Bem Vindo à Time Watch! escrita por alerea


Capítulo 5
Loading... Arch 1, Chapter 5: Um Sentimento Estranho


Notas iniciais do capítulo

de longe, um dos meus capítulos favoritos

recomendo que coloquem uma playlist bem animadinha, bem tuts-tuts pra acompanhar a leitura



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Segunda Região: Utopia. Um dos três primeiros lugares mais ricos do sistema de divisões, imediatamente abaixo da Elite. População aproximada: 15 milhões de pessoas, incluindo moradores antigos e pessoas que se mudam para o local, o que acontece com frequência. Construído para ser o templo da diversão e entretenimento. Preços relativamente baixos. Principal atividade: Turismo. Os melhores parques, as boates mais requisitadas, as lojas de marca mais admiradas.

Eu estava caminhando em meio a uma multidão de jovens recrutas da empresa. Aparentemente, é um recurso muito utilizado hoje em dia. A maioria ali se conhecia; eu avançava em meio a vários grupos de fofoca enquanto o segundo portão se abria. Na outra sala, inúmeras portas abertas serviam de passagem para recrutas de várias empresas. Todos usavam o mesmo traje de linho, mas com diferenças.

"−Vai começar a DIVERSÃO!"

Alguns adolescentes começaram a gritar, animados, enquanto um carrinho gigante de montanha-russa surgia em meio à trilhos violeta. Era a cor oficial da segunda divisão. O carrinho era decorado com pedras transparentes, brilho e lâminas de vidro, montando um mosaico que parecia fogo. Um garoto menor puxou as barras da irmã mais velha, assustado.

O Comissário de Festas surgiu. Era um magrelo, vestido em um collant xadrez, e o rosto pintado como um bobo-da-corte. Ele sorriu eufóricamente para nós enquanto liberava as barras de proteção do carrinho. Dois outros surgiram e fizeram um sinal para entrarmos.

A multidão corria tão rápido que tive que fazer esforço para não ser atropelada. Pulei em uma das fileiras do meio, mais perto do final, e acabei espremida ao lado de duas garotinhas histéricas. Elas não paravam de rir e cochichar, o que simplesmente me dava arrepios. Sempre imagino que estão falando de mim.

−Estão todos prontos? − disse um dos comissários, com o pé apoiado na frente do carrinho − Então, preparar para a contagem!

O último portão se abriu, revelando um túnel erguido por vários canos de metal, como uma teia, que subia inclinando.

−Dez! − Todos gritaram em uníssono.

−Nove!

"−Um dia, vamos todos para o melhor parque da cidade. Quem topa?"

−Oito!

"−EEU! EU, Papai! − uma garotinha jovem estendia a mão, animada. A mãe fez uma expressão desaprovadora. −Você não deveria dar falsas esperanças para sua filha, Roger. O homem sorriu, triunfante. −Eu cumpro minha palavra. Se estou falando que vamos, é porque vamos".

−Sete!

"−Tem muita coisa pra se fazer antes de ir a um parque. Precisamos juntar dinheiro, quitar as dívidas... Bota esses pés no chão. −Ah mamãe, PORFAVOOR! − a garotinha era um protótipo de gente, suas pernas mal a separavam do chão. Ela encarou a mãe com aqueles grandes olhos verdes. −Viu só, Jessica? Você está acabando com os sonhos da coitadinha − sorriu o homem, irônico − Por favor, mamãe!"

−Seis!

"A mãe não tinha argumentos sobrando. Olhou com doçura para a filha, e concordou".

−Cinco!

"−Um dia nós iremos, meu bebê. Um dia".

−Quatro!

−Três!

"Eu estou aqui, mãe. Eu consegui".

−... Dois!

−... Um!

O carrinho deu um tranco, depois começou a subir lentamente. Os garotos da frente já estavam assobiando e levantado os braços. Perto do fim do túnel, onde os raios de sol ofuscavam a visão, o carrinho virou um turbo. As garotas do meu lado começaram a gritar.

