Flores e Montanhas escrita por Chiisana Hana


Capítulo 2
Capítulo II




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Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada. Com as minhas fics, eu não ganho nada além de diversão e novos amigos.


FLORES E MONTANHAS

Chiisana Hana


CAPÍTULO II

12 de fevereiro

Mais de duas semanas sem escrever nada... Às vezes, não tenho tempo, em outras sinto pura preguiça, além de um senso de inutilidade desses relatos. Para quê estou fazendo isso? Quantas vezes reli os diários antigos? Pouquíssimas. E acabaram todos no lixo... Mesmo assim, vez ou outra, vem essa vontade de escrever, então eu pego esse meu velho amigo e despejo nele meus pensamentos.

Quando digo “velho”, é velho mesmo. Esse caderno de capa forrada com uma bonita seda vermelha foi presente do meu avô, que o tinha comprado não sei quantas décadas atrás. O caderno ficou esquecido no fundo de uma arca que ele tinha no quarto, até que um dia ele o encontrou e me deu. Foi o último presente... Está amarelado, mas em bom estado. Acho até que as páginas envelhecidas são um charme. Então, transformei-o no diário onde venho escrevendo nos últimos anos. É, anos... Eu sei que devia ser mais assídua...

Conheci o namorado de Saori no sábado passado, quando ele apareceu para almoçar. Chama-se Julian Solo e é um rapaz loiro muito bonito e elegante. Disse que era empresário e falou brevemente sobre seus prósperos negócios, informações que considerei desnecessárias. Achei-o adequado a ela, se for julgar apenas pela aparência e pelas posses, mas não sei por que algo me diz que não combinam de verdade. E eu já li por aí que “algo geralmente tem razão”.

Sabe, Saori e eu somos parecidas. Temos a mesma idade e praticamente a mesma história, exceto pelo detalhe de ela ser milionária, enquanto eu vivo contando os tostões desde que nasci. Ambas fomos encontradas e adotadas por homens que se achavam velhos demais para serem nossos pais, por isso nos criaram como avôs.

Eu cresci nas magníficas montanhas de Rozan, na China, livre, com os pés na terra, correndo pelo bambuzal, tomando banho na cachoeira sem roupa e, ao mesmo tempo, fadada às tradições ancestrais que consideram a mulher um mero objeto do marido. Ela, ao contrário, cresceu na prisão da mansão Kido, cercada por grades, rodeada por seguranças e por um mordomo que até hoje passa praticamente o dia inteiro vigiando-a, mas educada à maneira ocidental, talhada para ser uma mulher de negócios e assumir sozinha a fortuna e as empresas do avô, o que fez quando ele morreu.

Eu lutei para fugir do meu destino, abrindo mão de um casamento à chinesa e indo para a faculdade. Ouvi de vizinhos e conhecidos que faculdade não era coisa de mulher, que meu lugar era em casa, de preferência na cozinha. Meu avô, que nunca tinha saído daquelas montanhas, felizmente pensava diferente e me apoiou até o fim.

Mas deixa-me voltar ao almoço... As refeições nessa casa já são normalmente um espetáculo, pois Saori tem um chef trabalhando para ela. Nesse dia, com a presença do namorado, o nível da coisa toda foi ainda mais alto. Olhei e comi tudo com curiosidade. Não sou muito dessas comidas cheias de frescura, com molhinhos espumosos, ovas desse ou daquele peixe, sou mais das coisas simples, da comida do dia a dia, gostosa e reconfortante. Entretanto, sou curiosa, gosto de aprender e, quando posso, invado a cozinha e bisbilhoto o trabalho do chef.

Como eu previ, serviram-nos comidas sofisticadas, mas tudo estava ma-ra-vi-lho-so. Depois do almoço, ficamos um pouco mais à mesa, conversando. Quando nos retiramos, voltei ao meu quarto, e o pensamento recaiu naquele policial. Tenho pensado muito nele. Aliás, bem mais do que devia. Comecei a achar que seria bom conversar com ele outra vez. Acho que poderíamos ser bons amigos. Felizmente ele ficou com a mesma impressão, pois na segunda-feira, no final de uma manhã tranquila no hospital, fui surpreendida por um telefonema. Uma voz masculina me cumprimentou e reconheci o dono dela de imediato.

– Bom dia, doutora Tzeng – disse meu interlocutor.

– Senhor Suiyama? – indaguei. Sabia que era ele, mas sério que ele estava ligando para o meu consultório? Fiquei tão surpresa que foi como levar um choque.

– Sim, sou eu. Como foi sua primeira semana no Japão?

– Tudo bem, graças a Deus – respondi, ainda procurando assimilar o que estava acontecendo.

– Fico feliz! Eu estava pensando... será que não gostaria de almoçar comigo hoje?

Cobri o fone com a mão e suspirei. Ele estava me convidando para almoçar?! Isso sim foi uma surpresa de verdade. Respirei fundo e descobri o fone.

