Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 82
Capítulo 81


Notas iniciais do capítulo

Milena marketeira, informações ~privilegiadas~, sonhos, ~calculismos~ e novos "protagonistas". Ninguém entendeu nada, né? Só lendo pra sacar :)

Enjoy!



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Ajeitando minhas coisas no carro de Gui, que me sento no assento do carona e aceno para a Roberta que passa pela porta do carro pedindo por mais amostras, declaro para meu amigo, que está organizando seu material no banco de trás:

– Sabe, tô me sentindo num episódio de Jimmy Neutron.

Lembro de um episódio desse programa infantil em que o gênio Jimmy inventara algum doce especial e viciou toda a cidade e todo mundo começava a persegui-lo atrás desse doce. A diferença era que os cookies da dona Bia não deixava todo mundo paranoico ou louco, embora muitas pessoas insistissem em conseguir mais amostras.

Dona Bia tem uma pequena venda de biscoitos faz um tempinho, mas só agora decidiu expandir. Seus cookies já fazem parte de muitos comércios alimentícios de nosso bairro, e eu disse que ela poderia ir mais longe se quisesse aumentar a produção. Aumentar o alcance também implicaria em mais investimento, afinal, teria que fazer entregas mais dispersas, porém mais centralizadas, em lanchonetes que tivessem visibilidade e uma clientela bem maior. Valia a pesquisa de mercado ao menos. Por isso me ofereci para tratar com o gerente da cantina da empresa e pensava em outros locais, como lá na faculdade e quem sabe no Center. Feliz, ela topou.

Conquistei primeiro os clientes, para mostrar que havia interessados quando me dirigisse para a lanchonete. Como fiz isso? Sendo a melhor marqueteira de todas! Chegava na pessoa, enfiava o cookie na boca dela e esperava o resultado. Bom, fiz assim com quem conhecia, claro, né? Nem Iara e nem Gui reclamaram. Meu amigo até tentou se esgueirar para mais amostras e claro que eu tinha balançado o dedo ao rosto dele em negação. Eram amostras, oras. Tinham que alcançar público e opinião. Ele faz administração, sabe disso.

Meu chefe também foi fisgado. Com muito apreço, Thiago conseguiu uma segunda amostra. Mas naquela, você não recebeu de mim, você não recebeu nada, você nem fala. Disse que se a lanchonete não aceitasse a prova para revender em seu estabelecimento, ele mesmo já queria fazer uns pedidos. Dizia que era para os sobrinhos. Sei.

Quase pude vê-lo revirando os olhos com muito gosto. E quem não fazia isso quando se deliciava com esses mimos da Dona Bia? Pelo menos pelas redondezas em que fiz a propaganda tinha algum sucesso, meus colegas estavam todos estão interessados. Com esse contento que me encaminhei para a lanchonete já no fim do expediente para fazer meu teatro lá. Com uma clientela conquistada, foi fácil surgir com a proposta.

A única coisa que pedi aos colegas, quando eu ofereci uma amostra a eles, foi que solicitassem o cookie na cantina. Ao chegar lá, o gerente já tinha sacado o esquema todo da minha propaganda indireta e queria provar ele mesmo, saber se equivalia ou não com a verdade. Minhas duas últimas amostras foram para ele e posso dizer que quase temos um contrato! Mediei e representei dona Bia, mas agora era com ela, que negociaria com o gerente.

Como estou encostada no banco do carona, voltada para trás, consigo ver a tempo a sobrancelha do Gui ser levantada. Reviro os olhos.

– Vai dizer que nunca assistiu?

– Era desenho de nerd.

Ele dá de ombros, o safado!

– Como se tu não fosse um grande nerd! Vivia atrás de mim e da Flávia pra fazer grupo de estudos.

– Há controvérsias. Eu tava de olho na Flávia.

Cruzo os braços e volto-me para a posição original, encarando o painel do carro. Finjo-me de zangada porque... porque sim, oras.

– E me usou, né? A velha tática de conquistar a melhor amiga primeiro.

