Daniela tamborilava os dedos irritados no volante. Seus problemas invadiam sua mente e a única coisa que ela conseguia pensar era que ela tinha que resolver todos em uma semana.

“Não posso ir para o Japão com o Rodrigues e deixar Alice sozinha, preciso de alguém para substituir Cláudia, nem que seja um homem.”

A Cláudia que invadia os pensamentos de Daniela, era sua emprega, a governanta Cláudia que estava com ela desde que ela havia se casado. Porém ela não era nova, esse ano ela havia completado 62 anos e havia pedido demissão.

Daniela negou veemente, mas uma coisa que não podia negar era que a mulher estava velha e não conseguia cuidar da casa e da filha como antes. Daniela aceitou o pedido, mas pediu um prazo de um mês para que achasse outra pessoa.

Mas a mais de um mês eles estavam tentando achar alguém mas não conseguiam, a maioria estavam apenas interessado no dinheiro e não fazia o serviço direito, sempre tentando pegar seus bens, outros achavam que ela exigia demais para o salário e pediam o dobro tentando a extorquir, mas ela logo os mandava embora. As que tentavam não ficavam mais de duas semanas no cargo, logo pediam para sair.

“Eu tenho que achar um funcionário ainda essa semana, ou não sei o que farei”

-x-

Duas semanas antes – Rio de Janeiro

Um moreno andava apressados pelas ruas escuras do subúrbio carioca, devido a seu capuz ele passava despercebido por muitos, e era isso que ele queria. Não ser notado.

Ele entrou em um beco apressado, e retirou um cigarro do bolso acendendo-o, tragou o profundamente e soltou a fumaça inundando o ambiente

-Sabia que mais cedo o mais tarde você viria – O moreno se virou nervoso e encontrou um negro encostado na parede oposta o olhando divertido.

-Preciso de mais

-Mais? Você me deve 20 mil. Não vou lhe dar mais – O negro se desencostou da parede e veio caminhando furioso em direção ao moreno que recuava. – Você irá me pagar, até sábado, ou então será você boiando na Baia de Guanabara

-Não me ameace - O negro apenas riu do olhar do moreno e o empurrou fazendo-o recuar alguns passos.

-Você não está mais na gringa meu irmão, quem manda aqui sou eu.

-Mas eu preciso de tempo e de dinheiro – Ainda implorou o moreno fazendo o negro rir ainda mais.

-Sábado é meu ultimo prazo.

-E como vou conseguir 20 mil até sábado?

-Se prostitui. Com esse seu corpo, muitos vão querer. Posso lhe indicar um excelente cafetão – Zombou o negro, mas o moreno apenas fechou a mão em punho se irritando.

-Não!

-Então arranje outro jeito. Quero os 20 mil na minha mão, no sábado. – O negro caminhou em direção a saída do beco, mas antes de se virar ainda disse – Não tente fugir de mim, irei te caçar até o inferno. – Com uma risada sarcástica o negro saiu do beco deixando um moreno furioso.

“Terei que fugir, mais uma vez”

Ele jogou a butuca de cigarro no chão e pisou apagando-a, ele teria que dar um jeito de sair da cidade, até sábado.

O moreno voltou a andar pelas ruas apressado e apenas parou quando chegou a cinco quilômetros do local do encontro e adentrou num beco, tão escuro quando o primeiro.

Dirigiu-se até uma lata de lixo, e se sentou no colchão ao seu lado e começou a reunir todos seus pertences que estavam reunidos em diferentes cantos do beco.

“Nem que eu tenha que ir a pé, no Rio de Janeiro eu não fico mais”

-x-

Daniela suspirou cansada enquanto esperava o portão de sua casa abrir e ela passar pelos jardim até chegar a garagem e estacionar seu Audi A6 preto.

Olhou para o relógio e percebeu que já se passavam das oito, provavelmente sua filha estaria dormindo, enquanto ela tinha mais no mínimo duas horas de trabalho

“Odeio semanas pré-viagem”

Daniela abriu a porta do carro e jogou os chinelos que estavam em sua bolsa no chão, tirou os sapatos de salto e saiu do carro colocando os chinelos com os sapatos na mão.

Enquanto caminhava por seu hall de entrada, Daniela só pensava em o quanto queria um banho gelado e colocar seu pijama. Com os pensamentos longes ela nem percebeu a presença da senhora parada ao lado da escada.

-Sra. Cavalcanti? – Daniela parou no meio da escada e se virou surpresa para a senhora

-Cláudia? Nem a vi parada ai. Algum problema com Alice?

-Não, a menina está bem

-Então o que é?

-Sobre a vaga...

-Eu sei que já faz mais de um mês Cláudia – Daniela suspirou frustrada e soltou os cabelos deixando seus longos cabelos castanhos escorreram pelas suas costas até sua cintura – Mas prometo que vou providenciar tudo antes mesmo de eu viajar para o Japão

-Não precisa – Daniela a olhou estranhando, enquanto a senhora apenas sorria aliviada. – Consegui uma pessoa, e espero que a Sra. Goste

-Quem?

