Despertar escrita por Seto Scorpyos


Capítulo 9
Capítulo 9




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Uruha se mexeu preguiçosamente, antes de abrir os olhos. Por um momento, franziu a testa ao encarar o quarto tão diferente do seu e então, lembrou-se. Ficou parado, absorvendo o fato de acordar na cama de Aoi, depois de uma noite de amor com ele.

Amor... palavra estranha entre os dois. Mas a outra o ofendia profundamente e não pensaria nela.

Com um gemido baixo de dor, sentou-se e mordeu o lábio.

– Eu sinto muito, mas não vou pedir desculpas por isso.

A frase, dita claramente, o fez erguer a cabeça. O moreno estava sentado, totalmente vestido, numa poltrona em frente à cama. Uruha elevou uma sobrancelha, olhando para o lado vazio na cama.

– Acordou cedo... – comentou, neutro.

– Não consegui dormir.

O medo começou a se insinuar em Uruha, fazendo-o perder um pouco da segurança.

– Estou em desvantagem, então. – o loiro comentou, baixo – Posso perguntar o que aconteceu?

– Você aconteceu. – Aoi respondeu, simples. Uruha o encarou e ele sustentou o olhar – Você, aqui comigo... – o mais velho encolheu os ombros – Eu levei a noite toda tentando absorver isso... Por mais que eu tivesse você nos braços, ainda assim me pareceu irreal... – com um gesto nervoso, o guitarrista moreno passou a mão pelo cabelo, bagunçando-o.

O loiro não soube o que responder e puxou as pernas, abraçando-as. O moreno observou o gesto com atenção e se ergueu, incapaz de ficar parado, mas não notou que Uruha se encolheu. O jovem olhou em volta, e então, jogou de lado o lençol e se levantou. Aoi o encarou, surpreso.

– O que foi? – perguntou, estendendo a mão para segurar o músico.

Uruha recuou, olhando da mão estendida para o rosto sério do mais velho. A velha desconfiança e o medo, que aumentou vertiginosamente, o fizeram recusar o gesto.

– Preciso ir para casa... – murmurou, desviando os olhos.

O jovem se virou, pronto para fugir para o banheiro, mas Aoi o segurou.

– Uruha, o que aconteceu? – a voz do mais velho demonstrou preocupação.

Ignorando a resistência de Uruha, o moreno o segurou e virou-o, obrigando-o a encará-lo.

– Qual o problema? – perguntou, alarmado.

A resposta demorou a vir, deixando-o ainda mais nervoso.

– Preciso ir. – o jovem respondeu, baixo, depois de soltar o rosto com um gesto brusco.

– Não. Quero saber o que foi que aconteceu. – o mais velho insistiu, segurando o outro pelo braço.

Uruha ergueu os olhos e parou de tentar se soltar.

– Não vou encarar suas inseguranças a esta altura, Aoi. Não preciso e não vou passar por isso. – a voz do jovem falhou e ele negou com a cabeça – Não posso...

– Eu te amo. – o moreno disse, segurando-o com mais força – E não estou inseguro com isso. – o guitarrista loiro o olhou e Aoi pode ver a desconfiança espelhada – Sei que somos homens, sei que não é normal nem natural, sei que um monte de gente não aceitará e provavelmente teremos que esconder de outro monte de gente, mas eu quero você, quero o que está acontecendo e vou pagar para ver.

Aliviado por que o jovem se acalmou, Aoi o abraçou.

– Não sei o que pensou, mas eu só estava dizendo que quase não consegui acreditar que finalmente te tenho aqui, nos meus braços. Eu fiquei te olhando a noite toda, lembrando de tudo... me convencendo que não estava sonhando... Por favor, me diz o que fiz de errado...

Uruha fechou os olhos, sem saber como explicar o medo de ser ferido, de não conseguir esquecer e de ter que encarar o fato de, depois de ter se exposto tanto, tudo não passasse de um capricho do moreno. De uma frustração que o outro queria resolver.

– Não consigo... – o loiro murmurou, descansando a cabeça no ombro do amante.

Aoi respirou fundo e abraçou Uruha com mais força, deixando-o sentir as batidas do seu coração até que se acalmaram. Ambos.

– Ainda quer ir embora? – o mais velho perguntou baixinho, sentindo um súbito peso no peito.

– Eu disse que ficaria. – o jovem respondeu, depois de alguns minutos.

– Disse sim, mas eu estou perguntando se quer. – o moreno replicou, se afastando relutantemente - Se não estiver se sentindo seguro, eu vou respeitar. Eu espero.

Uruha devolveu o olhar, dividido.

– Está fazendo muitas concessões... Me pergunto se está tão seguro quanto quer parecer.

O moreno piscou e sem que pudesse evitar, corou. O loiro o olhou, incrédulo.

– Bem... – o mais velho se afastou e desviou os olhos – fizemos coisas muito, muito constrangedoras... e eu... bem... – o embaraço de Aoi aumentou e ele coçou a testa, segurando uma mecha de cabelo – Eu... bem... claro que já tinha lido, mas fazer... é...

O loiro não agüentou e gargalhou, divertido. O moreno o encarou, indignado.

– Estou tentando me explicar aqui! – reclamou, cruzando os braços.

Ambos se encararam e Aoi relaxou a expressão. Quando o moreno abriu a boca, Uruha ergueu a mão.

– Chega de assuntos sérios. – disse, respirando fundo – Acho que me deixei levar por pensamentos não muito coerentes e acabei confundindo as coisas. Me desculpe se te assustei.

– Você é naturalmente confuso. – o moreno rebateu, visivelmente aliviado.

Uruha encolheu os ombros, numa concessão silenciosa. Aoi sorriu e recuou um pouco mais.

– Eu estava esperando você acordar para irmos tomar café. – explicou, à guisa de explicação – E Kai ligou.