Mentira, porque nossa amizade se firmou bem muito antes, só disse isso por pura implicância. Ao abrir a porta do seu lado e se sentar, que ele declara tão direto e descarado, eu bato no seu braço. Ele disfarça com um resmungo, mas sei que ele quer rir. De mim, da minha atitude, da situação. Mereceu o pequeno tapa.

– É, provavelm... Aiiin, Mi!

Assim que ele fecha a porta do carro, que liga o carro e ajeita o retrovisor, eu aproveito o assunto para perguntar outra coisa.

– Sabe, você nunca disse... quando se apaixonou mesmo. Se teve algum momento.

– E tem como saber?

De fato.

– Eu teria juntado vocês dois, sabia?

– Sempre pensei que você a protegeria com unhas, dentes e uma faca.

Foi essa faca, na realidade, que firmou nossa amizade de verdade. Mas é outra história. Pra nunca ser contada.

– Não fala dessa faca de novo. Mas sério, eu teria. É minha melhor amiga com meu melhor amigo. Se soubesse o quão fofos eram, teria feito altos esquemas. Ou mesmo só apoiaria, contanto que contribuísse para a felicidade de vocês.

– Acho que tive medo de ser julgado ou que você achasse que quebraria nossa união, algo do tipo. Que ficasse contra. Eu nem sabia mesmo se ela me corresponderia. Depois daquele aniversário dela ano passado, fiquei meio maluco e...

– Não me invente de parar agora, bonitinho!

Logo quando ele tava falando tão abertamente!

– Não, é que... olhei aqui a marcação no painel e... Caraca, tamo quase sem gasolina. Eu jurava que tinha mais. Não sei se aguenta até a faculdade.

– Então abastece, ué.

– Tô meio zerado na carteira. Vou ter que passar num caixa eletrônico pra sacar. Só que... Argh, acho que o mais próximo fica depois da ponte.

Espio o seu perfil ao meu lado e não entendo o motivo de tanto alarme. Nível Gui puxar os fios de seus cabelos como se tivesse com um super problemão e se jogar no banco como se fosse insolúvel. E eu sou a dramática.

Ofereço-me para ser a salvadora e recebo o quê? Isso mesmo, orgulho besta!

– Então vamos num posto mais perto e eu pago a gasosa. Resolvido.

– O quê? Não, negativo.

– Gui, não temos opções. Agora vamos.

– Não, deve ter outro jeito.

– Ter tem, mas não acho que você vá gostar de pegar ônibus esse horário. E se pegarmos mesmo um ônibus, eu vou te perturbar por todos os minutos que ficarmos em pé. Ou seja, o caminho todo. Deixa esse orgulho besta. Eu pego carona com você a semana quase toda e você quase nunca aceita minha ajuda de custo. Pois devia, viu.

– Aff, Mi. Você sabe que gosto de pagar eu mesmo minhas coisas.

– Mas uma ajudinha de vez em quando não mata ninguém. E se você tá com problema, por que não?

– Você é tão orgulhosa quanto eu nesse quesito, não sabe?

– Sei até bem demais. Por isso mesmo digo pra deixar o orgulho comigo e vamos logo, que não quero ter que ir na recepção na hora do intervalo. É o pior horário, tu sabe.

Ele liga o carro, contrariado. Dois orgulhosos discutindo não é de dar certo, mas entre a gente às vezes dá. Às vezes. Logo vejo que ele pega um caminho diferente, que trilha para o lado onde se encontra o posto mais próximo. Antes de mais nada, ele acrescenta:

– Vou te pagar tudinho de volta, só passar no Center.

– Eu quero saber é do resto, bonitinho.

– Que resto?

– O resto da história com a Flávia. Tá pensando que me engana? Ou conta ou a gente fica parado no posto. O que você escolhe?

Ele escolhe primeiro suspirar e se perguntar como me aguenta. E eu replico, tinhosa, que iria pagar pela gasolina.

– Viu, era por isso que eu não queria aceitar. Dinheiro sobe na cabeça das pessoas pelo visto.

