O Cavaleiro dos Lírios escrita por Kuro Neko


Capítulo 12
Mentor


Notas iniciais do capítulo

Fiz algumas modificações no capítulo desde a primeira vez que o escrevi.
Então, se você já leu o capítulo, sugiro que leia de novo (Pode pular até a parte do retorno deles para o acampamento), pois adicionei algo que muda o final do capítulo.
Se você ainda não leu o capítulo, vá em frente!



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— Vamos parar um pouco, o sol está se pondo e há vários insetos nessa região. Por sorte, levamos um pouco de lenha que achamos, não? — Disse Sartah, a mulher Kernportiana que havia se voluntariado para seguir caminho com Ron, Leonard e Flora. Os quatro seguiam numa formação que quase ninguém concordava: Sartah andava a frente, cortando matos altos e ditando direções e os três restantes andavam atrás, levando mantimentos cedidos por Ben Rerol, carregando lenha e outros itens de valor. Apenas a mulher Kernportiana concordava com o plano, que ela mesmo elaborara, enquanto os outros integrantes protestavam a princípio. "Vocês por acaso sabem para onde ir?", Ron recordou da suposta líder argumentando. Ambos Leonard e Flora o olharam naquele momento, esperando uma resposta que ele não conseguia dar.

Há alguns dias atrás, quando deixaram Kernport, seguiram por campos de plantação de trigo, passaram por uma floresta, mais campos e nenhuma cidade. No momento atual, passavam por uma planície cheia de ervas daninhas secas por conta da falta de umidade da região. A noite estava lentamente aproximando, pintando o céu azul sem nuvens de poucas horas atrás em um mar de laranja coral. O grupo depositou tudo ao chão.

— Ron, dê-me uma ajuda com as barracas, por favor — Pediu Flora. Mesmo que o contexto exija uma certa doçura no tom, ela não estava presente nessa frase. Mas era o que mais caracterizava Flora — Leonard, ajude Sartah com a fogueira.

Leonard Talhart deixou cair seus ombros numa face de total frustração:

— Quando eu finalmente acho que vou me livrar das benditas lenhas, elas voltam novamente. Foi para isso mesmo que eu virei cavaleiro, carregar lenha.

E então ele pôs-se ao lado de Sartah para iniciar o trabalho. Depois disso, Ron parou de prestar atenção na dupla, mas escutou palavras furiosas vindo da mulher e vários lamentos do rapaz. Ron pegou um grande pedaço de pano remendado, porém dobrado cuidadosamente, de uma das mochilas que eles carregavam na jornada. Flora fez o mesmo pegando outro. Logo depois, ambos foram pegar um pouco de gravetos que haviam separado para montar o sustento das barracas.

— Ela já falou para onde está nos levando? — Perguntou Flora, em baixíssimo tom, como de costume quando os dois estavam sozinhos.

— Não, mas pede para que confiemos nela — Ron respondeu. Geralmente ela cessava a conversa quando Ron respondia com a negação da pergunta que ela geralmente fazia, entretanto dessa vez foi diferente.

— Precisamos saber, Almur — Flora não concordava em chamá-lo de Ron pois, obviamente, para ela, aquele era apenas um pseudônimo. Ron argumentava sempre que Almur não era seu nome, mas de nada adiantava. O nome o fazia lembrar da pequena garota Kernportiana que havia salvado e nomeado. Como ela havia ajudado Ron nos momentos em que ele estivera fraco e inapto, recebera alguns títulos, honrarias, prêmios e demais coisas, mas não deixara Kernport no fim — Você é o centro de tudo isso que tem acontecido, desde o acampamento até Jane Olho-bom. E não sabemos nada. Eu não sei de nada, pelo menos — Flora enfincava um galho grande ao chão para começar o sustento da cabana. Ron fez o mesmo.

— Ben Rerol e Kernport inteira sabia de algo. Seja lá o que for, logo saberemos — Ron respondeu e a pequena conversa acabou. Ambos focaram na criação de cabanas.

Quando tudo já estava preparado, isto é, fogueira, cabanas, sacos de dormir, uma mesa de madeira (dobráveis devido a um mecanismo de pregos) e, o mais importante, o jantar, a noite já estava sobre eles. Sartah estava sentada em um dos lados da mesa, que comportava quatro pessoas, vestida com um vestido curto, até o joelho, adornado com pedras brilhantes ao redor de um colarinho. Ron vestia-se com roupas simples estufadas com algodão, para suportar frio, que o deixavam mais gordo do que era. Já Leonard e Flora vestiam-se como não-tão-humildes cidadãos de Kernport. O jantar que estava a frente deles era resumido em repolho, caju, alface, couve, coelho defumado e porco assado. Obviamente, o porco assado foi mais rapidamente esgotado, junto ao caju. Todos comiam ávidamente.