Senti uma pontada do estômago. Nunca tinha ido tão rápido. A ansiedade cresceu tanto que tudo o que pude fazer foi soltar com um grito. Todos estavam aos berros, inclusive eu. O vento batia gelado no meu rosto, levando algumas lágrimas. Eu gritava como nunca gritei, depois ria, depois gritava de novo. As garotas do meu lado estavam em pânico. Eu não conseguia parar de rir. Senti o rabo de cavalo balançar e levantei os braços.

O carrinho pareceu ir mais devagar quando sobrevoamos o Castelo, feito inteiramente de cristal arroxeado, que reluzia como um arco-íris. Era o centro comercial da Utopia. Os trilhos estavam muito, mas muito alto, porém era possível ouvir a banda que tocava lá embaixo. Pessoas corriam como formigas pelas ruas.

Os trilhos começaram a descer, e entramos em um túnel erguido cheio de diamantes. O carrinho começou a sacudir e a guinar, o que gerou alguns gemidos e xingamentos. Quando saímos dali, os trilhos subiam sem parar.

−OLHA O LOOPING! − gritou um dos comissários, sentado no final. Cara, como ele chegou ali?

Sempre tive medo de looping. Achava que se aquilo parasse, estávamos ferrados. Mas não parou. Eu apenas conseguia ver os trilhos. Não satisfeito, o carrinho ainda inclinou de lado antes de parar, nos arredores do castelo. Fomos orientados a descer.

Percebi que não sentia minhas pernas direito, mas tinha gente bem pior: as garotas do meu lado estavam com o cabelo todo em cima, mas continuavam chiando e fofocando. Algumas pessoas estavam verdes, e eu tive que virar o rosto pra não vê-las passarem mal.

−Isso foi, no mínimo... bizarro.

Havia um garoto do meu lado. Tinha mais ou menos a minha altura, a franja preta caindo até as sobrancelhas e uma feição calma. Seu nariz era comprido e ligeiramente curvo. Vestia moletom e calças de linho muito bem costurados e passados. Um pequeno crachá prateado mostrava "McMayer".

−Ah, desculpe − sorriu ele − meu nome é Caleb.

−Tudo bem. Sou Jane − lembrei que também haviam me dado um crachá, com "Adams" escrito.

−Você é da Orange Corporations?

−Não, TimeWatch.

−Ah, tudo bem − ele pareceu meio envergonhado- sabe como é, todo mundo aqui meio que se conhece, e eu vim sozinho.

−Não se preocupe, somos dois − respondi.

Admirei a coragem dele de puxar assunto comigo. Geralmente, sou bem antissocial. Os recrutas foram liberados pelos arredores, e ele me convidou para dar uma volta.

−Então, de qual divisão você é? Espero não estar sendo muito intrometido...

−Sou do Entulho, e você?

Ele me encarou, surpreso, como se nunca tivesse visto algo do tipo antes.

−Do Entulho? Meu Deus! Eu nem sabia que pessoas do Entulho entravam em programas como esse.

−E eu achava que quem entrava nisso eram pessoas principalmente do Entulho- ergui uma sobrancelha − você é do Bordado?

−Como sabe?

−Suas roupas. São muito bem passadas, e a costura é perfeita. Quase não dá pra ver. Você não precisa de dinheiro, precisa?

−Bem, não exatamente. Mas minha mãe acha que está na hora de eu aprender sobre a vida- ele olhou para o alto, pensativo- Ela quer que eu conheça outras regiões, não fique limitado ao pessoal do Bordado. E, bem, eu nem sabia que pessoas como você existiam. Como é viver no Entulho?

−Ruim.

−Certo.

Na praça principal, a banda continuava tocando. Pessoas dançavam animadas, jogando confetes umas nas outras e bebendo em taças de cristal. Outras abriam pacotes de roupas recém-compradas, trocando e comparando peças. Caleb parou em um pequeno quiosque que vendia tortas. Perguntou se eu queria uma.

−Não tenho dinheiro.

−Tá falado sério? Eu vou pagar- disse, rindo. Arregalei os olhos.

−Ficou doido? Vai gastar seu dinheiro comigo? Eu nem sou da sua família nem nada assi-

−Ei, eu estou precisando desesperadamente de um amigo aqui, se não percebeu. Vai, escolhe uma.