– Pra mostrar que sou humilde, te concedo que pergunte sobre qualquer coisa que você queira saber.

– Qualquer coisa?

– Você me ouviu.

E nunca pensei que ser humilde assim sairia tão mais caro que a aquela gasolina.

– É verdade que vocês estão escondendo de mim um encontro com o Sávio?

~;~

Você se prepara, se esforça, quase sai no tapa com seu amigo, pra no fim das contas o professor resolver faltar e a apresentação ser cancelada. Muitos colegas meus de turma, pelo menos quem não tinha apresentado ainda no dia anterior, quinta-feira, meu grupo incluso, comemoram a ausência de Max. Por outro lado, foi bom porque Sávio não pôde vir e ao menos na aula de ontem conhecemos o esquema do professor. Ele escolhe uma pessoa do grupo e ela tem que explanar sobre o assunto. Depois ele escolhe outra pessoa do grupo para contrapor de alguma maneira o que o primeiro disse. Na maioria das vezes há concordância. Mas todo mundo tem que estar preparado do mesmo jeito, porque essas escolhas são sempre aleatórias.

Gui faz uma aposta com Flá de que Max vai chamá-lo. Eu não quis me meter na aposta, embora também acreditasse nessa. Ficava à vista que eu estava do lado dele, o que, na conversa do carro, possa ter parecido que não. Gui pareceu um pouco magoado (chateado talvez seja uma palavra melhor) por ele ter sido deixado de fora do encontro com Sávio na minha casa, com Murilo, Aline e Iara. Meu amigo não se exaltou nem nada, só... ficou quieto.

Mas não quero pensar sobre isso. Quero descansar, quero meu Vini e quero me livrar logo dessa atividade, mentalizo enquanto desço a rampa e me despeço de meus amigos. Como a apresentação pelo jeito só vai rolar semana que vem e como Vini tem seus próprios trabalhos o ocupando, me resta só descansar. Foi uma baita de uma semana isso sim. Já ia mandar uma mensagem ao Bruno comunicando eu estava fora de sala quando Glorinha me avista, vindo provavelmente da recepção.

– Milena, que bom que te encontrei. Esqueci de te dizer no intervalo, Djane está te esperando em sua sala.

– Hum, ok.

Decido esperar um pouco antes de mandar alguma mensagem de texto pro Bruno. Quando Djane me tranca com ela, geralmente acabamos saindo juntas. Ao entrar em sua sala e ela me mandar uma interrogação, uma que prenuncia uma preocupação, é como confirmar essa previsão minha. Vou voltar com ela.

– Milena, você já teve um sonho com alguém que não gostasse e essa mesma pessoa estivesse em apuros?

– Em apuros no sonho ou na realidade?

– Na realidade.

Bom, eu já sonhei em ir visitar a cela da Denise, mas lá eu encontrava a Ingrid, a menina da minha escola que foi pega nas armações da minha prima. Às vezes eu sonhava com ela, e presumia eu que era algum sinal de procurar por ela, contatá-la. Se eu estiver certa, Ingrid foi aquela que verdadeiramente amou Kevin, que era outro que não dava notícias desde aquela nossa conferência. Na verdade, eu vinha procurando pela Ingrid faz um tempo, tentei com Eric até, e a garota simplesmente sumiu do mapa. Pelo menos do cibernético, né.

Também já sonhei com o traste do André. Estávamos na empresa e de alguma forma ele era bondoso comigo. Era o bastante pra me assustar. Aquele ali, bondoso? Nem em um milhão de anos!

Mas para Djane, devo parecer apenas pensativa, querendo entender onde ela queria chegar com esse papo. Esses dias tem estado estranha, distante, o professor Renato também observara, e agora... não sei dizer.

– Por que pergunta?

Arrumando umas pastas na prateleira de cima de uma estante de sua sala, Djane não se vira para mim quando me responde.

– Eu... sonhei com Filipe essa noite. Acho que fiquei sentida esses dias pelo que ele me falou no domingo.

Domingo? Eles conversaram domingo?

E vocês conversaram?

