Páginas Esquecidas escrita por Napalm


Capítulo 17
Herói, Vilão, Tirano


Notas iniciais do capítulo

You wanted to fall for all these years...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/471880/chapter/17

Emmet sorriu. Ele estendeu seus braços de forma rápida e ao mesmo tempo me senti ser retirada do chão. Meu corpo foi levado numa velocidade extrema em direção ao teto. Mas antes que o impacto físico acontecesse, fiz com que minha massa se tornasse incorpórea e atravessei o topo do Santuário. Logo que me encontrei do lado de fora da sala do Livro, meu corpo foi solto pela força psíquica do Guia e então, inclinei-me na queda em direção ao garoto, numa velocidade ainda maior, pronta para acertá-lo com meu punho. Quando cheguei perto de tocar seu rosto, ele invocou seu campo de força ao redor de seu corpo, fazendo-me ser lançada para longe e cair no chão.

– Eu esperava mais. – Ele disse. E então, com novos gestos da sua mão, removeu à distância blocos de concreto da parede do Santuário e os fez voar contra mim. Usando de sua mesma técnica, desviei os blocos antes que me acertassem, fazendo-os se espatifar contra a parede. O Santuário se reconstruía mágica e lentamente.

Avancei-me contra ele. Estávamos os dois no ar novamente. Tentei acertá-lo com novos ataques, mas todos eram defendidos por seu campo de força. Ele me olhava debochado, com os braços cruzados e rindo de meus esforços vãos. E então meus olhos encontraram os dele e, por um momento, consegui acesso à sua mente. Ele rapidamente desviou o olhar, o que foi mais do que suficiente para sua concentração falhar e seu campo de força cair. Agarrei-o pela roupa e o atirei contra a parede, com auxílio de minha força mental, que acrescia ao meu adejo um poder descomunal. Antes que ele acertasse a parede, eu já havia me locomovido para o ponto onde eu o atirara e refiz o lançamento, mandando-o para o chão. Ele conseguiu amortecer o impacto de seu corpo contra o concreto, embora não completamente. E antes que ele pudesse levantar eu já voava em sua direção…

Algo me prendeu pelo tornozelo e me puxou para trás, impedindo que eu o alcançasse. Bati contra o teto e senti uma das minhas costelas se partirem. E então vi que Athema controlava as correntes às paredes, usando-as contra mim. Novas correntes investiram em minha direção, como se tivessem vida própria. Porém, atravessarem meu corpo como se ele não existisse. Notando que seus ataques físicos não me acertariam, Emmet aproveitou para mais uma vez tomar controle do meu corpo através da força psíquica e me atraiu a ele, com uma velocidade e poder que não pude contra-atacar. Quando eu estava próxima o suficiente, ele invocou seu campo de força para que eu me chocasse com a barreira invisível e sofresse dano – o que ele conseguiu fazer com sucesso. Fui atirada contra o chão, perdendo minha concentração que me tornava incorpórea. As correntes me ataram, cada uma a cada membro de meu corpo, e Athema criou um lacre em volta de mim que me impedia de me livrar delas. Fui elevada pelos elos e mantida em posição vertical.

– Posso não conseguir destruir seu corpo, Ayede. – Athema começou, olhando em meus olhos, – Mas posso destruir sua mente.

E dizendo isso, o cenário ao meu redor mudou. As correntes, porém, continuavam ali, impedindo-me de me movimentar. E então tudo entrou em chamas e dentro do fogo, pessoas morriam tostadas a minha frente. Um rio de sangue passava pelos meus pés e eu estava ali parada sem poder fazer nada, senão assistir ao massacre, crucificada naquelas correntes. Eu sabia que era uma ilusão, mas eu sentia o líquido vermelho na minha pele, o calor do cenário e o terror a minha volta. Jess morria ali na minha frente, outra vez, enchendo-se de bolhas pelo corpo antes de se enegrecer por completo. E Reeve era despedaçado a minha frente, seus membros sendo lançados em mim.

– Ajude-me! – Um das pessoas implorava. E então pude ver que se tratava de uma criança loira familiar, que rapidamente perdia seus cabelos e pele devido às queimaduras.

Eu soltei um grito de agonia. Senti meu corpo reconhecer uma força que eu pensei que havia perdido. A barreira de Emmet se quebrou, bem como as correntes se partiram. E eu caí no chão do Santuário Selado, de quatro, lágrimas de ódio caindo sobre minhas mãos. Emmet havia sido lançado longe devido a energia que emanei. Eu levantei a cabeça para vê-lo nos olhos. Estávamos ambos tombados.

