu um nó na garganta, mas não deixou transparecer. Levantou-se e abraçou seu pai. Passou os braços por cima do ombro, e apertou a nuca de seu pai com as mãos. Ao tirar as mãos da cabeça dele, tinha alguns fios de cabelo dele entre os dedos. Guardou-os discretamente no bolso.

Margarida chegou no mesmo momento na porta, que estava aberta, e foi entrando, perguntando por Janine. Estava à procura da amiga. Percebeu que estava atrapalhando algum momento íntimo da família, mas já era tarde. Já havia aparecido na porta.

– Ham, desculpa interromper, gente. Mas alguém sabe da Janine. Não a vejo desde cedo.

– Não, tudo bem. Já estou de saída. Eu volto em outro momento para conversarmos mais, Mateus.

Mateus deu de ombros, tentando demonstrar frieza, e virou-se para Margarida para responder sua pergunta, enquanto Jaime saia.

– Ela está presa! O Delegado Celso a levou hoje cedo!

– O que? – Perguntaram em uma só voz, e com o mesmo espanto, Mariana e Margarida.

– Mais cedo, a polícia encontrou um casal de amigos da Janine mortos na casa do tio Silva, o delegado parece ter certeza que foi ela. E levou ela presa. O povo saiu da casa um pouco antes de vocês chegarem.

– Sua prima foi presa injustamente, e você agiu de maneira fria assim? Como pôde? E por que só contou isso agora?

– Tia, não sei no que acreditar. Se ela for inocente, logo ela sairá de lá. Mas é muito estranho tudo ter acontecido depois que ela chegou. Janine deve ter surtado!

– Meu Deus, vou pra delegacia! Você vem comigo, Margarida?

– Claro! Posso ir com a senhora?

– Sim, sim! Vamos! E quanto a você, Mateus, estou muito desapontada. Você nunca pode virar as costas para a família! Eles são nosso principal ponto de apoio. – Mariana estava furiosa!

Assim que Margarida e Mariana saíram, Mateus correu para o carro. Acelerou para a capital. Precisava saber se era realmente filho de Jaime. Foi direto para um laboratório fazer um exame de DNA. O atendente do laboratório pediu vinte e quatro horas, mesmo com o pagamento extra feito por Mateus. Ele não tinha escolha. Aceitou e voltou para Sonhos.

***

Mariana e Margarida chegaram à delegacia junto com Andréia. Janine estava em uma cela isolada. Em Sonhos não havia presídio ou cadeia, então Janine permaneceria ali até que a Juíza decidisse o que seria feito com ela. Janine não sentia forças nem para se mexer, deitou no fino colchonete da cela, e ali permaneceu, imóvel.

O delegado Celso havia ido almoçar. Só havia um policial na delegacia. Era amigo de infância de Margarida. Deixou que ela, Mariana e Andréia fossem ao encontro de Janine.

– Janine, minha amiga, já vou ao fórum protocolar um pedido de Abeas Corpus pra te tirar daí. Sua prisão é injusta. Este delegado está cometendo um grande erro.

– Ah, amiga, eu nem tenho forças mais. O delegado tem razão. Está tudo ligado a mim. Foi só eu chegar à cidade, que a maldição voltou. Essas pessoas inocentes morreram por minha causa.

– Não acredito que você esteja acreditando em maldições agora, Janine.

– Pra ser sincera não sei mais em que acreditar.

– Está claro que alguém tem muita raiva de você, está tentando te prejudicar.

– Mas eu nunca fiz mal para ninguém! Por que alguém quer me prejudicar assim?

– Nunca se sabe! – Disse Margarida, entrando na conversa. – Aqui tem muita gente maluca.

O Delegado Celso chegou interrompendo a conversa! Já pedindo para que as três saíssem da carceragem da delegacia. Margarida e Mariana se despediram de Janine e foram embora. Andréia acalmou-a e disse que iria direto para o Fórum para tentar conseguir a liberdade da cliente e amiga.

***

– Vigário José, preciso me confessar!

– Agora, minha filha?

– Estou muito aflita, preciso que seja agora.

– Eu estava saindo para almoçar, minha filha. Não pode esperar?

