Diário de Bordo escrita por Lady Bellemare


Capítulo 1
Avatar: The Last Airbender - Light - Zutara 1/1


Notas iniciais do capítulo

Zuko está no meio de seu trabalho cotidiano e cansativo como Senhor do Fogo quando uma visita inesperada aparece.

... Lately, i've been, i've been losing sleep (Ultimamente eu tenho, eu tenho perdido o sono)
Dreaming about the things that we could be... (Sonhando sobre o que nós poderiamos ser...)
Counting Stars - OneRepublic

DISCLAIMER: Avatar: The Last Airbender pertence a seus criadores Michael Dante DiMartino e Bryan Konietzko. Se pertencesse a mim Zuatara seria Canon.
A música pertence a OneRepublic.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/473129/chapter/1

luz
(latim lux, lucis)

substantivo feminino

4. O que ilumina o espírito.

Zuko descansou o pergaminho que estava lendo sobre o pequeno espaço na mesa de madeira entre as enormes pilhas de “lidos” e “para ler” e apertou a ponte do nariz entre o indicador e o polegar, sentindo uma lenta dor de cabeça começar a pulsar por trás dos olhos e pressionar as laterais de seu crânio como se seu cérebro tentasse escapar de seu confinamento.

Permitiu a si mesmo tempo suficiente para um longo suspiro, que escapou tremido por entre os lábios levemente partidos; em sua juventude, algumas línguas de fogo escapariam junto com o ar, porém seu pouco – e longo – tempo como Senhor do Fogo ensinou-lhe a manter sua dobra propriamente sob controle. Ergueu o olhar de volta para os caracteres que cobriam o papel de refinada qualidade, e que agora dançavam em movimentos lentos e ondulantes para provocar seu leitor já cansado.

As duas portas largas na outra ponta do cômodo luxuosamente decorado abriram-se num movimento preciso e um guarda, com aquela armadura vermelha que o Senhor do Fogo tanto sentia vontade de vestir novamente como também era grato por não vestir mais, entrou e cumprimentou seu senhor num gesto rápido e preciso, sem a graciosidade exigida entre membros da nobreza.

— Senhor do Fogo Zuko, você tem uma visita. — Ele anunciou em sua voz monótona.

Outro suspiro escapou por entre aqueles lábios, porém desta vez mais rápido e duro. Zuko estava cansado de receber visitas da alta corte, bajulando-o ou exigindo esclarecimentos sobre reformas realizadas após a queda do Senhor do Fogo anterior – queda figurativamente falando, visto que o homem ainda estava vivo, escondido no ventre das prisões da Nação do Fogo.

— Senhor do Fogo Zuko? — O guarda falou, desta vez sua voz mais alta, exigindo sua atenção imediata. — Devo deixá-la entrar?

Deixá-la. O pronome feminino não passou despercebido pelo homem. Suas pálpebras caíram sobre suas esferas douradas, bloqueando o mundo de sua visão momentaneamente. Se era uma mulher, isto queria dizer que ela estava ali para bajulá-lo.

Desde que seu romance com Mai morrera prematuro, com pouco mais de um ano de vida, todas as mulheres da nobreza visitavam-lhe, não declarando-o em voz alta, mas com o claro objetivo de conquistar um noivado com o recém-solteiro Senhor do Fogo. Não bastasse a pressão da parte feminina, os seus conselheiros, quase em sua maioria homens que passavam da casa dos 60, insistiam que ele devia se casar logo – gerar herdeiros logo. Afinal, “nunca se sabe o que o dia seguinte o reserva” – como uma faca nas costas ou um copo envenenado, o homem gostaria de acrescentar em tais ocasiões, contudo não externava tal opinião, já que ela seria vista com maus olhos e abalaria o frágil respeito como Senhor do Fogo que a tão duras penas conquistara.

Zuko esforçou-se a sair dos próprios pensamentos quando o homem clareou a garganta, ainda esperando por uma resposta.

— Deixe-a entrar — sem abrir os olhos, ele fez um gesto com a mão, dispensando o soldado com a sua única e curta ordem. Embora desejasse ardentemente poder dispensá-las, esta seria outra ação que seria vista com maus olhos, obrigando a render-se.

