Nostalgia escrita por Yori Sora


Capítulo 1
Apresentação:




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Meg era Meg. Meg Kelvan, mas mesmo assim Meg, a inocente garota vítima de um ato de inocente e viciosa crueldade humana. Ela foi vítima da dor da perda e do desgosto. Oh, eu divago demais e tento passar conceitos reais de forma simbólica, talvez eu não esteja conseguindo expressar sobre a curiosa Meg, com seu cabelo negro e curto, negro como a noite, e um par de olhos azuis como o distante céu brilhante. Seus olhos possuíam um brilho de curiosidade, talvez isso fosse o mais fatal na garota, a curiosidade. O dia começou ensolarado naquela vez, mas o ambiente em que ela estava era escuro, sem a claridade do dia - e ela estava, supostamente, dormindo, mesmo que sua mente estivesse desperta há muito tempo (ou será que a mente nunca adormece?). Sua pele clara delicadamente posta em seu corpo, ela estando deitada no chão de madeira do local com um único lençol branco em cima. Há muito tempo ela não experimentava a maciez de uma cama.

Ela se lembrava, enquanto forçava os seus olhos a se abrirem, de tudo que ocorreu em sua vida, desde que ela tomou consciência de si mesma - tudo culpa dele, tudo culpa do maléfico Zos, que com sua ganância sem limites e busca por poder, enlouqueceu. Era normal, não é? Todos enlouquecemos com o poder, todos estamos a procura desse licor dourado que leva à imortalidade de cada ato, de cada ação escrupulosa e inescrupulosa. Todos enlouquecemos quando temos tudo o que mais queremos.

Ou ao menos essa é a teoria. Mas diferente das teorias, temos fatos comprovados, e um fato comprovado era que Meg estava se levantando, mas não sem antes abrir os seus olhos e contemplar o teto de madeira de seu quarto. Suas costas não estavam doloridas por ter dormido no chão duro, ela já estava acostumada, então simplesmente se levantou sem se espreguiçar, mas ao mesmo tempo sem tirar os olhos do teto - uma figura maravilhosa! - Ela estava com a mente em branco, como em um negrume clareado, como se ela estivesse em uma sala onde reinasse o branco, desde as paredes até o teto e o solo, uma sala inexistente e vazia. Era essa a sua sensação psicológica.

Ela deixou isso de lado e foi se vestir, com uma roupa que estava próxima da porta (sim, aquele quarto também tinha uma porta), dobrada. Ela caminhava em passos normais até lá, se agachando e pegando a roupa, seu fiel uniforme diário - uma camisa social branca e uma calça jeans, assim como um par de all stars. Ela se vestia como um garoto, talvez em outra época fosse considerada tomboy ou algo assim, se não fossem os traços angelicais da sua face e seus olhos cheios de graça, ela seria facilmente confundida com um garoto. Ela foi se despindo de seu pijama acinzentado, sabendo que ninguém ousaria entrar naquele quarto. Sua pele era branca como neve ou talvez como papel, ela sentiu o leve frio da manhã, mesmo num quarto fechado, mas não deu importância.

E logo vestiu a sua roupa habitual.

Em seguida, já vestida, Meg abriu a porta, também de madeira, de seu quarto até um pouco grande, mas sem nenhuma mobília, e saiu de lá.

"Mais um dia começa na minha pacata vida", ela pensou. "Minha vida, de hábito tão depressivo, mas é apenas minha e ninguém pode tirá-la de mim. Nem mesmo Zos", ela caminhava em passos largos, a bela garota-menino, andando por um estreito corredor e atravessando uma porta em seguida, adentrando numa sala onde haviam quatro pessoas reunidas. Ela sorriu para elas.

– Bom dia, pessoal! - ela disse. Um rapaz loiro, de cabelo um tanto bagunçado e olhos azuis, olhou para ela em espanto, dando um pulo.

– V-v-você está sendo simpática!? O que te aconteceu, Megzinha!? - ele questionou e exclamou, sem entender. Meg suspirou e o olhou de maneira rígida em seguida, erguendo o dedo indicador.