– Vai ser rápido, padre! Estou meio que desesperada.

– Ok, vamos ao confessionário, assim podemos ficar mais à vontade.

Mariana era “muito católica”, como ela dizia, e sempre se confessava. Ajudava muito o vigário José na igreja. Era professora de catequese aos fins de semana, e sempre se dedicava a adornar a capela em época de festas. Na verdade ela fazia tudo isso por remorso. Era uma forma de pagar pelos “pecados” passados, que sempre a atormentaram.

– Tem certeza que não dá para ninguém ouvir o que falamos pelo lado de fora?

– Claro, minha filha. Além do mais quem viria à igreja na hora do almoço, além de você?

– Eu já entendi que o senhor está com fome, vigário José, mas preciso do senhor. – O riso no rosto deu lugar a uma expressão séria e carregada.

– Eu acho que alguém sabe!

– Sabe do que, minha filha?

– De tudo, Padre! Essas mortes estão ligadas à Janine. Alguém sabe de tudo e está levando adiante algum tipo de vingança doentia!

– Do que está falando, minha filha? Não estou acompanhando seu raciocínio!

Mariana teve que relembrar muitos fatos do passado que haviam ficado em segredo. A memória do Vigário José já não era mais a mesma. Eram muitas coisas que deveriam ter ficado enterradas. Eliete e seu Silva já estavam mortos. E enterrados com ele deveria ter continuado essas lembranças.

– Não se preocupe minha filha. Tenho certeza que não tem nada a ver. Só nós dois sabemos disso. Ninguém mais. Deve haver outra explicação. Vá para casa, e fique tranquila.

– Não dá pra ficar tranquila, padre! Para piorar tudo, o Jaime está de volta à cidade! O Mateus não pode saber da verdade!

– E como saberia, minha filha? Nem mesmo o Jaime sabe. Apesar de eu sempre ter incentivado vocês a contarem pra ele. Ele tinha o direito de saber, sobretudo agora que Eliete morreu.

– Não, padre! Jamais! Se depender de mim, nem ele nem Mateus saberão de nada.

– Essa é uma escolha sua. Eu não posso falar por estar preso ao sigilo do confessionário. Então cabe a você!

– E esse segredo vai morrer comigo. Se Eliete quis manter assim, vou respeitar.

– Incrível como vocês ainda tem medo do Marcos mesmo depois de morto.

– Não tenho medo dele. Só estou respeitando a escolha da minha irmã.

***

Andréia protocolou seu pedido no fórum. Porém só teria uma resposta no outro dia. A Juíza Karen estava fora da cidade. Havia ido à Capital resolver alguns problemas pessoais. Só voltaria no dia seguinte. Janine teria que dormir na cadeia.

Andréia foi para o hotel da dona Sônia. Não havia outra escolha. Conseguiu um quarto no fim do corredor. O Hotel tinha aquele formato de hotéis de estrada americanos, com quartos lado-a-lado e um corredor aberto, como se fossem pequenos apartamentos ligados, eles ficavam em frente ao estacionamento. Cada vaga em frente ao seu respectivo apartamento. O único quarto disponível ficava no fim do corredor, quase já ao lado da mata que cercava o hotel. Já próximo à estrada. Andréia não tinha escolha.

O céu se fechou rapidamente. Seria mais uma noite chuvosa. Andréia deitou na cama e adormeceu. Na cadeia, Janine escondia a cabeça embaixo do travesseiro. Não bastasse o medo de chuva, teria que passar a noite naquele lugar horripilante.

***

Mariana entrou em casa correndo e pegou o telefone. Digitou um sms: “Preciso te ver hoje! É urgente! Estou com medo!”. Selecionou um contato já salvo na agenda. Porém no lugar do nome, havia um asterisco.

Em menos de um minuto veio a resposta: “Está maluca? Já falei para não me mandar mensagens. Imagina se minha esposa pega o celular e lê isso? O que aconteceu?

