Take Back the Night escrita por Camyarsie


Capítulo 19
Sacrifício


Notas iniciais do capítulo

"O que você fez? – perguntou, mesmo sabendo que não ganharia resposta. "



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Eram muitos monstros de uma vez. Jean nunca tinha visto tantos assim desde o primeiro ataque aos seus onze anos – quando ganhara a sua cicatriz no braço. Porém agora chegava a ser pior – pois além de ter quantidade havia variedade, não somente zumbis.

Nem sabia mais quantos já matara; preocupava-se em desferir golpes nas cabeças daqueles que desejavam a sua morte. Na tamanha confusão, perdeu Rick entre a multidão, mas sabia que ele estava bem.

O seu maior problema era as aranhas – os monstros mais rápidos. Por pouco desviava de seus ataques. Teve um momento que uma delas conseguiu abocanhar a sua perna, mas pôde tirá-la antes que fizesse mais estrago. Ardia, contudo era suportável.

De repente, o chão vibrou com uma explosão. Viu alguém sendo arremessado e atingindo uma casa. Assim que ele caiu, não levantou.

– RICK! – Jean gritou temeroso. Correu aplicando golpes em qualquer ser que se opunha ao seu caminho. Parou a poucos metros do seu amigo; o defendendo.

– AGUENTE FIRME! – via pelo canto do olho que ele até tentava levantar, mas sempre acabava desabando na areia. A pancada foi feia.

Jean começou a ficar receoso com a quantidade de monstros que o atacavam. Contudo precisava se defender – não era somente a sua vida que estava em jogo. Em um de seus impulsos de um ataque fatal, outras aberrações o cercaram por trás. Não pareciam ter mais interesse em Rick. Quem sabe quisessem primeiro eliminar os que lhe causavam problemas; que ali no caso era somente o Jean.

Por meio da cabeça de dois zumbis, viu que Rick perdeu completamente as forças.

– RICK! VAMOS! FICA COMIGO! – tentou ultrapassar novamente a barreira e ir acudi-lo, porém... Os seus inimigos mostraram que não seria tão simples.

Um dos zumbis mordeu o seu braço e outra aranha o abocanhou na perna esquerda novamente. A dor que acompanhou foi insuportável. Jean tropeçou e caiu com tudo na areia.

Virando-se para cima, tentou efetuar alguma defesa... Qualquer coisa... Mas outros mortos-vivos o feriam em todo lugar – dando preferência aos lugares já machucados. O engraçado é que quase não iam ao seu rosto: a parte de baixo parecia estar mais interessante.

No começo, nada poderia descrever a dor que sentia. Contudo, aos poucos, Jean foi se sentindo cada vez mais leve. As partes sendo arrancadas já não lhe importavam mais.

Estava morrendo – e sabia muito bem disso.

Muito acima de si, viu o céu e as estrelas com a visão falhando. Nunca reparara como as constelações eram belas... Frias, mas poderosas.

Pensou qual foi o sentido de sua vida... Não fizera algo realmente útil... Então, várias memórias de somente uma pessoa passaram pela sua mente: de Rick. O seu companheiro e melhor amigo desde sempre.

Conseguiu dar um leve sorriso. Fechou os olhos e sussurrou com o último fôlego que lhe restava:

– Não... Ouse... Morrer...

* * *

Rick abriu os olhos lentamente. Naquele exato instante era erguido do chão por alguém.

– O... Quê...? – questionou com a voz fraca.

– Rick – reconheceu a voz de Mestre Eddard.

Ele o ajudou a sentar novamente na areia.

– Como está? – o Mestre lhe perguntou o encarando seriamente.

– Eu... – sua mente estava em branco até tocar nas bandagens em volta de seu machucado logo acima da testa. Lembrou-se de tudo: o ataque, os monstros... De Jean.

Arregalou os olhos.

– Jean! Onde...? Ele está bem?! – exclamou. Seu coração batia a mil.

Seu mundo começou a desmoronar quando Mestre Eddard desviou o olhar.

– Não... – Rick sussurrou.

– Finalmente conseguimos eliminar todos os monstros. Eram muitos mais do que imaginávamos... Outros invadiram pelas laterais, como deve ter percebido. Jean... Não resistiu.

