1

Emily viu o dia clarear. Surpreendentemente ela estava muito preocupada com Victoria, e ficou vigiando ela a noite toda. Aos primeiros raios de sol, Emily se levantou e colocou a mão na testa de Victoria. Ela ainda estava com febre, embora fosse menor do que a da madrugada. Emily tentou acorda-la.

— Victoria — disse Emily a sacudindo de leve

Victoria abriu lentamente os olhos, mas voltou a fecha-los.

— Vou pegar água pra você — disse Emily — e você vai beber de qualquer maneira

Victoria não respondeu, ela estava fraca demais. A desidratação estava agindo rápido, sem água o corpo não funciona e Victoria poderia começar a ter alucinações a qualquer momento, entrar em coma e morrer. Emily não queria nem imaginar essa possibilidade. Ela se levantou, pegou o casco de jabuti e seguiu para o lago.

2

Ainda era muito cedo, o dia mal nascera, mas Conrad já estava no heliporto de onde sairia o resgate. Dois helicópteros estavam sendo preparados. Eles não sabiam que em condições encontrariam Emily e Victoria, por isso era necessário levar um helicóptero ambulância.

O investigador responsável veio receber Conrad.

— Não se preocupe senhor Grayson, vamos conseguir resgata-las.

Aiden se aproximou com cara de preocupação

— O que foi? — perguntou Conrad

— Tem uma tempestade se aproximando da ilha — disse Aiden — isso dificulta o resgate

— Quando vão partir? — perguntou Conrad

— Em 10 minutos — respondeu Aiden

3

Emily chegou ao lago o mais rápido que pode. Ela se abaixou para colher a água com o casco do jabuti, quando notou que a água não estava completamente parada como no dia anterior. Havia uma pequena ondulação. Emily olhou para as pedras na parte final do lago e viu que estava escorrendo água.

Ela se animou. No dia anterior as pedras estavam apenas úmidas, mas agora tinha uma fina corrente de água descendo. Emily imaginou que estaria chovendo no alto da montanha. Ela apoiou o casco na parede de pedra para tentar colher a água que descia, pois esta estava visivelmente mais limpa do que a do lago. Infelizmente a corrente era fina demais e ela não conseguiu coletar nada.

Emily deu um passo para trás e olhou para cima. Havia um pequeno declive nas pedras, e na parte de cima a água descia um pouco mais forte.

— O que eu faço? — perguntou Emily para si mesma

Ela estava em duvida se pegava a água do lago ou se tentava escalar as pedras para conseguir água mais limpa. Victoria não estava bem e se Emily pegasse a água do lago, ainda ia ter que ferve-la e esperar esfriar, sem contar que o organismo já debilitado de Victoria poderia não aceitar bem aquela água visivelmente suja.

Emily pegou o casco de jabuti e o amarrou na cintura com a corda do paraquedas, que ela carregava sempre consigo. Ela ia escalar as pedras e conseguir água limpa.

Emily começou a escalar a parede de pedras. Mais uma vez o treinamento que tinha feito com Takeda foi bastante útil. Ela subiu lentamente, sempre calculando bem onde devia se apoiar. À medida que subia, ela podia sentir a água escorrendo com um pouco mais de velocidade e isso a animava.

Emily já estava a cerca de 3 metros acima do chão, quando ao pisar numa pedra, esta se desprendeu. Ela ficou pendurada, se segurando fortemente na pedra de cima e tentando encontrar um apoio para os pés. Emily notou que as pedras da parte de cima, não estavam completamente presas, elas rangiam conforme ela tentava subir e isso não era bom sinal. Seus braços estavam doendo, ela precisava encontrar um apoio para os pés ou não conseguiria aguentar por muito tempo.

Emily olhou para os lados, viu uma pedra mais saliente e tentou se apoiar nela. Ao colocar o pé na pedra, esta também se desprendeu e Emily não aguentou se segurar. Tudo desabou. Emily caiu de costas e sentiu o impacto do chão de forma intensa. As pedras que haviam se soltado desceram rolando e atingiram Emily.

— Ahhhhh — gritou Emily. Era um grito angustiante de dor.

As pedras tinham caído sobre as pernas de Emily e ela não conseguia se mover. Ela só sentia dor, muita dor, e teve certeza de que sua perna esquerda estava quebrada.

4

No acampamento improvisado Victoria abriu os olhos, mas não conseguiu se levantar. Sua cabeça doía e ela estava com frio. Aos poucos tentou se arrastar para mais perto do fogo e percebeu que estava coberta pelo casado de Emily.

