Catch You Catch Me escrita por yumesangai


Capítulo 3
Capítulo 3




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III

Gary não era o tipo paciente. Não era o tipo gentil e tão pouco o que fazia as coisas na hora em que pediam. E as pessoas sabiam disso, e ainda assim esperavam sempre que ele tivesse o melhor comportamento, fosse o mais inteligente. As garotas só queriam vê-lo sorrindo, os rapazes bem... eles queriam que Gary se ferrasse, mas as mães desses rapazes achavam Gary um sonho.

E Gary era somente um garoto de 13 anos. Mimado? Sim, com certeza. Ele tinha tudo que queria e precisava. Nada lhe faltava.

Bom, ao menos ele tinha certeza que tinha vida de Rei. Com um avô importante, e todo o conhecimento de Pokemons que tinha. Do que mais ele precisava?

Gary passara 13 anos não se preocupando com essas coisas, até conhecer Ash, o garotinho tímido que de repente aparecera em sua casa.

Pallet não era uma cidade grande, mas Gary estava –mal– acostumado a ser reconhecido pelas pessoas e não de reconhecê-las, por isso, não saberia de fato dizer quem era o garoto sem que o avô tivesse feito as devidas apresentações.

Mas dizer que era só isso seria uma grande mentira.

O que vinha incomodando Gary era... tudo naquele garoto. O silêncio, a distância que ele mantinha ao sentar, a forma como ele não esmagava os botões do controle do vídeo-game, o hábito de puxar a aba do boné quando estava envergonhado, os olhos castanhos brilhantes.

E principalmente, como aquele garoto parecia solitário.

E isso, acima de todas as outras coisas, havia feito o estômago de Gary revirar. Porque ele de alguma forma se via naquele menino. A diferença era que Gary vinha de um berço de ouro e Ash não.

Mas a solidão exista.

Gary só fingia que era superior a isso. Que ele de fato não precisava de ninguém. Mas afinal de contas quem sabe o que um garoto de 13 anos precisa?

Até aquele dia, Gary achava que a coisa mais preciosa que tinha era o próprio orgulho.

-/-

“Velho”. Gary chamou o avô que largou o jornal e olhou para o querido neto. “Ele não vinha pra cá depois da aula?”

Paciência não estava no vocabulário de Gary, o Professor Oak sorriu internamente, mas concordou que de fato Ash já deveria ter aparecido na casa deles.

“Vamos aguardar apenas”. O Professor disse com simplicidade.

Mas mal haviam se passado três minutos e Gary se levantou empurrando a cadeira, fazendo com que ela fizesse um rangido desagradável no chão.

“To saindo”. Avisou enquanto dava as costas e seguia para fora da casa.

O Professor Oak olhou para o relógio da cozinha e balançou a cabeça negativamente. Nada acontecia em Pallet sem que todos soubessem.

Mal Gary havia aberto a porta e a Senhora Ketchum quase caíra em cima dele, Gary mordeu a língua pra não falar nenhum palavrão, ele ‘empurrou gentilmente’ a Sra. Ketchum e ficou a encarando com as sobrancelhas erguidas como quem diz “Quem é você? Saia da frente, eu estou ocupado”.

“Gary”. Ela o segurou pelos ombros e o chacoalhou, o pegando completamente desprevenido, o fazendo balançar mais do que ela gostaria. “Gary, onde está o Ash? Você o viu? Onde ele está?”

E algo desceu como pedra pela garganta de Gary.

“Ele não está com você?”. Ele perguntou num tom alto, e a Sra. Ketchum balançou a cabeça negativamente para não responder com voz de choro.

“Delia?” O Professor Oak já estava empurrando o neto para o lado e dando espaço para que a velha amiga pudesse entrar. “Está tudo bem? O que aconteceu?”

Gary grunhiu, ele queria respostas naquele segundo, mas o olhar sério do avô o fez se calar e segui-los de volta para a cozinha. Onde ele fizera o favor de entregar um copo d’água para Delia que estava... ele pôde perceber, tremendo.

“Eu fui buscar o Ash, mas disseram que ele tinha saído por conta própria, então eu comecei a perguntar pras pessoas na rua”. Ela soluçou. “Mas... mas ninguém tinha visto o meu Ash!”. Ela escondeu o rosto com as mãos e se permitiu chorar um pouco.

“Delia... você já foi até a polícia?” Oak perguntou a olhando com receio.

