Não, essa história não é sobre mim. Não é sobre mim e também não é sobre uma história que inventei ou que gostaria de viver. Não é porque, depois que o conheci, a minha história se tornou patética demais, banal demais para que se tornasse um livro ou mesmo um texto de um diário qualquer. Às vezes, quando me sinto mais importante, me coloco como parte disso e então a história também é minha, mesmo que em uma quantidade menor e, assim, eu finalmente acredito que sou especial.

No final das contas, foi ele que realmente me mudou, que me fez ver que o mundo não girava apenas ao redor do meu umbigo: foi ele que me ensinou a amar. Pensando assim, nada mais sensato que escrever sua história e, quem sabe, mudar outras pessoas também, mas garanto que não foi nada fácil... Para escrever totalmente a história de uma pessoa, precisamos entrar em sua mente, saber o que ela pensa. Eu quase cheguei perto disso. Com anotações, entrevistas e meus próprios relatos colocaram parte de uma vida em um papel muito mais frágil que a força que ele me representou, mas ainda assim o fiz.

Não queria colocar tantos detalhes sobre a minha vida aqui, mas tenho medo de que a falta de detalhes faça você ter uma interpretação diferente da que eu gostaria e isso não está nos meus planos. O que menos preciso em algo tão delicado quanto esta leitura é que a minha mensagem não chegue ao meu leitor.

Tudo começou com uma briga. Dramática como era, queria dar um fim à minha amargura de bullying sofrido na escola como se fosse um filme adolescente americano. Comecei pintando os cabelos de preto e trocando todas as roupas do armário para a mesma cor, para andar como uma sombra pelos corredores do colégio. A segunda parte era mais difícil para a minha mente imatura em relação a maldades: uma cola potente para a cadeira e algo gosmento embaixo da carteira provavelmente dariam conta do recado. Obviamente a autora do bullying descobriu. Obviamente veio tirar satisfação.

Com o nariz e o lábio superior sangrando, fui expulsa e levada para casa pelos meus pais. “Você vai passar um tempo fora”, eles disseram para mim “Você precisa espairecer um pouco, pensar nessas atitudes estranhas que tem tomado, se tornar uma pessoa melhor...” Eu não me importei em dizer alguma coisa, reclamar a respeito dessa decisão e acho que não teria me importado ainda hoje. Para mim, aquilo significaria um novo começo, uma vida nova, sem aqueles tormentos infantis e agora eu sei como aquilo foi importante para o meu amadurecimento. Acho que, se estivesse no lugar deles, teria feito a mesma coisa com a minha filha porque, como eles, não saberia exatamente como agir e apostaria na sorte. Foi esta sorte que me trouxe incríveis experiências, afinal.

Como a minha rebeldia não se limitava ao bullying, mas a mim mesma e a todos ao meu redor, não me preocupei em descobrir para onde iria. As malas já estavam prontas e dentro do carro, apenas coloquei meus fones de ouvido e fechei os olhos. Acordei entre sacolejadas e chamados na porta da minha nova vida. Se eu não estivesse tão amargurada, perceberia que aquele lugar sorria para mim, hoje eu sorrio de volta em forma de agradecimento. Eis que começou a minha aventura de reviver. E, antes mesmo que eu soubesse, ele já fazia parte disso. Ele sempre fez parte...