So Far Away escrita por Vivi


Capítulo 1
Capítulo Único




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As lágrimas continuaram escorrendo por muito mais tempo.Talvez continuassem assim,não havia motivo pra parar.

Quando a deusa estava ali,em sua companhia,elas haviam cessado.Tentou lembrar-se das palavras reconfortantes de Afrodite para se acalmar,mas de nada adiantou.Talvez fosse só a presença dela,afinal.Só se perguntava porque a bela deusa havia mentido.

Dois dias haviam se passado e deus algum havia aparecido pra ela.Talvez fosse o fato de que não havia saído daquela caverna havia três dias,contando o que fora abandonada em Naxos.Não sentira fome nem frio durante esses três dias.Só havia a dor e o desespero pela ingratidão de Teseu. Talvez esteja sendo castigada pela traição a meu pai na mesma moeda,pensou.Talvez a deusa só tivesse dito aquilo para que a esperança revivesse e então morresse outra vez.

Mas ela sentiu que não era isso e a esperança continuou viva dentro de si.Talvez o tal deus a visse se caminhasse pela praia...

Foi então que um homem,se é que aquilo poderia ser comparado á um homem,adentrou a caverna cambaleante.Num primeiro momento não a viu e sentou-se á sua frente ainda rindo debilmente.Depois fitou-a como se estivesse tentando enxergar o seu rosto - o que era bem possível,pelo nível de embriaguez em que o rapaz se encontrava.Depois continuou rindo,murmurou algo inaudível e tomou um gole da garrafa de vinho que trazia embaixo do braço.

-O que você disse?- ela perguntou.

-Você é bonita- ele respondeu e tomou mais um gole.

-O-obrigada- ela gaguejou de volta. Ele riu mais alguns minutos e tomou metade da garrafa antes de quebrar o silêncio.

-Eu estava no bacanal,sabe.Um marinheiro tinha me ajudado a chegar aqui.Malditos eram os seus companheiros.Achavam que iam conseguir dinheiro pelo meu resgate- ele riu e tomou mais um gole-.Eles iam conseguir um raio na cabeça pelo meu resgate.Por sorte encontrei Sileno quando cheguei com o único marinheiro bondoso daquele navio.Admito que não bebi pouco- ele não pareceu se importar se ela estava ouvindo ou não.Riu e bebeu por mais alguns minutos até que a garrafa estivesse vazia.Enquanto isso,Ariadne o analisava.

Não duvidava que fosse um deus,pela beleza do jovem.Tinha olhos e cabelos negros e grandes cachos que emolduravam o rosto pálido sob a luz da lua,pois estavam sentados na entrada da caverna.Vestia um manto púrpura e que parecia combinar com tudo nele,desde o sorriso embriagado e irresistível até as feições suaves.Mas nada a impedia de achar que ele nunca,nunca seria seu amante.

Primeiro porque ela somente esteve disposta a se entregar para um homem uma vez,e isso a levara a estar ali,presa e magoada em uma ilha desconhecida dentro de uma caverna com um possível deus que não estava exatamente ciente de seus atos.

Segundo porque ela não se tornaria amante de um homem que voltava de bacanais bêbado e sentava dentro de cavernas com donzelas indefesas,obrigada. Ela assistiu ele esticar o braço musculoso para colocar a garrafa de lado e desviou os olhos,corada.Ele lhe dirigiu um sorriso propositalmente sedutor e apoiou a cabeça na parede avaliando se a moça a sua frente valeria seu tempo ou se seria como mais uma sacerdotisa oferecida.

Era bela,sem dúvidas.Filha de algum rei,talvez.O longo cabelo negro e liso caía pelas costas e estava bagunçado,mas não enozado. Alguns dos enfeites que ele costumava ter estavam espalhados pelo chão em volta da jovem,que parecia não perceber. Dioniso pensou em colocar um de volta em seu lugar,mas se segurou. Já deveria ter assustado a jovem o bastante por uma noite. Seus olhos verdes estavam longe,as bochechas morenas,ruborizadas e o rapaz creditou a si mesmo por isso.A vergonha da jovem só o deixou mais confiante de que ela sim,valeria o tempo,e não só o tempo,de um deus.

-Você sabe quem eu sou?- ele perguntou obrigando-a a olhar pra ele.Ela levantou uma sobrancelha e deu um sorriso,tímido,mas irônico.Ela tinha certeza que ele era,no máximo,um deus menor.Grandes deuses tinham coisas mais importantes pra fazer.

-Eu deveria saber quem vossa majestade é?- ela debochou.No fundo,estava com uma pontada de medo.Ela era só uma mortal,afinal.

-Confesso que não sou muito cultuado.É díficil essa vida de jovem deus,sabe- ele fez uma careta.Atrevida,pensou.Gostei dela.

-Eu imagino.Muitas sacerdotisas?-ela fez uma tentativa de piada.

-Na verdade,acabei de voltar do meu próprio bacanal- a embriaguez havia sumido completamente,um dos sintomas de não ser tão afetado pelas drogas mortais.Mas Dioniso admitia que a conversa com a mortal era no mínimo...interessante.

-Deveria estar se agarrando com uma sacerdotisa,então.Não é isso que geralmente acontece num bacanal?- ela levantou a sobrancelha novamente.

-Você obviamente nunca foi num bacanal.Lá acontecem orgias em massa,não tem essa de "se agarrando".Ninguém é de ninguém,minha pequena pupila - ele respondeu com ar superior enquanto fazia sinal de aspas com os dedos.

-Tem razão,eu nunca fui a um bacanal.Porque princesas de respeito não frequentam bacanais,preferem cultuar seus deuses no templo,obrigada- ela retrucou com o mesmo ar superior.

