Os novos herois do Olimpo escrita por valberto


Capítulo 66
Acertando as contas




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Estavam todos reunidos de novo, junto ao resto de dois batalhões de katómeros. Eles olhavam para a sede do santuário, tão perto e ao mesmo tempo tão longe. Entre eles e o resto dos semideuses um oceano de inimigos.

– Bom, estamos com o poder no máximo. Não vejo porque não descer essa ladeira a toda velocidade e varrer esses caras de formiga vermelha do caminho. – disse Eric externando toda a confiança que jamais tivera antes em sua vida.

– Por causa do “papi” e da sua pedra voadora. – disse Oliver apontando o dedo laconicamente para cima, onde a enorme rocha de uns setecentos metros de diâmetro parecia estar flutuando. Ele nem a olhava mais. Era uma visão desconcertante demais. – precisamos de um plano.

– Planos são comigo mesma – exclamou Nathalia, estendendo um pedaço de pano sobre um caixão preto que ao que parece ela vinha arrastando desde o chalé de Ares. O pano era um mapa mais ou menos detalhado daquela área do santuário. – As forças deles estão concentradas nesta área. Se nos dividirmos em duas frentes temos mais chances. Podemos começar o ataque por aqui e depois dando a volta aqui. Fico um pouco preocupada com os minotauros, mas eles não são exatamente resistentes contra o poder de fogo que temos aqui... depois o que precisamos é... vocês trocaram de roupa?

Só agora os colegas deram uma boa olhada em Oliver e Jade. Os dois estavam com roupas de campistas, enquanto Nathalia, Lucas, Isabel e Eric ainda estavam com as roupas do jantar no Terraço Itália. Ou o que sobrou delas, a julgar pelo estado em que se encontravam algumas.

– Demos uma passada na antiga casamata, que eu e você construímos quando éramos crianças. Estava tudo lá, mas com um leve cheirinho de mofo. – disse Jade com um sorrisinho amarelo no rosto.

– Aquele do bosque dos buritis? Com Dezan e os outros? Imagino que tiveram a decência de trazer algo para que eu me livre deste pesadelo em forma de vestido de festa...

– Na verdade... – começou Oliver antes de ser fuzilado pelo olhar desconcertante da filha de Ares. O menino engasgou e apontou para Jade – foi tudo ideia dela. Eu não sabia de nada.

– Isso é que é coragem – resmungou Lucas que por enquanto não pensava em vestir as roupas do Santuário. Não tão cedo pelo menos. Aquela sua roupa parecia assentar muito mais sua recém descoberta personalidade extrovertida.

– Ah, mas isso é realmente maravilhoso! – disse Nathalia, dando voltas em torno de si mesma. – você tem noção do que é lutar num vestido de festa?

– Acho que todos nós sabemos. Pelo menos as que usam vestidos. O que tem de tão ruim? – perguntou exasperada Isabel. Aquela conversa era para ela algo que não deveria estar acontecendo. – Você tem raiva de ser mulher? Acha que o feminino é fraco? Acha que a guerra não foi talhada para usar um vestido de festa? Cresce menina!

Todos pararam e fitaram a menina por um instante. As palavras de Isabel deixaram um curto silêncio, seguido pelos sons de batalha que se ouviam ao longe. Nathalia olhou sério para ela. Parecia que a qualquer momento ia explodir em fúria, uma coisa bastante comum para os filhos de Ares. Mas não com ela. Nathalia parou, descerrou os punhos e baixou a cabeça. Suspirou antes de continuar.

– Desculpe Jade. Não é culpa sua... é que... deixa para lá. De onde paramos?

– Seja lá de onde for, parece que não é mais importante. – disse Eric, sacando suas adagas. – parece que demoramos demais e o exército inimigo resolveu agir.

Ao longe, lenta, mas inexoravelmente as hostes vermelhas estavam se pondo em marcha, mas com o gigante abobado puxando a linha, seguido por pelotões de minotauros, ladeados por touros mecânicos do tamanho de tanques de guerra. Estavam vindo na direção dos meninos.

– É amor, acho que aquele seu plano de passar no meio deles vai ter que funcionar – disse Jade sacando seu arco.

– O plano funcionaria se eles estivessem de costas – resmungou o menino – precisávamos do elemento surpresa.

Elemento surpresa. Acho que nenhum deles jamais vai esquecer dessas palavras quando Isabel se teleportou uns vinte metros na direção dos inimigos. Ela moveu os braços em movimentos amplos e um círculo brilhante começou a s formar em volta dela, como se tivesse sido pintado no chão com tinta fosforescente. As letras foram se formando, misturando palavras em grego e latim, símbolos arcanos e símbolos dos deuses. O símbolo de Hécate surgiu no chão e colado nele, desenhou-se o símbolo de Hades.

– Das profundezas do inferno, em silêncio. Suas magias, violência explosiva! Pilotas russas voam perfeitas. Anjos invisíveis da noite nunca erram seus alvos.

