As minhas sete ex-melhores amigas. escrita por Rodrigo Lemes


Capítulo 16
Parte III - Você aceitaria o meu pedido infinito?




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Dia 9

A madrugada estava tendo seus primeiros segundos de vida quando Noelle havia chegado para me encarar. Fitou-me por um longo tempo sem proferir uma palavra sequer, e depois de nossa distância de dez metros ter diminuído, ela correu para me abraçar. Senti o corpo familiar tendo contanto de afeto com o meu, e naquele momento eu só poderia dizer que a amo.

Não é o mesmo tipo de amor que tenho por Alice, é claro. É diferente, mas ainda assim ela era uma das minhas pessoas favoritas no mundo. Acho que no fundo, éramos como chuva e sol, intensos e inseparáveis.

“Me desculpa, por tudo...” Sussurrei nos ouvidos de Noelle.

“Não irei te desculpar! Há menos que você queira sair comigo agora.” Seu tom de voz estava um pouco invocado.

Olhei para meu pai que estava logo atrás de mim. Ele balançou a cabeça num gesto positivo, me dando permissão para sair com ela. Despedi-me dele e de João Paulo com um abraço, pedindo para que cuidassem bem de Alice. Entrei rapidamente no carro preto, cumprimentando o motorista com um aperto de mãos.

“Quem é ele?” Perguntei a Noelle, referindo-me ao homem que estava no volante.

“Um primo meu. Somos um pouco parecidos, por isso deve ter achado ele familiar ou algo do tipo. Não me lembro de vocês terem se visto pessoalmente.”

“Pois é, eu também não me lembro” Assenti.

Passamos em velocidade alta por algumas ruas escuras, até pegar a estrada para o litoral de São Paulo. As rodovias estavam vazias, e haviam somente caminhões que exportavam produtos na estrada. Fiquei encarando a menina de olhos azuis por algum tempo, e embora fosse de noite, ela ainda estava usando óculos escuros.

“Porque você tá usando óculos escuros de noite? E para onde estamos indo?” Perguntei, franzindo a sobrancelha de curiosidade.

“Primeiro: porque eu uso o que eu quiser e bem entender. Segundo: estamos indo pro inferno, lugar onde aquela Alice deveria ter ido.”

Confesso que o comentário de Noelle sobre Alice havia sido bem babaca, mas no fundo eu sabia que ela estava brincando. Me lançou um sorriso sem mostrar os dentes, e logo retornou a falar.

“É lógico que eu estou brincando, né Dante. Deixe de ser idiota! Mesmo eu odiando aquela vadia ruiva, não desejo a morte das pessoas. Sei que ama mais ela do que eu, pois como sempre você é o babaca que escolhe as pessoas erradas. Mas não posso lhe julgar, o amor é cego.”

“Você também já se apaixonou pelas pessoas erradas.” Retruquei.

“O grande problema é que, às vezes, as pessoas erradas são as pessoas certas para a gente. O mundo é interminavelmente deprimente, Collins.”

No fundo, acho que Noelle realmente está certa sobre tudo. Eu sou muito babaca por ter preferido ficar com uma garota problemática ao invés de ficar com ela, que é ‘saudável’ e coisas do tipo. Mas não posso deixar de afirmar que quando se ama alguém, algumas coisas perdem o valor de existência. E uma dessas coisas certamente é o mundo: você não irá se importar se a pessoa é um traficante drogado, pois está amando demais ela para ter um pré-conceito.

Chegamos a uma cidade litorânea, que senão me engano se chama Praia Grande, às cinco horas da madrugada. Descemos rapidamente do carro, se despedindo do motorista forte e bem talhado. Quando ele já havia virando a esquina, e só a escuridão do mar e a luz das estrelas predominavam, fiquei encarando Noelle por um bom tempo.

“E agora, que merda iremos fazer aqui?” Perguntei, ainda um pouco confuso.

“O que você nunca faz na vida: se divertir. Agora bote meus óculos escuros, dê as mãos pra mim, e vamos correr por aí. Vamos provar que somos muito mais do que realmente pensamos ser. Vamos provar que eu e você somos Dante e Noelle, os dois pombinhos apaixonados.”

E então ela me deu sua mão gelada e seus óculos escuros. Eu sempre gostei de usar óculos escuros, pois isso lhe dá uma sensação meio drogada. Enxergar tudo meio escuro e sem grandes pretensões é uma das melhoras sensações no mundo.