— Então, para onde estamos indo — Perguntou Flora para o grupo de uma maneira doce que nunca havia visto nela.

— Para todo lugar e pra nenhum em especial, querida — Sartah respondeu num tom mais afiado. Houve um contato ocular entre as duas por um tempo.

— Alguém sabe onde podemos achar mais porcos? — Leonard perguntou. A repentina mudança no assunto despertou a atenção dos outros integrantes do grupo — Se alguém souber, por favor, me diga. Porque é para lá que eu vou — Ron deu risada da situação inusitada que Leo sempre conseguia criar, mas ele parecia ser o único a praticar a ação.

— Você acha tudo isso uma brincadeira, não, Leonard? — Respondeu Sartah num tom sombrio — Aposto que não achará graça uma espada plantada na sua barriga.

— Não deixaria isso acontecer, senhora — Respondeu Leonard, num tom mais sério — Você esquece que fui nomeado cavaleiro logo após Ron. Passei por vários treinamentos e vivo aprimorando todas as qualidades que eu tenho. Lembre-se que uma mente calma e positiva faz muita diferença em batalha.

Um silêncio composto por grilos, cigarras e outros insetos afins caiu sobre o grupo. Todos eles continuaram a refeição em silêncio. Ron percebeu que Leonard era mais maduro do que parecia.

Quando todos terminaram a refeição, um barulho repercutiu na noite. Um resmungo masculino, na verdade. Todos levantaram num pulo, desembainhando espadas, ajustando aljavas e erguendo lanças.

— Posição defensiva — Sartah comandou silenciosamente. Todos os integrantes do grupo, exceto Flora, viraram-se de escudos em mãos para uma posição diferente: Norte, sudeste e sudoeste. Flora, com seu antigo arco, situava-se no centro da formação. Todos esperavam por algum ataque repentino vindo da escuridão.

Os segundos seguintes custaram a passar. Todos mantinham ouvidos e olhos abertos.

Quando finalmente escutaram algo, não demorou muito para que o homem aparecesse na frente deles. Ele não parecia ser perigoso, isto é, se realmente estivesse sozinho, concluiu Ron. O homem possuía barba e cabelos negros e lisos, com alguns indícios de branco, e eram curtos, provavelmente recém cortados pelo próprio, já que as mechas de cabelo estavam cortadas de uma maneira desigual. Usava vestes negras e difícieis de se observar no escuro, mas parecia ter classe. Ele se aproximava mais, olhando o grupo com um pouco de desconfiança. Quando o homem ficou aproximadamente sete metros de distância deles, uma rápida ação foi tomada.

— Posição predatória! — Gritou Sartah. Todos eles se distribuíram num V com a parte aberta voltada para o homem. Dessa vez, Leonard e Ron ocupavam a vanguarda e Flora e Sartah se posicionavam atrás — Avançar! Completou.

O grupo inteiro correu em direção ao homem que antes se aproximava. Agora, ele apenas ficava parado esperando o grupo chegar. Quando finalmente o grupo o alcançou, todos apontavam as armas para ele. O homem continuava esboçando nenhuma reação.

— Vocês tem a vantagem — Disse ele de maneira naturalmente séria. Possuía uma voz firme em medidas proporcionais: Meio aguda e meio grave — O que poderia eu, um homem sozinho, fazer com uma tropa armada como vocês?

— O que faz aqui? De onde vem? — Perguntou Flora.

— Primeiramente, sou Seldor, Seldor Fajoe. Estou aqui para iniciar uma nova vida como outra pessoa. O que eu faço aqui, bem, estou aqui rondando a região em busca de um novo objetivo para seguir. O que vocês tem a oferecer?

— Eu diria, se soubesse o que responder — Respondeu Flora, dando uma rápida olhadela para Sartah. O homem possuía um olhar firme, observando tudo o que importasse e não importasse. O gesto de Flora foi valioso para o homem, porque Ron percebeu que passou certa inconsistência na formação do grupo. Caso esse Seldor fosse mal intencionado, o que era provável, ele certamente plantaria dúvidas na cabeça de cada um e segregaria o grupo.