O loiro ergueu uma sobrancelha, esperando pelo resto da frase. O moreno se mexeu, desconfortável.

– Eu não sabia se podia contar sobre nós, então... – hesitou, desviando os olhos – Mas eu disse que ligaria mais tarde. Ele queria saber se eu já decidi para onde vou.

Uruha encarou o mais velho, ainda cauteloso.

– Você pode ficar uma semana com seus pais. – ofereceu, sem desviar os olhos do amante.

Aoi devolveu o olhar. Ambos sabiam que eram duas semanas de férias.

– Não consigo sugerir nada. – explicou, sentindo-se corar.

– Nunca vou me acostumar com isso. – o jovem respondeu, sacudindo a cabeça – Vou tomar um banho e então, conversamos.

Sem esperar resposta, Uruha entrou no banheiro e Aoi olhou em volta, respirando fundo. Sem esperar, trouxe a mochila do loiro e deixou sobre a cama, saindo em seguida. Apesar da aparente trégua, sabia que estavam andando sobre gelo fino.

Abriu as janelas e deixou o ar frio entrar, tomando cuidado em deixar as cortinas mais leves cerradas. Não conseguia simplesmente agir como se não pudessem vê-lo e sua prioridade no momento era estar totalmente a sós com Uruha.

Não que se importasse com as fofocas, já tinha aprendido a lidar com elas desde o início. O staff inteiro comentava, ainda que se achassem muito discretos, sobre as particularidades da banda. Aoi agradecia a discrição japonesa, que não deixava que os comentários se espalhassem muito, mas o simples pensamento que podiam fazer se quisessem, quer dizer, espalhar boatos sobre os membros, o deixava desconfortável.

Ainda bem que Kai sempre deu um jeito para que todos os dramas não fossem públicos e como se tornou uma pessoa confiável e respeitada, as pessoas simplesmente não queriam magoá-lo. Duvidava que teriam o mesmo tratamento se o líder não estivesse na banda.

O moreno acendeu um cigarro e sentou-se, sentindo o frio entrar através do tecido fino da cortina. Apesar da noite em claro, não se sentia cansado. Com paciência, tragou lentamente esperando o guitarrista loiro.


***


Aoi desceu do carro se sentindo dolorido. Não foi uma boa idéia ter feito todo o percurso dirigindo e com um suspiro exausto, reconheceu que Uruha estava certo quando sugeriu o trem.

– Agora é tarde para lamentar... – o moreno murmurou, resignado.

Encarou a porta da casa dos pais e sorriu. Quase ao mesmo tempo em que pegou a pequena mala, a porta se abriu a sua irmã correu para fora.

– Yuu! – ela comemorou, apesar de parar a uma certa distância.

O guitarrista sorriu e se aproximou, inclinando-se para abraçá-la.

– Kanako! – ele a apertou e então, soltou-a – Como vão todos?

– Estamos bem – ela respondeu, com os olhos brilhando – Que bom ver você.

Ambos entraram na casa conversando e na cozinha, Aoi encontrou a mãe.

– Mãe! – o moreno se inclinou respeitosamente, fazendo a senhora abrir um sorriso.

– Yuu! Que bom que pode vir!

Depois que Aoi se instalou no antigo quarto, a família se reuniu para uma refeição e o guitarrista contou sobre a turnê e o sucesso da banda. O pai ainda sentia uma certa reserva sobre a profissão que o filho escolheu mas o respeitou por trabalhar tanto pelo que queria. Embora não falassem sobre o assunto, os pais de Yuu ficariam felizes se o filho optasse por se casar e ter um filho.


– E quanto as namoradas, Yuu? Já encontrou outra pessoa para o lugar de Akaya? – Kanako perguntou, jogando-se na cama do irmão.

Ele ergueu os olhos e encarou a irmã.

– Lugar da Akaya? – perguntou, confuso – Como assim?

– Ela ainda não encontrou ninguém para colocar em seu lugar... – ela desviou os olhos, desconcertada.

– Kanako, a minha história com a Akaya já terminou e sabe disso. – o moreno explicou, paciente – Sinto muito que ela ainda não tenha encontrado ninguém, mas vai acabar acontecendo. Ela é legal.

A mulher sorriu, satisfeita.

– Mas ela ainda te ama muito... e se você também não encontrou ninguém... – parou, esperançosa.

Aoi observou a irmã, tentando saber qual a melhor saída. Se dissesse que encontrou, teria que responder a muitas perguntas e quase todas embaraçosas. Se dissesse que não, aumentaria a esperança já que estava vendo nos olhos tão escuros quanto os seus.

– Kanako, vamos deixar essa conversa para depois? – perguntou, diplomata.

– É claro, Yuu! – ela concordou de pronto, fazendo soar o alarme no irmão.


Aoi podia se congratular por não ser pego de surpresa. De algum jeito, Kanako arrumou um jeito de avisar Akaya que estava em casa e agora a moça o encarava com expectativa. De uma forma quase ensaiada, todos saíram e os deixaram a sós na sala.

– Que bom que veio, Aoi! Eu fico feliz... – ela comemorou, sem tirar os olhos do ex namorado.

– Eu também estou feliz por vir e ver todo mundo bem. – ele respondeu, neutro.

– E então... Como está? – a pergunta saiu hesitante e Aoi soube o que ela queria dizer.

– Está tudo bem. A turnê foi um sucesso e temos algumas músicas para o próximo trabalho. Dessa vez, vou ficar com a produção final das músicas, além da composição com Uruha.

A menção do guitarrista loiro a fez se sentir gelada, mas a moça deu um sorriso e disfarçou.

– Parece muita responsabilidade. – ela comentou – Mas não deve ser tão difícil para você, que costuma ser bem exigente.

Ele sorriu, sem responder.

