Ana escrita por Valentine, yashiichan


Capítulo 1
Um


Notas iniciais do capítulo

Olá! Esse capítulo foi escrito por mim, Valentine, e betado pela Yashiichan. Espero que gostem e deixem suas opiniões. Informações sobre o próximo capítulo estão nas notas finais. Beijão.



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O vazio era tudo o que eu lembrava da última noite, e, para a minha alegria, cada vez menos eu lembrava de meus sonhos.

– Você está bem?

Respirei fundo ao ouvir a típica pergunta matinal de minha mãe que entrava subitamente em meu quarto.

– Sim, mãe. Não precisa se preocupar.

Ela me abraçou como de costume e depositou um beijo no topo de minha cabeça.

– Não demore. Estou preparando o café da manhã.

A preocupação de minha mãe era justificável, apesar de desnecessária. Mesmo com os problemas que aconteceram há oito anos atrás, ela continuava com aquele medo constante de me ver em crise outra vez. Parecia que eu ainda tinha apenas nove anos de idade, como se todos os anos de tratamento psicológico não fizessem diferença para a minha atual força e maturidade.

– Está pronta para hoje? – Ela perguntou exatamente o que eu havia previsto enquanto admirava o grande prato de panquecas recheadas na cozinha, claramente em excesso para a minha pouca fome.

– Sim, eu acho. Vai dar tudo certo, não vejo a hora de dizer adeus ao William.

– Se você quiser pode continuar com as consultas e para quando achar que deve.

– Não precisa, mãe. Hoje é a minha última consulta trimestral. Se depender de hoje, serei liberada de uma vez.

O silêncio se estabeleceu por um instante enquanto eu mastigava calmamente e foi posteriormente quebrado pelo anúncio do aparelho de TV. Me assustei rapidamente e fixei a imagem do jornalista local que anunciava a notícia que, provavelmente, acabaria com o meu dia.

O relógio em meu pulso esquerdo confirmava meu horário marcado para a consulta, mas a recepcionista do consultório me impedia de entrar.

– Srta. Thompson, por favor, aguarde mais um pouco, o Sr. Plummer está com um paciente agora.

Revirei os olhos e fitei as letras prateadas na porta à minha frente que identificavam a sala de William Plummer. Contei de um a vinte mentalmente, perguntando-me como alguém poderia demorar tanto.

Ignorei o aviso anteriormente recebido e empurrei a porta, reconhecendo a sala familiar que me acompanhou nos últimos oito anos de minha vida. O carpete macio vermelho contrastava com as paredes beiges repletas de estantes de livros. Prateleiras espalhavam-se por todas as quatro paredes, acompanhadas por quadros e certificados nada modestos emoldurados.

– Ana! – Ele exclamou ao me ver entrar. – O que aconteceu? Porque entrou assim, sem nem mesmo anunciar?

Um redemoinho de imagens surgiu em minha mente e a possibilidade de encerrar de uma vez com todas aquelas consultas havia acabado de desaparecer.

– Ele voltou, William. O Tom está em Seattle.

William Plummer levantou rapidamente da poltrona onde estava sentado, com uma expressão apreensiva.

– Luke! – Ele voltou-se para o garoto que estava sendo atendido antes de mim. – Você pode ir agora. Continuamos no próximo mês, tudo bem?

O garoto de aparentemente quinze anos de idade se levantou e deixou a sala. Assim que a porta se fechou, William apontou para a poltrona de couro marrom, me fazendo sentar.

– Agora me conte. Estava tudo bem da última vez em que nos encontramos, o que aconteceu?

Levei minhas mãos à cabeça, espremendo os olhos e respirando fundo. Era impossível descrever o medo que crescia dentro de mim e me fazia temer o que estava por vir.

– Eu vi no jornal local hoje pela manhã. O Tom foi transferido para um presídio em Seattle.

– Ana, ele foi condenado a trinta anos de prisão. Do que está com medo?

– E se acontecer de novo, William? E se eu voltar a ter aqueles sonhos novamente?

William respirou profundamente, lamentando ter que voltar àquele problema de novo.

– Meu bem, nos últimos oito anos você aprendeu a controlar esse medo. Não esqueça de tudo o que passamos! O Tom, apesar de estar em Seattle, está em uma cela, muito distante de você.

– Eu não sei… Eu estava tão confiante. Essa notícia repentina me pegou de surpresa.

– Vamos fazer o seguinte… - Respondeu enquanto tirava alguns papéis de dentro da primeira gaveta ao seu lado. – Eu vou agendar consultas quinzenais para você a partir de hoje, tudo bem? Vamos trabalhar melhor esse seu medo.

