A volta de Alice escrita por Serena


Capítulo 4
Steve, o jardineiro


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.

[revisado: 30/11/2015]



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Alice estava muito mais do que chocada, não podia acreditar que a irmã teve a coragem de esconder sua gravidez durante o jantar e seria capaz de continuar a esconder sua gravidez. Não conseguia impedir a raiva, seus punhos se fecharam com força não somente por ter escondido aquilo, mas também porque continuavam escondendo alguma coisa. Algo bem mais sério, que podia acarretar perigos e infortúnios no futuro. Seus castanhos olhos se cerraram ao perceber que Mathilda estava arfando.

Mathilda estava muito mais que decidida e seus grandes olhos azuis pareciam cristais entre a iluminação crepitante da lareira. O fogo dançava no fundo da sala. O marido, com um olhar péssimo de desaprovação, começou a irritar Alice ainda mais.

— Mathilda — disse Alice, arrasada, em um tom mais fino que o esperado. A irmã a encarou por um tempo, aparentemente não esperando apenas que terminasse a frase. — Como pôde pensar em esconder algo assim da gente? Se não fosse eu te olhar você ainda estaria escondendo! Que droga...

— Eu ia contar de qualquer jeit... — murmurou Mathilda.

— Isso não importa! — continuou Alice. Sua voz trêmula de raiva ecoou por toda a sala e ouviu cochichos por trás da porta. Ela foi marchando na direção dela e a abriu, flagrando os empregados. Estava com tanta raiva que se sentiu obrigada a descontar tudo neles. — Saiam daqui, isso é assunto particular de família. Se puderem ter a dignidade de criarem seus próprios assuntos em outro lugar, agradeço e muito. — Os empregados, de cabeça baixa, concordaram e saíram em silêncio.



A noite foi bem silenciosa na casa da mãe de Alice, principalmente depois da briga que teve com a irmã. Claro que ela estava arrependida de ter gritado com ela e não ter se mantido em silêncio foi mesmo um erro. Não sabia pelo que Mathilda estava passando e gritar com ela com certeza não foi de grande auxílio. Por isso, resolveu se levantar e se desculpar com a irmã naquele momento. Caminhando na direção da porta, girou a maçaneta e sentiu uma pressão, quase como se alguém estivesse girando ao mesmo tempo que ela.

E era mesmo. Quando a porta se abriu, Mathilda estava do outro lado, com os olhos quase fechados de tristeza. As duas se abraçaram, em silêncio, e fecharam a porta. Dinah abriu seus olhinhos sonolentos e os fechou novamente ao perceber que não tinha nada para ver.

— Mathilda, me perdoe.

— Está tudo bem, irmã, está tudo bem — respondeu Mathilda, chorando. Era claro que a última coisa que ela queria era ficar brigada com a irmã, mesmo por uma hora. — Meu Deus... como eu poderia imaginar que com a minha idade eu estaria fértil. Minha menstruação está atrasada há quase um mês e ando muito enjoada. É claro que estou grávida...

— É, estou feliz por você, Mathilda, mas por que esconder da mamãe e de mim? — perguntou Alice, o mais calma possível. Mathilda suspirou e baixou os olhos, em silêncio. Ela comprimiu os lábios e levantou os olhos quando Alice voltou a falar. — O que está acontecendo aqui, irmã?

— Acho que Lowell está mentindo para mim — Mathilda soltou tudo de uma vez, sem pausas ou vírgulas. — Ele simplesmente parece não gostar da ideia de termos um bebê e tampouco chega cedo em casa. Alice, acho que ele está me traindo com alguma vagabunda. Ele pediu para que escondêssemos tudo de vocês e quando perguntei o motivo disse que não me dizia respeito. Eu decidi não contestar, mas é claro que me dizia respeito.

Aquele era o momento de Alice escolher entre contar à irmã e a arrasar por completo ou fazer com que ela descobrisse por si mesma. Pensou por um momento e imaginou que se contasse, a irmã ficaria chateada por não ter contado antes e se não contasse, nada de mal aconteceria além do óbvio. Um dia ela descobriria. Escolheu por não contar e ouvir o restante da história.

— Meu Deus! — Alice olhou para o braço da irmã, roxo, e encostou o mais leve que podia. A irmã deu um gemido baixinho e Alice sentiu ainda mais ódio de Lowell. — Foi ele? Foi ele que te fez isso? É claro que foi, ele foi capaz de fazer isso na frente de nós! Ele te violenta, irmã? Porque se violenta, eu vou acabar com ele e...

— Irmã, não. Se acalme, por favor — disse Mathilda. — Ele não me violenta, só é um pouco agressivo de vez em quando. Não sei bem o motivo, mas sei que ele não seria capaz de me violentar.

— Mathilda, pra começar a te violentar falta muito pouco. Já olhou bem para o seu braço?

— Está tudo bem, Alice. — disse Mathilda, sem firmeza nenhuma. Ela foi caminhando para o seu quarto quando parou na porta e olhou para Alice. — Aja como se nunca tivesse contado para você — E fechou a porta às suas costas.

Alice não achou aquilo nada convincente.




O dia amanheceu cinzento como de costume. Porém, as nuvens estavam um pouco mais escuras que as do dia anterior e Alice concluiu que choveria mais tarde. Ela desceu as escadas do casarão e encarou a família, incompleta por Lowell, tomando café. Onde mais ele estaria? Para Alice, era óbvio. Para Mathilda, nem tanto.

O cheiro maravilhoso de café invadiu as narinas da jovem e ela não demorou a se sentar à mesa. As empregadas serviram-na com café e pães amanteigados. O sabor era tão amável quanto o aroma.