– Quanto tempo vai ficar? – ela perguntou, tentando acabar com o silêncio.

– Apenas até o fim de semana. – o moreno respondeu, sem conseguir evitar as lembranças.

Ele e Uruha passaram dois dias incríveis juntos e por mais que conhecesse o amigo e companheiro na banda, se surpreendeu em como ele podia ser indefinível. Divertido, mas mordaz nos comentários, além de um pouco manhoso, cuidadoso com as pessoas ao redor e sensual em tudo o que ia fazer. Ainda mais porque não tinha a menor idéia de que fosse sensual e isso era um perigo para as emoções de Aoi. O loiro não fazia nada premeditado, mas arrasava quando inclinava a cabeça para o lado, totalmente perdido.

Aoi ainda se lembrava quando simplesmente pagou a conta do restaurante sem que tivessem sequer jantado e o arrastou para o apartamento, faminto. Não soube como conseguiu coragem para jogar Uruha sobre a cama, mas no fim, quando terminaram exaustos e saciados, o loiro não reclamou.

– Aoi? – a voz de Akaya fez o músico piscar, confuso. – Está longe...

Ele sorriu, com o olhar ainda brilhante.

– Só recordações. – respondeu, levantando-se.

– Recordações nossas? – ela perguntou, levantando-se e se aproximando.

O moreno se virou, encarando-a seriamente.

– Não, Akaya. – diante da expressão decepcionada da ex, ele respirou fundo – Não devia deixar sua vida parada, esperando por algo que não vai acontecer. Não sei o que esperava quando veio, mas acho que devia se preservar mais.

– Sua irmã disse que... – ela parou, hesitando.

– Eu disse a ela que não tenho ninguém, mas isso não significa um recomeço para nós. – ele explicou, sério.

– Você não costumava ser tão duro comigo, Aoi. – ela comentou, mordendo o lábio.

– Eu não queria mesmo ser, mas não posso alimentar suas esperanças, Akaya. – Aoi tentou não soar muito seco, mas estava desconfortável com a situação.

– Não podemos ser amigos? – ela tentou de novo, se aproximando.

Ele hesitou e então, sorriu.

– É claro que podemos ser amigos.


****


Uruha ficou parado no meio do quarto, encarando a tela do celular com o rosto franzido.

– Só pode ser piada... – comentou, ferido.

Sentindo-se pesado, simplesmente teclou os números conhecidos e, quando ouviu a voz da secretária, fechou o telefone e os olhos.

– Por favor... por favor, não... – murmurou, tentando não chorar de frustração e desespero.

Só conseguiu falar com o amante na manhã do outro dia, e quase desistiu ao ouvir a música e vozes no fundo.

Uruha? – a voz de Aoi pareceu animada demais.

O loiro respirou fundo, tentando não se estressar ainda mais.

– Só liguei para agradecer a foto e a filmagem que me mandou. Foi esclarecedor. – explicou, seco.

O quê? Que foto? O que... – o moreno soou confuso.

– Vou te reenviar. – o jovem o interrompeu, engolindo as lágrimas – Valeu por me avisar.

Sem esperar, desligou a ligação e então, fez a chamada de novo, mandando a foto e o vídeo de volta para o amante. Assim que recebeu a confirmação, desligou o aparelho.


– E então? – a irmã mais velha perguntou, quando ele entrou no pequeno jardim.

– Mandei a foto e a gravação de volta para ele. – o jovem explicou, pegando o sobrinho nos braços.

– Vai ouvir o que ele tem a explicar? – ela perguntou, vendo a sombra no olhar do irmão e xingando mentalmente o moreno de todos os nomes que sabia.

– Não sei. – a resposta veio acompanhada de um sorriso triste.

Tamaki não insistiu no assunto e falou sobre o filho, distraindo o irmão. Logo a outra irmã chegou, junto com o marido. Uruha se concentrou em sua família, feliz por tê-lo ali e afugentou as lembranças que a foto de Aoi beijando Akaya e o vídeo dos dois abraçados, se beijando no jardim, ressuscitaram.


No final da noite estava exausto. Sentou-se na cama ainda secando o cabelo com uma toalha e então, percebeu o telefone desligado, jogado perto do seu pé. Ficou encarando o aparelho, perguntando-se o que tinha feito para merecer algo como aquilo. Sem resposta para si mesmo, pendurou a toalha e colocou o telefone sobre o criado, preparando-se para dormir.

No escuro, não conseguiu não se lembrar e acabar misturando as coisas. Não gostava desse tipo de situação e não a queria.

Não a queria mesmo.


****


Aoi terminou o décimo cigarro da noite, encarando a manhã através da janela. Não conseguiu dormir um segundo, preocupado com Uruha e tentando falar com ele a cada dez minutos, sem sucesso. Desanimado, checou de novo a lista de ligações feitas e encarou aquela que pareceu ter sido usada para mandar o vídeo e a foto.

Com um suspiro, se ergueu e apagou o cigarro. O banho foi rápido e logo, desceu. Como esperava, a mãe estava sozinha na cozinha.

– Yuu, meu filho! – ela cumprimentou, com um sorriso.

– Mãe! – o moreno se inclinou e depois, olhou em volta – Meu pai está em casa?

A mulher o encarou, surpresa.

– Está! Lá na oficina, como sempre.

– Eu preciso falar com vocês.

Shiroyama Haruna encarou o filho com atenção. A expressão séria e um pouco tensa do filho a deixaram preocupada.

– Filho, o que houve? – perguntou, baixo.

– Prefiro falar com os dois ao mesmo tempo. – ele explicou, encolhendo os ombros – Pode ser agora?

Ela se levantou e deu a volta na mesa.

– Vamos.

Aoi a seguiu, tentando encontrar as palavras certas para a pior hora da sua vida.


Meia hora depois, diante do silêncio dos pais, Aoi se sentiu pequeno e desajeitado, indigno.