— Bem, parece que vocês estão perdidos também. Então — Seldor pronúnciou. Esse último então saiu mais prolongado, como se a continuação fosse óbvia. Continuou a frase proferindo as palavras lentamente — Vamos criar uma parceria.

O grupo se entreolhou. Sartah continuou sem nenhuma consulta:

— Você conhece bem a região?

— Minha vida foi andar por ela, senhora.

Houve um minuto de silêncio.

— Muito bem, abaixem suas armas, todos — Ela abaixou a lança e todos desconfiaram muito do ato. Relutantemente, os outros repetiram a ação com suas armas — Saiba, senhor Seldor, que ficará submetido a limitação das suas mãos e que, na primeira ação contra nós, não hesitarei em matá-lo, justamente ou não.

— De acordo. A propósito, chame-me de Joe, se desejar.

E então, a noite foi bem tranquila. Como haviam apenas duas cabanas, uma para os homens e outra para as mulheres, Joe foi dormir na cabana em que Leo e Ron iriam dormir. A cena foi um pouco nostálgica, pois lembrou Ron do acampamento que faziam quando marchavam com os outros cavaleiros e soldados. Porém, Joe havia tomado o lugar de Jane. Ron não sabia, a princípio, se Joe os trairia como Jane fez. Quando foi dormir, Ron percebeu que o homem possuía mãos atadas por cordas. Aquilo o tranquilizou um pouco. Por fim, ele deitou-se no saco de dormir e caiu no sono.

Quando Ron acordou, já estava de manhã. Percebeu que, ao acordar, Leonard ainda estava dormindo e que Joe já estava acordado, de pé, sem as amarras, olhando para Ron. Num pulo, Ron sentou-se. Joe tinha uma adaga em mãos. Enquanto Ron olhava para o homem, que jogava a faca para cima, ele falou:

— Fique quieto, moleque, fique quieto! — Disse Joe, pondo a faca a frente da boca Se eu quisesse você morto, eu já teria — Ele olhou para os lados e para Leonard, para assegurar que ele ainda dormia — Vocês estão indo para um péssimo lugar, cheíssimo de víboras. Você confia naquela mulher, a grande de cabelos pretos e lisos?

Ron parou um pouco para processar o que estava acontecendo. Estaria Joe tentando persuadi-lo a virar-se contra o grupo ou queria avisá-lo sobre algo? A resposta do rapaz foi um aceno afirmativo com a cabeça.

— Não, rapaz, não... Joe tinha um modo de prolongar as palavras ditas — Eu, que sou o homem mais recente aqui, percebi que aquela mulher está planejando alguma coisa. Ah, eu sei que está.

— Eu confio nela, está bem? — Ron respondeu em um tom baixo também, não agressivo. Joe escutava cada palavra com grande atenção, afagando a sua grande barba — Eu tenho que confiar. O senhor deverá, também, uma vez que está aqui, recebendo nossa hospitalidade.

— Eu sou livre, rapaz. Não vê? Joe falou e logo em seguida levantou as cordas que antes o prendiam — Se eu quisesse, já estaria em Yagaer esperando por vocês lá — Ron estreitou o olhar para o homem — Sim sim, é pra lá que ela está levando vocês. Não sei se você, se o moleque ali ou aquela garota arqueira sabem que Yagaer é o maior fluxo de escravos de Loneway — Houve um tempo de grande silêncio.

— Por que está me dizendo isso, senhor? — Disse Ron de uma maneira pensativa, porém discreta como a conversa estava.

— Por quê? Bom, estou realmente buscando uma nova vida. Ajudar alguém, participar de uma baderna, eu não sei ao certo, mas vou descobrir — Joe estendeu a mão e Ron pôde ver um brilho em seus olhos — Deixaria que eu te ajudasse? Viria comigo?

Ron iria, de imediato, recusar o pedido do homem. Tudo aquilo que ele disse, mais o fato de ele ser um alvo importante como Víbora Escarlate e seus parceiros o influenciavam a dizer isso. Contudo, observou, de alguma maneira, um brilho no olhar do homem, um brilho verdadeiro que não via em Sartah.
Ron estendeu a mão e aceitou o pedido de Joe. Ambos saíram da cabana furtivamente.

Ali estava o sol a leste, mergulhando o mundo num tom azul puríssimo. Várias aves migratórias alçavam o céu, cantarolando uma sinfonia agradável. Seldor observou o céu por um momento, assim como Ron. Depois de um momento, deixaram o acampamento em direção a uma colina distante, cheia de mato alto.