– Sim, na hora de eu voltar para cá, nos encontramos no pátio, onde estavam nossos carros. Foi breve, mas... Não sei, Milena. Mexeu comigo, sabe?

Acho que minhas sobrancelhas se levantam sem eu mesma notar. Djane se aproxima de mim e me senta na cadeira com todo o cuidado, de repente me alarmando muito pela sua atitude. Ela parecia nervosa, inquieta. Como se não pudesse se conter em algo. Já estava assim quando a encontrei no intervalo e achei que era por algo que Fabiano tinha falado, pois hoje ele tava que tava. Acho que foi boa coisa o professor Max ter faltado para a última aula, significava mais tempo com ela pra decifrar essa sua linha de preocupação.

Djane senta-se na ponta de sua mesa, bem de frente para mim.

– Eu tenho uma pergunta e um pedido, querida.

– Diz.

– Como meu filho está em relação ao pai? De verdade?

Ela acha que eu menti para ela na última vez que me perguntou sobre isso? O que teria Filipe dito?

– Ele está bem, na medida do possível, como eu disse no outro dia.

Eu não diria o que Vini havia revelado uns dias atrás porque isso concernia somente a ele, que confiou em mim com uma informação bem privilegiada, diga-se de passagem. Ele não gosta de falar abertamente isso com ninguém, principalmente com a mãe.

– Olha, o Filipe me pediu para não contar nada a você, mas...

Interrompo ela antes de mais nada.

– Se ele pediu, deve ter alguma razão. Então não conte.

Me espanta ele querer que isso, o que quer que seja, não chegue aos meus ouvidos, mas se fosse pra respeitar seu desejo, eu o faria. Filipe já se martiriza por tanto.

– Mas Milena... quero que você interceda.

– E ele não quer nem que eu saiba.

– Porque ele sabe que você agiria.

Esse povo me conhece demais. Suspiro. Djane parece agoniada.

O que deve ser pra deixar a mulher desse jeito? E sobre Filipe?

– Ok, do que se trata?

– Você sabe por que ele ainda não se mudou para a casa do seu Júlio?

– Posso imaginar que por causa do Vini.

– Sim, sim... e é mais que isso. Ele teme a reação do Vini quando souber da investigação. Ele me pediu pra contar nada, porque não queria que nenhuma barra fosse forçada.

– Então por que interferir agora?

– Ele tá passando por muita coisa agora. Filipe tem mais medo do Vini do que da família de Viviane. E um amigo dessa família reapareceu. Lembra que a Iara mencionou no almoço?

– O tal cara do rancho?

– Ele mesmo. Filipe me pareceu muito perturbado, Milena.

– Eu o conheci... Ele apareceu essa semana na empresa. E o Filipe... é, ele pirou um pouco. Mas foi bem momentâneo, ele achou que era uma coisa e era outra.

– O que quer dizer?

– O tal senhor queria porque queria poder encontrar o Vinícius e o Filipe pirou achando que isso era uma grande ameaça...

– Oh, meu Deus!

– ... E não era. Quer dizer, eu pude conversar um pouco com esse senhor. Ele não quer prejudicar ninguém.

Ele na verdade achou que eu era algum tipo de arma ou jogada para ameaçá-lo. Depois de quebrar o gelo de estarmos sozinhos na sala do chefão, acho que aquela impressão minha de confiável, que as pessoas costumam falar sobre, foi certeira e o senhor Silveira amainou mais. Aproveitei e desliguei mais o meu profissionalismo, percebi a tempo que isso o deixava receoso.

– Então... o senhor quer ver o Vini. Algum motivo em especial?

– Você é espiã do Filipe?!

– O que o senhor disser e quiser que ele não saiba, não direi.

– Como posso ter certeza?

– Vai ter que confiar em mim.

– Hum. Eu encontrei umas coisas de Viviane. Achei que o Vinícius poderia querer. Pode ser que eu tenha que vender meu rancho e... lidar com isso, ainda é difícil para mim, menina. Ainda posso ouvi-la cantar.

– Cantar?

