§ ANO DCLXXX – Anos Atuais

Um lugar desconhecido pelos humanos: um lindo templo, feito de ouro e pedras brancas, em meio às nuvens e ao céu azul. Neste momento, podia-se ver um arcanjo caminhando pelo lugar, pensativo, mas logo ele parou. Então chamou por um anjo do templo e, quando o pequeno e obediente anjo chegou, ele falou em um tom forte:

— Trague-me Muriel, diga que é uma ordem.

— Sim, Arcanjo Miguel! — o pequeno mensageiro disse e saiu voando por entre as nuvens, atrás da anja requisitada.

Muriel estava treinando em seu quartel, que situava-se no meio de uma cordilheira, e usava suas espadas geladas pra treinar com seus aprendizes, os Anjos de Gelo. Havia acabado de demonstrar uma sessão de golpes ofensivos quando o anjo mensageiro pousou quietamente no pátio sinalizando que havia uma mensagem importante para ela. A capitã então parou o treinamento, dispensou os aprendizes com um sorriso e os mandou em rondas pela região. Então, virou-se para ouvir a mensagem que chegara.

— Capitã Muriel — o anjo a saudou — O General Miguel manda chamá-la. Ele disse que é uma ordem.

“Claro que é uma ordem”, pensou Muriel. Conhecia o mestre bem o suficiente pra saber que ele sempre dava ordens.

— Bom, avisarei ao meu pelotão sobre minha saída e irei ao encontro dele. — respondeu com paciência ao pequeno que ela conhecia bem — Pode ir à frente se quiser.

O mensageiro foi embora e, depois de avisar ao pelotão que partiria, Muriel seguiu para o Templo de seu mestre. Logo que a jovem capitã se aproximou do lugar, Miguel avistou-a e a acompanhou chegando. Ele deu um sorriso amigável e a cumprimentou:

— Capitã Muriel, como você está?

A situação não era nada boa. Muriel percebeu isso no momento em que ele resolveu ser gentil, mas ele era seu mestre, então resolveu seguir o jogo.

— General! — o saudou abaixando a cabeça e em seguida erguendo-a — Eu estou bem, como sempre. O mensageiro disse que queria falar comigo. Algo de errado mestre?

O Arcanjo se endireitou e disse com o tom de sua voz bem firme:

— Soube que alguns demônios estão tramando algo que pode afetar imensamente o mundo dos humanos. Pelo o que observei, não descobri exatamente o que planejam, mas senti auras muito fortes os acompanhando. Preciso que descubra o que planejam. Você deve nos informar assim que souber alguma coisa e, caso ache necessário, agir para impedi-los. Entendido?

Muriel se retesou. Em outras circunstâncias ela aceitaria o pedido, mas as constantes batalhas entre anjos e demônios estavam fazendo com que vários anjos entrassem para o serviço de guerra e ela, como Capitã de um dos pelotões, tinha que treinar e supervisionar a maioria deles até que decidissem para qual pelotão realmente iriam. Estava completamente ocupada e sabia que havia outros anjos mais velhos, mais poderosos e provavelmente mais ansiosos em agradar Miguel, que fariam o serviço imediatamente.

— Desculpe mestre... — começou ela com calma, teria que ser muito cuidadosa — Mas o senhor sabe que os aprendizes estão no Quartel de Gelo e eu sou responsável pelo treinamento da maioria dos novatos. Creio que há outros que possam realizar essa missão e que seriam melhores escolhas do que eu neste momento: O Capitão dos Anjos da Luz ou o Capitão dos Anjos do Vento ou mesmo um de seus Capitães do Fogo.

— Muriel, eu sei muito bem que poderia escolher qualquer outro anjo para essa missão, entretanto acho que você é a mais qualificada para este trabalho específico. Você tem bastante experiência em batalhas contra demônios e, o mais importante, tem uma velha conhecida sua no meio desse suposto grupo. — explicava Miguel — Lilith, você se lembra dela?

Aquele nome mudou completamente a opinião de Muriel, pois Lilith estava por aí tramando algo para estragar o seu precioso mundo dos humanos. Miguel estava certo, ela tinha que fazer isso, mas não envolveria seus homens nessa missão, deixaria que eles cuidassem do treinamento de seus aprendizes e partiria com Théa.

— O senhor sabe em que consiste o plano? — perguntou ela decidida — Quero dizer, quais os objetivos? Quem está com ela?

