Facilis Densensus Averno escrita por Heosphoros


Capítulo 17
Fogo & Gelo


Notas iniciais do capítulo

"Alguns dizem que o mundo terminará em fogo;
Outros dizem, em gelo.
Pelo o que provei do desejo, fico com quem prefere o fogo.
Mas, se tivesse que perecer duas vezes
Acho que conheço o bastante do ódio para saber que a ruína pelo gelo também seria ótima
E bastaria"

Robert Frost



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/481713/chapter/17

– Pode repetir, de novo, o motivo pelo qual saímos da casa de Dorothea no meio da madrugada? - Jace perguntou à Sebastian, fechando mais sua capa contra o corpo.

Estava quase amanhecendo; mesmo com as densas e cinzentas nuvens que escureciam o céu, havia um pouco de luz branca solar que indicava a manhã que nascia. O problema é que chovia como os Infernos! Gotas violentas de água caíam e molhavam as capas negras e improvisadas que os irmãos Morgestern "arranjaram" na boutique de Madame Dorothea.

Enquanto atravessavam a rua, Sebastian olhou para o irmão com impaciência. Seus cabelos brancos caíam, molhados, pela testa. Seus olhos negros ainda eram ameaçadoramente visíveis.

– Eles vão me procurar por lá - explicou - eu sei. Já devem estar lá, a essa altura.

– E deixou Dorothea sozinha? - uma sobrancelha dourada de Jace estava levemente arqueada. Clary se perguntou se, mesmo correndo perigo, os dois continuariam com aquelas brigas constantes por motivos idiotas.

– Provavelmente - Sebastian tirou a mecha rebelde de seu rosto impacientemente - foi ela quem nos denunciou.

Jace uniu as sobrancelhas. Em seus olhos cor de âmbar, havia um brilho misto entre confusão e desconfiança.

– Por quê? - perguntou - Ela ainda honra nossa mãe.

O maxilar de Sebastian se contraiu, como uma ação de controle de ódio. Clary não sabia se foi pela forma como Jace disse "nossa mãe", ou se a simples menção à Jocelyn o fez ficar assim. Até mesmo para ela, falar sobre a mãe era assunto delicadíssimo.

– Mas não honra ao nosso pai - respondeu entredentes.

Um momento inquietante de silêncio. O vento gélido e molhado fez Clary abraçar o próprio corpo, sentindo uma pontada no peito que parecia uma espada de gelo. Eles atravessaram a Pentoville Road, cada vez mais longe da cidade e da "ameaça".

Quando o instante passou, o frio não foi menor.

– Você falou com Valentim? - Jace quebrou o silêncio, soando mais como um detetive que desvendou o caso apenas com sua dedução do que como um irmão ciumento ou rancoroso. Jace nunca soava como essa última opção, não importa o quão amarguradas sejam suas frases.

Sebastian olhou para ele, incrédulo.

– O quê?

– Valentim - havia um fantasma de um sorriso na expressão sarcástica de Jace - nosso pai. Sabe quem ele é, não sabe?

– Claro que sei - Sebastian grunhiu - só não sei de onde você tirou que eu conversei com ele ontem à noite.

O rosto angelical de Jace rasgou num meio sorriso irônico.

– Eu não mencionei nada sobre "ontem á noite".

Silêncio.

Sebastian prosseguiu inexpressivo. Seu rosto não mudou, apenas seus olhos negros que fitaram um ponto invisível na frente deles. Clary conhecia momentos como aquele e conhecia a expressão vitoriosa, e de escárnio, que cruzou a face de Jace e iluminou seus olhos.

Um ponto para Jonathan Herondale, ela pensou.

– Falei - Sebastian disse por fim.

– E suponho que planejava nos contar quando estivéssemos reunidos daqui a dez anos, conversando e lembrando das coisas passadas - Jace emitiu uma risada alta - como seria, hein? "Clary, Jace, lembram quando estávamos fugindo no meio da madrugada de vários guardas reais? Então, eu falei com papai naquele dia. Saudades dele!".

Clary se encolheu.

– O que eu falei com Valentim não é agradável a seus delicados ouvidos, irmãozinho - Sebastian disse de forma ácida.

Com o canto do olho, ela viu Jace cerrar os punhos.

– Experimente então.

Sebastian suspirou.

– Pois bem. Valentim me avisou que Dorothea não planejava perdoá-lo e que achava que havia acontecido algo com Jocelyn, por conta de seu sumiço de anos, e achou que a melhor maneira de se vingar e ganhar ouro bastante para sair do país, era entregando seu filho mais velho altamente procurado. Papai disse para fugirmos, e aqui estamos.