– Você não sabe? Ela cantava. Maravilhosamente. Era um anjo. Cantava e até os animais, no campo, no celeiro, no rancho, onde fosse, eles se encantavam. Ela era de um espírito incrível. Tenho muitas saudades. Não passo um dia sem...

Era linda a maneira de que ele falava da mãe de Vinícius, eu quase podia vê-la. O velho senhor devia estar vendo-a também, pois muito se emocionou e isso trouxe um pouco daquele seu rancor novamente, mas não tão forte quanto no momento que brigou com Filipe minutos antes.

– Ela era meu anjo e ele a tirou de todos nós. Quero que o Vinícius conheça esse lado de sua mãe, como eu a conheci. Ele merece.

– Tenho certeza que sim, senhor Silveira, e também apoio que ele conheça. O Vinícius é bem curioso quanto a isso, mas agora... Agora não é um bom momento.

– Como assim?

– Agora não é um bom momento para um encontro desses. É o que Filipe tem tentado lhe dizer. O Vini... anda um pouco arisco. Não sei como ele pode corresponder a isso agora. É um momento delicado. Espero que o senhor possa compreender.

– Mas eu preciso...!

– É para o bem dele.

– E até quando isso?

– Até breve, imagino. Não sei quando exatamente. O senhor pode deixar seu contato comigo e eu lhe procuro assim que for possível.

– Mas eu queria tanto poder vê-lo. Filipe o levou uma vez ao meu rancho, tanto tempo atrás. Foi como sentir a presença dela de novo. Eles são tão parecidos.

O senhorzinho se emocionou mais uma vez e era perceptível sua dor quando falava de Viviane, essa pessoinha que a gente só basicamente tem um nome e em outros tempos tocou tantos em sua vida. Eu também me emocionei um pouco. Mostrei algumas fotos do Vini que eu levava no celular e até passei algumas por e-mail, o que o animou mais. O importante era que ele compreendera a situação e iria esperar o contato. Pedi desculpas pelo comportamento de Filipe e logo o encaminhava até a saída. Ainda fiquei um tempo off de meu trabalho porque tive que tranquilizar meu sogro, que tava quase comendo os dedos de nervoso. Então sim, eu também sabia e via como o Filipe andava perturbado nesse sentido.

– Milena, temos que fazer alguma coisa! Porque depois de ter conhecimento disso, e sabendo que seu Júlio precisa de uma companhia, vez que ainda tem algumas recaídas, me preocupo. Ele não contou, mas teve uma crise recentemente. Tenho medo de que possa acontecer algo e não ter alguém por perto. As empregadas da casa não dariam conta e não quero deixá-las com essa responsabilidade.

Isso muda as perspectivas num giro de 180º. Meu coração de repente salta.

– O vô-sogro...? Mas ele tá bem, né? O vô-sogro tá melhor, NÉ, Djane?

– Sim, querida, agora ele está. Mas precisamos agir, minha querida.

– Do que a senhora está falando?

– Precisamos preparar o Vini para o que vem aí. E depressa.

~;~

Normalmente eu sentia um temor sobre Vini descobrir a parada toda sobre sua mãe. Não só eu na verdade, Murilo era outro que tremia na base só de imaginar como ele reagiria. A gente assistiu várias discussões entre ele e o pai e por isso nos preocupávamos tanto. Mesmo progredindo, era algo que sempre ficava a nossa espreita, à espera.

Mas as coisas mudaram mais uma vez, viviam mudando. Murilo nem parece que está com seu sorvete preferido numa tigela, na mesa, absorto tanto quanto eu, que acabei de lhe contar sobre a agonia de Djane. Eu também acho que nem sentia o gosto.

– Acho que explica algumas atitudes da Iara, não acha?

– O que quer dizer, mano?

– Sobre ela não se sentir pertencente àquela casa. A nós. Acho que ela também teme que aconteça uma desgraça e nos separe de vez.