O guarda assentiu e fez o cumprimento estilo Nação do Fogo para o seu Senhor, mesmo que este não pudesse vê-lo. Alguns segundos depois, uma vez feminina encheu o local.

— Senhor do Fogo. — Todo e qualquer pensamento foi selado por aquele timbre único.

Suas pálpebras se abriram no mesmo instante, focalizando a figura que se aproximava com passos fluídos típicos das mulheres nascidas e criadas nos pólos, principalmente aquelas com o dom inexplicável que apenas as com o sangue dos ancestrais daqueles locais possuíam.

Cabelos negros e densos como ébano lustrado brilhavam sob a luz das tochas, carregando em suas mechas o tom avermelhado das chamas, e caiam como ondas pelas costas e pelos ombros e pescoço delicados. Mais trechos daquela pele achocolatada do que a nobreza da Nação do Fogo considerava politicamente correto estavam a mostra, embora agora mais de seu abdômen estava escondido do que quando eles viviam juntos com o resto da Gaangue, ensinando o Avatar o domínio sobre os elementos e fazendo planos de guerra. Sua roupa era simples, embora ela tivesse muitos vestidos adornados com riqueza e luxuria em sua posse. Um tecido vermelho, bem modelado, cobria seu tronco, pendurado apenas em um dos ombros e caindo até o umbigo, decorado com dourado; calças vinho abraçavam seu quadril, tornando-se mais largas nas coxas e se estreitando novamente nas canelas, onde se escondiam no cano alto das botas negras de bicos arrebitados, também detalhadas na cor do ouro. Todo aquele vermelho dava mais destaque ao colar azul que brilhavam ao redor de seu pescoço.

Os olhos masculinos trilharam seu caminho para encontrar o par de íris azuis como nem o oceano conseguia ser e emolduradas por longos cílios a observá-lo atentamente. Os cantos dos lábios avermelhados, então, curvaram-se num belo sorriso.

Todo e qualquer pensamento negativo voou para longe de sua mente naquele instante. A garota tinha uma incrível capacidade que cura que se estendia para além de seu toque de água, conseguindo afastar dores de cabeça e preocupações sem sequer um gesto além de seu sorriso e seus olhos intensos – ou seria assim apenas com ele?

— Como vai, Príncipe Zuko? — Ela provocou, os lábios contornando cada sílaba.

— Cansado. — Ele suspirou. — E você, Katara? Achei que vocês só viriam mais tarde... — ele se calou, percebendo finalmente que ela não estava na companhia nem de seu irmão Sokka ou seu namorado Aang.

— Eu decidi vir mais cedo. — Ela varreu a pergunta para longe, depois acrescentando num sussurro: — uma sábia decisão.

Um brilho de preocupação agitou aqueles olhos azuis. A Mestra da Dobra de Água se aproximou decididamente, contornando a mesa abarrotada e prostrando-se ao seu lado. O homem do fogo inclinou seu corpo para poder melhor observá-la.

— Sabe o que eu acho? — Ela perguntou, mas ficou óbvio que ela não esperava por uma resposta, já que se inclinou para frente e colocou uma mão do lado da própria boca como se para impedir que pessoas indesejadas, inexistentes naquele quarto vazio salvo por eles, ouvissem a conversa e completou num sussurro. — Você devia vir comigo espiar as tartarugas-pato. Eu passei pelo lago delas antes de vir para cá e elas me pareciam estar tramando alguma coisa. Sua Nação está sob uma tremenda ameaça e tudo o que você faz é ficar aqui sentado lendo papéis e mais papéis? — Encerrou a frase em um tom reprovador, as mãos na cintura. Um pequeno sorriso ameaçava surgir, mas ela tentava manter o rosto sério, o que acabava criando uma careta adorável.

Um pequeno e raro sorriso, que agora parecia brotar apenas quando estava por perto dessa garota, surgiu nos lábios do dobrador de fogo. Ele estava pronto para aceitar a oferta, quando o peso do seu cargo mais uma vez caiu sobre seus ombros, mais pesado do que mil armaduras.

— Eu não posso. — Então indicou a papelada a sua frente. — Se eu adiar o trabalho a situação só vai piorar.

