Os novos herois do Olimpo escrita por valberto


Capítulo 39
Capítulo 39




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Este é o caminho que escolhi

– Mas não é possível! – exclamou Dezan, espantado demais para fazer qualquer coisa. Todos os lugares onde Jade fora tocada pelo fogo estavam intactos. Era como se ela nunca tivesse tido nem mesmo uma queimadura de sol em toda a sua vida. Os cabelos loiros estavam cada vez mais claros, quase brancos, finos como dourados fios de trigo. Desciam cascateando pela lateral do rosto, emoldurando a expressão assustada da menina que olhava para si mesma sem entender o que estava acontecendo. Mas se ela não tinha sofrido nada, exceto algumas manchas de fuligem que apareciam de leve o seu rosto. O mesmo não poderia ser dito de suas roupas. Da cintura para cima Jade estava completamente nua.

Isabel levou as mãos à boca, espantada também. Não tanto porque a amiga tinha sobrevivido sem nenhum arranhão à torrente de fogo grego, mas porque ela estava seminua. Isabel não se acostumava a toda essa “indecência” do mundo moderno. Já achava estranho e desconfortável andar por aí sem vestidos, mesmo reconhecendo a praticidade de calças compridas.

Jade levou cerca de dois segundos para perceber o que estava acontecendo e instintivamente tentou se cobrir da melhor forma que pode. As lembranças do desafio do templo ainda estavam vívidas na sua mente, de quando Oliver a viu nua no seu quarto.

Isabel correu até ela, tirando a jaqueta que vestia e amparando a amiga. Dezan não se mexeu, embira fosse possível ver que o rapaz desviava os olhos das áreas mais “descobertas” da guerreira. Uma vez refeita e com o corpo coberto jade voltou suas atenções para Dezan. Meio segundo depois ela percebeu que esse tinha sido o seu erro.

Dezan era filho de Afrodite. Não apenas isso era também chefe do chalé de Afrodite e líder da unidade de elite dos lanceiros do Santuário. Era um inimigo desafiador. Mas o seu grande trunfo não estava na sua habilidade de combate. Era o seu olhar. O jovem tirou o elmo de guerra deixando os cabelos suados espalhar-se delicadamente sobre a sua testa bronzeada. Ele baixou a cabeça de leve e olhou de soslaio para as meninas. Numa instante ela parecia um modelo saído da propaganda mais sensual que a Dolce & Gabbana jamais tinha produzido. O coração de Isabel acelerou, sua boca ficou seca e seus joelhos fraquejaram. Ela sentia um calor dentro de si, uma excitação, um desejo de paixão, como se fosse uma fã adolescente diretamente na frente de seus ídolos teen. Não fosse a contida educação que recebera estaria descabelando como se fosse uma fã dos Beatles diante de seus ídolos.

Jade sentia a mesma coisa e se odiava por isso. Ela já tinha sido apaixonada por Dezan. Os dois já tinham sido namorados. “Namorados” é modo de dizer, já que Dezan já tinha “namorado” com quase todas as meninas do Santuário. Mas isso tinha sido a muito tempo atrás. Jade tinha acabado de chegar ao Santuário quando conheceu Dezan. Ela não tinha muitos amigos e nem tinha sido reclamada ainda. A única pessoa que era sua amiga de verdade era Nathália. As duas tinham chegado juntas ao Santuário salvas por Filoctetes. Uma amizade forte, nascida do infortúnio tinha unido as duas. Jade era a mais velha e Nathália a via como substituta de Verônica, sua desaparecida irmã mais velha. A amizade das duas crescia forte, como as raízes de um baobá, mas algo ficou entre elas. Dezan. Usando seu charme de filho de Afrodite ele namorou as duas, fazendo com que o doce néctar da amizade de ambas virasse um amargo fel que as separava. Dezan tinha sido um canalha não apenas por namorar as duas, mas especialmente por separar as amigas, pensou Jade centenas de vezes. Embora todos dissessem que era apenas a natureza volátil dos filhos de Afrodite Jade sabia que havia algo a mais ali. Mas seja lá o que fosse aquele “a mais”, Jade não estava disposta a pensar nisso agora. Ela queria sobreviver. Lutar. Salvar os amigos.