– Vou arrumar minhas coisas. – explicou, erguendo-se.

O moreno ainda hesitou, mas desistiu de esperar algum tipo de impedimento. O rosto marcado da mãe e a expressão soturna do pai não davam essa esperança. Sentindo um peso nos ombros, saiu da oficina direto para o quarto.

Tentando não jogar tudo dentro da mala e sair correndo, Aoi se refreou. Guardou tudo o que trouxe e puxou uma antiga mochila, para pegar algumas coisas que sempre ficaram na casa dos pais. Sabia que não poderia voltar sempre que quisesse e não queria que fossem jogadas fora. Duvidava que a mãe poderia fazer isso, mas não queria ter que enfrentar se ela fizesse.

– Aoi?

A voz da irmã o fez estreitar os olhos, mas não disse nada. Continuou a arrumar as malas, escondendo a tensão.

– Por que está arrumando a sua mala? Já vai embora? – Kanako se jogou sobre a cama, encarando o irmão com atenção – Aconteceu alguma coisa?

Ele ergueu o corpo e devolveu o olhar pesado. Ela se encolheu visivelmente.

– Estou indo embora porque contei a nossos pais sobre mim e Uruha. Como pensei, eles não aceitaram bem.

Ela se ergueu de um pulo, segurando o braço dele com força.

– Mas por que contou? Porque tinha que fazer isso? – Kanako quase gritou.

– Por causa do que você fez.

A mulher largou o braço do irmão, vermelha.

– Eu... – ela fez um trejeito desajeitado com as mãos e desviou os olhos.

– E como não perguntou do que eu estava falando, presumo que saiba de tudo. – ele terminou, seco.

– Mas ela me disse que não era nada importante... ela me disse que iriam tentar de novo! – a voz de Kanako saiu um pouco esganiçada.

– Ela não te contou que não é a primeira vez que tentou fazer chantagem comigo. Ela ameaçou contar a nossos pais que eu me apaixonei por ele quando terminei nosso relacionamento. – o músico encolheu os ombros, desanimado – Como não cedi e Akaya não insistiu, achei que o dinheiro que dei a ela como indenização acalmou seu instinto de vingança. Acho que me enganei. – o olhar se tornou duro para a irmã – Só não esperava que ela usasse você para isso.

– Mas o beijo... vocês se beijaram, não é? Não pode negar, eu vi! – ela teimou, recuando um pouco.

– Não vou negar nada. Eu realmente achei estranho que ela parecesse ainda tão frágil, mas quando me pediu um último beijo, não desconfiei. Na verdade, não estava me importando muito, e estou irritado que tenha sido uma armadilha. Fica difícil pensar em qualquer tipo de relacionamento, depois disso.

Kanako sentou-se sobre a cama, pálida.

– Eu só quis... quando ela me contou, eu... Na verdade, fui eu que contei a ela. – ela não ergueu a cabeça, envergonhada – Eu ouvi vocês conversando e contei a ela. Não sabia que era ele, o loiro guitarrista da banda, achei que era alguma nova namorada... Foi ela que me explicou e disse que ele é que estava sempre em cima de você e que achava que se acontecesse alguma coisa, vocês podiam ficar juntos de novo.

– Nunca foi assim, nem no começo. Ela mentiu para você. – ele decretou, frio.

– Eu não ia te chantagear. Nunca faria isso. – a irmã afirmou, convicta.

– Depois da foto e das imagens, quando visse que não deu certo, o que faria? – ele a encarou – Até onde seria capaz de ir por achar que está certa sobre como as pessoas devem viver as próprias vidas?

Kanako ergueu a cabeça, olhando o irmão voltar a arrumar as malas.

– Você vai deixar que ele separe nossa família? – perguntou, baixinho, sem se dar por vencida.

– Ele não está fazendo nada, minha natureza está. Não sou o que nossos pais esperavam que eu fosse e como é assim... – ele deu de ombros, resignado.

– Porque não pode desistir disso e se casar, como uma pessoa normal? – ela insistiu, fazendo cara de choro.

– Eu sou uma pessoa normal. Sou um bom homem e um bom profissional. – Aoi rebateu, sem olhar para a irmã.

– E filhos? Você sempre quis ter um filho... não vai ter, se continuar com isso. Além do mais, vai matar nossos pais de desgosto.

Aoi respirou fundo e encarou a irmã finalmente. A expressão triste dela o fez suavizar a voz.

– Kanako, eu falei com nossos pais e eles ficaram chateados e magoados sim, mas não surpresos. Acho que já tinham percebido que eu não seria tudo o que eles sonharam para mim, mas isso não me torna má pessoa. Também estou triste e magoado, mas não posso fingir a esse ponto. Não posso me casar apenas para torná-los felizes, vivendo uma mentira.

– Mas você e Akaya sempre se deram bem! Vocês moraram juntos! – ela se ergueu, encarando o irmão com olhos brilhantes – Ela sabe de tudo e te aceita! Que mal pode ter? Consertaria tudo!

– Não consertaria nada, Kanako. Não para mim. – ele respondeu, sério – E por que quer que eu seja infeliz? Apenas para construir uma fachada para satisfazer vocês?

Ela recuou, atingida. A palidez se tornou intensa e então, ela desviou os olhos.

– Espero que ele valha sua família, Yuu. – ela sentenciou, antes de sair do quarto.


Aoi não se virou e concentrou-se em terminar o mais rápido possível. Quando já estava tudo pronto, pegou o casaco sobre a cama e vestiu.

– O almoço está pronto, Yuu. – a mãe parou na porta ainda aberta, mas não entrou.

O músico se virou e a olhou, ela observava as malas fechadas.

– Você vai embora? – ela perguntou, neutra.

– É o melhor a fazer, mãe. – ele explicou, educado.

