Páginas Esquecidas escrita por Napalm


Capítulo 5
A Morte Bate à Porta




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Estava tendo aquele sonho outra vez. A voz pedindo que eu fosse “para casa” enquanto eu corria pelo breu. Talvez eu estivesse enganada, mas agora era como se a voz estivesse mais alta, como se eu conseguisse chegar mais perto de quem falava a cada vez que eu sonhava.

Logo que o sol despontou no céu, meus olhos abriram e me levantei. Acordei aos outros e eles se arrumaram para voltarmos a viagem. Deixamos a estalagem de Nael e o que eu tinha de moedas retiradas do porquinho já estavam terminando.

– Próxima vez, vamos dormir no chão mesmo. – Eu disse, enquanto contava o que sobrara.

Reeve consultava o mapa e fazia cálculos, olhando a bússola. Jessica brincava com o cavalo do Sr. Peter.

– Bom, não tem muito segredo. – Reeve constatara. – É só irmos nordeste agora em direção ao litoral e estaremos em Gaela.

Fomos dar mais uma olhada no tubo metálico antes de sairmos. Havia um senhor ali quando chegamos, olhando para o tubo. Quando nos viu aproximar, ele falou sonhador, olhando para os dois cês pintado no misterioso objeto:

– Este é o símbolo da morte.

– Símbolo da morte? – Perguntei, esperando que ele falasse mais.

– Sim. – Foi a única coisa que ele disse, dando as costas para nós e indo embora.

– Conversei com algumas pessoas da estalagem, – Reeve começou. – E cada um tinha uma história para contar deste tubo, assim como em Cersa. Somente suposições e historinhas de terror, nada realmente concreto.

– Pode ser. Mas todos tem algo em comum quando contam sobre este tubo. – Olhei para o símbolo dos dois cês. Símbolo da Morte? – Nunca é algo bom.

Deixamos Nael, ansiosos para chegarmos logo em Gaela, ou seja lá o que estivesse em seu lugar agora. O cavalo que Jessica trouxera levava nossas mochilas, enquanto íamos a pé. Tivemos que seguir cegos, num caminho fora da estrada, que ia para sudeste e oeste apenas. Contornamos alguns planaltos que o cavalo não poderia nos seguir e por isso a jornada acabou sendo mais longa do que deveria. Já era meio da tarde quando avistamos uma cerca de arame imensa, cuja extensão se perdia nos dois horizontes, com placas de “mantenha distância” penduradas a cada certo espaçamento.

– Temos que atravessar essa cerca. – Reeve falou.

– Será que tem como dar a volta? – Jessica perguntou.

– Não. – Comecei. – Sinto que essa cerca circunda Gaela inteira.

Tirei as mochilas de cima do cavalo e as atirei por cima da cerca.

– Amarre o cavalo aqui, Jess. Depois a gente volta para buscá-lo.

Ela assentiu e prendeu o cavalo com a corda de sua sela no arame. Não foi difícil escalar e pular para o outro lado da cerca, já estávamos treinados nisso e enfrentamos desafios maiores em Cersa.

– Estamos perto agora.

O fim da tarde ameaçava chegar, quando finalmente avistamos algo além de mato e pedras.

Havia um longo plano árido, com várias pilhas de madeira queimada e postes desengrenhados sobre o mesmo.

Corremos para nos aproximarmos das ruínas do que algum dia teria sido uma vila. Começamos a andar em meio aos destroços, olhando para o local aterrorizados.

– O que houve aqui? – Perguntei, chocada. – Está tudo destruído…

– Definitivamente quiseram tirar esta cidade do mapa. – Reeve disse. – Vejam aqui!

Eu e Jess corremos até onde ele estava. Havia uma placa de madeira tombada no chão, com suas bordas enegrecidas. Mas ainda dava para ler o que ela dizia.

SEJAM BEM-VINDOS A GAELA.

Neste momento, Jessica soltou um grito de agonia e levou a mão a testa, como se tivesse sido acertada por uma pedra. Ela ajoelhou-se e começou a chorar de dor.

– O que houve, Jess? – Ajoelhei-me próxima a ela.

– Eu… – Ela começou, lacrimejando. – Eu não sei…

Ela então, tirou a mão da testa e começou a esfregar os braços, como quem quisesse se aquecer.

