Crônicas de Um Meio-sangue ao Resgate escrita por arashi


Capítulo 3
Eu descubro da onde vêem os morangos gigantes


Notas iniciais do capítulo

Não se assustem com Miranda.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/48079/chapter/3

 

Havia acordado cedo naquele dia, porque o Sol estava claro e ameno. Eu estava deitado em uma cama muito macia, em um quarto relativamente grande que tinha uma grande janela na lateral. Pela mesma, pude ver extensos campos de morango, que pareciam supermorangos, na verdade.

Andei em direção à porta ainda sonolento, lentamente girei a maçaneta cúprica antiga, e em uma sala maior com portas para fora, estava uma mesa com dois homens sentados, jogando baralho. Um numa cadeira de rodas, o outro com cara de embriagado, alto e com barba mal aparada.

 

“Até que enfim, temos mais hóspedes pra hospedar; sabia, queridinho?”, o mais alto disse, olhando para mim.

“Sr. Desoilet, como se sente?”, o outro perguntava.

 

Quero dizer, o que eu poderia responder para dois homens após aparecer numa casa depois de ser raptado quando estava procurando minha melhor amiga numa gruta? Oi, provavelmente não.

 

“Quem são vocês?”. Eu estava nervoso, novamente.

“Esse é o Sr. D, e eu sou Quiron”.

“Como... Como vim parar aqui? Digo, onde estou exatamente?”.

“Venha comigo, irei te explicar”.

 

Ele começou a guiar sua cadeira com as mãos até a porta, e fez um sinal para que eu o seguisse. Minha mãe sempre dizia que era perigoso confiar em estranhos, mas acho que havia alguma exceção que abrangesse o fato de ver um homem-cavalo.

Descemos até o solo gramado, e ele começou a dizer.

 

“Ontem, eu te encontrei dentro da entrada de Orfeu, e saiba que mortais comuns nunca conseguiriam entrar lá”.

“Mas, digo, eu sou humano, e Michaella, ela...”.

“Na verdade, achamos que não”. Ótimo, eu era um alienígena, ou uma nova raça de animais. Bem que minha mãe dizia que eu agia com muito selvageria, às vezes.

“A entrada de Orfeu sempre se abre quando algum ser não-humano canta ou toca alguma canção”.

“Espere, eu estava cantando”.

“Justamente isso, você abriu-o. E ele leva diretamente ao Hades, o mundo dos mortos”.

 

Minha voz abriu uma entrada para o inferno. Óbvio que Clarisse deveria ter sentido alguma coisa sobrenatural nisso. De qualquer forma, eu estava tremendo.

“Michaella está no mundo dos mortos, é isso?”.

“Provavelmente”, respondeu.

“E por que, por que diabos eu não pude trazê-la de volta?”. Irritei-me.

“Veja, ela é especial, não é afetada da mesma forma que os outros ao entrar naquele lugar. Você não desmaiou na caverna? Se eu não tivesse te tirado de lá a tempo, provavelmente sua alma sucumbiria e seria levada direto para o submundo”.

“Quem é você?”.

 

Parei de caminhar e olhei para ele. O mesmo se levantou da cadeira de rodas, inacreditavelmente, tirou suas botas, e seus pés viraram patas. Em segundos, eu me deparava com o mesmo homem-cavalo que vira na noite anterior.

 

“Sou um centauro, Rick”.

Meu queixo caiu subitamente. Com certeza, aquilo era uma fantasia muito bem feita.

“Acho que já te ensinaram sobre mitologia grega, não é? Acredite, é tudo, tudo real”.

“Quer dizer, o lance de Zeus ser o deus do céu, Poseidon do mar, Afrodite da beleza e...”, três trovões ecoaram no céu, mas não estava chovendo, e o Sol ainda brilhava.

“Os nomes têm poder, eu não te aconselharia a dizê-los por aí tão deliberadamente”, ele sorriu "Estamos no Acampamento Meio-Sangue, o acampamento de semideuses, meio humanos e meio deuses”.

"Quero dizer, eu sou algo assim? Digo, um semideus?", perguntei extasiado.

"Sim, mas não sabemos quem é seu pai ou sua mãe, por enquanto".

 

Conforme íamos andando, pude ver a extensão dos campos de supermorangos. Mais à frente, um salão feito segundo o estilo arquitetônico grego antigo, pilares de mármore branco reluziam sob a luz do sol. O lugar não tinha um teto, aparentemente, e me perguntei o que faziam durante chuvas ou nevadas. Dentro do recinto, várias mesas grandes, com uma maior e mais acabada no centro.

Havia um enorme campo onde crianças-cavalo, ou centauros, brincavam de tiro ao alvo com o arco-e-flecha. Acho que já tinha parado de me assustar até essa hora.

Quero dizer, eu sabia que era filho de um deus, que deuses governavam o mundo, que minha amiga foi para o mundo dos mortos através de uma entrada mágica que se abre com a música de um não-humano; o que poderia me surpreender agora?

Então, me deparei com um espaço reservado a diversas cabines enormes, cada uma com um estilo peculiar de arquitetura e decoração.

 

"Esses são os doze chalés que abrigam os semideuses que vêm para o acampamento. Cada chalé é destinado a um deus em especial, e por enquanto, você ficará hospedado no chalé de Hermes, o deus dos viajantes e dos ladrões" disse Quíron, piscando para mim. Acho que ele fez isso por causa da palavra "ladrões".