— Emily? — disse Victoria num tom baixo. Ela não tinha forças nem para falar

Ninguém respondeu e Victoria imaginou que Emily tivesse ido buscar água. Desde que chegou ali, Victoria tinha se recusado a beber a água daquele lago, mas agora ela estava disposta a bebê-la. Sua boca, garganta e olhos estavam complemente ressecados, e ela sentia tudo arder. Naquela situação ela beberia qualquer coisa liquida, não importando o quão sujo fosse.

Victoria se aproximou o máximo possível do fogo, se cobriu com o casaco e fechou os olhos. Ela sentia que poderia dormir por um mês inteiro

5

Emily estava caída e presa no meio das pedras. Apesar da dor, ela conseguiu reunir forças para gritar

— Victoria! Socorro!

Emily gritou algumas vezes, mas sabia que mesmo que Victoria a escutasse não teria forças para ir até ela.

Emily esticou os braços e sentiu água. Ela tinha caído na beira do lago de modo que além da dor, ela ainda tinha que aguentar aquele cheiro desagradável.

Com muita dificuldade, Emily conseguiu tirar as pedras menores que tinham caído sobre si, mas suas pernas estavam presas embaixo de uma grande pedra e ela não conseguiu move-la.

Mais uma vez Emily tentou levantar o tronco e se sentar, mas foi impossível. A dor era intensa e ela sabia que em casos como aquele se mexer demais poderia causar mais danos. Ela não sabia o que fazer, e imaginou que não poderia estar numa situação pior.

Mas podia. Emily sentiu uns pingos atingirem seu rosto.

— Chuva — exclamou Emily — era tudo o que eu não precisava agora

A chuva rapidamente aumentou e os pingos grossos a estavam incomodando. Ela cobriu o rosto com as mãos e torceu para ser uma chuva passageira.

6

Na casa dos Graysons Daniel entrou no escritório de Conrad furioso

— É verdade que colocou aquele Aiden na equipe de buscas? — Perguntou Daniel aos gritos para o pai

— Acalme-se — disse Conrad — É verdade sim

— Por que fez isso? — questionou Daniel — Aquele cara não é confiável

— Eu sei que ele não é confiável — disse Conrad — mas nesse caso ele pode ajudar.

Daniel estava visivelmente perturbado

— Eu queria ter ido, mas você disse que não deixavam familiares e amigos irem. Como esse Aiden esta lá? — perguntou Daniel

— Ele tem experiência com isso — disse Conrad — ele já trabalhou com alguma coisa parecida. Eu não sei direito o que era, mas o fato é que ele é qualificado, por isso a equipe o aceitou

Daniel não se conformou com aquilo. De todas as pessoas que poderiam ter ido nesse resgate, Aiden era o que ele menos queria.

— Fique calmo — disse Conrad — não importa quem esteja na equipe, o que importa é que consigam trazer elas sãs e salvas.

7

Alguns minutos se passaram, mas a chuva não parecia diminuir. Emily retirou a mão do rosto e esticou seus braços que estavam doloridos. Ela sentiu a água do lago muito mais próxima. Antes ela só podia atingir o lago com a ponta dos dedos, mas agora seu cotovelo estava imerso nele.

Emily olhou para as pedras de onde caiu e viu a água descer fortemente, como numa cachoeira.

— Oh meu Deus! — exclamou Emily tentando se levantar, mas novamente sendo impedida pela dor

À medida que a chuva caía o lago ia se enchendo e aumentando de tamanho. Emily não conseguia se erguer e sabia que em pouco tempo se afogaria. A única coisa que ela podia fazer era gritar

— Socorro — gritou Emily desesperadamente

8

Victoria sentiu a chuva em seu corpo e acordou.

— Emily? — chamou ela — cadê você?

Com muita dificuldade Victoria se sentou e virou o rosto para cima sentindo a chuva cair. Ela estava com frio, mas a sensação da água caindo sobre seu corpo desidratado era maravilhoso.

Victoria juntou as mãos coletando a água da chuva e em seguia bebeu. Era uma água pura e geladinha. Ela conseguiu sentir o liquido percorrendo todo o seu corpo e imediatamente se sentiu um pouco melhor. Ela continuou tomando a água da chuva aos poucos, e a sensação que tinha era de que poderia beber um rio inteiro

Victoria olhou em volta, mas não viu Emily. As pedras ainda estavam no meio da fogueira, que já tinha se apagado por causa da chuva.

— Estranho — pensou Victoria

Ela sabia que Emily tinha saído há muito tempo para pegar água, mas pelo visto não tinha voltado.