A vitrine exibia tortinhas de todos os tipos e sabores. Abaixei-me para ver melhor. Cada uma tinha uma fruta diferente no topo.

−Sério, Caleb, não quero.

−Ah, com toda certeza − disse ele, olhando para mim- Qual você quer Jane? Eu vou levar a de chocolate.

−Eu não gosto de nenhuma –menti − e isso vai conta os meus princípios.

−Você está olhando a de uva ou a de morango?

−Morango − suspirei.

−Vou levar − disse à mulher do balcão.

Sentamos no chafariz, enquanto comíamos as tortas em silêncio. Caleb perguntou se eu queria provar um pedaço da torta de chocolate, mas esse ato foi chocante demais para meus princípios.

De repente, uma agitação começou a percorrer a praça. Ouvimos tambores, e cada vez mais gente se reunia ali.

"Senhoras e senhores, temos o orgulho de apresentar nosso espetáculo de boas vindas, patrocinado pelas empresas dos recrutas aqui presentes"

Ouvimos aplausos e gritos.

Em um piscar de olhos, uma mulher surgiu no meio da praça, inteiramente de preto. Ela puxou seu xale escuro e exibiu para nós. Em um simples movimento do pano, um acrobata surgiu ao seu lado. Ela ia e vinha pelo espaço, fazendo surgir mais acrobatas estáticos, ou então recuando o pano e fazendo-os desaparecer. Por fim, ela estalou os dedos. Os acrobatas se juntaram e começaram a criar formar com o próprio corpo: uma casa, um elefante, uma miniatura do Castelo. Comecei a aplaudir, boquiaberta.

De repente, alguém trouxe uma armação de metal, que rolava pelo chão como uma bola. Dois acrobatas subiram nela e começaram a deslizá-la pelo chão. Outros três puxaram, cada um, três objetos diferentes, e começaram a fazer malabarismo, sozinhos e entre eles. Como se já não fosse impressionante, a mulher continuava agitando seu xale, fazendo todos mudarem de roupa sem pararem suas atividades. Um homem surgiu com uma tocha de fogo. Ele colocou e fogo na boca, e, para nossa surpresa, cuspiu borboletas azuis que se elevaram ao céu.

−Parece mágica − comentou Caleb

−E não é? − perguntei.

−Não de verdade. Eles têm um truque. Já vi várias vezes.

Senti-me um pouco decepcionada com aquilo. Mas não deixava de ser surpreendente.

−Ei, minha empresa me deu ingressos para a melhor boate VIP daqui- falei- está a fim de ir?

−Tá falando sério? Pode crer! − Falou ele, animado.

***

Entramos no Castelo para descer uma rampa que levava ao andar subterrâneo. Um elevador estava guardeado por dois seguranças enormes, que exigiram os ingressos antes de nos deixar entrar. Fomos descendo lentamente, até que as portas se abriram.

O espaço era gigante, com música boa pulsando sem parar. Me senti quase cega com a combinação de escuridão e luz fluorescente.

−Você já foi a uma dessas antes?− perguntou-me Caleb

−Não...

−Nem eu!− sorriu, e adentrou o espaço.

Parecia loucura o quanto as pessoas estavam eufóricas ali; uma batida viciante e algumas bebidas faziam as pessoas esquecerem da gravidade, e pularem alto como se pudessem voar. Vi rostos e mãos pintadas: assustador, mas belo. Haviam muitos garotos da nossa idade ali, a maioria recrutas. O único que parecia alheio a tudo ali era o barman, que já devia estar acostumado à confusão. Fui puxada por Caleb até um dos banquinhos do bar. Ficamos sentados de frente para a confusão, e pela segunda vez, uma imensa ansiedade foi tomando conta de mim, de forma que tive de me controlar para não rir que nem uma louca. Então, isso era diversão.

−Dá pra acreditar em quantos recrutas eles andam contratando!?− tive que gritar para fazer a pergunta.

−Pois é! Acho que isso movimenta a economia!