– Ni, vamos embora daqui. Eu não gosto desse lugar. – Ela dizia chorosa.

Foi quando ouvimos sons de passos. Levantei-me então para observá-lo se aproximando. O garoto de vestes negras e colantes que me convidara até este local.

– Sejam bem-vindos! – Ele disse, um sorriso irritante no rosto.

Emmet se aproximou de Jessica, ajoelhando-se próximo a ela.

– Está tudo bem. – Ele a ajudou a se levantar. – Você já fez sua parte.

– O que significa isso? – Perguntei.

Ele suspirou e virou-se para mim.

– Isso tudo é uma armadilha da qual nenhum de vocês sairá vivo. – Ele disse, usando um tom completamente normal para palavras tão ameaçadoras.

Por um momento fiquei paralisada. Quem esse cara pensa que é para me fazer esse tipo de ameaça?

– Você planejou tudo isso, não foi? Por que você queria que viéssemos aqui? Por que nós?

– Desculpa, mas não temos tempo para conversa. Logo eles estarão aqui.

– Eles? – Indaguei. – Eles quem?

Ele não me respondeu. Dirigiu-se até Reeve e o olhou nos olhos, bastante próximo, como quem observasse um quadro.

– Sim. É perfeito.

Reeve o olhava confuso. Subitamente, Emmet retirou uma adaga de seu cinto e a perfurou no ventre de Reeve, que deixou escapar um urro de dor. Ele caiu no chão se contorcendo.

– Desgraçado! – Gritei, querendo acertá-lo com um soco. Mas Reeve chorava de dor no chão e decidi correr ao seu socorro. Retirei minha blusa de seda que usava por baixo, ficando apenas com o casaco para cobrir meu tronco e a rasguei em tiras. Fiz um nó com as tiras e a amarrei sobre o tórax perfurado de Reeve para estancar-lhe o sangue.

Jessica nos olhava paralisada. Parecia estar em choque.

– Trouxe-nos aqui para nos matar?! – Perguntei, minha voz saindo mais alta do que eu queria pela raiva que estava sentindo.

Nesse momento, outro barulho invadiu a área. Olhei para o céu. Três helicópteros se despontavam ao longe, voando em nossa direção.

– Eles chegaram. – Emmet começou, enquanto olhava tranquilamente para os objetos voadores. – Olha, cedo ou tarde eles vão te pegar, mas recomendo que você corra agora.

Eu olhei para ele chocada. Mas não me movi.

– É melhor fazer o que eu estou dizendo.

Subitamente, um estouro aconteceu e um buraco se abriu na placa de Gaela. Uma das pessoas no helicóptero havia atirado contra nós, felizmente errando o tiro.

Levantei e dei um tapa na cara de Jess. Ela levou a mão ao rosto, deixando um “ai” escapar.

– Temos que sair daqui agora, Jessica!

Ela balançou a cabeça afirmativamente e segurou minha mão para que a guiasse. Corri para ajudar Reeve a se levantar.

– Sei que está doendo, Reeve. – Comecei, apoiando-o ao meu ombro. – Mas por favor, tenta correr.

Esgueiramos o mais rápido possível para longe dos helicópteros, tentando sair do local aberto. Já se podia ouvir mais tiros. Logo que chegamos à floresta, os helicópteros já sobrevoavam nossas cabeças. Escondi sob a copa de uma das árvores e sentei para respirar. Reeve tentava segurar os gemidos de dor, mas lágrimas escapavam de seus olhos. Jessica olhava para todos os lados apavorada, segurando minha mão.

– Estamos, cercados, Niele, – Reeve disse. – Não tem como sairmos daqui sem que nos vejam.

Maldita cerca que colocaram nesse lugar!

– Não fale, Reeve. Poupe suas forças.

Eu estava à beira de um colapso emocional também. Havia um pensamento querendo me derrubar, que eu tentava em vão bloquear. Uma lágrima acabou descendo de meus olhos.

Eu trouxe meus amigos para a morte.

Limpei a lágrima antes que notassem.

Não, Niele. Controle-se.

Ouvi passos se aproximando e nos guiei para uma árvore de tronco mais grosso. Avistei um homem trajando um uniforme azul-celeste, com um futurístico visor no rosto. Trazia consigo uma arma de fogo, da qual segurava nos dois braços. Escondi-me atrás do tronco e dei sinal a Jess e Reeve para que se encostassem no mesmo. Prendemos a respiração.