– Ora, Deck, eu não posso ser uma mocinha legal de vez em quando? - ela brincou. Deck, o nome do rapaz, quase caiu no chão.

– Aposto que é por causa daquela sua amiguinha, né? - ele disse. - Vamos, vamos, nos diga, o que está rolando entre vocês? - ele estava curioso, quase soltou uma piscadela para Meg, no sentido de dizer que guardaria segredo.

– Não seja, desagradável, Deck - diz um rapaz de aproximadamente dezessete anos (Meg e Deck tinham quinze), ele bufou, estava sentado na mesa do local junto das outras pessoas, exceto Deck, que se mantinha de pé. O rapaz não tirou os olhos da mesa nem por um instante -, ela não vai dizer nada e com razão - foi nesse momento que ele levantou o olhar e seus olhos castanhos-mel olharam para os dois jovens fora da mesa. - Agora venham comer o café da manhã.

"Ninguém aqui ousa desobedecer o Fausto, então é por isso que devemos nos sentar e comer", Meg pensou, como se sua vida fosse uma narrativa. As outras duas pessoas na mesa permaneciam quietas, era sempre assim, os irmãos Foust, ambos de cabelo castanho, um garoto e uma garota. Eles não falavam nada há anos, todos já estavam acostumados com isso, era até mesmo cotidiano. Eles apenas comiam em silêncio e Deck se sentou na mesa, sendo seguido por Meg.

"Leonard Foust e Liana Foust, eles são os caladões daqui, eu sempre achei que eles fossem loucos. Desde que vim aqui, vi que eles nunca diziam nada, não conseguia entender o motivo. Hoje não importa mais", ela explicava para algum expectador invisível, novamente.

Meg, diferente das pessoas da idade dela, junto de seus companheiros de moradia, não frequentava aulas no colégio de Downtown, ela não via necessidade em aprender vários conhecimentos enlatados e superficiais sobre os mais diversos assuntos. Ela estaria bem desde que um dia pudesse se vingar de Zos. Ela estaria bem desde que visse Lisete Avanez novamente e pudesse contemplar seus lábios rosados que pareciam levá-la à perdição cada vez que eles se abriam para falar, cada palavra da moça parecendo uma linha obscena da mais profunda e perversa mentalidade humana.

Lisete era a rainha da perdição, afinal.

Meg comeu todo o seu café da manhã em silêncio, eram apenas algumas torradas com geléia e suco de laranja, mas dava para se manter com aquilo. Ela terminou tudo com um pouco de pressa, até notar algo óbvio: se esquecera de escovar os dentes! Oh, ela se sentiu uma burra.

– O que foi, Megzinha? - Deck perguntou, preocupado, observando a feição preocupada da suposta amiga.

Ela se virou para o loiro, um pouco pálida, e disse:

– A-ah, eu estou bem, D-Deck - ela disse e então se levantou da mesa. - Com licença.

– Meg está atípica nesta manhã - Fausto disse, dando uma mordida na torrada. Tudo que ele dizia saía um tanto frio demais, formal demais. Até mesmo seus cabelos eram brancos, quase prateados, o que fazia com que suas feições sem calor e afeto ficassem mais atenuadas.

Meg saiu do local e foi correndo até o banheiro escovar os dentes. Ela não podia se apresentar a Lisete com mal hálito! "Droga, como pude me esquecer!?", Meg questionou para si mesma. Ela escovava os dentes com o sabor adocicado da pasta com velocidade e força, ela poderia quebrar a escova de dentes com aquilo, mas felizmente isso não ocorreu. Após lavar a boca, ela aproveitou para ligar a torneira e lavar a face, tirando todos os resíduos da sua noite bem dormida. Depois de enxugar o seu rosto em uma toalha de cor amarela desbotada, ela estava pronta para sair e encontrar a sua queridinha. Ela poderia cantar uma canção para dizer como adorava Lisete, mas isso seria romântico demais para ela, um tanto... meloso demais?

