“Porque o mundo não é dividido entre especiais e comuns. Todos têm potencial para serem extraordinários. Contanto que você tenha uma alma e livre-arbítrio, pode ser qualquer coisa, fazer qualquer coisa, escolher qualquer coisa.”

Dois anos antes...

O Céu apresentava várias constelações conhecidas, naquela noite: Aquarius, e a constelação do Caçador, Orion. Era difícil ter noites como aquela: com o Céu limpo de nuvens – tanto de poluição como nuvens brancas – e estrelas pontilhando aquele azul, quase preto.

E ali, observando o Céu, estava um grupo de amigos.

— Bianca!

A garota de cabelos castanhos se despertou de seu devaneio.

— O que foi, Annabeth?

— Luke disse que poderíamos ir ver alguns pontos históricos, por aqui.

— Um passeio romântico entre vocês? – Questionou Bianca, sussurrando. Luke olhava distraidamente as estrelas.

Annabeth corou.

— Nós três. E-eu e Luke não temos nada.

— Se você acha...

— Mas a sua resposta?

Bianca observou que Luke brincava com os dedos de Annabeth, e ela parecia alheia à isso. Tanto quanto ele parecia.

Os cabelos loiros dela esvoaçavam, uma coroa dourada, contrastando com o Céu escuro. Como um Sol pela noite. E os olhos tempestuosos na cor cinza: a cor da sabedoria. Refletia bem quem ela achava que Annabeth era: sábia e radiante como o Sol. Como ela própria queria ser.

— Pode ser. – Falou, apesar de não querer segurar vela. – Mas agora, vou deitar. Boa noite. – Depois acrescentou: — Boa noite, Luke!

Ele pareceu despertar com aquele suave grito.

— Ah! Boa noite, Bianca.

A avó de Annabeth era londrina, e possuía aquela propriedade por ali. Era uma casa clássica no formato, mas recentemente pintada na cor creme. Por dentro, a casa possuía três quartos e um deles – o que Bianca estava – parecia ser feito das próprias estrelas quando um enfeite de teto luminoso girava na escuridão.

Bianca sempre gostou muito da avó de Annabeth: ela conhecia Bianca desde pequena e a tratava como se fosse a própria neta. Por vezes viu Annabeth ficar incomodada, apesar da avó tratá-la da mesma forma.

Após por um pijama, Bianca caiu de qualquer jeito na cama e dormiu, se acordando, o que pareceu segundos depois, com leves – mas audíveis – batidas na porta.

Tropeçando nos próprios pés, foi abrir a porta – observou no relógio, na cabeceira da cama, que haviam se passado apenas uma hora desde que deitou –, encontrando uma figura loura. Não era Annabeth, era mais sexy que ela. E tinha uma cicatriz no rosto. Luke.

— Lu... – Começou ela. Bom, considerando o fato de que ela foi interrompida por um beijo, não se importava muito. Mesmo assim, se afastou. – Muito estranho. O que foi isso?

Luke gaguejou, ficou vermelho e, por fim, disse:

— Posso entrar? Digo, no seu quarto?

Bianca hesitou, mas precisava saber o que acontecia. Se enrolou num robe – porque ela era chique. 'Tão pensando o quê? – e disse:

— Tudo bem...

Ele se sentou na cama, despenteou o cabelo com os dedos e hesitou antes de falar:

— Você tem que me ajudar.

Ela se surpreendeu. Um beijo e um pedido de ajuda. Filme de drama?

— Com o quê?

— Annabeth. Ela se recusa a dizer que está comigo! Inclusive para você. – Então ele estava ouvindo... – Eu quero que ela goste de mim como eu gosto dela.

Ele a beijou porque queria a ajuda dela para fazer outra pessoa que ele gosta gostar dele? Bianca ficou tonta. Que confusão!

— M-mas ela gosta de você, Luke. Por isso que eu vivia perguntando. Eu percebo. – Ela disse num fiapo de voz.

Ela virou o rosto como se tivesse levado um tapa. O lado da cicatriz ficou mais exposto para Bianca. Como Luke arranjara a tal cicatriz?

— Então ela finge muito bem para você. Tão falsa quanto qualquer um, Bianca. Annabeth pode ser sua amiga, mas não se engane: ela é egoísta e eu tenho certeza que, um dia, vai precisar fazer algo por ela própria e não hesitará em esquecer de você.