– Você não pode destruir minha mente. – Eu disse, ofegante. Comecei a rir descontroladamente. Eu me sentia em frenesi. – Não há pesadelo que me faça desistir de nada.

Levantei-me cambaleante e comecei a me mover lentamente na direção do Guia. Ele adejou seu braço contra mim, tentando conjurar uma de suas magias. Porém, enquanto eu mantivesse meus olhos sobre ele, Athema não teria sucesso em mais nenhum movimento.

– Eu conheci todas as dores e todos os sofrimentos. Eu perdi todos que amei, mais de uma vez. E eu lutei pra conseguir o que eu queria incontáveis vezes e falhei em todas. E veja, eu estou de pé. Você vai ter que fazer muito melhor pra me derrubar.

Ele se levantou e alcançou sua adaga em sua cinta, apontando-a contra mim.

– Vamos lutar da velha maneira. – comecei, – Eu estou usando um encantamento que bloqueia todas as forças psíquicas. Seremos mais humanos do que nunca.

Athema sorriu.

– Isso não vai te dar vantagens. – Ele falou.

Segurando firmemente a adaga com os dois punhos, Emmet avançou contra mim. Com a palma da mão, golpeei seu braço, apontando sua adaga para o lado contrário e com o calcanhar eu acertei sua cabeça num meio-giro. Ele se recompôs rapidamente após ser lançado ao chão e atacou novamente. Segurei o braço com que ele apertava a adaga firme nos dedos e o acertei o queixo com a palma da mão. Usando o outro braço, ao se recuperar do meu golpe ele tentou me acertar na face. Eu travei seu pulso com meu outro punho, conseguindo imobilizar seus dois braços. Acertei-o então no abdome com o joelho direito e ele se recolheu, soltei seu braço esquerdo e o golpeei na face, fazendo-o ser lançado ao chão novamente. E mais três vezes ele tentou investir contra mim, sem sucesso algum. Recompondo-se de sua última derrota, ele olhou para mim, sua expressão vazia. Limpou o filete de sangue que descia de sua boca com as costas de sua mão. Levantou-se e me encarou.

– Antes disso acabar, – ele começou, falando com um pouco de dificuldade – quero que reflita sobre uma coisa.

Ele respirou por alguns momentos.

– Você sabe me dizer onde eu estava, antes deste universo existir?

Eu o encarei.

– Você sabe. – Emmet continuou. – Eu não estava em lugar nenhum. Minha existência havia sido banida de todos os universos. Estou errado?

Eu balancei a cabeça negativamente.

– Então, pense. Por que você me trouxe de volta a vida nesse universo? Você não deixaria um detalhe como esse passar despercebido desta maneira. Eu estou aqui porque você quis isso e você sabe como isso vai terminar.

– Você entendeu errado. – Eu respondi. Mas havia algo em mim agora que deturpava meus pensamentos.

Alguns segundos se passaram.

– Você já abraçou a derrota. – Ele disse. – Sinto muito. É esse o nosso destino.

Subitamente, Emmet atirou a adaga contra mim. O que aconteceu a seguir, foi completamente involuntário, um ato totalmente instintivo. Deixei que a barreira que bloqueava nossas habilidades caísse e controlei a adaga, ainda no ar, para que voltasse contra seu dono. Athema aparentemente não percebera que seus poderes haviam voltado e não rebateu. A adaga o cravou no ombro e ele adejou contra o chão. Ele permaneceu caído e parecia sofrer convulsões. Por um instante, eu não havia entendido ainda o que estava acontecendo.

Então eu lembrei.

Corri até ele e descravei a adaga de seu corpo, jogando-a longe.

– Aquela adaga… – comecei, – era a mesma da outra vez, não era?! A mesma que você usou para ferir Reeve.

Emmet relutava contra si próprio para permanecer imóvel. O veneno agia rapidamente dentro ele.

As palavras de Alice, que alterou o Livro do Destino no outro universo, estavam claras em minha memória.

“E o sangue dos Kingsizer foi veneno mortal para o Guia.”