Miguel se endireitou e começou a caminhar pelo salão do templo, já que ele conseguia pensar melhor desse jeito, e começou a explicar o plano para sua aprendiz mais uma vez:

— Como você sabe, eu e os outros seis generais temos a incumbência de observar e cuidar do plano terrestre, mas há cinco anos algo nos incomodou. Percebemos que Laican, o filho de Azazel, estava lá, caminhando como um humano qualquer. Porém, não o vimos gerar grandes confusões ou ameaças e decidimos não interferir, apenas o verificávamos de tempos em tempos. Até que vimos isto há alguns dias.

Miguel se direcionou a uma pequena, bonita e delicada mesa branca que tinha um espelho no centro. Esse era o espelho que permitia Miguel observar cada ponto da Terra. A imagem dele começou a mudar e Muriel conseguiu ver Lilith e Laican aparecendo em um campo aberto. Eles estavam lutando, não pareciam dar o máximo de si ainda, estavam apenas se ameaçando, mas ambos se demonstravam dispostos a lutar para valer. Depois de observarem a cena, o Arcanjo prosseguiu:

— Laican é forte como Lilith. Eu sei que você é forte, mas talvez não consiga lutar contra os dois ao mesmo tempo. Com isso, o General do Espírito, Azrael, indicou seu aprendiz Kalel, meio irmão de Laican, para lhe acompanhar nesta missão. Entendido, capitã?

— Desculpe senhor, mas por que Kalel? — Muriel não conseguiu esconder a surpresa — Ele é um meio anjo, filho de um anjo caído! Além do mais, é insolente, arrogante e nunca obedece ninguém. Ele nem sequer tem que obedecer as Regras Celestiais já que não é um nephilim com aceitação celestial nem um anjo puro!

Miguel encarou a capitã com um olhar duro de repreensão e falou de forma forte:

— Lionel é um grande guerreiro! Não o rebaixe nem o desonre! Você sabe que ele é um anjo rebelde, não caído. Sabe que ele nos ajudou muito na ultima guerra santa, até desaparecer misteriosamente, e que seu filho, Kalel, teve um ótimo treinamento. Seu novo companheiro conseguiu segurar Laican durante a guerra e pode ser de grande ajuda, não se esqueça disso. — o general então suavizou a voz — Além disso, Azrael fez questão de que ele fosse o escolhido. Você deve encontra-lo logo e depois procurar por mais uma pessoa: uma druida chamada Daphne. Sei que geralmente não incluímos seres não-celestiais em missões, mas nossos anjos aptos já tem suas próprias tarefas e esta druida conhece muito bem a Terra deste tempo, então pode ser de alguma ajuda. Isto é uma ordem.

Ela não poderia escapar de uma ordem direta de um General, ainda que não fosse o General de seu elemento. Especialmente uma ordem de Miguel, pois ele era seu mestre e fora quem lhe ensinou a lutar, mesmo quando ela mudara para outro elemento.

— Sim senhor. — respondeu ela relutantemente e abaixando a cabeça em submissão — Quando devo partir senhor?

— O mais breve possível. Pensando bem, vá agora. Encontre Kalel e parta ainda hoje com ele. Eu conto com você, então não me decepcione. Boa sorte Capitã Muriel!

— Não o decepcionarei mestre. — Muriel assentiu.

Ela estendeu as asas e partiu do Templo de seu mestre em direção ao de Azrael, o General dos Espíritos; daria um jeito de controlar aquela fera que ele tinha como aprendiz.

Com o passar do tempo foi avistando, ao longe, seu destino: um templo feito de mármore negro e diversas pedras preciosas coloridas. Muriel sempre achara estranho que o Templo de Azrael fosse tão encantador, considerando que sua principal missão era extremamente sombria. Pousou no pátio do local e perguntou a um anjo que estava próximo onde poderia encontrar o meio-anjo. Seguiu as instruções que recebera e chegou a um cômodo com portas negras e entalhes em forma de ondas prateadas. Então bateu e esperou, havia recuperado sua calma, teria que ter muita paciência para o que estava por vir.

Kalel estava relaxando em seu quarto enquanto pensava em como o dia estava calmo quando alguém bateu na porta. "Era tudo o que eu queria", ele bufou, mas resolveu não atender de imediato. Sabia que não era seu Mestre, pois ele nunca batia. “Se alguém quiser falar comigo, que insista” continuou a pensar. A batida soou novamente, desta vez mais forte, e Kalel xingou mentalmente "Quem será esse idiota?". Chegou a se levantar, mas hesitou: aquilo estava ficando divertido. Então gritou:

— Não tem ninguém! — E riu.

Foi então que a batida quase derrubou a porta de seu quarto e ele resolveu abrir. Quando o fez, encarou dos pés a cabeça com olhar de desdém a anja que lá estava.

"Ah não!"

Chibi- Muriel