– Não acredito nisso - Jace afirmou.

Sebastian deu de ombros.

– É uma pena - parou de caminhar.

Clary e Jace pararam ao seu lado, estavam na esquina de uma rua vazia e na frente de uma estalagem. Luzes douradas vinham lá de dentro, junto de risadas e gritos típicos de quem bebeu por tempo demais. Era um prédio de três andares feito à base de madeira.

Um pouco confortável.

– Onde estamos? - Clary perguntou, emitindo finalmente um som por todo aquele tempo.

– Estalagem do Pônei Saltitante* - Sebastian respondeu - vamos passar a noite aqui, talvez duas para eu arranjar um curativo novo, e depois seguimos para a mansão de Ragnor Fell.

Clary olhou para ele.

– Quem?

Ele sorriu.

– Um sujeito tão capitalista quanto Bane, que vai nos ajudar pelo preço certo. Magnus disse que é bom procurar por ele caso tenhamos algum problemas e pudermos pagar para concertá-lo.

Jace deu um passo a frente.

– Vamos ficar aqui na chuva discutindo, ou vamos entrar nessa estalagem?

Sebastian girou a maçaneta dourada na porta de madeira, que rangiu enquanto abria para dentro.

– Damas primeiro - falou para Clary.

Ansiosa para sair da chuva fria, ela entrou.

. . .

Sentada com os irmãos em uma mesa isolada no primeiro andar, onde as pessoas bebiam e comiam à vontade (ênfase no à vontade), Clary só conseguia agradecer pelo calor enquanto tentava tirar o excesso de água nos cabelos ruivos. Ela observou os homens que derramavam barris de cerveja sobre si, mulheres que beijavam-se com taças de vinho nas mãos e garçons passando aos tropeços levando e trazendo copos ao bar.

Parecia o Inferno; mas ela não ligou muito para isso.

– Ótimo lugar você encontrou - Jace, porém, não tinha o mesmo tipo de pensamento que ela.

Sebastian permanecia com o capuz negro sobre os cabelos prateados. O rosto estava coberto por sombras, mas havia um resquício de sorriso quando Clary olhou com atenção.

Ele deu de ombros para o comentário de Jace.

– Você vai parar de reclamar ou vai pegar um vinho para nós?

Jace lhe lançou um olhar assassino.

– Acho que prefiro continuar reclamando.

– Então vamos continuar com sede - Sebastian argumentou - pois não acho muito seguro que eu fique pedindo bebidas por aí. É muita exposição, se é que entende o que estou dizendo.

Clary revirou os olhos verdes.

– Podem parar com a discussão que eu mesma vou pegar - ela já ia se levantar quando Jace segurou seu braço, impedindo-a.

– Deixe, Clary - ele se levantou e saiu.

Quando ele se tornou apenas uma cabeleira dourada falando com alguém no balcão, ela olhou para Sebastian.

– O que houve com Dorothea? - perguntou, séria.

Ele ergueu os olhos negros sob o capuz para olhar fixamente para ela.

– Ela está bem, Clary.

– Promete?

Ele assentiu, sério.

– Prometo.

Clary soltou um longo suspiro, que parecia aprisionado em seus pulmões.

– Acho que estou com mais sono do que gostaria de admitir....

Algo brilho como um diamante negro nos olhos do irmão.

– Pode dormir comigo hoje? - perguntou, com um meio sorriso.

Ela o encarou, primeiramente surpresa. Algo naquela proposta fez seu coração bater mais rápido do que deveria, mas depois ela resolveu apenas retribuir o tom travesso com um sorriso divertido.

– Você sabe a resposta, Sebastian - ela falou.

Ele emitiu uma risadinha baixinha.

– Negar um pedido de seu irmão que quase morreu há dois dias? - ele fingu uma expressão de desapontamento - isso não se faz.

Clary o encarou do outro lado da mesa sem evitar o sorriso. Espertinho...

– Tudo bem, eu durmo. Mas nada de gracinhas - advertiu.

– Você faz com que eu me sinta um estuprador, Clarissa - ele tentou parecer irritado, embora o brilho do sorriso entregasse.

– Olá, queridos irmãos - Jace colocou a garrafa sobre a mesa e depois as três taças de vidro, o tom de sua voz era ao mesmo tempo entretido e resmungão - espero que não tenham se entediado na minha ausência.

Sebastian abriu a garrafa e foi enchendo as taças.

– Acho que não temos nada pela qual brindar - ele disse distraidamente.

– Sua cara-de-pau? - Jace sugeriu, fingindo uma expressão inocente.