Haruna assentiu com a cabeça e então, encarou o filho.

– Seu pai saiu e Kanako está trancada no quarto. – a voz dela saiu sem emoção – Espero que saiba o que está fazendo com sua família.

– Sinto muito. – Aoi se inclinou respeitosamente.

– Eu posso fazer alguma coisa para mudar isso? Existe algo... – a voz da mulher falhou e ele se sentiu miserável.

– Não. – ele a interrompeu, erguendo-se antes que perdesse a coragem – É melhor eu ir.


Para sua surpresa, a mãe pegou a bolsa mais leve e o acompanhou até o carro, recomendando cuidado e que ligasse quando chegasse em casa. Paciente, ela esperou o filho trazer tudo e ajudou a arrumar na mala do carro. Quando terminaram, ela fez com que ele se abaixasse para receber um beijo na testa.

– Seja um bom homem filho, e não se esqueça de não envergonhar seu pai. – ela recomendou, séria.

– Sou sempre discreto, mãe. – Aoi respondeu, sem sorrir.

– Eu sei. Nunca deixe que as pessoas falem de você ou dele. – diante do olhar surpreso do filho, ela encolheu os ombros – Se é assim, nunca dê brechas para que possam machucar você e proteja também seu.... – ela hesitou e então, respirou fundo – Seu companheiro.

– Obrigado, mãe.

Ela se afastou e ele entrou no carro, dando partida. Ainda a olhou pelo retrovisor, mas logo se concentrou em chegar em casa. Estava louco para chorar como um desesperado e sentindo-se sujo e anormal. Sabia que era um absurdo, mas era exatamente assim.


***


Uruha atendeu o telefone no meio de uma conversa com os pais e os cunhados.

– Alô!

Uruha, diz para o seu porteiro me deixar entrar....

– Aoi?

Eu não quero ir para casa... eu contei a eles... desculpe pela foto, mas eu não te traí. Eu juro!

Em volta do loiro se fez um silêncio preocupado diante da expressão do músico.

– Está em frente ao meu prédio? – o jovem perguntou, tentando se refrear.

Estou. Não quero ir para casa... mas eu posso procurar outro lugar...

– Pode passar o telefone para ele, por favor?

O recepcionista do prédio de Uruha atendeu e o loiro autorizou que o apartamento fosse aberto para Aoi, e ainda pediu que fosse providenciada uma chave extra para o moreno. Assim que o telefone foi devolvido, tentou acalmar o músico.

– Aoi, não se preocupe, está bem?

Você acredita em mim, não é?

– Vamos conversar depois, tá? – respondeu, diplomático.

Isso significa que não acredita.

– Descanse, Aoi. Precisa estar bem para me explicar o que aconteceu. – o loiro orientou.

Tá bom.

Aoi desligou e Uruha respirou fundo, preocupado.

– Aconteceu alguma coisa. – murmurou, mordendo o lábio. O músico se ergueu e encarou os pais – Eu preciso vê-lo.

– Te levo até o aeroporto. – o cunhado ofereceu, também preocupado.

Em questão de minutos, Uruha arrumou a mala e deixou a casa dos pais. A mãe se encarregou de explicar ao resto da família que o loiro teve uma emergência e precisou que voltar antes do previsto.


****


Aoi encarou a tigela de udon sem realmente vê-la. Durante a tarde, mexeu e revirou as coisas do loiro, apenas para não pensar. Bagunçou e arrumou as roupas e os cd´s, arrumou os dvd´s em ordem alfabética e saiu para fazer compras. Acabou rodando sem rumo por algum tempo, até desistir e voltar para casa, apenas para pedir comida pelo telefone.

Com um suspiro, comeu sem vontade só por não saber com certeza desde quando não o fazia, mas se perguntassem depois, não saberia dizer se estava quente ou frio, ou mesmo se estava gostoso.


Um pouco surpreso, ergueu a cabeça ao ouvir seu nome ser chamado e então, Uruha entrou na sala. Os dois músicos se olharam e o mais novo percebeu a expressão atormentada do outro. Deixando a mala e a mochila no chão, se aproximou.

– Devia estar com seus pais. – o moreno constatou, aliviado por ver o jovem.

– Meus pais estão bem e minhas irmãs também. Meus sobrinhos e meus cunhados estão bem também. Não dava para ficar lá sem saber como você estava aqui. – Uruha respondeu, sentando-se de frente a Aoi na bancada da pequena cozinha – O que aconteceu?

– Akaya me pediu para sermos amigos e depois, me pediu um último beijo. – o mais velho deu de ombros – Foi isso o que Kanako mandou para você. Uma armadilha em que eu caí como um idiota.

Uruha elevou uma sobrancelha.

– Não está neste estado apenas por isso, não é?

– Eu me estressei e não queria ser alvo de chantagem de novo – o músico loiro não escondeu a surpresa e Aoi sorriu, sem humor – Achei melhor acabar com isso logo de uma vez e contei a meus pais sobre mim.

O moreno levou os hashis à boca, mas Uruha duvidou que ele soubesse o que estava comendo. Com cuidado, observou o amante.

– Eles te mandaram sair? – perguntou, preocupado.

– Não. – o mais velho respondeu, depois de engolir a porção distraidamente – Mas eu não conseguiria ficar, depois do olhar deles. Quero dizer, não foi uma surpresa, mas mesmo assim eles reagiram de um jeito... bem.. – Aoi sorriu, brincando com a borda da tigela – Minha mãe foi legal e se despediu de mim. Não vi meu pai... ele saiu e até a hora que eu também saí, ainda não tinha voltado.

– E Kanako? – o loiro perguntou, estendendo a mão para brincar com os dedos do amante.

Aoi segurou a mão dele com força, entrelaçando os dedos.