Ela respirou fundo, inalando mais que o ar à sua volta. Ela inalava a fúria que começava a arder em volta dela. Seus músculos estavam retesados e ela sentiu os mesmos sentimentos que Isabel. Mas havia algo diferente dessa vez. Jade sabia com quem estava lidando. Sabia que o amor de Dezan era tão falso quanto uma nota de três reais. E ao vê-lo assim alguma coisa acendeu dentro dela. Algo que nem ela e nem o filho de Afrodite sabiam que poderia existir.

– Dezan meu amor – ela sussurrou caminhando de braços abertos para ele. Em poucos passos foi amparada pelo abraço forte do lanceiro. Ele sentia o calor do corpo da menina e de seu dorso nu roçando em sua armadura de couro. O perfume de Jade era ainda mais doce do que ele se lembrava.

– Tudo vai ficar bem, eu prometo – dizia ele apaziguador enquanto via Isabel debater-se em choro porque sua grande recém-descoberta paixão se entregava aos braços de outra. Ele sabia que era uma questão de tempo para que Isabel deixasse o choro de lado e partisse para cima de jade com tudo o que ela tinha. As pessoas ficam cegas pelo amor, pensou ele ao recordar-se das palavras de Cupido.

Então Jade levantou o rosto encarando Dezan de frente. Ela entreabriu a boca, esperando o beijo. Ele olhou fundo nos olhos dela. Quem sabe o beijo acelerasse a fúria da menina bruxa e as duas pudessem se nocautear mais rápido. A mão de Jade tocando o seu rosto o fez esquecer-se dos estratagemas por um segundo. Ela estava linda, ali, entregue a seus desejos, ansiosa por seu beijo. Ele se curvou e seus lábios rumaram em direção aos dela.

Foi quando ele sentiu a pior dor de sua vida. Uma pancada forte atingiu seus países baixos, fazendo com que o guerreiro se curvasse para frente, caindo ao chão em posição fetal. Ele gemia enquanto as lágrimas escapavam pelos seus olhos cerrados. Jade estava em pé, a lança de Dezan em mãos, crepitando de energia. Ela se abaixou junto a ele e o agarrou pelo rosto, apertando as bochechas com força.

– Quero que você se lembre lanceiro. Lembre-se para sempre dessa dor. Ela não é nada à dor que você me causou ao partir o meu coração. Lembre-se sempre de como me senti inútil, despedaçada, jogada na sarjeta, um pedaço de pano largado ao relento. Lembre-se também de que eu o derrotei no seu próprio jogo. E que você só vai viver porque eu assim permiti. Sua vida, por mais imprestável que seja agora me pertence. – ela ergueu a lança e golpeou Dezan no rosto. A lança partiu-se com o impacto levando o garoto inconsciente ao chão.

Isabel começou a se recompor. Ela sentia a magia pulsando à volta dela, consertando seus sentidos, expurgando a paixão de Dezan de seu corpo. Num minuto ela sentiu-se livre da influência do semideus, mas depois sentiu-se suja, ultrajada. Era como ele a tivesse violado, forçando uma paixão não natural para dentro de seu coração. Ela pensou em atacar o guerreiro caído, mas aquilo não aplacaria a sua dor. Ao invés disso fez apenas um rápido feitiço e correu para Jade tratando de cobrir a amiga. Não longe dali os co0legas estavam desacordados. Não demorou para que fossem libertados e curados. Os lanceiros tinham vindo preparados e não pareciam se importar em dividir seus recursos de ambrosia com os guerreiros recém-despertos.

Lucas entretanto, não estava com o grupo. Ao ser informada do acontecido, do ataque com fogo grego, Jade sentiu ainda mais raiva de Apolo. Muitos daqueles semideuses que faziam parte dos lanceiros eram amigos de Lucas. Não que ele fosse um menino popular no Santuário, mas não havia qualquer um que o odiasse. Pensar um atacar o amigo com fogo grego lhe revirava as entranhas. Apenas a influência de Apolo poderia ser capaz de algo assim. E ela sabia como sue pai poderia ser bastante “persuasivo” quando ele queria.