Num primeiro momento nada aconteceu. Eric tencionou mover-se na direção dela, mas ela se virou antes do velocista fazendo sinal que ele não viesse.

– Das profundezas do inferno, em silêncio! Suas magias, violência explosiva! Pilotas russas voam perfeitas! Anjos invisíveis da noite nunca erram seus alvos! – gritou a menina a plenos pulmões, primeira uma vez e depois mais outras até que sua voz sumisse num fiapo de som.

Nada aconteceu. As hostes começavam a subir a ladeira que dava acesso direto até a parte dos chalés onde os meninos estavam. Não demorariam muito mais para chegar. Dava para ver o gigante abobado com uma expressão malvada no rosto, esfregando as mãos de antecipação.

– Hades, você não vai negar meu pedido, nem que eu tenha de usar isso – disse Isabel sacando uma adaga de bronze. Ela fez um longo corte na palma da mão direita. A menina tentou disfarçar a careta de dor, mas não conseguiu. Trêmula, ela pôs a adaga de volta em sua bainha e cerrou o punho ferido fazendo com que o sangue gotejasse sobre o símbolo de Hades. A cada gota que caía mais partes do círculo arcano eram tomadas de vermelho até que todo o círculo pareceu ter sido feito de sangue. A menina respirou fundo, fechou os olhos e recitou novamente:

– Das profundezas do inferno, em silêncio! Suas magias, violência explosiva! Pilotas russas voam perfeitas! Anjos invisíveis da noite nunca erram seus alvos!

A estrada de ladrilhos finamente encaixada pouco a frente dela começou a tremer e depois explodir em pequenos gêiseres de vapor. Depois uma explosão de vapor maior ainda deixou uma cratera no chão, grande o bastante para engolir um ônibus inteiro. Foi que começou o barulho. Distante no começo, ecoando pelas profundezas do túnel recém-formado. Um som distinto e muito conhecido. O som de um motor de avião. O barulho foi aumentando até que o primeiro biplano da 1º guerra mundial saiu de dentro dele, como um dardo cuspido de uma zarabatana. Depois dele mais quatro aeronaves saíram do buraco.

– Essas aeronaves... são biplanos russos Polikarpov Po-2. – comentou Nathalia, espantada e extasiada, como um amante de carros de corrida que encontra uma Ferrari Enzo estacionada casualmente na frente do seu mercado favorito. As aeronaves eram feitas de madeira, cobertas com lona. Bom, deveriam ser assim quando ainda voavam, mas agora, saídas das profundezas do Tártaro era a visão da decadência: rombos de metralhadora nas laterais, rasgos de lona tão terríveis que a segunda aeronave não teria pano para levantar uma pipa do chão. As pilotas, todas mulheres jovens, com olhares cadavéricos. Mas estranhamente felizes, como se estivessem voando numa missão de vingança e satisfação. Como se depois de uma temporada no inferno, estivessem satisfeitas por voar de novo. Numa das aeronaves era possível ver uma inscrição pichada em cima da sigla 588 NBAP: Nachthexen. – Eles são a marca registrada das Bruxas da Noite, um esquadrão bombardeiro composto só por mulheres na segunda guerra mundial!

O pequeno esquadrão enfileirou-se no céu formando um “V” e mergulhou em direção à terra, num rasante impressionante. No quarto final do caminho elas arremeteram liberando uma carga mortal de bombas. Em seguida voaram à meia altura soltando sua carga. Mas estranhamente as cargas explosivas não detonaram ao impacto. Elas ficaram lá, no chão, inertes. Claro, algumas delas atingiram alguns katómeros, mas não causando nenhum dano real. Foi quando elas deram a volta no prédio central e passaram voando pelos meninos que as bombas detonaram.

Não havia palavras para descrever aquele espetáculo de destruição. As bombas explodiam sem sequencia perceptível, trazendo o caos ao exército inimigo. Era uma verdadeira sinfonia de fogo infernal, estilhaços de bronze celestial, dor, sangue e morte, varrendo o campo de batalha como o grito tempestuoso de uma bruxa. Uma não. Cinco. Cinco bruxas da noite que gargalhavam freneticamente em meio às explosões. Todo o espetáculo não deve ter durado mais do que alguns minutos, mas foi o bastante para ficar gravado com ferro em brasa na memória de todos: por fim os biplanos pararam na estrada, pousando num espaço exíguo, impossível não fosse pelos poderes sobrenaturais que os mantinham intactos.

Uma das pilotas desceu de sua aeronave e caminhou até Isabel, passando por seus amigos como se eles não existissem.

– Espasseba druzhishche! – disse a pilota russa zumbi estendendo a mão para Isabel. Prontamente frank traduziu as palavras da moça: “muito obrigada, camarada”. A menina bruxa não se fez de rogada e apertou a mão da pilota. – Eto Vam. Proshchal'nyy podarok i dokazatel'stvo druzhby (Isso é para você. Um presente de despedida e uma prova de amizade).