Rick começou a arfar.

– Não... Não... Não...! – levantou-se às pressas e saiu correndo, procurando-o desesperadamente, sem se atrever a acreditar...

Várias pessoas já andavam nas ruas. O sol acabava de aparecer. Após virar a última curva, deparou-se com os mortos.

Muitas criaturas eram empilhadas em um monte enorme mais na frente. As pessoas foram postas em uma fileira ao lado.

Seis figuras descansavam imóveis. Três mulheres, dois homens e... Jean.

Rick aproximou-se mais. Quase não o reconheceu: alguns machucados foram tão profundos que o osso estava visível. A pele não era mais morena; mas sim vermelha. A única parte que lhe permitiu ser reconhecido foi o rosto quase intacto.

Os joelhos de Rick fraquejaram e ele desabou à sua frente.

– Seu idiota... Não seja ferido desse jeito...

Recordou-se do momento que ele lhe defendeu quando estava prestes a desmaiar.

O que você fez? – perguntou, mesmo sabendo que não ganharia resposta.

Mesmo na frente do corpo, Rick ainda sentia-se incapacitado de aceitar que Jean morrera. Que nunca mais poderiam conversar juntos... Lutar juntos... Rir juntos...

Meramente, ouviu um comentário atrás de si:

– Parece que ele vai ter que arranjar outro escudeiro... Porque esse já bateu as botas – ouve risadas com a que era para ser uma piada.

Ainda entorpecido, virou-se lentamente para a pessoa que falara aquilo. Ninguém menos que Henry, que estava com os outros garotos junto às casas. Rick levantou-se e dirigiu-se a passos largos até ele.

Como se atreve a dizer uma coisa dessas?! Sua visão tornava-se vermelha com a raiva que aumentava em seu peito; seus punhos fechados tremiam; quase rosnava de frustação.

Quando Henry se deu conta, foi arremessado por um soco no rosto. Rick poderia ser mais baixo que o seu oponente, contudo tinha uma força monstruosa. Prendeu-o com o cotovelo em seu pescoço contra a parede atrás de Henry.

Ouse falar mais alguma coisa para você ver o que faço contigo. – Rick rosnou com os dentes cerrados e o encarando com uma ira pura – Se atreva...

– Não consigo... Respirar – o garoto engasgou.

– Ei! Você vai mata-lo! – Philip falou, tentando segurá-lo, mas Rick o acertou com um chute traseiro.

Rick não sabia se queria realmente mata-lo; mas sua irritação chegara ao limite. Só queria machuca-lo... Feri-lo... Assim como Henry o feria com as palavras...

Uma pessoa o puxou para trás brutalmente; estava prestes a soca-la quando se deu conta de quem era, e parou no ato. Henry desabou no chão, arfando.

– Rick, pare. Tem certeza que quer fazer isso? – Mestre Eddard perguntou, com os seus olhos verdes-mar o olhando no fundo dos seus azuis.

Ainda tremendo de raiva, respondeu entre os dentes:

– Ninguém sentiria falta, mesmo se eu o fizesse.

– Os pais dele sentiriam. Pare – o adulto falava calmamente.

Os pais dele. Essa frase martelou na sua cabeça. Já perdi os meus faz tempo. E agora... Perdi o Jean, que morreu me protegendo. Meu único amigo. Meu único consolo. Toda a sua ira pareceu se esvair; sendo substituída pela tristeza.

Então Rick correu para longe de todos. Só queria sumir de vista. Sair deste mundo tão cruel – onde os bons perdem e os cruéis ganham.

Lágrimas cortavam sua face. Quase caía diversas vezes por conta da areia. Mas não sentia cansaço; muito menos a dor da pancada que levara.

– Jean... Foi minha culpa... Minha culpa... – revelou com a voz trêmula.

Só queria evaporar. Escapar de seus sentimentos tão devastadores.

* * *

Quando se deu conta de onde acabara de chegar, percebeu que era um lugar bem conhecido: o seu local de treinamento.

Entendeu do porque seu Mestre gostava dali. Parecia que era um espaço separado do mundo; onde ninguém podia lhe dizer o que fazer e muito menos limitar seus atos.