O olhar da morena recaiu sobre a referida papelada, mirando-a como se fosse um inimigo da humanidade – ele conhecia bem aquele olhar, pois era o que dela recebia a cerca de dois anos atrás (pensar nisso sempre o deixava espantado e impressionado com o quanto as coisas podem mudar em uma velocidade assustadora).

— Quer que eu dê um jeito nisso? — Ela questionou, um quê ameaçador em sua voz. A mão repousou casualmente na boca do cantil que se escondia atrás da curva de sua cintura.

— Não. — Zuko respondeu de imediato, como se ela realmente fosse molhar todos seus papéis caso não o fizesse.

Katara riu, uma risada deliciosa que encheu o ar. Quando o som finalmente cessou, a garota prendeu seus olhos índigos nos áureos dele, sua expressão tornando-se séria, apesar do brilho de alegria ainda estar presente.

— Falando sério, Zuko. — Ela disse, inclinando-se para frente e tomando o rosto dele entre as palmas de suas mãos, frescas e suaves como o toque da água num dia de verão. — Você precisa descansar. Vamos fazer um passeio por esse imenso e belo palácio. Aposto que todo esse tempo que estive longe você passou seus dias indo do seu quarto para cá, daqui para o seu quarto – e para a sala de reuniões. — Ela acrescentou quando ele abriu a boca para contrariá-la, calando-o efetivamente.

Depois de um momento de silêncio, no qual ele considerou seriamente fazer como sua amiga dizia, Zuko suspirou e ela soube imediatamente que não tinha conseguido convencê-lo.

— Essa Nação precisa de um Senhor do Fogo 100% dedicado para conseguir seguir adiante. — Foi tudo que ele disse, não querendo adentrar demais nesse assunto, afinal ele fora a causa da sua separação.

— Essa Nação precisa de um Senhor do Fogo descansado e que consegue refletir bem sobre os assuntos que são postos diante de si para não tomar um curso de ação que não trará benefícios para o seu povo, ou que possa até acarretar em sérias consequências. — Ela retorquiu.

O dobrador ficou em silêncio. Sua mente borbulhou, tentando encontrar uma maneira de replicar àquele argumento e trazer a razão de volta para o seu lado, porém não conseguiu pensar em nada. Ainda relutante a aceitar a derrota, ele suspirou mais uma vez.

— Eu não posso sair daqui, é o meu dever. — Murmurou, ainda resistindo a ceder ao desejo da garota da tribo da água. — Você sabe disso.

Dessa vez foi ela quem suspirou e recolheu as mãos. O calor típico do ar da Nação do Fogo encontrou a pele mais uma vez exposta e o Senhor do Fogo sentiu o vazio deixado pelo toque mais do que deveria.

— Antes era sempre honra, — ela estava sussurrando mais para si mesma do que para ele, movimentando-se para o lado e depositando a mão sob o cantil de água novamente —, agora é só dever.

Quando ela destampou o recipiente e começou a dobrar a água, Zuko se moveu para proteger sua mesa, temendo que, mesmo que ele tivesse dito não, ela iria destruir os pergaminhos de qualquer jeito.

— Katara...! — Ele começou, mas foi interrompido quando ela repousou a mão livre em seu braço e indicou que ele devia sentar e se acalmar.

— Eu não vou molhá-los. — Ela sorriu. — Apenas relaxe.

Zuko fitou-a desconfiado, porém fez como ela disse e voltou a se acomodar em sua cadeira. Num movimento rápido ela estava a sua frente, o corpo no estreito espaço entre seus joelhos e a mesa. Ela ergueu as duas mãos, agora envolvidas por uma brilhante luva de água, e colocou cada uma em um lado de seu rosto, acomodadas sobre suas têmporas. Ela sorriu carinhosamente para ele enquanto o dedão esquerdo traçou calmamente a borda de sua cicatriz. Lentamente, porém efetivamente, a dor começou a sumir e com um suspiro, desta vez de alívio e satisfação, o rapaz deixou seus olhos se fecharem e apoiou as costas no encosto da cadeira.

