O céu, a terra e o meio do caminho escrita por Hanako


Capítulo 5
Esperança




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Sora não dormiu bem aquela noite. Teve pesadelos com a que seria sua possível nova família. Imaginou-se torturado, abandonado, assim como sofria na fazenda da qual tinha fugido. Ele não parecia ter sorte. Acreditava que,por ter abandonado Maria, o seu raio de Sol, ela tinha levado consigo todas as coisas boas que poderiam acontecer em sua vida.

Foi retirado de seus pensamentos com João batendo na porta e o chamando para tomar um café. Estava na hora de partir. Fingindo que não sabia de nada, ouviu as explicações do avô. Não tinham dinheiro para bancar mais um e o levariam para uma vida melhor. Ele ouviu sem discutir. Não tinha o que discutir. Até ele concordava que ali não era o seu lugar.

Diferente das outras vezes que tinha viajado, ele iria de carro desta vez. Não era um grande carro, um usado, velho e batido em várias partes. Ele sequer sabia o nome ou a marca, mas ficou surpreso com o fato de poder entrar naquela máquina para uma viagem. Se bem que, antes da sua fuga, ele só tinha colocado os pés para fora da fazenda duas vezes para o vilarejo mais próximo em busca de mantimentos. Sempre à pé ou, dentro da fazenda, em um carro de bois que o levava ao seu trabalho.

Ele foi colocado no banco de trás e o prenderam com o cinto de segurança. Ele não sabia se estava empolgado ou temeroso com o que estava para acontecer. Tentou apenas aproveitar a viagem e se divertir conhecendo o carro, tentando entender como ele funcionava. Acabou desistindo e, vencido pelo cansaço, fechou os olhos.

Quando ele acordou, foi a chacoalhadas pelo seu pai, se é que podia ser chamado de pai. Ele o disse para ficar preparado que a qualquer momento ele iria descer. Segurou seu saco com força. Mesmo que não houvesse mais tanta coisa dentro dele, era aquilo que o dava confiança. A segurança daquele casal que ele gostava tanto, mesmo se esquecendo de perguntar o nome de cada um deles, já tinha um lugar reservado no coração.

O velho tinha saído do carro para conversar com um porteiro de muros absurdamente altos. Eles discutiam fervorosamente apontando para o carro. Um envelope foi entregue e colocado dentro das calças de João. O porteiro abriu a porta e Sora foi praticamente jogado para fora do carro. Meio inseguro e tropeçando em seus próprios pés, caminhou até lá inteiramente assustado. Naquele momento ele finalmente se parecia com a criança que deveria ter sido e, infelizmente, isso não mostrava um sinal positivo.

O porteiro tinha um olhar bondoso e sorriu quando o viu. Colocou as mãos em suas costas, o que o fez estremecer de medo, esperando uma pancada que não veio. Ele só queria explicar onde estavam e o que estava acontecendo.

“Olá, meu nome é Pedro.” Começou o porteiro “Eu trabalho aqui já tem uns vinte anos e ficarei muito feliz em te ver por aqui. O seu Otávio é um homem muito bom, ele vai te tratar muito bem, eu garanto. Os meninos já devem de tá chegando, são muito bons também. Vão gostar de ter você como irmão.”

Sora não sabia que teria irmãos. Se podia confiar no que aquele porteiro dizia a respeito de o homem ser bom e de os filhos dele serem bons também, ele não sabia, mas gostava de sentir a segurança na voz dele, mesmo que fosse uma falsa segurança.

A casa era enorme, mas ele não prestou muita atenção nas explicações de Pedro. As palavras de seu pai e seu avô sobre como se livraram dele pela primeira vez e o motivo para se livrarem dele de novo latejava na sua cabeça e lhe dava uma dor profunda no coração. Não sabia como conseguia continuar caminhando por aquela casa de desconhecidos quando nem suas lágrimas conseguiam descer de seus olhos. Ele havia secado até a sua última gota.

Subiram escadas e andaram por vários corredores, várias portas até que ele ouvisse algo surpreendente: “Este aqui é o seu quarto, pequeno Sora. Você poderá decorá-lo como se sentir mais à vontade. À direita tem uma porta que leva ao seu próprio banheiro e bem à frente temos uma varanda. Permiti-me pedir seu almoço à cozinha. Quando se sentir à vontade, desça para comer.”

Seu quarto, seu banheiro, quando se sentisse à vontade... Tantas expressões que nunca ouviu relacionadas a si agora estavam bem ali, dizendo que ele era alguém e alguém suficientemente importante para ter até mesmo uma varanda. Sentiu-se tentado a explorar, mas o peso em seu corpo era demais. Deitou-se na sua cama e em poucos minutos já dormia.

Não sonhou com nada e seu cansaço parecia não haver fim. Não tinha vontade de acordar, se levantar e seguir em frente, apenas queria permanecer deitado. Dormiu durante quatro dias seguidos e ninguém ousou acordá-lo. Ele precisava daquilo, precisava daquele momento dele para entender o que acontecia com sua vida e decidir se seguiria em frente ou se matava em tristeza e amargura.

Durante quatro dias dormindo, com o peso no coração um pouco amenizado, mas não curado (o peso não tinha mais como ser retirado depois de tantos anos de sofrimento) ele finalmente abriu os olhos e sentiu que tinha que agir em sua defesa mais uma vez. Abriu os olhos e sentiu que inflamava em seu peito uma chama, a chama de esperança.


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