— Como assim? Claro que não! Você parece não conhece a Annabeth! – Disse Bianca, tentando não gritar. Se Luke havia ido até ali, com certeza Annie estava dormindo.

— Eu conheço. Você conhece. E se ela aparecer na tevê, as pessoa também a conhecerão. Mas conhecer alguém não é saber sobre alguém.

— Você não sabe coisa alguma sobre ela, de qualquer modo.

— Mas egoísmo não é coisa da Annabeth. É humano. E todos somos humanos, então, como não vamos saber?

— Você está magoado porque acha que ela não gosta de você! – Elevou a voz.

— Bom, você gosta, certo? – Disse ele, virado de costas para Bianca.

— Como assim? – Ela cruzou os braços, estava vermelha, mas dessa vez de raiva.

— De qualquer modo – Disse, se virando –, acho melhor você não ir conosco, amanhã. E esqueça o beijo.

E saiu.

Apesar de tudo, Bianca conseguiu dormir logo. Não havia pensado na conversa, mas, infelizmente, sonhado com ela.

♣

Pela manhã, ela evitou sair do quarto, como boa parte da tarde. Quando chegou a noite, Bianca ouviu a porta bater e finalmente saiu do quarto, para comer outra coisa que não fossem as barras de chocolate que tinha na mala.

— Bianca? – Ouviu uma voz chorosa. A voz de Annabeth.

Se virou rapidamente, com o susto.

— Annabeth? – Engoliu em seco. – Pensei que tivesse saído com o Luke.

— E-eu terminei com ele.

— Por quê?

— Eu não gosto dele. Não desse jeito.

— Aonde ele foi?

Annabeth não respondeu logo. Começou a respirar fundo, repetidas vezes. Bianca pode observar seu estado: cabelos grudados no pescoço e na testa, por conta do suor. Olhos um pouco vermelhos e respiração acelerada. Parecia que tinha acabado de sair de uma corrida no deserto.

— Embora.

— Por que você está chorando? Você disse que não estava apaixonada por ele. – Falou Bianca, tentando parecer calma enquanto bebia um copo d'água, mas decidiu segurar a mãe que estava no copo, para acalmar o tremor.

— Não é por isso. Ele... falou... algumas coisas para mim.
Bianca engasgou um pouco. Será que foram as mesmas coisas que ele disse à ela?

— Me conte como aconteceu.

Annabeth suspirou e seguiu em direção ao sofá, depois sentou. Bianca foi atrás, ainda apertando o copo de água na mão, e sentou em frente à Annabeth.

— Eu tinha saído para caminhar um pouco hoje de manhã, mas acabei me distraindo com os pensamentos. Quando voltei, encontrei Luke, ele me chamou para a gente sair e... despejei tudo em cima dele. Acho que estava mais que na hora. Eu já estava cansada. Sempre que alguém me perguntava sobre nós eu corava, mas não era vergonha porque eu tinha algo com ele. Era vergonha por ainda estar com ele, mas sem gostar dele. – Ela respirou. – Então ele falou que eu era egoísta e falsa. E falou de você.

Bianca engoliu seco, será que ele havia falado do beijo? Mas Annabeth continuou:

— Ele disse que tinha perguntado a você se você achava que eu estava apaixonada por ele. E que você tinha dito que sim. Ele disse que era falsidade minha fingir para você e não te contar que eu não o amava. E eu sei que é verdade, porque você é minha amiga. A única que eu tive depois de Thalia. Você e a Silena. Eu deveria ter te contado. – Nesse momento Annabeth já estava em pé, andando em círculos. – Desculpe por não ser sincera. Eu não quero fazer jus aos adjetivos que ele me deu.

Bianca suava. Annabeth não era a única escondendo algo. Mas de qualquer jeito, Luke que havia beijado Bianca, não ao contrário. Não havia nem durado, e foi só um selinho. Não iria ficar se culpando.

E Annabeth sempre queria ser perfeita e boazinha. Sem defeitos. Mas ninguém era desprovido de defeitos.

— Então, Annabeth, não lamente. Que tal tirarmos uma foto do e no Big Ben? – Sugeriu Bianca, sorrindo.

Demorou um pouco, mas Annabeth pareceu perceber que a amiga queria animá-la. A loura assentiu e deu um sorriso.