O homem se aproximava e estava vindo em nossa direção. Reeve me pegou pela mão e me puxou para darmos a volta pelo tronco, silenciosamente. Lentamente, andamos em torno da árvore, olhando para o chão para não pisarmos em nenhum galho solto ou fazermos barulho desnecessário. Infelizmente, era só eu e Reeve quem estava prestando esta atenção e Jess pisou num galho, acelerando ainda mais minhas batidas cardíacas. Porém, um helicóptero sobrevoava bem na hora e suas hélices abafaram o som. Aproveitamos disso e corremos para longe do local aonde estávamos.

Já havia vários homens armados procurando por nós na floresta e sempre que avistávamos um ao longe, mudávamos de direção e íamos mais fundo na floresta. Mas assim que desvíamos de um deles, acabamos por ir de encontro com outro. Ele apontava sua arma para nós.

Acabou.

Nesse instante, houve um estalo e uma fumaceira subiu do chão nos envolvendo. Escutei um tiro, mas já não podia enxergar o atirador e nem ele a nós. Uma mão me puxou no meio da fumaça, me guiando para fora dela, correndo numa direção. Alguém encapuzado por uma longa túnica preta que alcançava seus joelhos me guiava por caminhos da floresta.

O homem misterioso que nos ajudava parou por um instante e tirou da túnica que trajava um objeto minúsculo. Antes que eu pudesse olhar e constatar o que era aquilo, ele o atirou para longe na direção contrária de onde íamos. Houve uma explosão quando o objeto chegou ao chão e ouvimos passos se distanciarem, indo naquela direção. Uma distração.

Mas havia um problema, o caminho por onde ele nos guiava era de onde havíamos vindo. Logo o campo aberto estava à vista de novo. Ele parou novamente e esperou um dos helicópteros que sobrevoava por perto se distanciar. Assim que achou seguro ele voltou a correr, nos dando sinal para acompanhá-lo pelas ruínas de Gaela, parando no centro do campo aberto. Eu já estava começando a achar que ele havia nos enganado, quando ele se ajoelhou no chão e abriu um alçapão.

– Entrem!

Obedecemos nosso ajudante e descemos pela abertura no chão por uma escada de ferro. Assim que todos nós passamos, o homem encapuzado fechou o alçapão e nos acompanhou à descida, tornando um local um breu. O único som audível agora era o dos nossos pés contra o ferro enquanto realizávamos uma aparentemente interminável descida. Mas ela terminou e finalmente chegamos ao chão. Ao pisarmos no assoalho, o local se iluminou. Várias lâmpadas ao teto se acenderam em cascata através de um longo e vasto túnel.

Já não corríamos. O perigo parecia ter terminado. O indivíduo misterioso nos guiou pelo corredor e andamos por um tempo, assustados demais para falar alguma coisa. Reeve cambaleou e quase caiu, mas o ser de capuz veio ao seu socorro e me ajudou a ampará-lo. Ele não tirava a mão de seu abdome, onde Emmet o havia esfaqueado.

– Precisamos lavar o ferimento dele. – Eu pedi.

– Aguenta mais um pouco. – O homem misterioso falou.

Saímos do túnel para chegarmos num vasto local que parecia uma espécie de laboratório. Havia mesas pelo local e também grandes tubos de plástico, que talvez tenha sido a casa de algum espécime de animal em estudo. O homem misterioso ajudou Reeve a se sentar e recostar num dos tubos. Tirou de sua túnica um vasilhame de spray e desatou o curativo que eu improvisara mais cedo.

– Isso vai limpar a ferida. – Ele disse, enquanto agachava-se e aplicava o conteúdo do spray sobre o abdome de Reeve, que deixou um urro de dor escapar. – Logo vai ficar bom.

– Obrigada por nos ajudar. – Eu disse. – Você tem um nome?

Ele se levantou e retirou seu capuz, revelando um rosto jovem, olhos ocultados por um óculos de lentes quadradas e desengrenhados cabelos roxos. Fiquei espantada, ele deveria ter a minha idade.

– Sim. – Ele disse. – Pode me chamar de Fergo.


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