Eu suspirei de olhos fechados. Só podia ser brincadeira. Estava tão perto de conseguir minha liberdade daquelas consultas, e, uma notícia como aquela destruiu tudo.

Qualquer pessoa poderia deduzir que Tom Meyer é o nome que mais me causa arrepios, mas, poucas se lembram do meu antigo problema com o traficante nacionalmente conhecido. Em maio de 2006, Tom era apenas o meu vizinho e babá nas horas vagas. Hoje, ele tinha uma longa pena presidiária pela frente. O pior de tudo isso é que fazer parte da história de Tom Meyer me fez não só ter uma série de problemas psicológicos, mas um sério problema em confiar nas pessoas. Não que eu seja antisocial. Tenho um bom relacionamento com as pessoas, mas amizades, daquelas que custam a separar – e, às vezes nem separam – eram praticamente missões impossíveis.

– Bom dia, Ana! – Recebi o cumprimento de Candace Mann assim que me sentei na mesa do refeitório.

Sorri amigavelmente enquanto observava as pessoas ao meu redor. Meu grupo amplamente eclético de convivê ncia escolar via em mim uma amizade que obviamente não era correspondida.

– Não vi você na aula de física hoje. – Candace comentou, atraindo a atenção de todos ali na mesa.

– Tive umas coisas para resolver hoje mais cedo, acabei de chegar, na verdade.

Todos voltaram a comer e a concentrar sua atenção apenas nas bandejas de lanche. Abri minha bolsa e comecei a rabiscar qualquer coisa numa página em branco de meu caderno, tentando escapar do olhar instigante de Candance sore mim. Seu olhar caramelado parecia buscar espaço para perguntar o que eu sabia que ela estava pensando.

– Você estava no William, não estava? – Ela sussurrou.

Respirei fundoe fixei meu olhar no tampo de vidro da mesa redonda. Candace Mann tinha uma típica expressão intimidadora para qualquer um. Longos cabelos ruivos e olhos caramelos que, para o meu azar, me viram no consultório de William Plummer há três meses atrás. A partir desse dia, a sobrinha do meu psicólogo tenta uma aproximação inútil comigo que não consegue resultado algum. Me pergunto se é apenas curiosidade para saber o real motivo de minhas consultas constantes ou se ela já sabe do meu caso e sente piedade.

– É, eu estava. – Respondi secamente.

– Porque você não gosta de conversar sobre isso? – Indagou.

Revirei os olhos, ignorando a pergunta. Ao ver minha reação, Candace mudou rapidamente de assunto.

O sinal tocou, me livrando do assunto constrangedor. Me levantei e caminhei para a próxima aula em meu horário, ignorando a rede de preocupações que me invadia naquele momento.

O caminho do corredor era uma das piores partes do meu dia.Pessoas conversavam e exibiam uma relação de amizade e carinho que eu enxergava apenas como falsidade. O egoísmo humano sempre me fez acreditar que vivo num mundo onde o que prevalece é a guerra por poder. Não acho que exista amizade, muito menos amor aqui. Qualquer que seja a relação, sempre há uma segunda intenção, um interesse. Seria ótimo não acreditar nisso, mas é impossível.

Entrei no laboratório de química e alcancei a minha habitual bancada. Ao meu lado, uma garota tinha a cabeça debruçada sobre o balcão e eu me perguntei se ela sentia alguma coisa. Quando o professor entrou na sala, a mesma levantou o rosto aparentemente inchado, fruto de lágrimas que rolavam de sua face. Ela levantou a mão direita e pediu para deixar a sala, permissão concedida pelo professor.

Sozinha em minha bancada, assisti enquanto o professor apontava para mim enquanto conversava com um garoto de rosto absurdamente familiar. De onde eu o conhecia? Seus olhos esverdeados eram diferentes o bastante para me fazer admitir que eu só os vira uma vez antes… mas, onde?

Ele caminhou em minha direção, sentando-se ao meu lado na bancada. Deduzi que ele fosse um aluno novo e que o professor tenha o instruído a sentar ao meu lado. Levantei meu olhar para o quadro negro e aguardei um cumprimento da parte dele. Mas ele não veio. O garoto se manteve em silencio durante toda a aula, sem nem mesmo olhar para mim. E eu não ousei em quebrar esse silêncio.

Tomei a liberdade de observar discretamente seus modos ao decorrer da aula. O jeito com que ele pegava no lápis, seu corte de cabelo social e seus traços faciais me causavam uma sensação nostálgica e intrigante. Eu sabia que o conhecia, sabia que ele não era novidade para mim.