Andamos até uma cabine que aparentava ser desarrumada, meio que caindo aos pedaços, feita de mármore e madeira, com um caduceu esculpido sobre a porta (um bastão com duas serpentes enroscando-se ao seu redor).

"Boa sorte com o pessoal, e se houver algo que queira me falar, procure-me na casa grande".

Então, ele me deixou em frente à porta. Bati na mesma, e logo essa foi aberta.

No interior do chalé, havia um monte de beliches e colchonetes espalhados por todo o chão. Algumas crianças pulavam sobre os colchões, enquanto outros adolescentes estavam sentados distraídos com algo.

 

"Indeterminado?". Uma garota morena de olhos castanhos escuro apareceu em minha frente e me questionou.

"Acho que, hãm".

"Certo", ela sorriu e deu um tapinha em meu ombro direito. "Sinta-se em casa, há alguns colchonetes naquele canto, então arranje um e estabeleça um espaço no chão. Provavelmente, deve haver algumas sacolas com utensílios básicos para você lá. Só tome cuidado para guardar muito bem suas coisas, porque, tsc, deus dos ladrões, sacou?".

 

Ela deveria ter um ano a mais que eu, mas era muito bonita. Tinha a minha altura, e usava uma camisa laranja com o símbolo de um caduceu estampado na parte frontal, uma caça jeans clara, quase branca, e um par de All Star branco.

 

"A propósito, sou Jenny, líder do chalé de Hermes".

"Meu nome é Richael, Rick". Ela sorriu para mim e eu corei.

"Acostume-se, novato", e saiu, dando outros tapinhas em meu ombro.

 

Por sorte, encontrei um bom colchonete de cor azul-marinho, que era espaçoso o suficiente para que eu coubesse no mesmo. O difícil foi achar um canto no cômodo, mas felizmente, havia um espaço atrás de uma das beliches. Depositei minha cama provisória lá, e sobre ela, a mochila provisória que eu havia arranjado. Então, saí.

O sol estava bem no topo da imensidão do céu. Presumi que já deveria ser cerca de duas da tarde, e olha que nunca estudei como ver as horas pelo sol.

Algumas pessoas estavam indo em direção ao salão de mármore sem-teto, enquanto uma ou outra saiam de lá com um sanduíche ou um recipiente com frutas. Deduzi que era o refeitório.

Como meu estômago roncava forte, decidi que era hora do lanchinho. Me lembrei de Michaella, e o quanto ela estaria falando sarcasmos sobre lanchinhos felizes se estivesse aqui. Senti-me um pouco culpado por não tê-la podido regatar, mas tentei focar-me em coisas melhores. Quero dizer, eu não poderia agir numa missão ao submundo de barriga vazia.

Logo ao entrar no recinto, uma jovem com os cabelos loiros e olhos azuis penetrantes veio em minha direção. Colocou as mãos nos lábios e, então, uma bandeja se materializou em suas mãos, contendo um prato com uma coxa de frango, legumes e algumas frutas. Ao lado do prato, um copo vazio.

Peguei-a desajeitado, e fui andando, com medo de coisas estranhas aparecerem do nada estilo materialização-de-bandejas.

 

"Você é novo por aqui, não é?".

Ouvi uma voz suave masculina atrás de mim, e quando me virei, encontrei um garoto loiro, de olhos esverdeados com tom de cinza, uma camiseta azul com uma coruja e bermuda com tema de folhas secas.

"Meu nome é Jake, e eu sou o representante do chalé de Atena". Ele me mostrou um sorriso brilhante, acolhedor.

"Sou Rick, bem, indeterminado. Digo, cheguei hoje aqui e...".

"Então vou te ajudar por enquanto, ok?". Jake apertou meu ombro com a mão. Acho que ele já devia estar doendo, acho que parei de contar quantas vezes fizeram isso por esse dia a partir da décima. "O pessoal do meu chalé está ali na grama, quer ir lá conosco?".

Assenti com a cabeça e o segui.

 

Só depois de 20 segundos caminhando e observando o que as pessoas faziam que me dei conta de que os copos estavam se enchendo sozinhos, à medida de que as pessoas encostavam suas bocas na borda do mesmo e sussurravam algo. Tentei com "suco de morango", e pareceu funcionar, porque o recipiente foi preenchido por um líquido vermelho rosado.

 

"Jake, err, tudo bem por hoje? Resolveu os problemas de travesseiros no seu chalé?", disse uma garota de cabelos ruivos em tom de fogo, que usava uma camisa vermelha e um shorts jeans escuro.

"Bom dia, Miranda. Bem, acho que esse problema vai cessar daqui em diante". Jake olhou de relance para um par de garotinhos idênticos que pulavam pelo gramado com espadas de madeira nas mãos.

Percebi que a garota corou um pouco, e decidiu fitar seus sapatos brancos ao invés dos olhos dele. Ambos deveriam ter a minha idade, pensei.

"E você, garoto?", ela me olhou de forma ameaçadora, "novatinho? Receio que o pessoal do meu chalé tenha um esquema bem bacana para novatos. Sou Miranda, do chalé de Ares. Prazer". Miranda me estendeu a mão, mas ao invés de me cumprimentar, levou o braço em direção ao meu copo de suco e o fez cair no chão.

"Ops, foi sem querer". Notei Jake revirando os olhos enquanto a ruiva dava risadinhas.

 

Minha estadia não seria tão fácil quanto eu imaginei. Aliás, eu nunca sequer imaginei que seria fácil, desde o momento em que pus os pés aqui.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!