Clary revirou os olhos.

– Vamos brindar o fato de ainda estarmos vivos - ela disse e ergueu sua taça - Á vida.

– Á vida! - Sebastian tocou a taça dele na dela; o tom não era dos mais animados, mas havia um brilho em seus olhos negros que Clary identificou como diversão.

Jace encostou a taça dele também.

– À qualquer definição alternativa que vocês queiram dar á sua existência.

E beberam.

. . .

Clary e Sebastian ficaram no bar depois que Jace subiu, só para subirem depois. Clary ainda se sentia mal em ter que admitir estar "mais íntima" do irmão mais velho, não importa quanto eufemismo usasse. Não queria abrir totalmente mão de Jace e também não estava pronta para admiti-lo à Sebastian.

Quando subiram, ela descobriu que seu quarto era bem simples. Tinha um baú para roupas e pertences, um espelho e uma mesinha ao lado da... cama de casal. Encarou a grande cama para dois por um tempo e depois lançou um olhar acusador a Sebastian.

Ele ergueu as mãos.

– Sou inteiramente inocente - falou, fechando a porta atrás de si.

Ela riu.

Acendeu a lamparina na mesinha e tirou a capa negra molhada do corpo. Clary aproximou-se da janela, sentindo mais frio, ainda mais com o vestido de mangas curtas, mas continuou seguindo. Passaram o dia inteiro caminhando na direção da estalagem mais longe do centro e a noite já havia chegado.

O céu estava estrelado, o que a fez ficar surpresa. As nuvens foram embora com uma facilidade monstruosa e a lua cheia brilhava como um grande olho prateado aberto, encarando-a.

Sentiu Sebastian se aproximando. Deixou que viesse, esperando que fosse se pôr ao lado dela e perguntar o que estava olhando com tanta atenção, mas ao invés disso ele preferiu afastar os cabelos dela de seu pescoço e depositar ali um beijo que a arrepiou mais que qualquer corrente de ar frio.

Ela sabia que era muito errado, mas estava sob o efeito do vinho e do sono. Não sabia muito bem o que fazia nem o que fazer. Apenas suspirou enquanto Sebastian traçava caminhos de beijos do pescoço dela às costas. A sensação era de quentura e anestesia.

Ele a virou bruscamente, fazendo-a ficar cara a cara com ele. Inclinou o rosto e a beijou, aproveitando as mãos para juntá-la mais e colar seu corpo no seu. Clary entregou-se, beijando com mesma urgência e necessidade que ele traçava a língua na dela. Uma de suas mãos agarrou a raiz dos cabelos dele e a outra torceu-se em sua camisa.

Com uma mão pressionando a cintura dela, Sebastian usou a outra para descer a alça de seu vestido devagar. Seus lábios caminharam até sua clavícula, arrancando mais suspiros entrecortados dela.

– Sebastian.. - ela sussurrou - melhor não.

Ele ergueu o rosto. Havia um divertimento no olhar.

Devagarinho, ele foi empurrando-a contra a parede. Olhava-a de cima, como um predador, e quando ela se encostou - sua presa encurralada - ele apenas exibiu um meio sorriso.

– Tudo bem - sussurrou - vamos dormir.

Meio frustrada e meio com a consciência leve, ela se juntou a ele na cama de casal. O cobertor era único, mas esquentava.

Clary se deitou com o irmão, que a abraçou como se fosse um segundo cobertor ou uma segunda pele. Ela enterrou o rosto em seus pescoço, permitindo-se desaparecer no meio de alguns cabelos prateados. Então sentiu as mãos dele passeando por suas curvas, até chegar na parte de baixo de sua coxa e puxá-la mais para si.

A sensação de quentura subiu nela de novo, junto com os arrepios de uma brisa gélida. A mão de Sebastian foi passeando da coxa até a nádega dela, exigente e delicada. Clary apertou a camisa dele quando sua mão decidiu se aventurar mais profundamente, falhando as batidas do coração dela.

– Só dormir - Clary teve que se controlar para não deixar que coisas mais erradas ocorressem ali - lembra?

Sentiu que Sebastian sorria e a mão dele voltou a encobri-la de forma protetora.

Sua resposta veio como um sussurro rouco:

– Lembro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

*Devidos créditos ao amado Tolkien pelo nome da estalagem ;)

Então gente, queria muito agradecer às leitoras Beatriz e Carol Potter Greymark pelas suas lindas recomendações! Garotas, agradeço milhões de vezes a vocês pelo grande incentivo. Obrigada mesmo *-*

Ah e o que voces acham de um Clastian moment no final de cada capitulo???