“Polícia?” Ela repetiu assustada enquanto erguia o rosto. “Não! Claro que não! N-não é um caso pra polícia, m-meu filho não foi ra-ra-rap--”

Ela simplesmente não conseguia pronunciar aquilo. Se conseguisse seria como admitir que havia perdido o filho. Perder uma criança na cidade de Pallet estava mais pra uma brincadeira de muito mau gosto.

“Já chega”. Gary descruzou os braços e se afastou do balcão onde estava encostado. “Eu estou indo procurar por ele, vocês fiquem por aqui”. E enfiou as mãos no bolso enquanto seguia para fora do cômodo.

“Gar--”

“Não enche!” Gritou basicamente cuspindo, Delia e Oak se encolheram. “Eu detesto ficar parado e detesto ficar ouvindo as baboseiras de vocês! Se aconteceu alguma coisa com ele eu vou descobrir!” E tirou do bolso uma pokebola. “E eu to pegando isso aqui emprestado”.

“O que?” Oak engasgou. “Quando foi que você?”

“Me pertence”. Disse girando a pokebola na ponta do dedo. “Presente de aniversário, certo?” Gary não esperou por uma reposta, saiu da cozinha com passos largos.

“Oh, por favor, que tudo ocorra bem”. Delia murmurou juntando as mãos em prece.

-/-


“Eu estava pensando, esse boné não é grande demais pra sua cabeça?” Implicou um garoto corpulento enquanto sacudia o boné vermelho bem alto.

“Me devolva!” Ash gritou enquanto pulava e tentava pegar o boné.

“Ele é tão miudinho”. Disse um outro dando um empurrão nas costas de Ash, fazendo o garoto cair com tudo no chão. “Até o vento o derruba, vê?” E riu sem realmente achar graça.

“Devolvam o meu boné!” Ash gritou enquanto tentava se levantar, mas logo um pé é afundado em suas costas o fazendo enfiar a cara no chão.

“Sabe pirralho, eu não gosto de garotinhos arrogantes que nem você. Mas eu gosto menos ainda de exibidos que ficam andando com os Oak só pra tentarem fazer algum sucesso”. E esfregou com força a sola do sapato nas costas de Ash.

E ignorou completamente os gemidos do menino.

“Já temos o exibido do Gary na cidade, não precisamos de uma miniatura no nosso colégio”. O outro disse enquanto chutava areia na cara de Ash.

“O Gary não é nada disso do que vocês estão dizendo...” Ash resmungou como pôde. Com a cara enfiada na terra e sentindo a areia raspar nos dentes.

“Ah não?!” O garoto tirou o pé das costas de Ash e o puxou pelos cabelos. “Me diga então, como ele é? Huh!?”

“Ele...” Ash tossiu. “Ele não é um covarde que nem vocês!” Gritou sentindo as lágrimas escorrerem.

“Ora seu!”

“Se você continuar com essa mão imunda em cima dele você vai se arrepender”. Gary ameaçou já com a pokebola em mãos.

“Ora, ora... O Senhor Oak, preferido de Pallet”.

“É, me desculpe se você é apenas um incapaz. Eu já não mandei soltá-lo?” Gary estreitou os olhos.

“Ah esse pivete aqui? É todo seu”.

Ash caiu com tudo no chão, o rosto ralado, o uniforme em péssimo estado.

“G-gary” No entanto, foi a voz chorosa e a expressão à beira de lágrimas que fez o sangue de Gary gelar.

Ninguém tratava uma criança daquele jeito. Ninguém machucava uma criança. Muito menos em Pallet, e ainda menos na presença de Gary Oak e jamais se fosse um protegido de Gary.

“Squirtle!”

Os olhos de lacrimejados de Ash observaram com atenção o pequeno Squirtle sobre o comando de Gary, mandar os três garotos contra algumas pedras.

Ash que almejava ser um mestre Pokémon, ali caído no chão olhou para Gary como se ele fosse uma espécie de Deus, ou apenas alguém muito poderoso.

“Você está bem?” Ele perguntou se ajoelhando na terra e colocando Ash sentado.

“Hm”. A resposta fora apenas um assentimento de cabeça.

“Sua mãe está preocupada”.

“Então acho que é melhor nós irmos andand--” Ash tenta se levantar, mas rapidamente cai sentado.

“Não consegue se levantar?”