Ron mediu três horas e meia de caminhada entre a vegetação rasteira, isto é, Joe a frente e Ron logo atrás. A este ponto, ele começava a pensar se realmente teria sido uma boa decisão confiar no homem. Lembrou-se da conversa na cabana e seguiu em frente.

Quando avançaram um pouco mais, isto é, quando chegaram a uma pequena floresta, Joe parou, levantando a mão com dois dedos, o indicador e o do meio, levantados. A cabeça estava erguida, olhando nada e ouvindo tudo. Ele voltou-se e falou bem baixo para Ron:

— Sabe lutar, garoto?

— Fui nomeado cavaleiro, senhor.

— Ótimo. Observe logo ali, venha!

Os dois foram passando arbustos e árvores anãs silenciosamente. Ron observava todos os lados, escutando tudo e esperando por uma emboscada. Quando parou perto de uma árvore maior, grande o suficiente para esconder os dois, ele percebeu que eram eles quem estavam fazendo a emboscada.

— Até aqui, estamos bem — Disse Joe, suando Observe bem aquilo.

Ron olhou para trás da árvore. Havia um pequeno acampamento ali, com tendas majestosas, mas com poucas pessoas. Haviam três ou quatro homens, vestidos com armadura de cobre adornada com pedras pontudas. O capacete recordava a forma de um dragão. No centro, nenhuma fogueira. Haviam apenas grandes peças de carne penduradas em um tipo de varal. Ron retornou para trás da árvore.

— Não temos chance contra eles! — Disse Ron, em tom desesperado, para Joe — Eles estão muito melhores armados e em maior quantidade!

— Raciocine, criança, raciocine... Não temos melhor armamento e estamos em menor quantidade, então vamos dividir para conquistar — Joe disse e Ron não conseguiu entender o que ele quis dizer. Logo continuou — Por que você acha que eu te levei aqui de manhã? Olhe, olhe! — Joe apontou para um lugar. Quando Ron ajustou melhor a visão, conseguiu ver sete cavalos presos, sem nenhuma guarda — Os cavalos precisão de água, certo? Essa é a nossa chance. Venha.
Joe correu para uma árvore mais a leste do lugar onde estavam. Ron o foi atrás dele logo em seguida. Quando pararam, observaram um único soldado enchendo um barril de água em um lago, próximo a uma macieira. Ele já estava retornando ao acampamento.

— Ótimo — Disse Ron num tom desanimado — Ele está retornando. Perdemos nossa chance.

— Ele vai voltar — Rebateu Joe — Vá, corre e fica atrás daquela macieira, rápido!

— Sem nenhuma arma? Questionou Ron.

— Eu disse rápido! — Joe repetiu. Logo depois, empurrou Ron para o direção que ele deveria ir. Ron achava que aquilo poderia dar muito errado, mas decidiu fazer o que o homem mandou — Quando chegar lá, chame a atenção dele!
Ron saiu correndo em meio as árvores. Aquele era um lugar pacífico e bonito, com árvores que brotavam lindas folhas coloridas. Pela estação do ano, outono, o chão estava coberto dessas folhas. Continuou e escondeu-se atrás da macieira, como Joe havia comandado. Logo depois, o soldado chegou e começou a encher o mesmo barril.

Alguns momentos mais tarde, Ron ficou refletindo se a ação seria realmente sã. Não tinha nenhuma ideia do plano do homem, mas...

Ron saiu detrás da macieira.

— Senhor, com licença, senhor — O soldado com a armadura de cobre o olhou desconfiado. Desembainhou uma espada curva e apontou para Ron. Ele não conseguia ver a face do soldado, pois um véu negro cobria a face dele — Eu estou perdido e busco algumas informações...

— Bom dia senhor — O soldado aproximava-se lentamente, dando uma pequena risada — Que péssimo dia para se perder, não? Me desculpe, mas há rumores que a Víbora Escarlate está rondando essa região, disse um ex-companheiro próximo a ele. Minhas ordens são de eliminar qualquer um que ronde essa região — O homem aproximava-se lentamente. Atrás dele, para a surpresa de Ron, estava Joe com uma adaga em mãos. Agora que estava bem perto, o soldado levantou sua cimitarra - Ron percebeu que essa era a espada que ele carregava - Ele continuava a dar suas risadas macabras — Talvez você mesmo seja a Víbora Escarlate, por que não? Meu nome vai entrar para a história!