Olhei para um grupo deles, conversando perto da nossa mesa. Seus trajes tinham fios de ouro e algumas coisas brilhantes que não consegui identificar. Tinham a pele lisa e bem cuidada como anjos, felizes, despreocupados, com seus drinques coloridos. Talvez nunca tivesses conhecido a fome, nem o trabalho pesado.

−Mas porque gente com dinheiro iria entrar em programa desses? Não entendo...

−Acho que é honra, fazer um filho jovem servir a uma corporação grande dessas. Como se fosse algo a mais no currículo. Você não ia acreditar em quantos garotos aqui são ricos. Cheguei a ver dois da Elite!

−O quê!?!?− da Elite? Os mais ricos da cidade? Achei que a música tinha me entorpecido.

−Sério!! Mas a maioria é dos Ganhos, ou Platina. Comparado a eles sou um pobre coitado.

−Ah, você não viu nada – bufei.

Na verdade, assim que falávamos, um dos recrutas bem vestidos veio em nossa direção. Um garoto alto.

−Ih, acho que ele está vindo para você-disse Caleb − vou deixar os dois à sós...

−Espera Caleb, na-

−E aí, lindinha? − disse o garoto Ele era uns seis centímetros maior que eu, que nunca fui uma pessoa baixa. Não tinha como não dizer: ele era lindo. Tinha o cabelo cor de mel desgrenhado e olhos escuros. Talvez o garoto mais bonito que eu já tinha visto

−Você vem sempre aqui? − disse, em tom sedutor. Como eu ainda era iniciante nesse tipo de coisa, não tinha como saber que essa cantada é totalmente ridícula. Mas eu tive uma noção.

−Nossa, amor, assim você me magoa com essa cara-riu.

−Que cara? − perguntei, confusa.

−Esse seu olhar de desdém aí, tá me deixando envergonhado. Mas até que é bonitinho... − Ele esticou o braço lentamente para passar sobre meus ombros e eu não entendi aquilo.

Em vez disso, fiz uma coisa completamente impulsiva: peguei uma de suas mãos e apliquei um golpe, segurando um dos seus dedos como uma pinça e friccionando a unha. Era uma medida médica, usada para acalmar pacientes em estado de choque, mas a dor causava um bom susto para defesa pessoal.

−AAI!! − gritou o garoto alto o suficiente para algumas pessoas ao redor se virarem − O que você fez!?!

−Não te dei permissão para tocar em mim − disse, simplesmente-ou dei? − Você é doida! − gemeu, e voltou correndo para a roda dos recrutas ricos. Algumas pessoas me observavam curiosas, como se eu fosse um pedaço de carne.

−Meu Deus!! − exclamou Caleb voltando ao balcão, num misto de admiração e medo-Você não entende dessas coisas mesmo, não é!? − Você estava espionando? − falei, indignada

−Mas é claro que sim! −respondeu com empolgação− Eu disse que ia deixar vocês sozinhos, mas não falei que não ia ver! Olhar não tira pedaço .

−Hunf! Intrometido... −Ele sorriu e se virou para o barman, pedindo duas doses de Soda Estrelada. Perguntou se eu já tinha bebido isso antes. Eu disse que não, era um desperdício: era mais fácil misturar água gaseificada com limão. Ele parecia fascinado com meu estilo de vida.

−Sabe, não precisava ter feito aquilo com o garoto- comentou.

−Você queria o quê? Ele estava encostando em mim!- protestei.

−Ele só ia botar a mão no seu ombro, não é nada demais! − disse, e tomou um gole de Soda. Suspirei.

−Donde eu venho, as pessoas não ficam se tocando toda hora. Isso só pode ser tentativa de agressão ou roubo. Coloquei um pouco da bebida na boca. Deus era muito bom.

−Você é engraçada, Jane Adams.

−Ah não, por favor, não tente me cantar também! – falei, alarmada. Caleb começou a rir.

−Nãão, Jane, fica calma, isso se chama "amizade".

Ri um pouco, aliviada. Me virei para ele:

−Gostei de te conhecer também, Caleb McMayer.


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Notas finais do capítulo

ai cara, como eu amo essas paradas da Jane...
já sacaram, né menininhas? se chegarem irritando, use a técnica do dedo, funciona smp
ai meu deus, escritora de fic n é pra qualquer um