– Ela tentou fazer chantagem emocional, apesar de afirmar que nunca faria. Ficou dizendo um monte de coisas e eu até cheguei a duvidar que pudesse ter algum tipo de sentimento por mim. O que ela queria que eu fizesse não dava para acreditar.

Uruha respirou fundo.

– Ela te disse para esquecer isso e ser normal. – arriscou, sabendo estar certo.

O guitarrista moreno o encarou, inclinando a cabeça.

– Foi. – depois de observar o amante por alguns minutos, tomou coragem – Como aconteceu com você? – hesitou – Quero dizer, chegou a contar?

– Não tive que fazer. – Uruha respondeu, dando um sorriso calmo diante do olhar confuso do outro – Quando eu tinha quatorze, minha mãe me ouviu falando com Tomoe sobre um garoto da escola. Como eu nunca arrumava namoradas e nem falava sobre elas, deduzir foi fácil, então, quando eu larguei a escola para fazer música, ela me puxou para o quarto, fechou a porta e me disse para ser sempre discreto e nunca deixar que minha opção envergonhasse a família. – Aoi arregalou os olhos e o loiro encolheu os ombros – Quando estou em casa, não falamos sobre isso. Meus pais não perguntam sobre a minha vida pessoal e eu não digo nada também. Minhas irmãs e meus cunhados também sabem, mas como sou sempre reservado...

Aoi encarou o outro, chocado.

– Parece horrível. – comentou, com frio.

– É, mas muito melhor que a outra possibilidade. – Uruha rebateu, sensato.

– Qual?

– Eles me colocarem para fora e esquecerem que eu existo. – a palidez de moreno fez o loiro apertar os dedos entrelaçados aos seus – Meus pais fizeram grandes concessões, Aoi. Apesar do jeito autoritário, meu pai não me forçou a seguir a advocacia e minha mãe, apesar de não gostar muito, apóia minha profissão. Ambos conhecem minhas preferências e até tentaram me sugerir um casamento, mas não me forçaram a ele. Não é o ideal, mas é que posso ter.

Um silêncio se instalou entre eles e Aoi desistiu de comer. Uruha pegou os hashis e experimentou um pouco do udon, e franziu a testa ao senti-lo frio.

– Isto não está bom. – sentenciou, afastando a tigela.

– Não apresentou Kovu a eles? – o moreno perguntou, de repente.

Uruha olhou para ele.

– Não. Eu falei dele, mas em termos gerais. – o loiro respondeu, levantando-se e pegando a tigela ainda cheia.

Aoi se sentiu um pouco envergonhado.

– Desculpe por perguntar... eu fui... – parou, sem saber como se justificar.

– Não é tão importante, Aoi. – o loiro se virou para ele, deixando a tigela sobre a pia – Kovu me levou para conhecer os pais dele, que são infinitamente mais liberais que os meus. Eu nunca expliquei porque não fiz o mesmo. Não deu tempo, mas tenho certeza que ele sabia.

O velho sentimento de ciúme voltou a crescer no peito mais velho que se remexeu no banco, inquieto.

– Não começa. – o loiro pediu, observando o outro.

– Estou sendo imaturo, inseguro... estou me sentindo miserável e culpado, e estou com ciúme do seu ex namorado. – Aoi riu de si mesmo, passando a mão nervosamente pelo cabelo – Acho que não posso ir mais baixo.

Uruha deu a volta e abraçou o mais velho por trás, que simplesmente se recostou no corpo quente.

– Estou aliviado que tenha vindo. – Aoi murmurou, cansado.

– Não te deixaria sozinho nessa. – o loiro respondeu, baixinho.


Ficaram abraçados por algum tempo, até que Uruha resolveu agir para não deixar Aoi se afundar em melancolia e culpa. Sabia como era se sentir errado e indigno dos próprios pais, mas sabia também que não podiam realmente fazer nada a esse respeito. Não se quisessem ser felizes.

Era fácil se acovardar e buscar a saída mais fácil, como se casar e tentar esquecer, mas desconfiava que no fim, não valia a pena. Nem podia imaginar como era viver de aparências, levando uma vida que não era a sua verdadeira, mas imposta por outras pessoas, por outras circunstâncias.

Durante o banho, enquanto Aoi remexia em sua mochila por um motivo qualquer, não pode deixar de se sentir sortudo. Seus pais não o deserdaram e até o recebiam bem, apesar de tudo, e estava em um mundo em que podia ser ele mesmo, mesmo que todos pensassem que era um personagem. Uruha, o guitarrista loiro e andrógeno da banda de visual kei The GazettE, deu a Takashima Kouyou a chance de ser livre para seguir seu coração.



Quando saiu do banheiro, recostou-se ao umbral e elevou uma sobrancelha. Aoi estava jogado sobre a cama, de bruços, mexendo em seu celular.

– Encontrou alguma coisa interessante? – perguntou, um pouco surpreso por não se sentir invadido.

O outro deve a decência de corar.

– Ah... eu estava... só queria... – parou, rindo de si mesmo – Fui pego no flagra, me desculpe.

– Tudo bem. – o loiro garantiu, desencostando-se do umbral e atravessando o quarto – Curiosamente, eu não estou chateado.

Aoi se ajoelhou na cama, confuso.

– Como assim? – perguntou, tentando entender.

– Eu costumo não gostar quando alguém mexe em alguma coisa minha, mas não me importei agora. – Uruha explicou, calmo.

O mais velho olhou do amante para o celular, ainda em sua mão.

– Eu não quis invadir seu espaço... – explicou, baixo.

– Eu sei que não quis. Deve ser por isso que não me chateou. – o loiro sentou-se na ponta da cama, dobrando uma perna para ficar de frente para Aoi.

– Eu estou curioso com uma coisa.... – o olhar do loiro se tornou cauteloso – Por favor, se não quiser explicar, não precisa.