“... Não”. Ash olha desanimado para as próprias pernas. Gary olha na direção em que os três garotos haviam corrido. Ash rapidamente agarra a mão dele o tirando atenção da floresta. “Mas eu não estou sentindo dor!”

Gary suspirou levemente e bateu de leve o boné na cabeça de Ash. “Isso é importante pra você?”

“Eu ganhei...” Ele murmurou baixinho. “Depois de mandar cem cartas”.

“Cem?” Gary realmente não pôde evitar o tom surpreso. “Então é um boné muito importante, não deixe ninguém tirá-lo de você, entendeu?”

“Pode deixar”. Ash sorriu enquanto ajeitava o boné na cabeça.

“Suba”. Gary disse enquanto se agachava.

“N-não precisa!”

“E como você espera que voltemos? Eu tenho um Squirtle e não um Pidgeot”.

Ash acaba se rendendo e sobe nas costas dele.

“Eu nem sabia que você tinha um Squirtle”.

“Acho que tem muitas coisas sobre mim que você não sabe”.

A conversa não se estendeu. Pallet já estava escura, havia pouca a quase nenhuma pessoa pelas ruas, os postes acessos indicavam o caminho que em parte era de terra, Ash já estava cochilando, os braços que até pouco seguravam com força a camisa de Gary, agora estavam pendidos sobre seu peito. Ele não pôde deixar de sorrir ao vê-lo tão descansado.

“Ash!” Delia veio correndo assim que avistou a sombra de Gary com seu pequeno Ash nas costas.

Seu tão querido e precioso filho.

“Ele está dormindo”. Gary fez questão de dizer antes que ela decidisse sacudi-lo. “Delia, não é melhor que o menino durma aqui?” Oak perguntou enquanto se aproximava. “Não, não”. Ela balançou a cabeça de forma negativa. “Gary, eu sei que meu pedido é um incômodo, mas, por favor, leve o meu filho até a minha casa. Depois desse dia eu só quero o meu Ash”.

“Sem problemas”. Gary ajeitou o garoto que ameaçava cair de suas costas. “Vovô?”

“Tome conta do Ash e da Delia”.

E os três seguiram em silêncio, Delia andava bem ao lado de Gary, ela andava olhando o tempo todo para o filho, de uma forma tão maternal e protetora que Gary se sentia até um pouco incomodado.

Mas a casa não era longe, os Ketchum até que moravam mais perto do que Gary tinha imaginado. Era uma casa bonita e simples como a maioria da cidade. “Por favor, entre”. Delia segurou a porta enquanto Gary adentrava. Ele não costumava reparar em detalhes, mas apenas daquela vez ele se deu ao direito de dar uma boa olhada no lugar.

“Venha, vou levá-lo até o quarto do Ash”.

Era no segundo andar, e Gary agradeceu internamente quando deixou o garoto na cama. Delia demorou o olhar no filho, mas não disse nada, foi somente enquanto descia as escadas com seu salvador que ela começou.

“O que houve?” Seu tom era sério e preocupado.

“Ele caiu”. Gary disse se virando.

Delia estreitou os olhos. “O que realmente houve?”

Gary suspirou. “Algumas crianças implicaram com ele, acho que eram um pouco mais velhos pelo tamanho”.

Delia segurou a respiração. “Meu pequeno Ash, passando por essas coisas”. Ela sentou ali mesmo na escada.

Gary não gostava de sentimentalismo, mas não pôde evitar sentir algum remorso e compaixão perante a situação.

“Sinto muito por não ter chegado mais cedo”. E ele realmente sentia.

“Não!” Delia elevou as mãos à boca. “Por favor, você salvou o meu filho! O Ash te adora, eu só posso ser grata por cuidar tão bem assim do meu Ash”.

Gary comprimiu os lábios, ele não queria sorrir.

“Acho que já está tarde”. Disse num tom mais frio e mais próximo ao que costumava a usar normalmente. “Você deve estar cansada, e meu avô está me esperando”.

“Agradeça a ele por mim”. Ela se levantou enquanto o acompanhava até a porta.

“Pode deixar”. Embora ele fosse o tipo de pessoa que não daria o recado.

“Obrigada, Gary”. Mas ela sabia disso.

“Boa noite”. Ele deixou a casa com as mãos nos bolsos e seguiu pela silenciosa Pallet.

 Continua...


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