***

Enquanto isso, uma garota estava sentada numa cadeira de metal, com as pernas levemente reclinadas para cima, um tanto dobradas. Ela olhava para um relógio impacientemente, ele era um relógio de parede antigo que fazia aquele mesmo barulho: "tic, tac, tic, tac", o que deveria ser um pouco irritante e realmente era. Ela bufou irritada, em seguida ajeitando os óculos redondos, que teimavam em ficarem tortos. Seu cabelo ruivo e de cor como fogo era curto, ela parecia uma versão de fogo de Meg, porém de óculos. Seus olhos eram belos e esverdeados como uma esmeralda, sua pele era clara como giz. Mas enfim, ela estava impaciente, culpa da demora de sua queridíssima amiga.

"Meg, se você demorar mais um pouco, eu juro que...", ela pensou, com um pouco de raiva.

E então surgiu um leve desânimo. "Não é a Megzinha que demora, sou eu que espero ansiosa demais. Ela vai ter que encarar Downtown, mesmo que passe pelas as partes mais pobres da cidade. Ela terá que, de um jeito ou de outro, passar por Zos. Se eu pudesse, eu a visitaria, mas não posso sair daqui, de qualquer maneira", a garota pensava, analisando friamente a situação. Ela estava sendo injusta com Meg, afinal. Foi esse desânimo que fez com que a garota compreendesse melhor a tão esperada amiga.

E os minutos continuaram a passar e o relógio de parede a fazer o mesmo barulho irritante de sempre, até ela ouvir batidas na porta. Ela olhou para trás, com seus olhos fatais, e foi atender, já sabendo quem era, mas por precaução, levava consigo uma faca com um filete de energia nuclear na lâmina, se ela perfurasse alguém com aquilo, a pessoa poderia não morrer, mas teria graves problemas. A faca estava em sua mão esquerda, que ela ocultava atrás das costas. Ela abriu a porta, com o coração saltando pela a boca. E realmente era quem ela esperava ver. Ela bufou, irritada.

– Estava te esperando, Megzinha - a garota disse. Meg sorriu.

– Bem, estou aqui pra você, Lisete - ela sorria ternamente e se jogou nos braços da amiga. Lisete a aconchegou num abraço, onde os corpos das duas se conectaram, um breve calor do momento passando pelo o corpo das duas. Elas se abraçavam mutuamente.

– Entre, eu tenho novidades para você - Lisete disse, abrindo espaço para a amiga entrar.

– Novidades? - Meg perguntava, entrando no que era uma relativamente grande sala, na verdade, um laboratório. Lisete e Meg tinham a mesma idade, com o diferencial de Lisete ser uma menina gênio que trabalhava para uma organização mafiosa dando invenções, em troca tinha o luxo de ter seu próprio laboratório numa parte afastada do centro de Downtown.

– Sim, você vai adorar! Mas agora quero o meu doce - Lisete disse, se sentando na cadeira metálica que era giratória em verdade e se virou para Meg.

Meg corou um pouco.

– Tem certeza? Só fizemos isso uma vez e... - Meg não sabia o que dizer, estava corada feito um pimentão. Lisete abriu um sorriso bastante doce e acalentador.

– Não se preocupe, só mais uma vez, ok? Eu sei que não é apenas eu que gosto - e seu sorriso se tornou malicioso e devasso. Meg engoliu em seco, aproximando-se da amiga.

Ela inclinou um pouco a cabeça para baixo, aproximando a face da amiga, e fechou os olhos, sabendo que seus lábios estavam na mira nos dela. Ela via apenas o escuro, a escuridão e então um toque, algo macio tocando os seus lábios, ela sabia que estava pronta para a dança fatal entre duas jovens companheiras.

1...

2...

3...

Aquilo poderia ter durado a eternidade e nenhuma das duas teria notado.

Ou será que durou mesmo uma eternidade? Não havia como saber.

Apenas foi maravilhoso para ambas, quando terminaram, um filete de saliva as unia, a sagrada união, uma bela heresia que não deixava de ser doce. Por isso Lisete havia pedido por um, tudo fazia sentido.


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