Mariana se enfureceu pela forma que Jânio lhe respondeu, e enviou outro torpedo apenas falando para que ele deixasse pra lá, que não era nada demais. Na verdade ela estava angustiada. Precisava falar com alguém e ninguém melhor que seu futuro marido para conversar sobre qualquer assunto. Inclusive sobre o tema de sua confissão mais cedo. Na verdade já havia lhe contado tudo. Sabia que podia confiar nele. O vigário José achava que ninguém mais além dele e de Mariana sabiam daquilo.

Eles não tinham ideia de que mais alguém também sabia de tudo. E não imaginavam o que lhes aguardava. Mariana chorava na cama. Acabou adormecendo por ali. Jânio ainda tentou lhe ligar, em vão. Ela havia desligado o celular. Lá fora a chuva começava a ficar mais forte.

***

Andréia acordou com o celular tocando. Estava meio zonza ainda. No visor aparecia escrito número bloqueado. Achou estranho, porém atendeu.

– Alô? Quem fala?

– Se quiser viver, Você deve largar tudo e deixar a cidade. A Janine não merece seus serviços, e algo muito ruim pode te acontecer se você permanecer por aqui. Saia enquanto eu permito. Mas saia agora, você tem dez minutos.

– Quem está falando? Que tipo de brincadeira de mau gosto é essa? Vou te processar!

– Hahahaha! Acorda minha filha! Você só está viva porque eu deixei. Estou te dando a chance de sobreviver. Saia da cidade ainda hoje e não volte mais.

– Jamais deixaria minha amiga na mão. E esse tipo de trote com voz alterada não me assusta. Isso não teve graça nem naquele filme bizarro, quem dirá hoje.

– Você fez sua escolha. Poderia viver. Porém escolheu morrer com sua amiga usurpadora.

Andréia desligou o telefone. Estava com tanta raiva que quase quebrou o celular, mas imediatamente riu daquele trote. Estava faminta. Ligou na recepção e pediu o telefone de algum delivery. Do outro lado da linha dona Sônia riu. Sonhos não tinha lanchonetes com serviços de entrega. Disse a ela que no restaurante do hotel havia alguns salgados, e que o jantar já havia sido servido e por ter muitos hóspedes naquele dia, tinham acabado com tudo.

A advogada foi até ao restaurante do hotel. Pediu um salgado que estava na estufa. Não soube reconhecer o que era apenas olhando. Mas a fome estava forte. Decidiu comer assim mesmo. Na primeira mordida descobriu que era um cachorro-quente.

A chuva piorou. A luz piscou umas duas vezes. Andréia decidiu voltar ao quarto. Queria tomar banho. Estava precisando. Despediu-se da simpática dona Sônia, e correu ao quarto. A Recepção e restaurante ficavam em um prédio separado dos apartamentos.

Quando entrou no quarto, Andréia percebeu que estava encharcada por causa da chuva. Tirou a roupa ali mesmo e entrou para o banheiro. Ligou o chuveiro. A água estava muito quente. Logo todos os vidros ficaram embaçados. O barulho da chuva lá fora era tão forte que nem escutou o barulho da porta se abrindo.

Estava com sabão no cabelo e no rosto. Fechou os olhos para não arder. Enquanto isso a maçaneta da porta do banheiro girava. Andréia estava de costas para a porta, com a cortina do box fechada. Estava curtindo aquele momento relaxante, com a água quente nas costas. A ligação que recebera mais cedo ecoava em sua cabeça.

Colocou a cabeça sob o chuveiro, tinha que tirar aquele sabão todo. Enxaguou o cabelo, e estava tirando o sabão do rosto, quando se virou para o lado cortina do box, que já estava aberta. Ao abrir os olhos estava de frente para a pessoa que lhe ameaçou mais cedo pelo telefone.

Andréia se assustou. A pessoa estava toda de preto, com uma capa de chuva. Na mão havia uma faca, dessas de açougueiro. O grito foi automático, porém parecia que ninguém havia lhe escutado. Deu um pulo para trás e ficou encurralada na parede. O capuz não a deixava saber se seu agressor era homem ou mulher.