-Douglas Ribeiro – Daniela a olhou surpresa.

Era um homem, e aquele nome ela conhecia, mas não lembrava de onde, havia algo de familiar nesse nome.

Um moreno estava parado no final do corredor com as mãos em punho e olhando irritado para a figura na escada.

Ela, era justamente ela sua chefe? Como a vida podia ser cruelmente irônica com ele.

-Conheço esse nome

-Ele é da mesma cidade que a Sra. – Daniela deu os ombros se dando por vencida.

Tentaria se lembrar mais tarde, mas agora ela apenas queria um banho

-Amanhã falo com ele, apenas mande o jantar para o escritório, estou cansada.

-Como a Sra. Desejar – A governanta deu as costas e Daniela voltou a subir, porém ela viu um mero vislumbre no corredor em que a governanta entrava, o vislumbre de alguém conhecido.

Ela apenas deu os ombros e se dirigiu ao seu quarto.

Para Daniela era comum ver vultos e vozes de pessoas conhecidas, principalmente de seu ex-marido falecido.

-x-

O moreno fechou a porta do quarto com um estrondo e tirou o colchão de sua cama jogando-o no chão.

Douglas tinha problemas sérios de raiva, ele não conseguia controlá-la e agora era um dos momentos.

Daniela Pereira Cavalcanti.

Ele a conhecia, ele sabia que aquele nome não lhe era desconhecido, apenas o Cavalcanti lhe confundiu, mas esse era de seu falecido marido.

Daniela Pereira.

A garota que era afim dele na escola.

A garota que fazia as provas dele.

A garota que ele deu o fora.

Quando ela soltou os cabelos, Douglas a reconheceu imediatamente.

Ele sempre adorou os cabelos dela, longos e bem cuidados.

Continuavam os mesmo, mesmo 12 anos depois.

Dessa vez ele estava proposto a fazer tudo dar certo, mesmo sendo um trabalho do qual ele não tinha a mínima ideia ele queria dar certo, ele queria ser honesto. Sair da vida que tinha.

Mas ele não queria rever o passado, e ela estava ali.

Ele tinha certeza, quando ela o visse na manhã seguinte o mandaria embora, por que ela iria o querer ali? Sabia que ele não era o mais adequado para o trabalho.

Daniela o conhecia, sabia a pessoa que ele era, sabia os costumes dele e sabia muito bem que ele não era uma boa influência.

“Irei voltar para a rua novamente”

-x-

Daniela tinha os olhos concentrados em seu computador e nem ao menos tinha noção da figura moreno parada ao lado de fora da porta de seu escritório sofrendo um debate interno.

Era o seu trabalho agora, fazer as vontades dela e ela queria comer, só que ele não queria abrir aquela porta, ele sabia que no momento em que ele abrisse a porta estaria demitido.

E tudo que Douglas menos queria era ser demitido.

Finalmente ele havia conseguido um emprego após um ano.

Ele ganhariam razoavelmente bem, 1600 por mês, comida, casa e roupa. E tudo que ele teria que fazer era cuidar de uma criança e mandar os outros deixarem a casa limpa.

E mandar os outros fazerem o trabalho dele era ótimo.

Bem ele seria, se ela deixasse ele trabalhar.

Douglas bufou irritado e abriu a porta de uma vez entrando

-Seu jantar – Ele anunciou a olhando.

Daniela estava sentada atrás de sua mesa de mogno preto com os olhos grudados na tela de seu computador

-Tá, tá. Deixa ai na mesa – Ela falou apontando para um lugar qualquer daquele escritório. Que mais parecia uma biblioteca, devido a grande quantidade de livros que haviam por suas instantes.

Uma das paixões que Daniela sempre dividiu com seu falecido marido foi a leitura, e durante anos eles conseguiram montar aquela biblioteca, que era o lugar favorito dos dois na casa. E onde Daniela passava maior parte de seu tempo quando em casa.

Douglas deu as costas a ela e depositou a bandeja com o jantar numa mesinha redonda que havia perto de uma das estantes.

Quando o moreno se virou Dani o fitou com curiosidade

“Ele é forte!”

Foi seu primeiro pensamento ao analisar as costas largas de seu novo mordomo.

“Sem dúvida ele não é velho, e tem uma voz grossa bem interessante”

Dani balançou a cabeça tentando fazer os pensamentos saírem de sua mente e voltou a se concentrar na tela enquanto voltava a prender seus cabelos num nó.

-Mais alguma coisa? – Perguntou Douglas com seus olhos azuis céu fitando com curiosidade a morena, mas essa nem ao menos voltou a olhá-lo. Ela tinha que terminar aquele balanceamento.

-Não, pode ir dormir

-Boa noite Sra. Cavalcanti

Douglas se retirou do escritório antes mesmo de ouvir a resposta.

Pelo menos nessa noite ele dormiria em uma cama macia, como não fazia a muito tempo.