E com tais palavras, a garota, filha de Teoremo Kingsizer e por isso, dona de seu sangue, atirou a adaga contra Athema, acertando-o e causando sua morte em todos os universos existentes. Porém, ao mesmo tempo que Athema tinha sua existência banida do espaço, uma arma letal fora criada para qualquer Guia existente. Sangue dos Kingsizer.

– Foi por isso que você atacou Reeve. Sendo o clone de Teoremo, ele teria o veneno mortal em suas veias…

Emmet finalmente se estabilizou. E então ele olhou para mim, sorrindo.

– Exatamente. – Ele disse, sua voz rouca e fraca.

– Você esteve esse tempo todo com um plano para me matar. – Eu disse, séria. – No final, não deu muito certo, não é?

– Sim e não. – Ele respondeu, ainda sorridente. – Meu plano era dar a você e a mim mesmo uma arma final, que fosse capaz de nos dar uma luta realmente letal. Se fosse você quem caísse, tudo bem. Se fosse eu… Meu plano teria sucesso de qualquer maneira.

Ele olhou para mim por alguns instantes, deitado agora tranquilamente sobre o chão do Santuário. Uma lágrima caiu dos meus olhos e eu sorri também. Eu me sentia feliz e triste. E eu sabia que Athema sentia o mesmo que eu.

– Eu entendo. – Eu disse, emocionada. – Eu te entendo, Emmet. Eu sempre entendi você, mas eu nunca consegui aceitar. Mas eu sempre soube… Sempre soube… Não sou eu o herói dessa história.

“Athema, você esteve encarregado com o fardo se ser Guia, algo que só fui entender quando me tornei um também. Você tem que punir aqueles que tentam usar o Livro contra seu próprio destino. É assim que é e é assim que sempre será. Essa é a nossa natureza e a natureza do universo. Eu fui quem lutou contra isso, por motivos cegos e ambiciosos. Eu sou o vilão…”

Eu inspirei por um momento, sem tirar meus olhos dos dele, que lutavam para se manter abertos. Continuei:

– Também tenho consciência que você sabia que, se eu tomasse seu lugar, coisas terríveis aconteceriam. E realmente aconteceram. Eu não pude suportar tamanho poder. Mas eu precisava dele pela minha sobrevivência e como consequência disso, destruí muitas vidas… Destruí Gaela. E acabei por destruir também minha própria existência.

– Niele… – Ele falou lentamente. – Não se culpe. Você merecia viver e merecia sua vingança… Eu também sempre soube de uma coisa…

“Virtude e justiça é um preço cobrado por tiranos.”

Eu assenti. Mais lágrimas rolaram de minha face.

– E agradeço também, – ele continuou, – por ter me dado esse lado do plano. Eu agora posso me desfazer das minhas obrigações. Obrigações de Guia. – E deu um grande sorriso. – Eu vou ser livre agora.

Ele fechou os olhos então. E então passei meus dedos sobre seus cabelos negros.

– Os heróis não morrem antes do final. – Eu olhei sua face calma, desacordada. – E é você o herói dessa história.

***

Já fazia muito tempo desde que Niele e Emmet haviam entrado juntos no Santuário. Reeve e eu andávamos de um lado para o outro, apreensivos. Escutamos alguns barulhos estranhos que vinham lá de dentro. Reeve cogitou que entrássemos. Temi que se fossemos lá dentro, encontraríamos coisas que podiam mudar a vida do garoto para sempre. E então, eu o impedi de prosseguir.

Reeve estava apoiado num dos pilares e eu estava sentado sobre uma rocha no chão quando as portas duplas finalmente se abriram e Niele saiu de lá. Sozinha.

Levantei-me e fui até seu encontro:

– Tudo certo?

Ela começou a mover os lábios para responder e então seus olhos encontram Reeve, que viera se reunir a nós. Por um instante ela ficou olhando para ele, boquiaberta.

– Alguma coisa errada, Niele? – Reeve perguntou.

Percebi que ela estava prestes a começar a chorar, mas esforçadamente se recompôs antes que qualquer lágrima caísse de seus olhos.

– Está tudo bem. – Ela respondeu enfim.

– Onde está Emmet? – Perguntei.

Ela balançou a cabeça. Eu entendi.

– Vamos embora. – Ela respondeu e se pois a caminhar para a saída do Vale Ogren.

– E para onde vamos agora? – Reeve perguntou.

– Vamos visitar uma velha amiga. Temos contas a acertar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Páginas Esquecidas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.