-Então eu sou seu deus?- ele retrucou com o mesmo sorriso sedutor e o rubor voltou ás faces de Ariadne.

-N-não foi isso que eu quis dizer- ela gaguejou.

-Acho que foi sim- o deus se aproximou lentamente,e lentamente...ela se afastou. Dioniso levantou uma sobrancelha diante da recusa dela.

-Me desculpe.Me desculpe,mas eu não posso.Simplesmente não posso- as lágrimas tornaram a escorrer e ela se levantou pra sair da caverna.Mas antes,Dioniso segurou seu tornozelo obrigando-a a parar.

-Ei,espere.O que aconteceu?-ele perguntou,surpreso pela reação da princesa.Ela virou o rosto para olhá-lo e as lágrimas escorreram mais ainda pela face.Tinha certeza que aquele era o deus de quem Afrodite falava.Mas também tinha certeza que nunca mais iria se permitir ter esperança de que amaria novamente.Teseu fora somente seu primeiro amor,e veja só,o que acontecera.

Ariadne desabou no chão,chorando tudo o que segurara enquanto esperava pelo seu deus.Aquele que a cuidaria,que a consolaria e que faria dela sua esposa.Esse homem certamente não seria um deus bêbado,Afrodite havia se enganado.

Então Dioniso fez tudo o que Ariadne esperava que ele não fizesse:a abraçou.Mas no momento,ela não se surpreendeu,apenas encostou a cabeça no ombro do deus e esperou que o próprio choro cessasse.E quando parou,ela não moveu um músculo.Apenas continuou ali,abraçada com um deus que ela não conhecia. De repente,Dioniso se soltou dela e a estendeu a mão.

-Prazer,eu sou Dioniso,deus do vinho,das festas e da alegria.Agora se apresente,fale seu nome e porque uma moça tão bonita chora tanto. Ela soltou um risinho diante da última sentença.

-Meu nome é Ariadne e eu choro porque percebi que nunca mais serei feliz,mas estou começando a mudar de ideia.

-Ótimo- o deus tirou uma garrafa da bebida púrpura,da mesma cor de seu manto,que estava tomando antes da bolsa de couro que sempre carregava consigo.-Tome.Vai se esquecer de qualquer coisa que a esteja incomodando. -Ela olhou a garrafa com dúvida,mas acabou aceitando.

A bebida era boa,mas forte,principalmente pra ela que era acostumada com a água mais pura de Creta.Tossiu algumas vezes e tomou mais um gole.E outro.E outro.Até que o deus teve que tirar a garrafa dela para que não se embebedasse de uma vez.

-Ei,ei,ei.Não tome tudo.É a sua primeira vez,vai ficar com uma ressaca horrível- e puxou a garrafa dela.Ela protestou um pouco mais acabou entregando.Dioniso suspirou e guardou a garrafa.Ela riu debilmente e suas costas escorregaram pela parede.Ela caiu deitada no chão e continuou rindo.

-Primeira vez.Primeira vez.Quer dizer que haverá outras?- Ariadne olhou esperançosa para o deus ao seu lado e ele soube que ela não falava do vinho.

-Quem garante que haverá uma primeira?- ele respondeu enquanto assentava as garrafas na bolsa.

-Afrodite garantiu- ela respondeu o desafiando a discordar da deusa do amor.

-Afrodite,é?Nesse caso,não há como discordar de um deus.- Dioniso respondeu enquanto baixava a alça do manto de Ariadne.

[...]

-Já falei,Ariadne,volto logo.Você sabe que não posso simplesmente parar de viajar.Tenho que espalhar meu culto pelo mundo- disse Dioniso com um olhar sonhador.

-Eu sei,eu sei.É só... eu fico preocupada. Dioniso suspirou.

-Quantas vezes vou ter que dizer que só tenho olhos pra você?- ele lamentou.

-Tudo bem,tudo bem.Eu entendo que fique com outras mulheres.Você é homem e tem que frequentar bacanais e...- O deus do vinho suspirou.

-Ariadne,eu nunca vou possuir outra mulher enquanto tiver a mais bela mortal aqui,me esperando no Olimpo.

-E quem é?- ela olhou pros lados como se as ninfas,deusas menores e todas as mulheres não-mortais fossem concorrentes. Dioniso soltou uma gargalhada,deu um beijo de despedida em sua esposa e cutucou sua testa.

-Você ficou ainda mais bonita usando seu presente de casamento. -Ela ajeitou a coroa dourada e cravejada de pedras preciosas na cabeça e levantou o nariz,como uma digna princesa.

-Porque eu o ganhei do melhor marido que uma simples mortal poderia querer. -Lá de baixo,Sileno acenava para que o casal se separasse.

-Preciso ir.Te vejo em alguns meses- ele disse para a esposa que suspirou com pesar e o deixou ir.

-Tudo bem- ela disse com um ar triste. Dioniso acariciou sua face.

-Não fique assim.Eu volto,e apesar de não ter poder suficiente para torná-la uma deusa,você será imortal.Naquele momento,Ariadne não entendeu do que o deus falava.

Mas entendeu no momento de sua morte,quando cada uma das pedras de sua coroa subiu até o céu formando uma constelação,chamada Coroa Ariadne,de onde ela pôde observar seu marido que a cada dia longe dela tornava-se mais rabugento e cada um dos semideuses que não sabiam o quanto poderiam estragar a vida de uma pessoa.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Comentem. Se gostarem de uma comédia inteligente (mentira),leiam minha outra fanfic,That's What You Get.



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