As faces rosadas de um velhinho pálido estavam mais rubras que o comum. Chamariam-no de caquético, caso não fosse capaz de derrotar todos em jogos de apostas.Suas mãos, grandes, mas sem a destreza que costumavam ter a 20 anos atrás, não o deixavam segurar sua dose diária de seu destilado favorito, Uísque. Seus cabelos, antes castanhos, agora tinham textura de neve, tão ralos e branquinhos e certamente pareciam tão frágeis, como sua amada o não era. Seus olhos, antes uma imensidão azul, que deixaria qualquer uma louca para fazê-los brilhar, agora viviam caídos em uma escuridão tão perversa quanto seu passado. Suas póstumas memórias já haviam se acostumado com a dor da perda, mas ainda não haviam se conformado com as besteiras feitas há muito tempo, onde tudo era bom e ele, simplesmente, jogou tudo para os jacarés, que vivem nos esgotos de Nova Iorque, comerem.

Ah, como ele daria tudo para voltar!

Ah, como ele daria tudo para consertar seus erros passados!

“Pena que esses dias não voltarão” – pensou ele consigo mesmo.

***

A vida era uma pregadora de peças inconfundivelmente cruel. Não adiantava o quanto você se esforçava para se esconder nas profundezas de um grande lago, ela sempre acha um meio de descobrir onde está, só para te ferrar. E foi assim desde o começo dos tempos, e será assim até o final, porque ela, simplesmente, não se conforma em te ver feliz.

Era isso que Katherine Beckett pensava desde a morte de sua mãe.

Oh, Deus, como ela a amava!

Os traços vívidos no rosto da mulher, dona dos olhos verdes mais intensos e penetrantes de todo o mundo, apareciam como furacões. Não que ela ainda não fosse bonita, mas, agora, era uma beleza mais madura como ela. Não teve filhos como desejava ter tido, não havia família para ela. Tudo o que restou de seu legado no departamento de polícia de Nova Iorque foram suas medalhas de honra ao mérito, por ter servido seu país em momentos de crise. Em seu dedo ainda guardava um anel de noivado, dado há séculos atrás, que a cada dia que passava perdia 100 quilos de sua massa emocional. Talvez tudo tenha sido melhor assim...

Talvez eles fossem melhores separados do que juntos.

“Parceiros confiam... E ele não confiou em mim enquanto parceira dele. Enquanto mulher dele. Eu sempre soube que isso não daria certo, éramos de mundos extremamente diferentes, nunca ficaríamos juntos.” – Kate disse em alto e em bom som, como se tentasse se convencer de suas palavras sem valor.

***

A respiração de Rick era calma mas ao mesmo tempo ofegante como se o ar estivesse sendo retirado de seu peito a cada lufada. Suas lembranças vinham à tona e lembrou-se de como era bom ter suas mulheres perto dele, Kate, Martha e Alexis eram as mulheres mais adoradas na face da terra. Aos poucos ele foi adormecendo com a cabeça apoiada em seu travesseiro ortopédico, mas a sensação de que algo estava errado não desaparecia de seu coração...