Caminhou até o lago, observando a enorme cachoeira. Respirava fortemente por conta da longa corrida.

Subitamente agarrando a cabeça, Rick soltou um berro ensurdecedor e se jogou de joelhos na grama. Não se importou com a possibilidade de atrair monstros. Queria arrancar seu peito e acabar com aquela agonia sufocante.

A culpa lhe dominava.

Ele abriu os olhos e encarou seu próprio reflexo na água.

– Eu... Sou uma merda... Um inútil desgraçado! Nem consigo me defender sem ajuda. E agora, mais uma pessoa morreu por minha causa... Jean morreu me protegendo! Ele... Teve uma morte extremamente dolorosa... Por... Mim...

Não aguentando mais, enterrou a cabeça entre os joelhos e extravasou todas as lágrimas que poderia soltar.

* * *

Mestre Eddard estudava a enorme fogueira. Os monstros eram utilizados como o combustível delas. Eram dezenas. E perguntava-se como fora possível o fato de tão pouca gente falecer.

Claro, o número ainda era devastador. Seis pessoas que conhecia e se importava em proteger foram perdidas. Mas considerando a violência do ataque... Achava que não foi tão ruim.

Eddard olhou para o horizonte – na direção que Rick desapareceu. Já fazia horas desde que partira. Preocupava-se com a sua segurança. No estado que deveria estar...

Decidiu ir busca-lo. No final do dia, Jean seria enterrado no templo com os outros... E achava que o seu melhor amigo não gostaria de perder a última oportunidade de dizer adeus.

Caminhou por um caminho conhecido. Foi para o único lugar onde o adolescente poderia estar. Depois de uma hora e meia, avistou-o entre as árvores.

Rick estava sentado de frente para a cachoeira. Assim que Eddard afastou alguns galhos e aproximou-se, ele deu uma leve espiada pra trás – provavelmente conferindo se não era nenhum perigo.

– Vá embora – Rick mandou com a voz frágil.

Se estivessem em qualquer outra situação, Eddard teria dado tanta bronca que seu discípulo sairia com os ouvidos zumbindo. Mas após tê-lo impedido de matar um garoto, percebeu que ele enfim havia se acalmado um pouco.

Não ficou zangado por Rick ter ficado tão irado com o tal de Henry. Também ouviu o comentário cruel e ficou bem irritado. Contudo não pôde deixa-lo terminar o serviço – Rick não era uma pessoa má; se arrependeria disso no futuro.

Mediu as suas palavras antes de dizê-las.

– Ele ficaria triste em ver seu estado nesse momento – Eddard começou cautelosamente – Não se entregue desse jeito.

Rick soltou o ar fortemente.

– Se não fosse por mim, ele ainda estaria vivo. Se não fosse por mim, ele não teria sido estraçalhado até a morte. Se não fosse por mim, ele não teria sofrido tanto.

Ele está se culpando... Por isso está tão acabado psicologicamente.

– A culpa não foi sua, Rick. Os culpados foram os monstros, e somente eles.

– Ele estava me defendendo! – começou a falar mais alto – Morreu protegendo meu traseiro inútil!

– Não faça isso consigo mesmo. Você não é fraco! Pelo contrário, tem uma força que é difícil de alcançar pela idade que possui. Não os deixe... Ou melhor... Não o deixe acabar com a sua vida!

Puro silêncio paira no ar.

– Eu vou matá-lo – Rick diz inesperadamente, com uma raiva tão intensa que todo o seu corpo chegava a tremer – Vou fazê-lo pagar por levar tudo o que eu amava! Vou destroça-lo com as minhas próprias mãos!

Vê-lo desse jeito entristeceu Eddard. Teve êxito em tirar a culpa de seu coração; porém no lugar plantara o ódio e a vingança.

Pigarreou – Jean e os outros... Vão ser enterrados ao final do dia. Se quiser chegar a tempo, temos que voltar agora.

Para a sua surpresa, Rick levantou-se firmemente e pôs-se a caminhar.

– Herobrine não vai me impedir de dizer adeus uma segunda vez.


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Notas finais do capítulo

Doeu muito postar esse capítulo.... (:'C)



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