De repente, num ataque rápido, Joe pôs-se atrás do soldado, chutou a parte de trás dos joelhos do homem e, enfincando a adaga debaixo do véu, deitou o soldado no chão. Ron não conseguiu ver a morte do soldado, pois o véu o impediu.

— Está feito. Vire-se, criança, por favor Disse Joe num tom ofegante. Ron obedeceu e, algum tempo depois, Joe veio com a armadura do homem em mãos — Vista isso. Você pegará aqueles cavalos.

Ron achou loucura o plano. Contudo, se funcionou até aquele ponto, deveria funcionar posteriormente.

Para a surpresa de Ron, tudo saiu perfeitamente. Ele foi, vestido com a armadura do soldado que havia encontrado anteriormente, chamar a atenção dos soldados ao redor. Para a sua felicidade, eles falavam a língua tradicional. Enquanto Joe pegava os cavalos, Ron pegou a oportunidade:

— Quando a senhora Sartah chegará aqui?

Os homens se entreolharam, mesmo com os véus na frente do rosto.

— Sartah? Quem é a senhora Sartah? — Um deles respondeu. Haviam outros dois entretidos com Ron.

— Ah, perdoe-me, acho que confundi o nome, ou o gênero.

— Grandes caminhadas o deixam meio confuso, né Hugh? — Os outros dois soldados riram. Ron, tentando camuflar-se, lavantou os ombros e riu junto — Estamos esperando por June Tark.

— É só lembrar do senhor dos pergaminhos — Completou um outro — Ele disse que nos ensinará a acionar todos os Ceifadores para ir atrás da Víbora Escarlate, e o melhor, sob o nosso comando.

— Ah, a água dos cavalos! — Exclamou Ron. Como ele combinou com Joe, haveria um sinal. E houve: Uma maçã foi atirada próximo a ele. Os outros soldados viram mas não deram devida atenção ao fato.

Quando saiu do acampamento, Joe estava montado num dos cavalos e segurava outros quatro por cordas, dois em cada lado. Assim que Ron tirou aquela armadura, montou em um dos cavalos, segurou apenas um e foi em direção ao acampamento do seu grupo.

A viagem de volta foi bem mais rápida que a de ida. Os cavalos eram todos brancos e fortes e tinham o quádruplo da velocidade de um homem normal. Na volta, Ron esclareceu alguns fatos que Joe deveria saber, já que ele havia provado sua confiança. Contou sobre Jane, Kernport, a jornada que estava fazendo para resgatar um amigo próximo e emitiu toda a parte sobre a Víbora Escarlate. Quando Ron perguntou a história de Joe, ele apenas disse que não tinha uma história para contar, mas uma para criar. Mas esclareceu que possuía grande influência e fama no passado.

Nesse caminho de volta, apesar de ter sido bem pacífico e monótono, notaram algo inusitado. Joe e Ron voltaram pelo exato caminho que haviam traçado na ida, mas, de repente, encontraram uma fonte quando estavam passando por um bosque de pinheiros. Joe deu um comando para o cavalo dele parar e Ron fez o mesmo. A fonte jorrava água de maneira majestosa, a criar um espiral ascendente que caía em cinco jatos finos. A fonte, na verdade, era uma mulher esguia feita de cimento cujos jatos d'água saíam de seus olhos, dois a dois, e um mais grosso da sua boca. Ela ficava em uma bacia circular de pedra cheia de plantas entrelaçadas que não mostravam flores. Como haviam deixado aquele acampamento para trás há algum tempo, não teriam problemas com soldados sem cavalos. Usaram as cordas para amarrar os cavalos a um pinheiro altivo. Depois foram verificar, lado a lado, a fonte.

— Quem são vocês? — Uma voz feminina e rouca ecoou no vento. Ron e Joe não estavam nem perto ainda da fonte. Segundo as suspeitas de Ron, ela se posicionava na parte de trás da fonte. Suas suspeitas mostraram-se corretas logo depois que a mulher surgiu tateando o contorno da fonte.

A mulher que apareceu era uma senhora de idade avançada que usava uma toga branca adornada com mangas laranjas. Seus cabelos eram lisos, finos e brancos, sua pele era enrugada como uma uva passa e por ela estar tateando o contorno da fonte, Ron concluiu que a senhora era cega. Quando a mulher fez um sinal fraco com a mão para ambos se aproximarem, Ron disse a Joe, em tom baixo:

— O que ela poderia fazer conosco?