– Bom, eu tenho duas horas de almoço às treze – eu disse, disfarçando o nervosismo. – Acho que posso ir com você, mas só se for para algum lugar aqui perto do hospital, está bem?

– Está ótimo. Pego você às treze em ponto, certo?

Assenti e recoloquei o fone no gancho, mas ainda fiquei alguns minutinhos imóvel, pensando se o telefonema tinha acontecido mesmo ou se eu estava ficando louca. Tá, eu queria falar de novo com ele, só não esperava que ele desejasse o mesmo.

Recuperada da surpresa, tentei continuar trabalhando, mas eventualmente pensava nele. Havia algo naquele homem que definitivamente me chamava a atenção e não era só aquela beleza exótica. Vi muitos rapazes tão ou mais bonitos que ele na faculdade e nenhum chamou minha atenção como esse policial. Bom, eu tive um namorico nessa época, mas na verdade tudo que ele queria era uma esposa para lavar suas cuecas e fazer sua comida. Definitivamente não era isso que eu queria da minha vida. É por isso que eu não tenho vontade de me casar. Porque quando penso nisso só me vem à mente um marido opressor que exigirá o abandono da minha profissão. Só que agora, depois de sair com o policial bonitão, eu já não sei mais de nada...

Na hora combinada, desci até a recepção e ele já estava lá me esperando. Além de bonito, é pontual. Devo dizer que isso é bom.

Estava fardado e tão lindo quanto na primeira vez que nos vimos. Cumprimentamo-nos e fomos andando até um restaurante perto do hospital, um lugar bem pequeno que, segundo ele, servia um yakisoba perfeito.

– Sabe, quando eu te deixei na mansão Kido – ele falou quando nos sentamos à mesa –, me arrependi de não ter pedido seu telefone. Depois me lembrei do boletim de ocorrência e você informou o telefone lá. Mas aí me dei conta que era o telefone da mansão Kido e não tive cara de pau suficiente para ligar. Então liguei para o hospital e pedi pra falar com a doutora Tzeng. Bem mais fácil, não?

Eu sorri. Ele era uma graça, não tinha como ficar imune a esse encanto. E isso me preocupou um pouco.

– Então não foi difícil – eu disse, apenas para não ficar só olhando com cara de boba.

– Não mesmo. É que eu fiquei incomodado com a sensação de que ainda tínhamos o que conversar.

– Eu também fiquei pensando nisso – admiti, e ele respondeu com um sorriso mais encantador. Uma mecha do cabelo dele soltou-se e caiu pelo rosto. Então ele amarrou tudo de novo, sob meu olhar embevecido. Como pode ser poético um homem amarrando os cabelos? Como pode?

Pedimos o mesmo yakisoba de carne, o qual devoramos sem pena, mas logo chegou a hora de voltar ao hospital. Esse tempo que passamos no restaurante voou! Foi inacreditável! Só que dessa vez trocamos telefone! Ele me deu seus números e eu dei a ele o número do celular que tinha comprado dias atrás.

Depois, ele fez questão me levar de volta ao hospital. Despedimo-nos com um abraço meio sem jeito e ele foi embora, prometendo telefonar em breve. Eu não devia, mas realmente esperei que ele telefonasse. Ele telefonou mesmo no final da tarde de quarta-feira e ficamos conversando um bom tempo. Depois, ele me ligou outra vez na sexta, convidando-me para sair no sábado. Aceitei. Seria bom dar uma volta por aí, ainda mais na companhia dele. Como sou 'nova’ na cidade, Shiryu levou-me a um parque, ponto turístico bem conhecido de Tóquio. Sim, esse é o nome dele. Acho que ainda não tinha mencionado. Bonito, né?

Foi uma coincidência legal, porque na verdade, eu já estive nesse parque muitos anos atrás. Meu avô e o senhor Kido me trouxeram quando eu era criança, durante aquela viagem que fizemos, e tenho uma lembrança muito forte daqui. Eu vim na época da florada das cerejeiras e as delicadas pétalas róseas voando ficaram na minha memória para sempre. Quase posso senti-las ao meu redor de novo, ainda que não estejam floridas dessa vez. A memória é uma coisa fenomenal mesmo.

Sentamos num banco perto do lago e eu me perdi a pensar nessas coisas do passado, no meu avô, nos dias que passamos juntos aqui em Tóquio. Éramos felizes naquela época e passei a me perguntar se um dia eu voltaria a experimentar isso. Não que a minha vida seja ruim. Eu amo minha profissão e o trabalho no hospital tem sido muito bom. Estou falando é daquela felicidade pura e simples, de um estar feliz por estar, de se sentir plena. Será que um dia vou sentir isso de novo?

Despertei dos meus pensamentos com Shiryu me olhando intrigado.

– Desculpe – eu disse. – Me perdi nos pensamentos.

– Eu estava tentando adivinhar no que tanto pensava – ele falou, olhando-me com ternura.

– É que bateu uma saudade de um tempo que não voltará...

Ele não disse nada, só colocou o braço em meu ombro e, gentilmente, me trouxe mais para perto. Preciso dizer que gostei?

Continua...


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