Till the world end escrita por Júlia Lerman


Capítulo 2
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Bem, aqui está o primeiro!
Boa leitura, querido leitor.



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Quando eu era mais nova, costumava subir nas árvores do quintal da casa da minha falecida avó. Foram inúmeras as vezes que eu caí de algumas das árvores mais altas e escorregadias.

A sensação de cair de costas, do pico da árvore, ficar sem ar e com uma dor latejante na cabeça, foi a mesma quando o vi. Estava sozinho, as roupas rasgadas, mas ainda podia-se ler o escrito na blusa: Alice in Chains. Sua banda favorita.

Por um segundo seus olhos fundos, agora sem vida, cruzaram com os meus. Podia jurar que ele estava com uma feição confusa estampada no rosto. Brad começou a correr em minha direção.

Paralisada. De terror ou choque. Talvez os dois. Não consegui me mover, não fui capaz de ser forte nem mesmo para salvar minha própria vida. Mas quem se importa? Eu não conseguira salvar nem mesmo a de Brad. Brad, dos sorrisos tortos. Brad, das piadas engraçadas, mas não maldosas. Brad, o único louco o bastante para ser meu amigo. Melhor amigo.

Sua voz ecoava em minha cabeça, martelando, martelando, martelando. Ela estava a ponto de explodir. Minhas mãos trêmulas apertavam, com toda a força existente do meu ser, aquela velha espingarda que meu avô usava para caçar. Todos os meus instintos diziam para atirar, mas eu não podia. Não podia atirar no meu melhor amigo. Eu sabia que ele estava ali, em algum lugar. Seus olhos azuis, cheios de vida, estavam por trás daquelas horríveis olheiras fundas e pupilas dilatadas. Ele estava completamente desfigurado. Tão magro e acinzentado. Eu tinha certeza de que ele estava lá.

Não suportava vê-lo daquela maneira. Eu não suportava mais a mim mesma, por tê-lo deixado sozinho, sem ajuda. E então, fiz a coisa mais insana de toda a minha vida. Gritei. Clamei por seu nome. Chamei por um morto.

Pouco me importava se outros deles fossem me achar. Não. Não podia falar como se Brad fosse um desses monstros horríveis, porque ele não era. Recusava-me a aceitar.

– Brad! – Berrei, não conseguindo conter as lágrimas. – Brad, por favor, me escute! – Ele não estava me escutando. Mas que diabos eu estava fazendo? Ele está morto! Mas eu não me permiti aceitar esse fato, de modo que passo a gritar ainda mais alto, entre soluços. – Brad... Eu não posso... não me obrigue...

Apontei a arma, puxei o gatilho, sem coragem de atirar. Fiquei apenas observando cada passo dele, lembrando de cada sorriso. Palavras ditas ao vento, cochichadas para que ninguém, além de mim, pudesse ouvir. O som de sua risada, esta que me fazia rir junto. As brigas, que nunca duravam. Alguns beijos trocados, meio desajeitados e desesperados. Eu precisava de Brad. Nunca tinha percebido isso, até o momento em que atirei.

Fiquei sem ar. Imóvel, sem nem mesmo piscar. Vendo seu corpo cair no chão, com um tiro certeiro na testa, lembrei que fora um erro gravíssimo atirar. Outros viriam atrás de mim. Eu ficaria cercada e eles me atacariam, transformando-me em um deles. Soltei algo como um choro e um engasgo, arrastando-me até o corpo do meu melhor amigo.

Os zumbis poderiam esperar, afinal, eu tinha algo importante para dizer.

– Oi, Brad – solucei, passando minha mão trêmula e suada por seu ninho de rato, que antes eram seus cabelos. – Eu queria dizer... Queria... – Eu gaguejava muito, entre soluços. – Eu te amo. Queria que você pudesse me ouvir agora, pois estou prestes a virar comida de defunto – comecei a rir por puro nervosismo e terror. – Vou cuidar bem do Sr. Banana, não se preocupe. Não vou deixar que arranhem seus CDs novos, meu amor. – O abracei. Seu corpo gelado e corpulento, nada parecido com meu antigo Brad.

Não me recordo direito do que aconteceu depois. Apenas de um som alto e agudo, parecido com um alarme de carro. De ter beijado a bochecha ossuda do meu amigo zumbi e disparado até em casa. Por sorte nenhum defunto me viu, ou conseguiu me alcançar. No meu bairro, agora desabitado, não havia nem sinal deles. Entrei pelo porão, cheguei até o sofá e simplesmente desmaiei.