Por um tempo que não pareceu longo o suficiente para o dobrador de fogo, eles permanecerem nessa posição. Então as mãos dela sumiram e ele abriu os olhos, mirando o par de safiras brilhantes.

— Melhor agora, Senhor Dever? — Ela brincou, e um pequeno sorriso surgiu nos lábios de Zuko.

O desejo de esticar uma mão e tocar aquele doce rosto inundou o Senhor do Fogo com uma força arrebatadora, mas ele conseguiu contê-lo. Ao longo dos dois últimos anos, desde aquele crítico dia nas catacumbas sob Ba Sing Se, ele resistia bravamente a todos os desejos que envolvia essa imprevisível dobradora de água. Depois de todo esse tempo, diferente do que ele havia esperado, eles não diminuíram. Em fato, eles cresceram e amadureceram de uma forma que ele sabia que permaneceriam consigo, em seu coração, até o último dia de sua vida. Até depois do fim dela. Zuko nunca fora alguém de acreditar em algo como reencarnações, mas tamanho era seu sentimento por Katara que ele não acreditava possível isto ser algo capaz de se desenvolver em meros dois anos. Ou em todos os 19 anos que ele viveu, para constar.

Ela estava falando algo, ele conseguiu perceber pelo movimento dos lábios dela. Mas o Senhor do Fogo já estava muito fundo em seus pensamentos para prestar a devida atenção. O momento que ela se ofereceu para remover a marca dele, seu inimigo, piscou novamente diante de seus olhos. Suas pálpebras deslizaram mais demoradamente, e o frescor do toque dos dedos dela em seu rosto naquele dia foi tão real que ele quase ergueu uma mão no presente para cobri-la. Naquele dia na caverna, ela foi a sua luz, seu guia, a oportunidade de uma nova vida, de um novo começo. Ela representou o seu segundo maior desejo desde seu banimento – restaurar seu rosto, restaurar sua honra.

É claro que ele teve que estragar tudo. Vê-la quebrada daquele jeito, com o avatar nos braços, uma corrente de lágrimas no rosto e a dor da traição nos olhos transformou alguma coisa em seu interior. Até o momento de seu perdão, seu mundo foi envolvido pela escuridão, uma escuridão que brilhava com o rugido do fogo e o queimava por dentro e por fora até transformar seus nervos em frangalhos. E então ela trouxe a luz de volta para sua vida.

Ela o fez enxergar que tudo o que ele procurava estava dentro de si – era só uma questão de olhar o lado interior ao invés de destruir o exterior. Diferente do que costumavam pensar, do que ele costumava pensar, ela não havia o transformado em alguém melhor. Ela apenas mostrou seu potencial, mostrou a ele quem ele realmente era, tão diferente de quem ele fora ensinado a ser.

Ainda hoje, ela continuava sendo sua luz.

Katara era o que a luz deveria ser – uma guia em seus momentos de dúvida, indicando não o certo ou o errado, mas que não havia problema em ser você mesmo, inclusive quando isso destonava de tudo que considerava verdadeiro até então.

Talvez ela sempre seria sua luz.

Talvez esse era o seu destino – o destino deles.

Eles não poderiam ficar juntos agora.

Uma sensação morna e úmida no meio de sua testa o trouxe para a realidade. Katara ficou conversando com ele por todo aquele tempo, mas como Zuko não respondia, ela se inclinou para frente e plantou um beijo na sua fronte. Quando a dobradora se endireitou, praticamente sentando na tampa da mesa, e seus olhos brilhantes recaíram sobre o rosto do rapaz, ela começou a gargalhar. As bochechas do Senhor do Fogo estavam vermelhas, assim como sua nuca. Ele fez a sua típica cara emburrada e cruzou os braços, mas não conseguiu deixar de sentir seu peito se aquecer.

Mas em uma próxima vida...


Lady Bellemare, 10/02/14


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Essa one-shot foi escrita para o dia 09/02 do mês dos Fandoms com o tema "Light" (Luz). Eu adorei como começo ficou, achei o meio um pouco "bleh" e amei o final, mas em geral, eu adorei escrever, ainda mais porque fazia muito tempo que eu não escrevia algo sobre meu OTP ♥
Espero que tenha gostado ;)
xxx