Caminhei até o mar com Noelle em minhas costas, seus braços magros presos em meu pescoço. Nós sempre fazíamos isso quando saíamos e estávamos namorando, pois ela não era o tipo de menina que só queria ficar se pegando num canto. A realidade é que eu não vejo ela como uma menina bonita em que quero fazer coisas sexuais, e sei que isso pode parecer estranho, mas só de tê-la ao meu lado já basta. Namorar seria um lucro no fim das contas, pois sua presença me deixava com uma alegria descomunal.

Caminhamos pela areia durante toda a madrugada, entramos no mar, molhamos nossas roupas novas, fumamos alguns cigarros e compramos refrigerantes num posto 24 horas. E quando o sol já estava prestes a escurecer, Noelle fez uma coisa impressionante. Não me lembro muito o que eu havia falado, mas sei que estávamos sentados num banco de pedra, até ela me beijar. Sim, ela me beijou! Como se aquilo fosse à coisa mais natural do mundo. Depois, passou suas mãos brancas em meu rosto e cabelos, num gesto de afeto. Me deu mais um beijo, só que agora na testa, e ficou abraçada comigo. Eu não tinha nada a dizer sobre aquilo, mas tomei coragem de fazer uma pergunta.

“Porque... Porque... Está fazendo isso?” Gaguejei.

“Porque eu te amo. E também porque não poderemos ficar mais juntos, não só pela questão da Alice. Eu estou namorando, Dante. Quer dizer, não é nada muito sério, mas ele é um cara bem legal. O tipo de pessoa boa e bonita que não faz coisas erradas.”

“Isso é um tanto quanto decepcionante. Mas, porque fez isso? Desse jeito você estaria traindo o seu namorado queridinho... Puta que pariu, que merda.” Meu tom de voz já havia se alterado um pouco, o que é estranho. Eu não me importaria se ela tivesse namorando, mas confesso que estou com um pouco de ciúmes. Que merda!

“Não é traição. Sei que um dia ficaremos juntos, Dante. E quando ficarmos juntos, ninguém poderá nos separar. Ninguém mesmo! E eu realmente espero que você transe com muitas garotas, para que quando fiquemos juntos, você não seja tão bobo.”

E então ela me beijou de novo. E eu só retribui, enquanto via o céu ganhar tonalidades alaranjadas.

Dia 10

Estou me sentindo um merda nesse exato momento. Virei uma pessoa realmente odiosa, o tipo de gente que não sabe o que quer da vida. A menina que eu amo está num hospital, enquanto eu estava se pegando com uma amiga minha que tinha namorado. E mesmo se ela não tivesse namorado, tanto fazia. Mesmo que eu beijasse a mulher mais gostosa do mundo, seria traição. Seria como se o amor que sinto por Alice parasse de ser um furacão para se tornar uma garoa.

Agora estou sendo corroído por dentro. Estou num ônibus lotado de pessoas vazias, enquanto Noelle voltou para a capital. O que quero dizer, é que eu não planejo olhar na cara dela por um bom tempo. Correr o risco de fazer tudo aquilo de novo é repulsivo. Mas tirando isso, não vejo a hora de voltar pra casa e enfim ver o estado de saúde de Alice no hospital.

Durante todo o trajeto que fiz de ônibus, nada de muito interessante aconteceu. Eu só desci na rodoviária e gastei meus últimos dois reais comprando um suco, ligando para João vir me buscar de carro. Eu estava tragando um cigarro com expressão melancólica quando ele chegou buzinando e abaixando o vidro. Me encarou por um tempo com aquela com aquela cara gorda, até começar a encher o saco.

“Até quando você vai fumar essa merda? Puta que pariu, Dante! Já te disse pra parar de fumar esse câncer. Até seu pai não anda mais fumando...”

“Olha só quem fala, o menino que vai ser pai com dezesseis anos. Você sabe muito bem que eu só fumo para antecipar minha morte, não quero viver muito tempo depois que Alice for embora. E no fundo, o mundo cria seus próprios vilões. Alguns fumam porque acham legal, eu fomo para não precisar me suicidar.” Assim que terminei de falar, bati a porta do carro e bufei alto.

Durante todo o trajeto, não conversamos sobre nada. Provavelmente porque eu estava ignorante demais, mas quando chegamos ao hospital, eu pelo menos agradeci ao João Paulo.

Abri a porta de entrada rapidamente, o que fez com que algumas pessoas ficassem me encarando. Deve ser porque minha camisa social estava com um pouco de areia, embora eu não me importasse com isso. Quando passei perto do café, onde eles serviam aquelas comidas ruins pra caramba, encontrei Tom tomando seu café matinal. Ele percebeu minha presença, sorrindo pra mim.

“Ela tá acordada! Vai lá no quarto visitar ela, rápido!” Gritou Tom, antes que eu me aproximasse dele.