O guitarrista moreno não disse nada, apenas esperou.

– Quando falou em chantagem... – o mais novo parou, sem saber como perguntar sem ofender.

O amante compreendeu sua dificuldade.

– Akaya ameaçou contar a meus pais, se eu não ficasse com ela. – Aoi colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e se ajeitou – Ela fez quando eu quis terminar... – com um encolher de ombros, suspirou – Não aceitei e a desafiei... acho que ela considerou que tinha mais a perder do que eu e desistiu. – Uruha ficou calado, observando o outro com cuidado – Dei a ela um valor... mais para ficar com a consciência limpa do que por real necessidade, afinal, desmanchei um compromisso de anos. Achei que ela tinha entendido e se conformado.

O moreno desviou os olhos para o aparelho em suas mãos.

– Quando ela apareceu na casa dos meus pais, Kanako não conseguiu disfarçar e eu percebi que elas tinham conversado. Como eu expliquei antes, não desconfiei de nada. – com o olhar atormentado, ergueu a cabeça e encarou o loiro – Eu não pensei muito. Se ela teve coragem de fazer isso, levada ou não por Akaya, Kanako era capaz de fazer mais. Ela sempre quis e incentivou meu relacionamento, dizia que eram como irmãs. Eu não quis passar por isso de novo, Uruha.

– Entendo. – o jovem ofereceu, tocado – Sinto muito, Aoi.

– Eu sabia que algo assim podia acontecer. – o outro deu de ombros, resignado.

Ambos se encararam por alguns minutos e então, Uruha se ergueu.

– Vamos sair um pouco.


Apesar da resistência e dos resmungos, Aoi acompanhou Uruha. O moreno ficou um pouco estressado ao perceber que o loiro queria caminhar, mas depois de alguns minutos, não reclamou mais. Estava frio e ambos usaram casacos pesados e gorros. Vestidos casualmente, não foram reconhecidos.

Aoi ficou secretamente agradecido quando percebeu que Uruha falou o tempo todo. Sobre vários assuntos e nada muito sério. Falaram sobre vídeo game, músicas, vídeos engraçados e filmes. O jovem discretamente apontou pessoas estranhas na rua e ambos riram do figurino de alguns. Juntos, se surpreenderam com a quantidade de luzes no cruzamento e quando pararam finalmente para tomarem um chá quente por causa do frio, o moreno se pegou encantado com as bochechas coradas do guitarrista loiro.

– Tá me secando de novo. – Uruha constatou, pegando a xícara com as duas mãos, para se aquecer.

Aoi lhe lançou uma olhada rápida e então tomou o próprio chá.

– É automático. – explicou, neutro.

O loiro ergueu a cabeça, elevando uma sobrancelha. O moreno devolveu o olhar e encolheu os ombros.

– Eu sempre olho você andar, comer, rir, tocar guitarra... como eu disse, é automático.

Uruha arregalou levemente os olhos, surpreso.

– Uau! – murmurou, desviando os olhos.

– Quero fazer amor agora.

O loiro, que estava tomando um pouco de seu chá, engasgou e tossiu, avermelhando o rosto na tentativa de respirar. Quando finalmente controlou a reação mais que surpresa, encarou o amante do outro lado da mesa. Aoi não perdeu a chance.

– Não posso dizer que...

– Eu ouvi a primeira vez! – o outro se apressou em interromper.

– Não vai se encolher e olhar para os lados, estampando culpa no olhar? – o mais velho provocou, malicioso.

– Não sou um criminoso. – Uruha rebateu, sério.

– Não. É meu namorado delicioso.

Uruha encarou Aoi por algum tempo e então rolou os olhos.

– Seu tarado! Vamos para casa.

Ambos se ergueram e o moreno galantemente pagou a conta, fazendo o jovem estreitar os olhos.

– Não adianta tentar me encantar. Sou um cara difícil. – comentou, assim que saíram.

Pela primeira vez desde que saiu da casa dos pais, o mais velho riu. Uruha olhou de lado e sorriu também, mas quando o moreno ia fazer um sinal para parar um táxi, segurou seu braço.

– Temos que comprar lubrificante e camisinhas. – explicou, adorando ver o rosto de Aoi ficar escarlate. Com um sorriso de lado, o jovem chegou bem perto do outro – O que foi, desistiu de fazer amor comigo?

– Eu te espero aqui... – o outro ofereceu, totalmente constrangido.

– Sem essa! Já que está pagando... – sem esperar, Uruha saiu na frente, rindo da reação extrema do amante.

– Isso foi golpe sujo! – o mais velho reclamou, após correr um pouco para alcançar o loiro.

– Que nada! Eu valho o sacrifício. – o jovem rebateu, sem se alterar.

– Verdade.

Aoi concordou, aproximando-se de leve de Uruha. O loiro sorriu, discreto, ao sentir o braço do amante roçar o seu. Andaram lado a lado na calçada até encontrarem uma farmácia e, para espanto do jovem, o moreno tomou a iniciativa de entrar e procurar pelos itens.


Uruha não sabia que ia se arrepender de ter provocado. Aoi não só procurou os itens como perguntou para o atendente sobre os sabores e texturas. Curioso, comprou vários tubos de lubrificantes, de sabores e cheiros variados e duas caixas de camisinhas, também variadas. O atendente chegou a olhar para eles com uma expressão suspeita, mas acabou sendo sufocado e quase não conseguiu responder a todas as perguntas. O jovem, sentindo uma mistura de vergonha e irritação, ficou atrás do mais velho, tentando se tornar invisível.

Quando Aoi se virou para perguntar alguma coisa, foi instantaneamente fulminado pelo olhar de Uruha.

– Nem sonhe! – ameaçou, entredentes.

O mais velho se virou, tentando não rir. Depois que já estava satisfeito, pagou a compra e pegou a sacola, seguindo Uruha que saiu quase correndo da farmácia.

