Blue escrita por Marie


Capítulo 1
Um.




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Havia burburinho e calor como era típico daquele lugar. O cheiro de óleo fazendo-a torcer o nariz.

Contudo, nada abalaria o seu bom humor com relação à próxima aula. Aquela seria a primeira vez em meses que eles dariam uma pausa na literatura anglo-saxônica e estudariam — como fora mesmo que seu tio Ares definira? Antipatriótico? Herança da globalização? Não. Não fora isso. Ah! sim, claro — algo importado.

Ou ao menos foi nisso que tentou acreditar.

— Aconteceu algo? — Poseidon lhe perguntou quando a viu franzir o rosto.

Tinha acontecido, sim.

E ela perdera o apetite porque ser feita de idiota tinha um gosto intragável.

— Suponho que você não tenha visto Orion ontem, na minha festa de aniversário — resmungou, afastando a bandeja de perto de si mesmo sabendo que Poseidon não a deixaria sair dali até que comesse o que restara porque ele não tolerava que jogassem comida fora.

— Eu nem sabia que você tinha convidado alguém além de mim — admitiu e já empurrava a bandeja para perto dela outra vez.

— Mas eu convidei e ele disse que iria — voltou a engolir o almoço, mastigando a comida de qualquer jeito e a empurrando com água, sua garganta ficando dolorida no processo. Já não sentia outro gosto além de sal e vinagre.

Poseidon olhou por cima do ombro para o ponto que Artemis encarava. Orion tinha se sentado de costas para eles, algumas mesas distante.

— Apenas não apareceu? — fez uma careta ao perguntar, cobrindo a mão dela com a sua, confortando da maneira como podia.

— A última mensagem que ele me mandou foi ontem de manhã e parecia tudo bem — suspirou. Ela e Orion tinham sido amigos quando criança e então se afastado. Tentara reverter isso em mais de uma ocasião e sempre falhava. Todas as vezes em que julgara ter recebido abertura dele para se aproximar acabaram se mostrando um equívoco e ela começou a desconfiar que estava presa dentro de um joguinho. — Mas então ele sumiu e só voltou a aparecer pra postar no twitter aquele emoji dos olhos espreitando os lados como se estivessem desconfiados.

— Eu não o entendo — Poseidon afirmou, já quase tão frustrado quanto ela. — Se ele tem algo contra você, porque te seguiu deliberadamente em um monte de redes sociais?

— Meu tio Ares tem uma teoria, a de que Orion quer saber sobre a minha vida, mas não quer participar dela — contou, já se levantando ao terminar de comer porque não queria ficar mais tempo ali. Algo na presença de Orion a estava fazendo se sentir sufocada.

Poseidon também se ergueu para sair do refeitório e ela teve que se conformar em andar devagar para respeitar o ritmo dele. Seu amigo tinha sofrido um acidente durante a última competição de hipismo da qual participara e ficara com sequelas que agora o faziam mancar. Fora aterrador quando acontecera. A poeira. O Sol. O sangue.  Sobretudo o grito da égua de montaria se dilacerando no eco formado pelo silêncio das pessoas.

Lembrar daquilo a fez se sentir grata pela vida dele e por isso o abraçou de lado, ganhando um beijo na têmpora muito provavelmente por ele ter achado que a fragilidade momentânea dela se resumia ao ocorrido com Orion.

Andaram tão sem pressa e sem rumo que quando chegaram na porta da sala de Artie a campainha para a aula tocou.

A professora já estava lá dentro, então se despediu de Poseidon com um último abraço e entrou, indo se sentar.

Mas foi parada.

— Hoje vocês não ficarão em sala, querida — a Srta. Erato lhe corrigiu, pedindo que se aproximasse com um gesto leve. — Diga-me, de todos os que eu pedi para a aula de hoje, qual você mais gostou de ler?

Artemis sorriu porque só havia uma resposta.

— João e Maria é o meu favorito desde criança — contou. Por isso ela desejara tanto ter um irmão e infelizmente ganhara um com a morte de seus pais.

Fora mandada primeiro para uma casa de assistência, é claro, porque a única família que tinha era seu tio Ares e ele estava com quinze anos quando o acidente aconteceu. Artie se lembrava ainda de como chorar de medo era diferente de chorar por qualquer outra coisa. Nem mesmo as lágrimas de tristeza que derramara por seus pais carregavam um gosto tão forte de impotência quanto a mínima menção de ter sua guarda negada ao tio.

O irmão mais novo de seu pai, só sete anos mais velho que ela, durante muito tempo significara a única coisa que a separava da sensação mais perigosa de todas. A de não ter um porquê para estar viva.

— ... Mas — prosseguiu, lembrando-se de um conto em particular que lhe causara vertigem — eu gostaria de escrever sobre Barba Azul.

Erato pareceu estar satisfeita quando concluiu:

— Se é assim, faça dupla com Apolo — àquela altura outros alunos já tinham chegado e se aglomerado junto dela ao redor da mesa, esperando a sua vez para perguntar sobre a tarefa, mas o sobrinho da professora, Apolo, não era um deles e por isso Artemis franziu o cenho.

Ele não tardou a chegar, contudo, e ao vê-lo Artie se perguntou, não pela primeira vez, se o cabelo tingido de azul era mesmo excesso de personalidade ou falta dela.

— Apolo, eu acabei de falar sobre você! — Erato exclamou.

— Verdade? — ele estreitou os olhos castanhos, unindo as sobrancelhas claras que levavam Artie ao questionamento do quão loiras seriam as mechas sem toda aquela tinta.

— Sim. Artemis escolheu o seu conto favorito para a análise e acho que deveriam fazer o trabalho juntos.

E o que pegou Artie de surpresa foi ele saber que era dela que sua tia falava e de imediato lhe estender a mão após ser informado de que a duplas não precisavam permanecer em sala enquanto discutiam a tarefa.

— Prefere ficar aqui? – Apolo questionou e ela notou tê-lo feito parecer um bobo com a palma voltada para cima, aguardando que ela segurasse sua mão.

Artemis era péssima com garotos.

Não que Poseidon não fosse um, é claro. Só que lidar com ele era muito mais fácil.

— Não, eu só... Como sabe que meu nome é Artemis? — precisou perguntar.

Apolo a fitou por um breve momento longo demais para que ela fosse capaz de evitar corar.

— Por que eu não saberia?


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Notas finais do capítulo

Blue não vai ter data de postagem ou algo assim, mas eu me comprometo a continuar escrevendo sempre que conseguir. Muito obrigada caso tenha decidido dar uma primeira ou segunda chance a ela



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