— Bruxaria. Isso ela poderia fazer conosco — Respondeu Joe num tom mais baixo ainda. Contudo, logo em seguida, ambos foram se aproximando da fonte.

Quando chegaram na fonte, a água estava radiante e semi-transparente. Dava-se para ver o fundo sem qualquer dificuldade. O reflexo dos dois estava na água.

— Ah, um jovem rapaz e um não tão jovem assim — Anunciou a senhora. Joe e Ron olharam-na com desconfiança, tentando ocultar o espanto que sentiram — Sim, sim, estou vendo vocês. Um peregrino em busca de um tesouro e um perdido fugindo do ouro — Continuou ela, adicionando pequenas risadinhas fracas ao fim. Ron e Joe viam o reflexo deles mudarem na medida em que os jatos d'água iam caindo na bacia de pedras — Posso ver o futuro de vocês, as conquistas, riquezas e a morte. Mas, é claro, se vocês desejarem. O que me dizem?

Ron e Joe estavam ainda olhando o reflexo na água. Seria tentador responder 'sim' e ver se Almur seria salvo por ele ou não, mas ficou encantado demais com as formas que tomava na fonte. Aparecia, em um segundo, mais alto, mais barbudo e musculoso, com uma espada reta e pesada sobre o ombro com uma armadura de ouro reluzente. Noutro segundo, aparecia com um cajado em mãos, sem barba e com o cabelo grande, com tomos e pergaminhos na outra mão, vestindo um sobretudo com faixas de uma língua erudita. Muitas visões foram passando, de ele coroado, de ele casado e muitos outros benefícios. Mas, em um momento, viu-se como realmente era com uma mulher de cabelos e olhos vermelhos, de pele branca, atrás dele. Num instante, a mulher no reflexo, com um sorriso macabro no rosto, o empurrou e, então, Ron caiu dentro da bacia de água da fonte.

Surpreendentemente, havia mais espaço ali do que Ron havia estimado. Ele olhava para cima e conseguia ver Joe observando o reflexo como se ele fosse apenas mais uma das ilusões da fonte. Tentava subir, nadando incessantemente para cima, mas nunca alcançava a superfície. Seu ar ia rapidamente esvaindo do seu corpo.

— Ora, ora, mas o que temos aqui? — Ouviu uma voz feminina, similar a da senhora de antes, porém mais jovial, dizer em um tom claro, mesmo que debaixo d'água — Você não merece um fim como qualquer outro, não, não. Serás meu — E, assim que o pronunciamento acabou, um braço o puxou com uma força extraordinária para fora da bacia da fonte.

Agora, Ron podia ver que estava ao ar livre, novamente. Ron olhava ao redor e encontrou Joe, que o olhava com olhos totalmente abertos e com sobrancelhas levantadas. Não encontrou a senhora de antes. Percebeu, por fim, que estava no centro da fonte, a frente da mulher de cimento que antes jorrava água, mas que agora havia parado. Numa ação nada comum, a estátua o abraçou firme e forte, mas que não o encomodou nem um pouco. Ron percebeu que estava ficando mais fraco e que o cimento da estátua tornava-se menos sólido. Pouco tempo depois, Ron estava fundindo-se com a estátuda. O cimento era gelado e começava a engoli-lo quase totalmente. Apenas depois de escutar o som do desembainhamento de aço, perdeu a consciência.

Quando Ron e Joe foram para o acampamento com os cavalos, Leonard havia acabado de acordar, Flora estava de vigia próximo a antiga fogueira (que agora era toda cinzas) e Sartah estava sentada ao chão, afiando a ponta da sua lança. Todos eles estavam surpresos, exceto Sartah que possuía um olhar de decepção.

Ao lado de Seldor, de Sartah, de Flora e Leonard, Almur estava um passo a menos de ser salvo. E, agora, Ron sabia seu próximo objetivo: Encontrar June Tark.

Mas, havia mesmo ele retornado ao acampamento?


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Notas finais do capítulo

É isso! Como sempre, deixe seu comentário caso queira deixar sugestões, caso tenha alguma dúvida, caso queira spoiler (Brincadeira. Sem spoilers!) ou caso queira dar um elogio. Enfim, qualquer coisa que condiza com as regras do site!
Aliás, Seldor Fajoe foi inspirado (Sim, inspirado. Não USEI nenhum outro personagem que já exista, na história) em um personagem popular, tentem descobrir!



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