A zumbi retirou sua jaqueta de vôo, revelando a camisa branca que usava por baixo dela cravada de furos. Ela a dobrou com distinção e entregou para Isabel. Depois, em silêncio, retornou para sua aeronave e decolou, seguida pelas outras, em direção ao norte.

– Isso foi incrível – disse Eric enquanto se apressava para limpar o ferimento da amada em enfaixa-lo o melhor possível. Isabel não reclamou quando enquanto o menino demonstrava o seu carinho por ela, mesmo de forma descuidada como ele sempre fazia. Quando ele terminou ela vestiu a jaqueta por cima do seu vestido. Ela ainda rescendia a sangue.

– Não acabou ainda – disse Lucas, colocando-se em posição de combate. Pelo menos um quarto das forças inimigas não tinha sido destruída durante o ataque eles se reuniam instintivamente, buscando cumprir o último comando que lhes tinha sido dado. Claro, havia o também desejo de retaliação pelos companheiros mortos.

– É... eu estava guardando isso para um dia chuvoso e parece que está chovendo. – disse Nathalia, abrindo o caixão que carregava. Tinha de tudo lá: uma metralhadora m60, muita munição em correia, lança granadas m9, um lança mísseis RPG-7 40mm. Ela pegou um sobretudo feito de pedaços de couro costurado e o vestiu. Depois foi arrumando as armas em volta de si mesma.

– Não vai dar uma de cavaleiros do zodíaco? Tipo vestir aquela maneiríssima armadura de Ares? – perguntou Eric.

– A armadura não me pertence mais. Eu a dei para a minha irmã mais velha... – respondeu ela, não deixando transparecer alguma tristeza. Era assim sempre que falava da irmã. – em troca ela me deu sua moto lobo. Vamos embora pacato. Temos trabalho a fazer!

– Pacato? Não entendi a referência... – disse Eric.

– Só mesmo a filha de Ares para misturar na mesma frase He-man e Scarface – disse Oliver, montando em seu cavalo de mármore. Jade montou em sua garupa, arco pronto para ação. Lucas ficou na frente de Isabel para protegê-la. Nathalia gritou e todos foram ao ataque.

– Pacato... era o gato do He-man? Mas eu achava que era “Cringer”... ei esperem por mim! – disse o filho de Hermes lançando-se no ar.

Os meninos partiram para o combate. A moto lobo uivava de satisfação destruindo qualquer mostro que passasse perto dele. Nathalia usava suas armas com maestria mortal. Fazia parte do pacote de ser filho de Ares: saber usar instintivamente e muito bem qualquer arma. Aquilo que passava por Nathalia ou seu lobo caia invariavelmente nas mãos de Oliver e Jade. Eric mergulhava em vôos rasantes, cortando tudo em seu caminho com a velocidade de uma flecha. Em poucos minutos o que restou do exercito invasor era um punhado de manchas no chão.

Os semideuses que estavam encastelados no prédio central saíram de lá comemorando como se fosse o final do campeonato brasileiro, envolvendo os jovens heróis com gritos de felicidade, agradecimentos, abraços e tapinhas nas cotas. Estava feridos, magros, desgastados, abatidos, mas com um novo sopro enchendo de esperança seus olhos fundos.

Lucas buscou entre os amigos e conhecidos o rosto de uma pessoa. Finalmente o rosto surgiu no meio da multidão. Uma montanha de grama se levantou do chão, livrando-o da cacofonia fraterna de seus irmãos e irmãs e o empurrou até onde o filho de Dionísio estava. Outra montanha de matéria vegetal levantou o outro menino no ar deixando os dois frente a frente.

– Você está bem João? – perguntou Lucas com um tom inflexível na voz.

O filho de Dionísio parecia confuso com a pergunta. Ele estava tão bem quando poderia estar um semideus que sobreviveu a um cerco e uma guerra. Estava ferido, claro. Um corte sobre o lábio superior deixaria uma cicatriz charmosa no seu rosto apolíneo. Seus cabelos negros, encaracolados desciam como cascatas pela pele morena jambo. Ele era mais velho que Lucas, e até alguns meses atrás tinha o corpo maior e mais definido. Hoje os dois estavam quase que empatados neste quesito, sendo que Lucas levava clara vantagem.

– Estou bem sim. Obrigado por me salvar... obrigado por salvar todos nós. – disse o filho de Dionísio sem jeito.

– Eu pensei no que você me disse meses atrás – disse Lucas olhando fundo nos olhos do outro rapaz.

– E então?

– Então que eu não tenho mais medo.

Os dois se abraçaram e se beijaram longamente. Não que houvesse alguém olhando ou que alguém se importasse. O Santuário tinha sua primeira vitória significativa em semanas. Pouco depois o conselho foi reunido. Havia muito a falar. Muita coisa para ser feita.

42 horas para a coroação de Apolo.


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