– Sabe, é até interessante o que se aprende... – o moreno murmurou, olhando de lado o namorado prestes a explodir.

– Te odeio. – o outro quase cuspiu, ainda irritado.

– Não fiz por mal, eu queria realmente saber. – Aoi explicou, encarando Uruha.

– Podia ter perguntado para mim. – o jovem reclamou, exasperado – Não precisava encher o homem com aquelas perguntas!

– Mas quando eu ia perguntar você quase me fulminou! – com uma expressão divertida, o mais velho tentou se defender.

Uruha estreitou os olhos e respirou fundo.

– Nem vem! Você fez de propósito! Eu sei disso e você sabe disso! Não banque o inocente!

– Desculpe, amor. Da próxima vez, eu te pergunto.

Diante da atitude do mais velho, Uruha rolou os olhos e fez sinal para um táxi. Quando entraram, o loiro deu o endereço do apartamento e Aoi segurou seus dedos discretamente.

– Você está realmente zangado? – perguntou, depois de algum tempo.

– Não de verdade, fiquei com vergonha. – o outro respondeu, lançando um olhar rápido para o companheiro – Não precisa me pedir desculpas por isso.

– Que bom! – o mais velho comemorou, recostando-se e abraçando a sacola.

O guitarrista loiro resolveu não perguntar mais nada, não na frente do motorista. Quando chegaram ao apartamento, pareceu ainda mais frio e eles praticamente correram para o saguão do prédio. Uruha não se importou quando Aoi pagou o táxi e deixou-o passar à frente, segurando a porta do elevador. Também não disse nada quando o moreno se adiantou e abriu a porta para ele, deixando-o entrar primeiro.

Depois que o mais velho fechou a porta, virou-se e o encarou com uma sobrancelha elevada.

– O que foi? – o moreno perguntou, arregalando levemente os olhos.

– Não vai me ajudar a tirar o casaco? – perguntou, jocoso.

Aoi se adiantou imediatamente, sem perceber a armadilha.

– Desculpe... se vira. – o moreno se aproximou, solícito.

Uruha estreitou os olhos, mas sorriu, dissimulado. Assim que Aoi segurou o casaco para que tirasse o braço, o loiro girou sobre si mesmo e imprensou o amante na parede atrás deles. O moreno, pego de surpresa, não conseguiu reagir e gemeu ao ser apertado.

– Acho que fiz algo que não devia... – Aoi murmurou, sentindo perfeitamente o corpo firme contra o seu e a perna de Uruha entre as suas.

– Porque pensa assim? – o sussurro do loiro fez o mais velho engolir seco. O olhar do amante estava positivamente maligno.

O loiro ergueu a mão e delineou os traços do moreno, pressionando um pouco mais o outro contra a parede e impossibilitando que movesse os braços, presos atrás.

– Acho que... – Aoi começou, mas o dedo de Uruha desceu pela garganta de Aoi, fazendo-o perder o raciocínio e esquecer o resto da frase.

O guitarrista mais jovem elevou uma sobrancelha e segurou o pescoço delgado com uma mão, fechando os dedos levemente. O olhar escuro se tornou ainda mais estreito.

– Você dizia...

Aoi não conseguiu pensar em nada. A única coisa que podia sentir com certeza era o toque de Uruha em seu pescoço e em seu corpo. O loiro ergueu um pouco a perna, pressionando-o e ele gemeu baixinho.

– Gosto dos seus gemidos. – o jovem se aproximou e roçou os lábios nos do moreno – São excitantes.

O beijo deixou os lábios de ambos marcados e molhados. Uruha lambeu os do amante, com um meio sorriso malicioso.

– Tão forte quanto você... um pouquinho mais alto... – o jovem murmurou, imprensando um pouco mais o outro – E acho que não consegue se mover, não é?

– Uruha... – Aoi não conseguiu formar o resto da frase quando Uruha o provocou passando a ponta da língua em seus lábios entreabertos.

O moreno aceitou o convite, mas o loiro afastou a cabeça.

– Sua capacidade de concentração é impressionante... – o guitarrista jovem comentou, encarando o olhar cheio de desejo do amante.

Então, sem avisar, Uruha soltou Aoi que quase caiu. O moreno se segurou no casaco do loiro e este, passou o braço em torno da cintura do mais velho, apoiando-o.

– Covardia. – o guitarrista moreno reclamou, baixo.

O aperto aumentou e Aoi mordeu o lábio para não gemer de novo. Uruha se inclinou, mantendo o outro colado a si.

– Tem certeza de que pode me dizer que não gostou? – o olhar do loiro, muito mais escuro agora de desejo, prendeu o moreno – Devo mesmo pedir desculpas?

Aoi não conseguiu responder e então, Uruha o soltou.

– Vem, preciso te ensinar como usar algumas coisas.... – comentou, como se estivesse falando do tempo e não depois de um amasso que deixou o moreno sem chão.


O guitarrista moreno deu dois passos, afastando-se da parede. Com um olhar perplexo, observou Uruha atravessar a sala e pegar a sacola. Com um olhar divertido lançado por sobre o ombro, o loiro simplesmente se dirigiu ao quarto, deixando-o sozinho.

– Ele vai me enlouquecer... – o mais velho murmurou, respirando fundo para se controlar.

E então, com um sorriso que rivalizou com o do amante em malícia, seguiu o mesmo caminho.
















Udon - é servido normalmente como sopa, em caldo quente à base de dashi, shoyu emirin

(Ramune (em japonês: ラムネ) ou Lamune é uma bebida gasosa não-alcoólica do tipo soda limonada fabricada no Japão. A palavra é uma corruptela do inglês lemonade, pois tanto a soda quanto as garrafas originais eram importadas do Reino Unido. – Wikipédia)



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