Talvez fosse um antigo colega do primário? Isso explicaria o fato dele não ter me cumprimentado. Provavelmente não me reconhecera, ou reconheceu e lembrou-se da minha antiga fama de doente mental entre os meus colegas. Fechei os olhos por alguns segundos e relembrei o nome a face de cada um. Ele não fazia parte deles. Ele era, de fato, um estranho completo. Mas sua aparência familiar me intrigava de forma agoniante.

O sinal tocou novamente, me fazendo odiá-lo por ter causado aquilo em mim. A aula de química na qual eu não tinha prestado atenção alguma foi praticamente inútil. Me levantei e fitei o relógio no topo da parede da sala, contando os segundos para chegar em casa e cair na cama, me livrando de toda aquela exaustão e dando um grande adeus àquele dia que havia sido, definitivamente, horrível.

Os ventos sopravam um ar congelante. A madrugada de Seattle estava calma demais para uma noite de segunda-feira. Tudo estaria na mais perfeita ordem se gritos e gemidos não soassem pela rua. Todos aqueles ruídos vinham de um pequeno beco. Andei sorrateiramente naquela direção, sabendo que me arrependeria amargamente pelo que veria.

Tentei parecer invisível aos indivíduos que ali estavam, afinal, não queria ser taxada de intrometida, muito menos pervertida. Danificando minha visão, semicerrei os olhos na tentativa inútil de enxergar naquele lugar mal iluminado. Apenas aquele rosto masculino que eu conseguia ver me intrigava durante essa insanidade que presenciei. O rapaz caído ao chão demonstrava um pânico desesperado enquanto o outro o chutava constantemente. Vez ou outra ele o esmurrava com o punho direito, escondendo algo que parecia uma arma na mão esquerda. OS gritos da vítima me causavam calafrios e não pude conter um grito abafado quando o agressor de rosto familiar disparou uma série de tiros no corpo estirado.

Depois de longos segundos ali, o garoto virou o rosto na minha direção, mantendo seu olhar fixo em meus olhos. Meu corpo congelou e minha mente gritava para eu correr, porém eu ainda queria descobrir quem era aquela pessoa que me prendeu com apenas um olhar. Tentei me aproximar um pouco mais, quando o meu lado lúcido finalmente me alertou de meus atos e, logo em seguida, corri para longe dali, temendo o que poderia ter acontecido. Cheguei em casa e, imediatamente, fui para meu quarto. Enquanto acalmava minha respiração, me joguei na cama, fechando os olhos até ver a escuridão tomar conta de minha visão.

Praticamente dei um pulo ao acordar. Minha respiração estava descompassada e suor escorria pelo meu corpo. Flashes surgiam em minha mente e o desespero tomou conta do meu ser. Não era possível, não podia ser. Depois de oito anos isso voltava a acontecer.

Procurei pelo meu celular e apertei a tecla de número três, ativando a discagem rápida. Não demorou muito para que eu fosse atendida, mais precisamente no terceiro toque.

– Alô? – Ele perguntou com uma voz aparentemente sonolenta.

– William, sou eu. – Respondi nervosa.

– Ana? O que aconteceu para me ligar a essa hora?

– Aconteceu de novo. – Respondi entre soluços. – Eu… Tive aquele sonho.

– Você teve? – Senti o desespero em seu tom de voz. – Era um sonho normal ou outro como aqueles?

– Não, não era igual. Era no mesmo lugar, com a mesma vítima… mas não era o Tom. Eu não sei quem era dessa vez. Não o reconheci.

– Tudo bem, tudo bem. – Ele resmungou, como quem tentava acalmar a si mesmo. – Mantenha a calma. Vá até o consultório hoje após as suas aulas, precisamos conversar.

Desliguei o telefone e tentei abstrair toda essa bagunça, repetindo em voz alta as palavras calmantes de William Plummer. Algumas horas de insônia depois, me vi caminhando até a escola.

Na esquina de meu destino final, vi um corpo razoavelmente magro passar pelos portões principais da construção. Partes do meu sonho da noite passada infestaram meus pensamentos. Calafrios percorriam cada milímetro de meu corpo. Minhas pernas se recusavam a andar novamente, me deixando parada onde eu estava, olhando para o nada com uma expressão de espanto. Ele era o garoto que apareceu no meu sonho.


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Notas finais do capítulo

Eu, sinceramente, não tenho uma estimativa de quando vamos postar o segundo capítulo. Atualmente estou finalizando uma outra história de mais de cinquenta capítulos, e, provavelmente, a terminarei primeiro para depois postar o segundo capítulo. De qualquer forma, deixem bastante comentários, e, podemos até postar o próximo mais rápido. Beijão, comentem!



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