Olho de repente para o nada e... Como eu não pensei nisso? A criatura não é de ligar pontos assim! Mas, droga, fazia um sentido danado. Iara sempre foi esquiva, e tendo isso mente, era uma boa explicação sobre como ela sempre parecia triste de alguma maneira. Não podia ser tudo relacionado ao Sávio, afinal.

– Pensando bem, faz sentido. Acho que ela não suportaria ser afastada novamente de quem ela ama, mesmo que para seguir os passos de Filipe. Ela nunca iria abandoná-lo. E tudo depende do Vini.

Ele sempre fora a chave da questão. Uma vez eu lhe disse isso num momento tão ingênuo da minha parte, que não tinha noção do que era a história em que ele estava metido, e eu, em consequência. O comportamento arisco dele também não ajudava. Ora ele queria descobrir tudo, ora ele deixava pra lá. Descobrir que Filipe era na verdade seu pai, não tio, foi de um tamanho baque que nunca eu iria esquecer.

Apesar de ser desejoso em conhecer mais da mãe, ele nunca pôde ir atrás. Pois o único que lhe cederia as informações era Filipe, quem cuidara desse assunto só porque nós pedimos. Até hoje eu não sabia se havia feito o certo. Estávamos atuando por trás de Vinícius, e ele, como eu, é bem exigente quando se trata de confiança. Não éramos nem para nos falar. E lá estávamos uma noite, convencendo Filipe de dar esse passo pelo filho.

Murilo levanta-se, coloca a tigela suja na pia.

– Djane tá certa. A gente tem que agilizar isso. Eu sei que você é contra mexer no assunto de Viviane, mas... isso... Isso poria algum fim, entende? Se não for pelo Vini, pelo Filipe ou pela Iara, que seja pelo seu Júlio. Ele muda tudo.

– O que quer dizer?

– Que o Vini não é mais prioridade. Ele também é nosso avô, Mi. Não acredito que ele teve uma crise e não nos avisou!

Quando levanto os olhos para meu irmão, de pé, encostado na bancada da pia, que larga sua colher lá com tamanha cólera, quase posso sentir o que ele está sentindo. Dói sequer imaginar de perder o vô-sogro por besteira. Os meus olhos marejam como os do meu irmão, contudo guardamos esse sentimento. Não era hora de se desesperar.

– Ele quis nos preservar, mano.

– Eu não quero ser preservado. Eu quero ele bem, droga!

Meu irmão funga de repente, raivoso desse jeito, e pelo modo com que cruza os braços, sei que ele não quer consolos. Ele quer resultados. Mais uma vez nessa noite ele encara a capa da pasta que guarda os documentos da investigação, documentos estes que Djane me devolvera essa noite, e declara tão resoluto quanto ela:

– A gente... A gente precisa fazer algo,

– O que poderíamos fazer, assim, de repente?

– Não sei. O que o Vini tem falado sobre o Filipe? Sinceramente.

Eu não conseguiria guardar isso do meu irmão, como fiz com Djane, nem se eu quisesse. Meu mano me olha de um jeito determinado que nem sei explicar bem. Como Djane, isso mexia muito consigo. Colocar seu Júlio no meio então, acho que pensava que isso exigia medidas mais incisivas. Ele e o Vini eram grandes amigos, só não sei o quanto meu namorado teria lhe confinado sobre o assunto.

– Ele não te diz nada?

– Acho que ele se sente acuado quando eu menciono por acaso, fica na defensiva. Raramente diz algo. E com você?

– Conversamos bastante sobre isso. É bem difícil para ele admitir, mas da última vez... ele disse. Sente falta de Filipe. E isso tem o deixado bem desnorteado. Principalmente depois do sonho ruim que ele teve.

– Que sonho?

– Ah, foi uma noite aí. O pesadelo mostrava Filipe sendo... errr... metralhado... bem na frente dele. O Vini pirou.

– Puta merda! E aí?

– E aí que ele ligou de madrugada pro Filipe. Tava muito assustado. Tipo muito mesmo. Ele imaginou que Filipe iria dizer algo pra mim, naquele almoço em prol da Iara, mas acho que ele também me preservou.

