Sinal escrita por Universo das Garotas


Capítulo 38
38º Capítulo




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38º Capítulo – Fred

Eu nunca tomei uma decisão tão rápido em toda minha vida.

Já passei por várias situações em que foi necessário escolher entre matar ou ser linchado. Roubar ou sofrer de fome. Trapacear ou ser prejudicado. Correr ou ficar para ser um bode expiatório. E principalmente, entre morrer ou sobreviver.

Nasci na pior parte da Cidade. Órfão de pai, criado por uma mãe que tentava inutilmente ganhar a vida lavando roupa para fora. Eu possuía mais dois irmãos, um que apenas servia para ser mais uma boca e outro, o mais velho, o bandido mais terrível da nossa região.

Aos 15 anos, meu irmão foi acusado de matar seu próprio pai, segundo marido da minha mãe e responsável pela perda da visão de um dos seus olhos. Mas por falta de interesse na investigação, não foi condenado. Eu tinha nove anos.

Aos 19 anos ele colecionava um ficha criminal de dar inveja. 29 homicídios, destes 10 latrocínios e inúmeros envolvimento em tráficos e roubos. Era o terror da nossa cercania. E o terror da minha vida.

Não podia me ver lendo um livro, vendo algum filme que me batia até eu gritar de dor. Depois de me espancar, quando nossa mãe estava fora, ele apenas se desculpava dizendo que aquilo era para eu virar homem. Ele era coberto de tatuagens. Eu odiava cada uma delas.

Nosso outro irmão assistia tudo completamente atônito. Seu frágil corpo era limitado pela sua mente. Ele possuía uma deficiência mental, o que era óbvio tendo em vista a atrofia de seus membros e da sua cabeça. A única coisa não atrofiada em seu corpo era sua língua. Não falava, só comia. E se eu não desse para ele de hora em hora ele gritava uns uivos estranhos até ficar rouco. Eu ficava apavorado com a possibilidade de ele conseguir andar e me acertar com as mãos.

Mas isso nunca aconteceu. Pelo contrário, sua situação piorava cada dia mais a olhos vistos, para desespero da nossa mãe.

Certo dia, eu estava acordado de tarde, lendo um de meus livros roubados da creche da favela, quando um cheiro de queimado veio da cozinha. Era um curto circuito provocado pelos fios entrelaçados, usados para funcionar a rede elétrica dentro da nossa casa. Gambiarra das piores.

Ao lado, Sandro, meu irmão mais velho e Junior o deficiente, dormiam no sofá com a TV ligada. Tentei acordar os dois aos berros, mas tudo na casa se incendiou em questão de segundos. Peguei muito rápido uma garrafa esquecida na bancada da cozinha e joguei na direção do caminho do fogo que se alastrava. Infelizmente, era álcool que a minha mãe armazenava em garrafas pet, para economizar. O pior aconteceu:

Todos os móveis, as paredes e meus irmãos, viraram borrões vermelhos bem na minha frente.

Eu pulei a janela apavorado, ainda com a garrafa na mão. Olhei para dentro enquanto gritos de desespero de meus dois irmãos interrompiam o crepitar do fogo. Não se tinham passado minutos, quando vizinhos correram na direção de nosso pequeno barraco tentando com baldes estropiados conter o avanço do fogo. Se não fosse triste eu poderia até sorrir da ridícula situação.

Nessa hora, o amigo do meu irmão e seu braço direito nas operações da boca de fumo chegou ao meu lado e olhou na direção da minha casa. Já completamente tomada pelo fogo. E olhou para as minhas mãos.

Pegou a garrafa das minhas mãos e cheirou o conteúdo: percebeu que era álcool. E sabia que eu tinha cometido a maior estupidez.

Mas ele fez o que eu nunca teria imaginado: sorriu para mim, como se tivesse orgulho do que eu tinha feito. Naquela noite, após a minha mãe chegar em casa e caí na nossa calçada, contemplando a morte de seus dois filhos, Jason puxou me pelo braço e me levou para a sede das transações dos negócios de meu irmão, para meu desespero: eu seria julgado pela “firma” e eu nem sabia qual era a penalidade por matar um dos seus líderes. No entanto, para surpresa geral, eu fui apresentado como o novo líder, por direito. Eu tinha ateado fogo no meu irmão vivo, por vingança pelos maus tratos. O outro, segundo eles era peso morto e eu tinha feito um favor. Agora eu era respeitado e eles seguiriam as minhas ordens. Virei o novo chefe do lugar.

Eu tinha 13 anos.

Voltando para o presente, eu avancei pela minha casa a procura de Beatriz. E de Jason.

Olhei ao redor e não encontrei nada que me indicasse a sua localização. Depois de revirar o andar de baixo, eu me preparava para subir, quando a vi.

Primeiro seu corpo estava no topo da escada. E logo atrás, segurando seu pescoço, vinha Jason com uma arma na outra mão.

Eu o olhei furioso, nesse instante. Ele apenas sorriu e em questão de segundos, desceu a escada com Beatriz, flanqueando pela minha sala para se afastar de mim.

Beatriz estava apavorada mas mantinha seu semblante fixo em mim. Eu só me movimentava quando ele o fazia. Esperava a minha melhor chance de atacar.

Só que Jason percebia isso e apenas afastava. Aí ele começou a fazer o que ele fazia de melhor: falar demais:

– Ora, se não é o mais novo engomadinho? Nem parece mais o Fred da favela. Lembra quando você só tinha um par de chinelos para colocar em seus pés?

Eu não falava, só observava. Quando ele desse uma brecha, eu atacaria.

– A lindinha aqui sabe como você começou seus negócios? Melhor, ela sabe como você adquiriu sua primeira firma? Não, eu suponho, mas vou contar. Detesto segredos...

Eu arregalei os olhos para Beatriz. Ele me olhava de maneira estranha, mas eu queria ao mesmo tempo tirá-la daquela situação. Qualquer coisa dita por Jason, não poderia significar mais do que sua vida.


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