“Valeu, tio!” Agradeci, deixando uma lágrima de alegria escorrer de meus olhos.

Sai em disparada por todos os corredores, até chegar ao quarto em que Alice estava de repouso. Havia uma enfermeira feia e gorda na porta que não havia me deixado entrar, mas depois de tanto insistir, consegui entrar.

Entrei sorrateiramente pelo local, com passos lentos e silenciosos. Alice estava sentada sob a maca, encarando uma parede esbranquiçada em sua frente. Suas expressões faciais estavam sem vida, e eu não podia ver seus olhos cor de mel, pois ela usava óculos escuros.

Ela havia mudado bastante desde a última vez que eu a vi. Estava com um corte à altura da bochecha rosada, parecia ter emagrecido muitos quilos, e sua pele antes cor de neve estava pálida.

Eu fiquei encarando-a por longos minutos. Alice não pareceu notar minha presença, ao contrário disso, cobriu suas pernas magricelas com um cobertor de ursinho. Para minha surpresa, virou-se para o canto do quarto onde eu estava, e depois de um tempo me encarando, resolveu abrir a boca.

“Dante Collins?” Perguntou-me a menina ruiva, a mesma voz doce e calma de antes.

“Hum... eu mesmo...” Gaguejei. Por mais que eu tivesse mil palavras para dizer, nenhuma viria na minha mente naquele instante.

“Já era de se esperar que fosse você. Ficou todo acanhado num canto, embora pudesse sentar-se na merda dessa cama e conversar comigo.”

“Minha camisa está toda molhada, não tô afim de sujar sua maca.”

“Eu não tô enxergando merda nenhuma, então pra mim tanto faz. Eu não sou tão fresca assim, seu idiota” O tom de voz de Alice estava mole e devagar demais para dizer palavrões.

Sentei-me ao lado dela, segurando suas mãos magricelas e dando um beijo no corte em suas bochechas rosadas.

“Você não está cega, né?” Perguntei, um pouco confuso.

“É lógico que não. Só que minha medicação contra dores musculares é muito forte, afetando assim minha visão. Quando fico sem os óculos escuros, enxergo tudo muito claro, o que certamente poderia me deixar cega e tal. E eu não quero ficar cega.”

Ficamos nos olhando por alguns minutos, até eu dar um beijo em sua testa branca e sardenta.

“Não precisa ficar me dando beijos, ou achando que sou alguém a ser protegida. Meu tio me contou o que você fez enquanto eu estive internada, e sei que isso é fofo e tal, porque você é um menino muito meigo. Mas, você tem aquela namoradinha idiota, e eu tenho uns caras pra transar. Não precisa disso.” Alice parecia ligeiramente irritada.

“Calma, Alice. Eu não estou mais namorando, então se você quiser ser minha nova namoradinha...” A essa altura, meu tom de voz gaguejou novamente, pois eu sempre gaguejo quando estou nervoso.

“Eu não aceito pedidos assim sem uma aliança.”

“Ah, mas quem precisa dessa merda! Vamos imaginar que estamos no Alasca fumando cigarros enquanto ouvíamos Bob Dylan e The Smiths dentro de nosso trailer. Você está super furiosa comigo porque eu quebrei seu disco favorito de música, mas daí você se lembra que nós iriamos ver as estrelas hoje, e começa a ficar feliz. E enquanto nós víamos as estrelas deitados na grama, eu te beijo e a peço em casamento. Só que dai eu lembro que esqueci as alianças! Mas pouco importa, pois a nossa aliança seria um bebê. Não, dois bebês! Você estaria grávida de um casal de gêmeos ruivos lindos que iriam brincar com o filho gordo do João Paulo.”

“Tem razão, Dante Collins. Você é um ótimo escritor, deveria usar essa sua lábia pra seduzir mais garotinhas do que uma problemática.”

“E se a problemática é que fosse a minha garotinha?”

“Mas pensando bem, essa é parte que eu aceito o pedido. E então, você me ama?”

“Até o infinito.” Assenti.

“Eu também te amo até o infinito, ida e volta, Dante Collins.” Disse a menina ruiva, logo após nós darmos nosso último beijo.


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Notas finais do capítulo

Para o pessoal que anda curioso: esse não é o último capítulo ainda.
Sobre o triangulo amoroso do Dante Collins: vocês sabem que eu prefiro a Alice.
Sobre o motivo de eu escrever sobre isso: eu nunca escrevo coisas muito boas. Mas agradeço a todos pelos comentários, e elogios. Mas continuo me achando um merda na escrita.



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