Naquele dia que Vini começou a perguntar sobre o pai, parecia que uma carga saía de suas costas. Tão curioso, ele mantinha-se um pouco quieto, acho que para não dar na cara. Ainda posso ouvir suas perguntas, sondando-me.

– Murilo me contou sobre o episódio do suposto namorado da Iara.

Também acabei contando sobre um fato em especial, visto que ele parecia tão em paz.

– Sabia que ele anda com uma foto sua de criança na carteira? É uma foto bem bonitinha.

– Sério? Nunca imaginei que ele seria esse tipo de pessoa. Ele te mostrou?

– Não, vi por acaso algumas vezes quando ele me dava carona.

E ele me contando sobre o almoço, no dia que pedi primeiro a ele para Filipe poder comparecer. Eu tava tão envolvida com a história de Iara e a história maluca de Sávio que sequer notei o que rolava debaixo de meu nariz.

Naquele dia que você me pediu para deixá-lo ir no domingo, por causa da Iara, eu meio que gelei. O pesadelo foi uma noite antes e eu teria que o encarar. Não minto que me preocupei mais com isso do que um cogitar sobre ele ter contado. Talvez tenha contado a Iara, mas não você. Fiquei esperando por dias você falar algo e nunca vinha. Aí vi que ele não iria fazer alarde disso.

Murilo, no entanto, ansioso, começa a maquinar consigo mesmo e me tira do plano dos pensamentos.

– Ok, a gente precisa calcular bem nossos passos.

– Calcular, Mu? Você me assusta falando desse jeito.

Ele passa a mão no rosto, bem mais apreensivo, mas se vendo sem saída.

– Desculpa, mas que o opção temos?!

Fecho os olhos e massageio as têmporas, sentindo isso cada vez mais próximo. Eu também queria o fim, mas... e se? E se o Vini surtasse de vez? Se ele ficar de mal mesmo com o Filipe e ele ter que definitivamente se afastar? Eu não ligo tanto para o que aconteceria entre nós, o que pensaria de mim. Tava ficando apertado para todo mundo.

– Espera, e quanto à Iara?

– Mantemos o plano, não podemos furar com ela amanhã. Ela foi outra magoada nessa história. De qualquer forma, não podemos deixar isso transparecer.

– Você nunca foi bom em guardar coisas das pessoas.

Não falo isso para ofender, mas como um alerta. Murilo, contudo, me surpreende.

– Eu vou me controlar, pode ter certeza. E você vai ter que voltar a ser aquela atriz... por um bem maior. Acha que consegue?

– É sério que você tá me pedindo isso?

– Acha que eu poderia brincar?

Não, não poderia. Recomponho-me e lhe dou minha resposta.

– Pode contar comigo.


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Notas finais do capítulo

Cuuuuuuuuuurtiram o combo?

Pra findar, vai um trechinho do próximo só pra dar o toque final:

"Mas o que, AFINAL, você disse pro Sávio ontem na hora de ele ir?
Murilo estava vendo algo na tela de seu celular, ainda comendo de seu sanduíche. Muito calmo, ele dá um sorrisinho de lado e não sei se é por algo no seu aparelho ou se pelo tópico em questão.
— Papo de homem.
— Aff, Murilo. Conta logo.
Mas ele insiste em não revelar muito. O que me admira nisso é que ele de repente levanta a cabeça, com a cara mais inocente-suspeita do mundo e dá de ombros, com o olhar meio vago, como que reanalisando o caso.
— Tô te dizendo... papo de homem. Tem coisas que... só funcionam assim.
— O que você quer dizer com isso?
— Nada em especial.
Meu irmão está treinando drible de conversa comigo? Pois vai ter que tentar mais, ainda tenho muita pulguinha nas minhas orelhas. Desligo a máquina e me aprumo pra levantar, enquanto ele volta-se mais uma vez para a tela do seu celular.
— Contanto que não tenha ameaçado ele demais, acho que tá de bom tamanho."

Digamos que o Murilo foi mto convincente ^.^

Até breeeeeeeve!



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