A figura encapuzada lhe acertou em cheio na barriga, com a faca, que estava afiadíssima, e entrou em sua carne como uma colher entra em um pudim. Andréia gritou novamente, desta vez de dor. Mas sabia que ninguém a escutaria com essa chuva. Tinha que fazer algo. Não poderia morrer tão facilmente. Sua mãe dizia que ela era uma batalhadora. Estava na hora de provar isso.

Ainda escorada na parede, Andréia tentava recuperar o fôlego, enquanto o sujeito retirava a faca de seu estômago e se preparava para lhe acertar com mais um golpe. A única coisa que conseguiu alcançar foi o frasco de xampu equilibrado na pequena janela acima de sua cabeça. Pegou-o e jogou com toda a sua força na cabeça de seu executor. O frasco estava cheio e aberto.

Com a pancada a pessoa de capa preta aparentemente ficou meio zonza, deu uns dois passos para trás, desequilibrada. Havia entrado xampu em seus olhos. Estava ardendo. Deixou a faca cair enquanto levava as mãos aos olhos para tentar limpar o excesso de produto e conseguir voltar a enxergar.

Foi a chance que Andréia precisava para correr. Saiu do banheiro e viu a porta do quarto aberta. O sangue escorria pela sua barriga. Mas não era hora de analisar o ferimento. Precisava sair dali. Ao chegar à porta do quarto percebeu que a chuva estava muito forte. Já estava tarde, o prédio da recepção estava trancado com as luzes apagadas, e um letreiro escrito “NÃO HÁ VAGAS!” aceso. Bateu desesperadamente na porta de dois quartos ao lado do seu. Ninguém abriu. Precisava sair dali. O desespero aumentava, o raciocínio diminua. Pensou em correr até a recepção. Mas era um espaço aberto. Seria pega, com certeza! Correu para o lado da rodovia. Talvez algum carro passasse e a ajudasse.

Cambaleou rumo à rodovia. Estava nua, descalça, e a chuva impedia que ela visse que seu assassino já estava atrás dela. Tropeçou em um meio-fio ao lado da pista. E caiu em uma das valas que foram construídas para o escoamento de água da chuva. A dor aumentava. A queda a fez ver estrelas.

Passava das duas horas, naquela noite chuvosa de dezembro. Um corpo feminino branco e nu jazia numa vala, perto da estrada que ligava a pequena cidade de Sonhos à capital. Os poucos carros que passavam pelo local não podiam ver que a jovem estava ali agonizando. Não havia forças para gritar, e cada movimento resultava em uma dor terrível. A chuva estava piorando. Trovoadas iluminavam aquela noite escura, e deixava os cachorros das fazendas próximas em alvoroço.

Por fim a jovem cansa de lutar. Era inútil. O sangue que escorria pelo corte em sua barriga se misturava à enxurrada e seguia se dissolvendo. Sua respiração cessou, depois de quase vinte minutos naquela situação, nua e sangrando sob a chuva, jogada ao chão. A dor havia passado. Tudo estava escurecendo. Não havia mais forças para manter os olhos abertos. Um trovão abafou seu último grito. Nem chegou a ver seu algoz chegando para conferir se o serviço estava feito.

Seu último pensamento foi a ligação que recebera. Deveria ter ido embora. Agora era tarde. Andréia estava morta. Cair na vala só aumentou seu sofrimento. O assassino observou de longe, sua agonia por quase vinte minutos. O corte na barriga era profundo, não conseguiu se levantar. A enxurrada forte impedia qualquer chance de se equilibrar e ficar de pé.

O Assassino se aproximou, mesmo sendo arriscado. Afinal estavam à beira da rodovia. Mas ele (ou seria ela?) precisava terminar o ritual. Com a faca afiada, aumentou o corte na barriga de Andréia, que começava no umbigo e ia até o externo. Pegou um saco plástico que estava em seu bolso, começou a arrancar e puxar cada um dos órgãos internos da pobre advogada. Levou quase cinco minutos para concluir o trabalho. Encheu dois sacos plásticos. Um foi usado para armazenar intestinos, fígado e estômago. No outro saco guardou o coração, pulmões e rins. Já estava ficando experiente naquele processo. A cada vítima nova, parecia aprimorar a técnica.


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Notas finais do capítulo

Vejo vocês semana que vem!



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