– Uau! Você os derrotou sozinha? – Eric parecia incrédulo exigindo mais e mais detalhes das façanhas de Isabel. – Vamos lá, conte mais! Então você ergueu um gigante feito de vapor que nocauteou os lanceiros? Hulk de Vapor esmaga – dizia o menino golpeando o ar e imitando o famoso personagem do cinema. O riso de Isabel vinha fácil. Ele sabia que naquele momento era o que ela precisava. Aliás, era o que todos precisavam: um bom alívio cômico depois da derrota.

– Ah, mas não fiz tudo sozinha não! Jade derrotou todos eles sem a minha ajuda. Ela os derrotaria sem mim. – as palavras de Isabel pareciam leves e divertidas, mas carregavam o peso da verdade. Apesar de todos os seus novos poderes ela ainda era apenas um peso extra para o grupo. Uma chave para abrir uma porta que eles nem sabia onde estava. Jade por sua vez parecia estar curtindo aquela coisa toda, satisfeita com seu desempenho em batalha. Ela empunhava uma lata de cajuína São Geraldo (um tipo de refrigerante local) como se fosse uma caneca de chope, bebendo largos goles entre uma risada e outra.

E se Eric sabia divertir, era o trabalho de Oliver trazer todos à realidade.

– Bem, pelo registro dos lanceiros, Lucas foi levado para o IJF – Instituto José Frota. Um hospital municipal com unidade de queimados. Provavelmente tem um ou dois lanceiros cuidando dele. Não fica longe daqui – dizia Oliver carregando algumas folhas de anotação nas mãos. Ao que parece, um dos lanceiros, filho de Atena, era uma espécie de escriba do grupo. Todas as missões e deslocamentos dos lanceiros pareciam estar detalhadas nos seus pormenores.

– Temos duas coisas a fazer: resgatar Lucas e pegar nosso equipamento. A essa altura o Santuário já deve saber onde estamos hospedados. Não quero que Dona Zulmira se meta em confusão por nossa causa. O Santuário tem por política se meter o mínimo possível com o mundo mortal, mas devido a essas circunstâncias não podemos vacilar. – Nathália dizia sem tirar os olhos de Jade. Ela sabia, sentia em seus ossos, que a amiga estava completa novamente. Mas havia algo diferente. Algo que não sabia explicar, como uma coiceira que não se sabe de onde vem. Ela queria mais tempo para tentar divisar o que era, mas agora tinha que agir. – Proponho que eu, Eric e Isabel vamos até o hospital resgatar Lucas. O resto de vocês vai até a pensão de Dona Zulmira para pegar o equipamento e pagar a conta. Oliver e Jade vão até o Hotel. Oliver, você ainda tem aquele cavalo de mármore?

O garoto assentiu e num flash de pensamento Marmarino estava a seu lado novamente. Jade não reclamou, ou pelo menos não fez menção de discordar das decisões de Nathália. A jovem semideusa ainda estava se acostumando aquele novo pedaço de si mesma. Estava mais arrojada e decidida. Ela se lembrava especialmente da crueldade das palavras que dissera a Dezan. Crueldade não, corrigiu-se ela: justiça.

Os amigos se despediram depois de colocar os lanceiros desacordados e sem equipamentos dentro do ônibus que eles mesmos tinham alugado. Eric tomou o cuidado de estragar a parte elétrica do motor para impedir que fossem seguidos de imediato.

Jade montou no cavalo, segurando Oliver pela cintura e os dois saíram pela madrugada de Fortaleza em direção à pensão que tinha sido seu lar por algumas horas. Eric pôs-se ao volante e traçou a rota para IJF. Dessa vez, pensou ele, não vou cair tão fácil. Ele apertou a moeda que seu pai lhe dera. Ela estava de novo quente no seu bolso. Algo estava para acontecer. Algo que não parecia se encaixar nos planos do velho Hermes.


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