Ele o faz e Peeta aparece, no quarto de vidro, de costas provavelmente sem saber ainda da minha existência aqui. Haymitch está dentro, falando com ele e acalmando-o. Até que seu olhar é voltado para mim e em seguida o de Peeta. Só que o resultado era bem diferente do que eu imaginava. Ao invés de bater no vidro e gritar, ele me olha atento e depois fica com a mão sobre o vidro.

– Oi. – pronuncio sem emitir sons.

Ele sorri atrás do vidro.

Passo o resto do dia deitada na cama olhando para Peeta no outro quarto e ele fazendo a mesma coisa para mim. Os dias se passam e ele já fez vários exames, seus braços estão roxos na dobradiça onde é de costume retirar o sangue, enquanto minha mão se resume a um tom pálido, tão pálido quanto o vidro embaçado da janela causado pelo frio. Ah, o frio... Deve estar em torno de 20°C dentro do meu quarto. Branco, silencioso e com papeis espalhados no móvel do lado da minha cama. Recebo refeições 3 vezes por dia e remédios 4. Todos para o mesmo tipo de coisa, me fazer voltar ao normal. Sem gritos, sem pavor do que não existe e sem pesadelos, mas não são os remédios que me deixam melhor, é outra coisa. E estou olhando para ela. Ou melhor, para ele.

– Você ficará com sono, tudo bem? – diz a enfermeira e aceno que sim.

Estou tentando ao máximo demonstrar que estou bem sem usar palavras, é cansativo, desgastante, sem falar que estou completamente rouca devido a meus gritos e cansada mais ainda de explicar as pessoas todas as minhas loucuras, fraquezas, defeitos e quedas. Não gosto de falar, não gosto de pessoas ao meu redor como se eu fosse um animal sendo exposto e elas tivessem que me analisar ou me estudar. Não sou um material, nem um animal ou uma amostra que eles podem mexer e modificar da maneira que eles pensam, eu sou uma humana. Eu sou uma pessoa, todos os defeitos e anomalias vêm no pacote. E eles tem de respeitar isso assim como respeito a estupidez deles de injetaram em mim o que eles acham que vai ajudar, sendo que só me fazem ficar mais alerta.

– Você poderia me soltar? – digo na manhã do outro dia para a enfermeira. – Digo, posso andar pelo hospital?

Tenne olha para os lados e depois sorri dizendo que sim. Ela me desconecta dos fios e depois me chama a atenção.

– Srta. Everdeen... – ela começa.

– Pode me chamar de Katniss.

– Katniss, talvez você tenha conhecido minha irmã...Tenn.

– Sim, ouvi falar dela, o que tem?

– Ela foi com a sua irmã para a Capital. As duas... – ela abaixa a cabeça.

– É... – olho para os lados com medo do agora não tão desconhecido assim, vento com capa.

– Não vai andar? – ela fala.

– Ah... Sim. – saio do quarto. Ainda meio que cambaleando pela culpa dos analgésicos.

Peeta, desde que acordei, está de frente para o vidro me vendo. Será que dormiu? Soníferos... Iria abrir a porta quando Haymitch me barra. Logo Peeta começa a se mexer dentro do quarto vindo para perto de nós.

– Ele tomou os soníferos, eu falei com ele, ele não sabe que a culpa são deles por ter aumentado os ataques e o veneno. Ele acha que foi apenas uma pergunta normal do doutor. Não fala para ele isso. Você sabe que só vai piorar as coisas.

– Ta. – respondo e fico de frente para ele no vidro.

Ele coloca a mão no vidro. Coloco a mão e sorrio. Ele estaria como sempre foi a não ser por uma coisa. Seus olhos continuam vermelhos desde o dia que ele saiu de casa. Tiro a mão do vidro e olho para ele virando a cabeça.

– Peeta?

Apenas precisei pronunciar seu nome para que o monstro viesse à tona. Ele fecha o punho e bate insistentemente no vidro. Gritando para que saia. Tão rápido assim, penso. Só falei seu nome, qual o problema? Até que sinto algo me tocar nas costas e caio sobre o chão frio. Ah, o frio. Me aconchegando como se eu fosse sua melhor amiga.