– Eu amo você.

– Ama, é? Ama como?

– Amo muito. Mais do que... batata-frita.

– Nossa, é muito amor mesmo. Me sinto... desejada.

– E você, como me ama?

– Eu nem disse que te amo.

– Mas eu já sei disso. Não precisa dizer. Está estampado na sua bunda.

– A expressão correta seria: “Está estampado na sua cara” e não “bunda”, seu idiota.

– Eu gosto de criar expressões novas, mais toscas.

– Você é impossível.

– E você me ama.

– Seu tosco.

Acordei suada, tremendo muito e gritando. Ótimo Jen, chame-os. Grite para que os zumbis venham para um belo jantar, e o prato principal será cozido de Jen com arroz.

Tentava respirar fundo e repetir comigo mesma que tudo fora apenas um sonho. Mas não foi. Percebi isso assim que olhei para a minha camisa. Estava suja de sangue, assim como minhas mãos. Corri até o espelho e descobri que meu rosto também estava manchado de um vermelho escuro com cheiro metálico tão forte que me deu náusea.

Comecei a chorar, mas não queria demonstrar ser fraca, mesmo estando sozinha em casa. Trêmula, subi as escadas com dificuldades. Não sei por que, mas meu corpo está fraco e tudo o que eu quero é um bom banho e depois, cama. Quero esquecer tudo o que aconteceu, mas não quero me perdoar. Este será um fardo que carregarei pelo resto da vida. Temo ter pesadelos com Brad à noite e não ter ninguém além de mim para culpar. Eu me detesto por isso.

...

Já estava indo me deitar quando me lembrei de um detalhe importantíssimo. Sr. Banana. O hamster de estimação que Brad ganhara no seu aniversário de dez anos. Confesso que até hoje não sei como aquele bichinho fedorento sobreviveu durante sete anos. Os meus geralmente morriam rápido, mas o Sr. Banana parecia bem saudável.

Resolvi que iria buscá-lo assim que o sol nascesse, pois agora tudo o que preciso é de um cobertor quente, principalmente depois do banho gelado que tomei. Bem, melhor um banho frio do que banho nenhum e acreditem, faz dois meses que vivo assim e ainda tem sabonete. Tudo bem, eu roubei alguns da farmácia, mas, dadas as circunstâncias, não acho que foi roubo. Foi mais um “pegar emprestado por necessidade”. Só que nunca devolver.

Deito em minha cama, cubro-me e fico longos minutos fitando o teto. Pensando em tudo, menos em Brad. Pensando em Brad, menos em tudo. É incrível quando uma pessoa de seu convívio morre e então a única coisa que você consegue pensar é nela. Cada minuto se torna uma tortura, quaisquer lembranças se tornam ainda mais vívidas e nostálgicas.

– Brad... – Digo sentindo o nó se formar em minha garganta, aquela pontada de dor aguda no peito. Viro-me, agora fitando o mural, cheio de fotos, que fora pregado por meu pai em meu quarto. Foco meu olhar em uma. Eu, Brad e Amy. Nessa ordem, Brad sorria como um bobão, fazendo careta. Amy sorrindo abertamente, feliz. Lembro-me desse dia.

Brad estava se queixando havia meses para que fossemos ao parque do terror. Eu, particularmente, não gosto muito dessas coisas. Acho um pouco masoquismo essas pessoas irem com o intuito de sentir medo. Mas eu fui. Amy adorava essas coisas. Ela e Brad passavam oras discutindo sobre quem era melhor em tal jogo de horror.

Amy. Como eu pude me esquecer? Estive tão equivocada durante esses meses que só agora percebo que não a vi desde o dia do incidente. Será que ela está viva? Onde ela poderia estar? Uma agonia toma conta do meu corpo, junto com uma ansiedade e uma pontinha de esperança que forma-se no meu peito. Não cometerei um erro duas vezes. Vou salvar Amy; mesmo que eu tenha de andar pela cidade inteira berrando com um megafone. E é com esse pensamento em mente que eu adormeço. Buscar Sr. Banana e salvar Amy. Eu devo essa a Brad. E, talvez assim, eu possa me redimir comigo mesma. Afinal de contas, o antigo Brad, de sorrisos tortos e olhos azuis intensos, faria o mesmo.


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Notas finais do capítulo

Espero realmente que tenham gostado! O melhor está por vir.
Por favor não deixem de comentar e me dizer se estão gostando ou não, se precisa ser melhorado e o quê precisa ser melhorado.
Façam uma autora feliz para continuar prosseguindo esta história.



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