Embora sentir a chuva tivesse sido maravilhoso no inicio, ela começou a sentir frio de novo. Victoria se levantou com dificuldade, amarrou o casaco de Emily na cintura e jogou o paraquedas por cima do corpo, transformando-o numa capa de chuva.

Ela ainda se sentia tonta, mas decidiu caminhar até uma arvore com a copa mais fechada para se proteger um pouco mais da chuva.

Victoria tinha dado apenas alguns passos quando ouviu a voz de Emily gritando por socorro.

— Emily — gritou Victoria o mais alto que conseguiu — onde você esta?

9

No lago, a água já estava no ombro de Emily. Ela estava completamente desesperada, quando um raio de esperança surgiu: Victoria tinha escutado seu pedido de socorro.

— Estou no lago — gritou Emily, que nunca imaginou que daria graças a deus por ouvir a voz a Victoria.

Victoria chegou ao lago ainda com muita dificuldade para caminhar, suas pernas tremiam e sua cabeça ainda estava um pouco tonta.

A chuva continuava a cair, embora já tivesse diminuído um pouco. Ao ver Emily caída a ponto de se afogar, Victoria juntou o restante de suas forças e foi ate ela.

— O que aconteceu? — perguntou Victoria se abaixando ao lado de Emily

— Estou presa — disse Emily — tente soltar minhas pernas

Victoria começou a empurrar as pedras que estavam sobre as pernas de Emily

— Ahhhhh — gritou Emily

Cada vez que a pedra se movia a dor aumentava

— É muito pesada — disse Victoria

— Você tem que conseguir — disse Emily — a água esta subindo depressa, logo vou me afogar

Victoria viu do que Emily estava falando, a água já estava chegando ao queixo dela, em poucos minutos Emily morreria.

— Aguente firme — disse Victoria se preparando para empurrar a pedra com todas as suas forças

Victoria apoiou as duas mãos na pedra e a empurrou. À medida que a pedra ia se movendo, Emily gritava.

Assim que conseguiu tirar a pedra grande, as outras foram mais fáceis.

— Consegui — disse Victoria segurando os braços de Emily para puxa-la.

Victoria conseguiu arrastar Emily para fora do lago e ela não corria mais o risco de se afogar

— Obrigada — disse Emily — salvou a minha vida

— Não tem de que — disse Victoria, olhando para a perna de Emily que estava sangrando.

Emily tentou se levantar, mas sempre que se movia a dor a paralisava. Sua perna estava quebrada com certeza, mas ela não sabia se algo mais também estava.

— Não consigo levantar — disse Emily

— Sua perna esta bem feia — disse Victoria enquanto tirava o casaco que tinha prendido na cintura

Victoria limpou um pouco a perna de Emily e amarrou o casaco tentando estancar o sangue. A ferida estava aberta e com pedaços pequenos de pedras e lama do lago. Aquilo não ia demorar a infeccionar.

— Como você caiu? — perguntou Victoria enquanto tentava estancar o sangue da perna de Emily.

— Tentei escalar as pedras para conseguir água limpa pra você — respondeu Emily

Victoria parou imediatamente o que estava fazendo. Um sentimento estranho tomou conta dela

— Você se arriscou por minha causa? — perguntou Victoria sentindo um nó na garganta.

— Foi estupidez, eu sei — disse Emily

A chuva voltou a ficar mais forte. Ainda era dia, mas as nuvens encobriram todo o céu. Mesmo com sol era difícil da luz penetrar na mata profunda, mas com uma tempestade daquelas o tempo tinha escurecido bastante.

Victoria percebeu que Emily estava tremendo.

— É irônico não é? — disse Victoria

— O que? — perguntou Emily

— A gente estar nessa situação porque tentamos conseguir água, e agora temos água até demais — disse Victoria

Emily riu um pouco. Mas até sorrir fazia seu corpo doer.

— Você ainda esta fraca — disse Emily — saia daqui e procure uma árvore grande para se abrigar

— E você? — perguntou Victoria

— Não consigo andar — disse Emily — mas vou ficar bem. Eu sou forte.

Victoria se levantou e saiu

Emily estava com frio e com muita dor. Ela tentava ficar o mais imóvel possível, mas seu corpo inteiro tremia. De repente ela sentiu alguma coisa a cobrindo. Victoria tinha ido buscar o paraquedas e o colocou por cima de Emily.

Victoria se deitou ao lado de Emily e cobriu ambas com o paraquedas se protegendo o máximo possível da chuva

— O que esta fazendo? — perguntou Emily

— Não vou a lugar nenhum — disse Victoria — Eu também sou forte.