Alice estava se deliciando com o café da manhã quando alguém bateu na porta. Curiosa como era, ficou olhando para a porta até que um empregado tomasse a atitude adorável de abri-la.

A empregada mais alta abriu a porta com rapidez e um rapaz com as roupas sujas de terra estava parado na varanda. Ele tinha lábios carnudos e tanto quanto seu cabelo quanto seus olhos eram castanhos. Um castanho diferente, o qual Alice nunca tinha visto. Ela nunca tinha achado um rapaz que a atraísse tanto como aquele e não demorou para dar uma tênue mordida no lábio inferior.

— Sra. Kingsleigh! — ele disse, calmamente. — Achei o problema nas roseiras, ela está sendo comida por umas lagartas azuis. Não parecem ser lagartas comuns, principalmente pela cor. Terão que comprar fertilizantes especiais. Anotei num pedaço de pergaminho o endereço da loja.

— Ah, Steve, obrigada! — exclamou a velha mãe, caminhando em direção de sua pequena e elegante caixinha de moedas para pegar uns trocados.

Steve deu um sorriso para a sra. Kingsleigh e quase instantaneamente correu seus olhos para Alice, que não parava de encará-lo. Ao perceber o contato visual, toda nervosa, exclamou, por sua própria surpresa:

— Olá, eu me chamo Alice. — ela disse, se levantando toda desengonçada da cadeira que mais parecia um trono.

— Olá, sou Steve, jardineiro de sua mãe — ele voltou a sorrir, retornando a atenção para a Sra. Kingsleigh, que continuava com a mão estendida para dar-lhe os trocados.

— Obrigado.

— Você nunca se perdeu naquela floresta, Steve? — perguntou a velha senhora em sua voz de preocupação. O jardineiro deu uma risada calma enquanto contava as moedas.

— Claro que não! — ele disse. — Estou tão acostumado, conheço aquela floresta como a palma de minha mão.

— Sempre quis conhecer a floresta — Alice disse sem perceber e no mesmo instante olhou para a mãe, arrependida, que a devolveu um olhar de negação. Claro que ela não ia aceitar que Alice tivesse um caso com um zé-ninguém como aquele.

Steve a olhou no instante em que começou a falar, parecia ser uma pessoa muita boa, boa do jeito que Alice gostava. Sonhava em ter alguém que podia contar suas histórias, marido ou não.

— A mostro a você, se quiser — falou Steve, sorrindo.

— Eu adoraria — respondeu ela, se perdendo nos olhos de Steve. Não sabia como dizer não a ele. Ignorando o olhar desesperado da mãe, foi caminhando até ele, já satisfeita do café.

Steve abriu a porta e deixou Alice passar, a seguindo até o lado de fora.

— Não sei, não — disse Mathilda, dando risadinhas loucas que eram abafadas com as mãos. A mãe a lançou um profundo olhar de desaprovação.

Alice estava seguindo Steve automaticamente, um pouco arrependida de ter deixado o conforto da casa iluminada e quentinha para ser guiada por um jardineiro por uma floresta assustadora. Ela ficou um pouquinho aliviada por não ser de noite.

— Está gostando do passeio? — perguntou Steve, enquanto percebia a distração de Alice nos pinheiros altos da grande floresta.

— Oh, claro! — mentiu Alice, estava amedrontada. Tremia discretamente por baixo do vestido rosado.

Eles continuaram andando por um longo trajeto. Os pés de Alice já estavam doloridos e sua preocupação aumentava a cada passo, a cada passo longe de sua casa, do conforto, da segurança.

Uma cabana se materializou lá longe, não era tão grande. Em frente dela, uma horta de alface e cenouras, o paraíso de um coelho, pensou Alice. Seus pensamentos ficaram por um momento bem distantes e quase esqueceu que estava parada no meio de uma floresta.

— Mi casa, su casa — Steve apontou para a cabana e Alice deu um sorrisinho, sem entender uma palavra do que ele disse. Ele percebeu e se corrigiu de um jeito que Alice diagnosticou como adorável. — É uma expressão em espanhol que diz que minha casa é sua casa. Gostou da sua casa? — riu ele.

— É assustadoramente linda!

No momento que Alice disse aquilo, algumas gotas de chuva começaram a cair sobre ela e não demorou nada para que se tornasse um temporal. Imaginou a preocupação da mãe ao assistir o temporal da janela e não ter sinal de Alice entre todas aquelas árvores.

Steve deu uma risada curta e abriu a porta. Automaticamente deixou Alice passar na frente. Com isso, fechou a porta e foi em direção de uma grande caixa e de lá tirou uma quantidade média de lenha, acendendo sua lareira para iluminar o ambiente escurecido.

Por dentro parecia bem maior, aparentava até mesmo ser uma casa normal. Alice se sentiu mal por ter categorizado aquela casa como casa anormal, para Steve devia ser normal sim. Cheia de detalhes belos e flores espalhadas por todos os lados, com certeza era um lugar aconchegante. Paredes de madeira bruta deixavam a cabana ainda mais charmosa.

Alice tinha uma visão primorosa da floresta lá fora. A janela era tão limpa que parecia não existir. Mas o vidro era tão grosso que seria impenetrável.

— Quer tomar um chá? — Steve estava de costas para ela, mexendo com uma chaleira e duas xícaras de porcelana. Alice se lembrou de uma pessoa muito importante na sua vida, e sentia falta dele.

— Quero sim, obrigada.

E agora se sentia segura, perto de uma pessoa de confiança, que parecia ser muito interessante. Mexia com plantas e Alice era de alguma forma fascinada pelo assunto. Além disso, pelo cheiro, fazia chás maravilhosos. Alice adorava chá.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler, aguarde o próximo capítulo! Quero reviews, obrigado.



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